terça-feira, novembro 17

Estamos tocando el fondo


Portugal não precisa só de ser vacinado. Precisa de ser varrido, lavado e desinfectado.
Varrido de sucateiros: dos encamisados, dos engravatados, dos fardados e dos togados.
Dos de mão sujas e dos enluvados. Dos suados e dos perfumados.
Estou farto. Estamos fartos. Dos “emPINocados” dos sobreiros, dos esquecimentos dos Loureiros, do pivete de Alcochete e da porcaria submarina.
De tanta contrapartida e de tanta massa perdida. De gente tão maltratada e de tanta face ocultada.
“Estamos tocando el fondo, estamos tocando el fondo.”
Brites

Etiquetas:

14 Comments:

Blogger Tavisto said...

Meu caro Brites

Junto-me à sua indignação e, cada vez mais, me pergunto que fazer? É que não encontro para este mal solução fácil.
A geração de 70 tinha a expectativa que o fim da monarquia e a implantação da República, seriam solução para retirar o País do atraso enorme em que se encontrava (só para se ter uma ideia, a taxa de alfabetos era de 20% á altura, sendo em Inglaterra de 90%; o nosso PIB à volta dos 20% da média europeia). Afinal a República pouco durou e rapidamente descambou para uma ditadura de 48 anos, com todas as consequência que se conhecem. A geração de Abril acreditou que o fim da ditadura fascista traria democracia e prosperidade. E, não pretendendo ser derrotista, trouxe-nos liberdade mas o pão volta a escassear e a emigração voltou em força. Vemo-nos ultrapassados por cada novo país que entra na CEE e temos hoje partidos políticos esgotados: os que passaram pelo poder em rápido processo de desacreditação por graves problemas de corrupção e os demais sem soluções políticas ou projectos sociais mobilizadores, esgotando-se em medidas de protesto.
Não se imagina nem desejam, soluções musculadas ou interregnos de democracia à MFL, mas que se não arrepiarmos caminho corremos sérios riscos de tudo isto acabar mal lá isso corremos.

2:45 da tarde  
Blogger tambemquero said...

Em declarações à TSF, Francisco Assis afirmou que “as propostas que foram apresentadas pelo sr. engenheiro João Cravinho podem a cada momento ser objecto de uma reapreciação” pelo grupo parlamentar socialista, mesmo depois de o primeiro-ministro já ter dito que as actuais leis sobre esta matéria são suficientes. Para o líder parlamentar, a revisão justifica-se como uma defesa do Estado de Direito. link

JP 12.11,

4:56 da tarde  
Blogger ochoa said...

(Armando Vara que não tirou a licenciatura ao domingo, mas fez a pós-graduação antes da Licenciatura).

