Saúde, a herança de LFP

- Gestão Hospitalar (GH) – Que avaliação faz do actual ministro da saúde ?
- Correia de Campos (CC) – É um pouco desagradável chegar ao fim destes três anos e fazer uma avaliação negativa, mas creio que tenho alguma liberdade para a fazer porque sempre lhe dei o benefício da dúvida. De certa forma, apoiei-o manifestando concordância com uma boa parte das medidas que ele executava.
Ele fez algumas coisas importantes, trazendo uma nova cultura empresarial para o Ministério da Saúde, iniciou uma boa reforma da política do medicamento – embora com alguns erros – mas perdeu muita da sua capacidade de intervenção por ter, quase insensivelmente, praticado uma manipulação informativa que descredibilizou as suas próprias reformas. Nomeadamente nos Hospitais SA. A publicação propagandística dos resultados dos Hospitais SA foi ...
- GH – A pior crítica que se lhe pode fazer é pela propaganda e não pelas acções ?
- CC – As acções foram, essencialmente, no caminho correcto, no sentido de empresarializar. Mas como estava obsecado com a visão materialista do desempenho da Saúde ele omitiu tudo o resto. Deu menos importância à Saúde Pública, fez um tratamento tardio e mal feito dos cuidados de Saúde primários, publicou uma legislação retrógrada, incompreensível, puramente quantitavista. Isso fez-lhe perder muito crédito. A certa altura, de uma forma quase desesperada, pretendia que os números que tinha na mão eram correctos. Não é possível que as despesas com pessoal nos Hospitais SA em 2004 só pudessem ter subido 1,8%. É uma impossibilidade aritmética! Todas as pessoas com menos de mil euros por mês – e são muitas – tiveram aumentos de 2,4%. A estimativa que nós fazemos é que deve ter havido um aumento da despesa de 5%. Para quê dizer coisas que são manifestamente impossíveis!
Isto associado ao facto de as escolhas para gestores dos SA terem sido pessoas que tinham insensibilidade para a Saúde, sem preparação, interpretavam-se como caciques políticos ...

- GH - Sabe que alguns sectores o acusam de seguir a política de Luís Filipe Pereira ?

- CC - Se continuar a política boa, tudo bem ! Não vejo razão nenhuma para se destruir a cultura empresarial que se criou, não vejo razão nenhuma para se destruir a procura de indicadores, de maior eficiência, o registo mais rigoroso de todos os serviços prestados pelos hospitais, o maior empenho de todas as chefias no registo e rigor na gestão sem desperdiçar recursos ... É uma cultura que se tinha perdido.
Entrevista de Correia de Campos, Gestão Hospitalar, Fevereiro 2005.

Estas declarações de António Correia de Campos não deixam de ser surpreendentes, mesmo para quem priva de perto com o professor. Nesta altura, as discordâncias de Correia de Campos, relativamente ao ministro cessante, são meras bagatelas e o PS não tem Política de Saúde, pois limitar-se-à a aplicar a herança de Luís Filipe Pereira, com pequenas afinações de pormenor.