Toda a 'carreira', se assim lhe podemos chamar, de Armando Vara, é uma história que, quando não possa ser explicada pelo mérito (o que, Aparentemente, é regra), tem de ser levada à conta da sorte. Uma sorte extraordinária. Teve a sorte de, ainda bem novo, ter sentido uma irresistível vocação de militante socialista, que para sempre lhe mudaria o destino traçado de humilde empregado bancário da CGD lá na terra. Teve o mérito de ter dedicado vinte anos da sua vida ao exaltante trabalho político no PS, cimentando um currículo de que, todavia, a nação não conhece, em tantos anos de deputado ou dirigente político, acto, ideia ou obra que fique na memória.
Culminou tão profícua carreira com o prestigiado cargo de ministro da
Administração Interna - em cuja pasta congeminou a genial ideia de transformar as directorias e as próprias funções do Ministério em Fundações, de direito privado e dinheiros públicos. Um ovo de Colombo que, como seria fácil de prever, conduziria à multiplicação de despesa e de "tachos" a distribuir pela "gente de bem" do costume. Injustamente, a ideia causou escândalo público, motivou a irritação de Jorge Sampaio e forçou Guterres a dispensar os seus dedicados serviços. E assim acabou - "voluntariamente", como diz o próprio - a sua fase de dedicação à causa pública. Emergiu, vinte anos depois, no seu guardado lugar de funcionário da CGD, mas agora promovido por antiguidade ao lugar de director, com a misteriosa pasta da "segurança". E assim se manteve um par de anos, até aparecer também subitamente licenciado em Relações Qualquer Coisa por uma também súbita Universidade, entretanto fechada por ostensiva fraude académica. Poucos dias após a obtenção do "canudo", o agora dr. Armado Vara viu-se promovido - por mérito, certamente, e por nomeação política, inevitavelmente - ao lugar de administrador da CGD: assim nasceu um banqueiro. Mas a sua sorte não acabou aí: ainda não tinha aquecido o lugar no banco público, e rebentava a barraca do BCP, proporcionando ao Governo socialista a extraordinária oportunidade de domesticar o maior banco privado do país, sem sequer ter de o nacionalizar, limitando-se a nomear os seus escolhidos para a administração, em lugar dos desacreditados administradores de "sucesso". A escolha caiu em Santos Ferreira, presidente da CGD, que para lá levou dois homens de confiança sua, entre os quais o sortudo dr. Vara. E, para que o PSD acalmasse a sua fúria, Sócrates deu-lhes a presidência da CGD e assim a meteórica
ascensão do dr. Vara na banca nacional acabou por ser assumida com um sorriso e um tom "leve".
Podia ter acabado aí a sorte do homem, mas não. E, desta vez, sem que ele tenha sido tido ou achado, por pura sorte, descobriu-se que, mesmo depois de ter saído da CGD, conseguiu ser promovido ao escalão máximo de vencimento, no qual vencerá a sua tão merecida reforma, a seu tempo.
.../

5:07 da tarde  
Blogger ochoa said...

.../
Porque, como explicou fonte da "instituição" ao jornal "Público", é prática comum do "grupo" promover todos os seus administradores quadros ao escalão máximo quando deixam de lá trabalhar. Fico feliz por saber que o banco público, onde os contribuintes injectaram nos últimos seis meses mil milhões de euros para, entre outras coisas, cobrir os riscos do dinheiro emprestado ao sr. Comendador Berardo para ele lançar um raide sobre o BCP, onde se pratica actualmente o maior spread no crédito à habitação, tem uma política tão generosa de recompensa aos seus administradores - mesmo que por lá não tenham passado mais do que um par de anos. Ah, se todas as empresas, públicas e privadas, fossem assim, isto seria verdadeiramente o paraíso dos trabalhadores! Eu bem tento sorrir apenas e encarar estas coisas de forma leve. Mas o 'factor Vara' deixa-me vagamente deprimido. Penso em tantos e tantos jovens com carreiras académicas de mérito e esforço, cujos pais se mataram a trabalhar para lhes pagar estudos e que hoje concorrem a lugares de carteiros nos CTT ou de vendedores porta a porta e, não sei porquê, sinto-me deprimido. Este país não é para todos. P.S. - Para que as coisas fiquem claras, informo que o sr. (ou dr.) Armando Vara tem a correr contra mim uma acção cível em que me pede 250000 euros de indemnização por "ofensas ao seu bom nome". Porque, algures, eu disse o seguinte: "Quando entra em cena Armando Vara, fico logo desconfiado por princípio, porque há muitas coisas no passado político dele de que sou altamente crítico". Aparentemente, o queixoso pensa que por "passado político" eu quis insinuar outras coisas, que a sua consciência ou o seu invocado "bom nome" lhe sugerem. Eu sei que o Código Civil diz que todos têm direito ao bom nome e que o bom nome se presume. Mas eu cá continuo a acreditar noutros valores: o bom nome, para mim, não se presume, não se apregoa, não se compra, nem se fabrica em série – ou se tem ou não se tem. O tribunal dirá, mas, até lá e mesmo depois disso, não estou cativo do "bom nome" do sr. Armando Vara. Era o que faltava! Acabei de confirmar no site e está lá, no site institucional do BCP. Vejam bem os anos de licenciatura e de pós-graduação!!!!!: Armando

António Martins Vara. Dados pessoais:
Data de nascimento: 27 de Março de 1954
Naturalidade: Vinhais - Bragança
Nacionalidade: Portuguesa
Cargo: Vice-Presidente do Conselho de Administração Executivo
Início de Funções: 16 de Janeiro de 2008
Mandato em Curso: 2008/2010 Formação e experiência Académica
Formação:
2005 - Licenciatura em Relações Internacionais (UNI)
2004 - Pós-Graduação em Gestão Empresarial (ISCTE)

http://www.millenniumbcp.pt/pubs/pt/grupobcp/quemsomos/orgaossociais/article.jhtml?articleID=217516

Extraordinário... CV de fazer inveja a qualquer gestor de topo, que nunca tenha perdido tempo em tachos e no PS! Conseguiu tirar uma Pós-graduação ANTES da licenciatura...
Ou a pós-graduação não era pós-graduação ou foi tirada com o mesmo professor da licenciatura, dele e do Eng. Sócrates...

E viva o BCP e o seu "bom nome"!!!

Expresso 8:00 Segunda-feira, 19 de Jan de 2009

5:08 da tarde  
Blogger joana said...

A fumaça é cada vez mais espessa. Generaliza-se a desconfiança nas instituições.
O combate à corrupção tornou-se a prioridade das prioridades.

10:47 da tarde  
Blogger Antunes said...

"É urgente tomar medidas para que a nossa democracia não continue envenenada pela suspeita de que a maioria da classe política é corrupta. Não é. Mas a convicção vale de pouco se não convencermos os nossos concidadãos. É, por isso, inadiável retomar o projecto do camarada João Cravinho e prever na lei penal o crime de enriquecimento ilícito. O político que adquirir bens em desconformidade com as suas declarações fiscais de rendimentos tem de provar que o fez com dinheiro limpo. Se não, será punido.É preciso parar de encobrir os corruptos com palavreado e má técnica jurídica.
(...) enquanto não tivermos a coragem de criar meios eficazes e expeditos de punir a corrupção, continuará a pairar a suspeita sobre todos, para desgraça da nossa República. Não podemos ignorar o estado e a morosidade da Justiça, pelo circo em que se transformou o segredo de justiça, sobretudo na fase de inquérito de processos mediáticos, e pelo insustentável desarmamento do Estado em relação à corrupção, ao tráfico de influências e aos crimes de colarinho branco. Actuemos e actuemos já! (...)".

Ana Gomes, causa nossa

10:54 da tarde  
Blogger tambemquero said...

As autoridades inglesas decidiram arquivar o processo Freeport, segundo avança o jornal Expresso na edição online. O caso era investigado pelo Serious Fraud Office (SFO) e a Overseas Anti-Corruption Unit (OACU) da polícia de Londres desde 2007.

Segundo escreve o jornal, a decisão deveu-se à falta de elementos para provar a alegada corrupção que terá levado ao licenciamento do outlet de Alcochete. As autoridades tomaram a decisão esta quinta-feira depois dos elementos recolhidos não terem permitido constituir arguidos no processo.

O SFO chegou a pedir informações a Portugal no início de 2009, através de uma carta rogatória, revelando nesse momento que tinha uma lista de seis cidadãos britânicos suspeitos de estarem envolvidos no caso.

Um deles era Charles Smith que veio a ser constituído arguido em Portugal por ser residente em Portugal. Em relação aos outros cinco não foram reunidos indícios capazes de sustentar a continuação das investigações.

O processo Freeport passa agora a estar apenas nas mãos dos investigadores portugueses. Os procuradores com o processo em Portugal, Pais de Faria e Vítor Magalhães, esperaram agora que os ingleses contribuam com as respostas aos pedidos de informação financeira enviadas por Lisboa e que ainda estão pendentes.

expresso online 13.11.09

1:06 da manhã  
Blogger tambemquero said...

O crime de enriquecimento ilícito

Anos a fio, a grande maioria dos nossos actores políticos desfazia-se em impropérios quando se falava no crime de enriquecimento ilícito. Basta recordar o clamor que se seguiu quando, pela primeira vez, a questão foi levantada entre nós - o discurso de Sampaio em 5 de Outubro de 2005.

Agora está tudo a favor... menos o PS. E o argumento do partido do governo é o mesmo - convém lembrá-lo - que, sem razão, foi sendo esgrimido pelos que agora estão na oposição: haveria inversão do ónus da prova, o que vai contra todos os princípios e viola a Constituição.

É que, no Estado de Direito - diz-se, e é verdade -, compete a quem acusa fazer prova da acusação. E é esse encargo que se chama ter o ónus da prova.

Ora o crime de enriquecimento ilícito pode ser formulado nos seguintes termos: é punido com a pena de x anos de prisão o agente público que adquirir bens em manifesta desconformidade com os rendimentos fiscalmente declarados e sem que se conheça outro meio de aquisição lícito. E caberá ao Ministério Público fazer prova de tudo: (i) dos bens adquiridos e seu valor, (ii) dos rendimentos fiscalmente declarados, (iii) da manifesta desconformidade entre uns e outros, (iv) de não ser conhecido outro meio de aquisição lícito. O acusado terá o ónus de provar que, afinal, existe uma causa lícita de aquisição que não era conhecida - herança, bolsa, totoloto, euromilhões.

Ora o ónus de prova, em matéria criminal, sempre se distribuiu assim: a acusação prova o ilícito e a culpa, o acusado os factos que possam excluir uma coisa ou outra - provado o homicídio, é o arguido quem tem de provar a legítima defesa; provado o furto, é o acusado quem tem de provar o estado de necessidade.

Onde, então, a inversão do ónus de prova?!

A resistência do PS é, por tudo isto, incompreensível. E só dispondo a lei penal para futuro, fica-nos a interrogação: afinal de que tem medo o PS?

Magalhães e Silva
I, 12.11.09link

1:57 da tarde  
Blogger cotovia said...

O primeiro-ministro reagiu ontem à divulgação de alegadas conversas com Armando Vara dizendo que está a ser vítima de “inverdades” e de “insultos”. Com a pressão do caso Face Oculta a intensifi car-se em torno do seu nome e das suas funções, José Sócrates começa a sentir que o silêncio é ensurdecedor. Ainda bem.
Numa democracia, o silêncio sobre assuntos que estão no centro da atenção dos cidadãos é sintoma de indiferença de quem ocupa o poder.
Como aqui já se escreveu, o primeiro-ministro tem o dever de encarar de frente este problema que mina os fundamentos morais do regime e está a degradar a um ritmo nunca visto a imagem do seu próprio Governo. Mas, pelo que ontem se pôde observar, José Sócrates preocupa-se apenas em cuidar de uma parte desse problema. O que mais lhe interessa e, ao mesmo tempo, o que menos preocupa os cidadãos. Dizer que está a ser de novo alvo de uma campanha é um direito que lhe assiste, querer saber junto do procurador-geral se as escutas são ou não legais é uma atitude que se lhe compreende. Mas, além do direito à legítima defesa da honra face a suspeitas, o primeiro ministro tem também o dever de esclarecer se essas suspeitas são, ou não, fundamentadas.
Concretizando, é crítico saber se José Sócrates falou com Armando
Vara sobre o possível favorecimento de grupos de comunicação social; se urdiu ou não um plano para calar a TVI; se pediu ou não ao seu amigo de anos ajuda ao financiamento do PS.
Como fez nos momentos graves do caso Freeport, o primeiro-ministro tem a obrigação de produzir uma declaração formal sobre estas perguntas que preocupam o país.
Responder-lhes entre remoques e acusações, não basta. O presente, mas também a memória futura, reclama do primeiro-ministro um nível de intervenção que uma fugaz conversa com jornalistas à porta do CCB não consegue produzir.


editorial do JP 14.11.09

9:22 da manhã  
Blogger tambemquero said...

Já não bastava mais uma polémica com o primeiro-ministro. Não era suficiente termos um Presidente da República fragilizado. Também era necessário que a sociedade portuguesa se confrontasse agora com as divergências públicas entre o presidente do Supremo Tribunal de Justiça e o procurador-geral sobre as certidões do "Face Oculta"!

Tudo isto parece uma tragédia de fim de regime, de consequências imprevisíveis.

Além do mais, no terreno, os administradores da justiça estão notoriamente empenhados em devassar, de novo, os processos que deveriam defender e investigar de forma recta e sem mácula.

É preciso que o País se habitue a investigar e castigar os poderosos, sim senhor, mas é absolutamente imprescindível que o faça num quadro europeu, de Estado de direito, em que toda a gente seja considerada séria até ao momento em que, de facto, deixa de o ser.

Não é isso que acontece e ontem foi um dia curioso neste sentido.

No preciso momento em que José Sócrates viu a respeitada e insuspeita polícia inglesa arquivar o processo Freeport (que produziu por cá as consequências de todos conhecidas), abriu- -se já uma nova frente a partir de escutas entre o primeiro-ministro e o seu amigo Armando Vara.

Não sabemos de que factos falamos. Não sabemos se as conversas são criminalmente relevantes. Não sabemos, sequer, da respectiva legalidade. Mas a realidade está à vista de todos: crescem as notícias, florescem os comentários, impõe-se uma comunicação doentia em que não faltam sequer os poucos escrúpulos de grupos de jornalistas ávidos de acertar contas com o passado.

2 A guerrilha, mais uma vez, está instalada e a culpa, sendo de muitos, é sobretudo de dois homens que eu acuso de serem os principais responsáveis pela actual crise que afecta a sociedade portuguesa: José Sócrates e Cavaco Silva.

É à sombra de ambos que os exércitos se acantonam e combatem, na justiça e na comunicação social.

Sob a passividade de São Bento e Belém, escorre a intriga na política.

São os seus operacionais que movidos pelo ódio (já não só político) estão a conspurcar a vida pública nacional.

Nos bastidores, joga-se com trunfos que vão do BPN ao Freeport, do aeroporto à "Face Oculta", de Dias Loureiro a Armando Vara.

Se as coisas se agravarem a um nível insuportável, Sócrates e Cavaco deverão ser julgados por isso no grande tribunal da cidadania que tem de abrir as portas e começar finalmente a funcionar.

No dia em que Portugal se transformar definitivamente numa pequena e desgraçada Itália, serão eles quem se sentará no banco dos réus da história. Que tenham a consciência disso e do mal que estão a fazer à democracia portuguesa.

A intervenção de Manuela Ferreira Leite no Parlamento, esta semana, é ilustrativa do que atrás disse. A presidente do PSD farejou uma última oportunidade e voltou à campanha, sem qualquer pudor. Não foi politicamente séria, mas teve eficácia popular. Uma líder populista e demagógica é assim que actua. Muito bem!

joão marcelino DN 14.11.09

8:09 da tarde  
Blogger joana said...

As más companhias

Pode ser que me engane, mas o potencial de danos que Armando Vara pode vir a causar a José Sócrates é bem maior do que todos os outros casos ou pretensos casos que tanto desgastaram a imagem do primeiro-ministro e tão decisivamente contribuíram para a perda da maioria absoluta do PS. Armando Vara (e não a ‘Face Oculta’) tem a capacidade de, por si só, arrastar Sócrates para a queda num poço de que se desconhece a profundidade. Há amizades que matam, quando se misturam com outras coisas que não são misturáveis. Foi José Sócrates quem, em nome da amizade (porque competência ou qualificação para o cargo ninguém a conhecia, nem ele), fez de Armando Vara administrador do banco do Estado, três dias depois de este ter adquirido uma espécie de licenciatura naquela espécie de Universidade entretanto extinta — e porque uma licenciatura era recomendável para o cargo. E foi José Sócrates quem, indisfarçadamente, promoveu a transferência de Santos Ferreira e Vara da Caixa para o BCP, numa curiosíssima operação de partidarização do maior banco privado português, sobre as ruínas fumegantes do escândalo em que tinha acabado o case study da sua gestão ‘civil’.
Manda a verdade que se diga, porém, que estes dois golpes de audácia de José Sócrates em abono de um amigo e compagnon de route político foram devidamente medidos: aparentemente, Sócrates contava com o silêncio e aceitação cúmplice com que toda a classe empresarial e financeira recebeu a meteórica ascensão de Armando Vara aos céus da banca e o take-over do PS sobre o BCP, como se de coisa naturalíssima se tratasse. O escândalo não ultrapassou as fronteiras da opinião pública, de modo a perturbar o núcleo duro do regime. E isso foi um primeiro sinal do nível de promiscuidade aceite entre o político e o económico a que estamos agora a assistir. E, em silêncio sempre, toda a classe empresarial clientelar foi assistindo a uma série de notícias perturbadoras sobre operações bancárias a favor de algumas empresas ou investidores que, por acaso certamente, pertencem ao tal núcleo duro do regime, que goza do favor político da actual maioria. Sempre escrevi aqui que, em minha opinião, o problema do PS não é o que ele deixa de fazer em benefício dos pobres, mas o que faz e consente em benefício dos potentados. O fascínio com o grande capital e os grandes negócios (inspirados, promovidos ou pagos pelo Estado) é a perdição do PS. Aos poucos, este PS tem vindo a copiar o modelo de gestão introduzido por Alberto João Jardim na Madeira: negócios privados com oportunidades e dinheiros públicos, em troca da solidariedade política para com o Governo. Um capitalismo batoteiro, com chancela ‘social’ e disfarce de ‘interesse público’.
Neste clima de facilitismo instalado, já ninguém se espanta com as sucessivas e tremendas notícias sobre o estado de gestão do ‘interesse público’. Já não espanta descobrir que nenhuma das contrapartidas da ruinosa e inútil aquisição dos submarinos tenha sido executada e que a sua execução nem sequer esteja devidamente salvaguardada no contrato assinado pelo Estado português. Não espanta que a Grão-Pará (uma empresa que não existiria sem os sucessivos favores do Estado, incluindo do ex-ministro e ex-socialista Pina Moura), possa, finalmente e com o beneplácito do Supremo Tribunal Administrativo, construir, e em grande, na zona de construção proibida do Parque Natural Sintra-Cascais.
.../

Sousa Tavares, expresso 14.11.09

12:17 da tarde  
Blogger joana said...

.../
Não espanta que, antes mesmo de lançadas ou terminadas as obras, as últimas seis concessões de auto-estradas já tenham ultrapassado em 40% o valor das estimativas do Governo — num impressionante ‘deslize’ de 1110 milhões de euros. Não espanta que o Tribunal de Contas chumbe duas das adjudicações porque as condições em que elas foram outorgadas não são as mesmas do concurso público, mas substancialmente mais gravosas para o Estado. E não espanta que o presidente das Estradas de Portugal venha afirmar que se trata apenas de “interpretações jurídicas” diversas e que a suspensão das empreitadas irá pôr em causa postos de trabalho (um ‘argumento’ mágico que vale para justificar todas as tropelias cometidas nos últimos anos, em matéria de urbanismo e obras públicas). E não espantará ninguém que, como aqui escrevi a semana passada, em breve se descubra que, antes mesmo de iniciadas as obras, já o TGV e o aeroporto de Alcochete ‘derraparam’ 20 ou 30% sobre o seu custo anunciado. E, se se conseguir penetrar a meticulosa teia de ‘pareceres’ técnicos, estudos, cláusulas ocultas dos contratos, arbitragens sempre desfavoráveis ao Estado, se formos tentar descobrir como, porquê e a favor de quem é que não há uma obra pública que cumpra o orçamento, encontraremos sempre mais do mesmo — os mesmos processos, os mesmos truques, as mesmas empresas, os mesmos ‘facilitadores’ de negócios no papel de go between entre o ‘interesse público’ e os negócios privados. Isto, num país onde o défice das contas do Estado chegou aos 8% e a dívida pública aos 80% do PIB e o extermínio fiscal sobre os que pagam impostos se tornou insustentável. O ar está a ficar irrespirável.
Como se tudo isto não fosse já alarmante, eis que a justiça implodiu de vez e à vista de todos, em sucessivas cenas lamentáveis na praça pública. A coisa ficou tão anárquica que já se tornou normal ver os jornalistas irem pedir opiniões sobre os casos mediáticos pendentes aos sindicatos dos juízes e do Ministério Público! Não fosse a PJ (única entidade da justiça que ainda merece algum crédito) e um seu investigador de Aveiro, e a ‘Face Oculta’ nunca teria conhecido a luz do dia ou teria logo patinado. Mas, como os maus hábitos nunca se perdem, eis que tudo já entrou na normalidade, com as escandalosamente normais fugas do segredo de justiça a invadirem a imprensa, tratando de sabotar alegremente uma investigação até aqui conduzida num exemplar silêncio e profissionalismo. E já só pode dar vontade de rir (ou de chorar!) assistir ao espectáculo único de ver os dois mais altos magistrados do país — o presidente do Supremo e o PGR — trocando galhardetes de antiga amizade fundada em rivalidades sindicais, empurrando um para o outro as malditas escutas entre Armando Vara e José Sócrates. Seja qual for o conteúdo de tão sensível material, e mesmo que jamais o venhamos a saber, eles conseguiram já o pior de todos os resultados: instalar uma suspeita mortal sobre o primeiro-ministro e o funcionamento da própria justiça, que não tem reparação possível. É, de facto, notável
que o único cidadão deste país que não entende que há coisas que não podem esperar dois meses ou até oito dias para serem reveladas, seja o cidadão que ocupa o lugar de procurador-geral da República! Realmente, o lugar parece estar amaldiçoado e desde há muito.
Junte-se então um governo cujo primeiro-ministro é dado a companhias comprometedoras, um sistema em que se fundem e confundem o político e o económico, o público e o privado, uma justiça que verdadeiramente se tornou cega e surda, mas não muda, um Presidente da República que se desautorizou a si próprio no pior momento, e um país onde as noções de interesse público e serviço público já quase se perderam por completo sem vergonha alguma, e tudo isto começa já a cheirar indisfarçadamente mal. Cheira a fim de regime e só os loucos ou os extremistas é que podem achar isso uma boa perspectiva para o futuro.

Sousa Tavares, expresso 14.11.09

12:18 da tarde  
Blogger Hospitaisepe said...

«Neste clima de facilitismo instalado, já ninguém se espanta com as sucessivas e tremendas notícias sobre o estado de gestão do ‘interesse público’.»

É neste clima de facilitismo que deve ser entendido muito do que tem vindo a acontecer nos últimos anos na gestão dos serviços de saúde, nomeadamente nas Parcerias da Saúde.
Basta atentar na constituição e forma de nomeação das equipas responsáveis pela fiscalização destes contratos.

12:53 da tarde  
Blogger PhysiaTriste said...

Caro Tavisto:

Obrigado pelo seu comentário. Uma leitura pelos jornais dos últimos dias, mostra-nos quão partilhada é a preocupação pelo estado da nossa Democracia.
Já não são apenas as previsões catastrofistas de Medina Carreira, o pessimismo militante de Vasco Pulido Valente, o cepticismo desiludido de António Barreto.
Pessoas com a experiência de Silva Lopes, de Henrique Neto, de Hernâni Lopes, e tanta outra gente de bem, obrigam-nos a reflectir profundamente sobre o estado da Nação.
O próprio ministro da Economia dava, numa entrevista recente, uma imagem significativa da situação da economia portuguesa. Dizia ele que estamos no meio duma ponte e já não é possível voltar para trás. Ou alcançamos a outra margem ou soçobramos.
Todos nós, no fundo, sabemos que é impossível garantir o Estado Social com a despesa a aumentar mais que a criação de riqueza.
O Governo parece confiar muito nas Obras Públicas para fazer crescer a economia. Acontece que as últimas seis concessões de auto-estradas (Nicolau Santos, no último suplemento económico do Expresso) derraparam 39,7%, custando ao contribuinte mais 1.110 milhões de euros a mais do que o previsto.
Diz o jornalista que os contribuintes portugueses deveriam “estar vermelhos de raiva e indignação” e aproveita para juntar ao texto a História da Moral de O’Neill:

Você tem-me cavalgado / seu safado!
Você tem-me cavalgado, /mas nem por isso me pôs/ a pensar como você.
Que uma coisa pensa o cavalo;/ outra quem está a montá-lo.

6:56 da tarde  

Enviar um comentário

<< Home