O Grande Desafio
1. -Dada a excepcional importância deste tema, inserimos hoje um "post" que não tem relação directa com a Saúde.
2. -A decisão do Supremo Tribunal dos EUA, sobre os recursos interpostos por dois prisioneiros de Guantánamo, põe à prova os limites da nossa Democracia.
Guantánamo : O teste decisivo.
Já começaram os dois julgamentos perante o Supremo Tribunal dos EUA, sobre recursos interpostos por dois indivíduos detidos na base militar de Guantánamo- um cidadão americano, e um estrangeiro.
O primeiro alega que - privado da assistência de advogado e do direito de ser ouvido em sua defesa por um tribunal- está a ser gravemente ofendido nos seus direitos civis como cidadão americano.
O segundo tem um caso mais difícil de patrocinar, mas bem mais importante para os defensores da causa dos Direitos Humanos em qualquer parte do mundo; o direito à assistência de advogado e o direito de acesso a um tribunal, por parte do suspeito da prática de um crime que se encontra detido, são direitos privativos dos cidadãos americanos, conferidos apenas a estes pela Constituição dos EUA de 1776, ou são "direitos naturais", reconhecidos a todos os seres humanos pela Declaração Universal dos Direitos Humanos, da ONU, de 1948 ?
Os dois indivíduos encarcerados na base militar de Guantánamo, há mais de um ano, argumentam como qualquer um de nós o faria: consideram o direito à assistência de advogado e o direito a um processo equitativo (fair trial) como direitos individuais inalienáveis, incluídos no conteúdo essencial do bloco principal dos direitos humanos, e inseparáveis do próprio conceito de democracia. Invocam ainda a seu favor a 3.ª Convenção de Genebra, de 1949, sobre prisioneiros de guerra. Aguardam, naturalmente, que o Supremo tribunal Federal dos EUA - fiel à sua inegável tradição democrática e liberal - se mantenha coerente com o seu passado e conceda a tutela jurisdicional efectiva aos dois seres humanos que dele esperam justiça.
Porém, e para grande escândalo dos meios jurídicos e forenses norte-americanos, o Promotor Público (equivalente ao nosso Ministério Público), agindo segundo instruções directas da Casa Branca e do Departamento de Justiça, tem vindo a defender uma concepção radicalmente diferente.
Depois do desprezo mostrado pela Administração Bush pela ONU e pelo Direito Internacional, depois da mentira colossal que procurou fundamentar a "guerra preventiva" contra o Iraque, depois das restrições às liberdades individuais estabelecidas em leis antiterrorismo e em decisões administrativas do Presidente dos EUA, a lamentável "cavalgada das valquírias" negadora do Estado de Direito, sustenta as seguintes teses perante o Supremo:
- Guantánamo, apesar de ser uma base militar americana, não se encontra em território nacional, pelo que não lhe é aplicável a Constituição Americana (atenção, Açores).
- Os detidos de Guantánamo não são "prisioneiros de guerra", mas meros "combatentes ilegais", pelo que não beneficiam da protecção jurídica das Convenções de Genebra;
- - Os Direitos Humanos consagrados e protegidos pelo Constituição Americana não são extensivos a estrangeiros, porque só os cidadãos americanos (num país de forte imigração) têm direito à protecção da Constituição dos EUA;
- - Os estrangeiros detidos em Guantánamo não podem invocar a seu favor a Declaração Universal dos Direitos Humanos, porque, em questões de segurança nacional, pelo menos, o direito interno (legislação antiterrorista) prevalece sobre o Direito Internacional.
Nunca uma Democracia se permitiu ir tão longe na defesa dos conceitos antidemocráticos! As teses que estão a ser defendidas pelo Promotor Público junto do Supremo Tribunal dos EUA só têm paralelo nos estados totalitários, designadamente a Alemanha Nazi e a União Soviética.
O que agora está em causa (e o Supremo americano já anunciou que iria decidir em finais de Julho) não é apenas, como se percebe, o destino individual daqueles dois recorrentes.
O que verdadeiramente está em causa, para a América e para o Mundo, é saber se uma Democracia de base electiva tem de agir de forma democrática, ou pode actuar de forma totalitária; é saber se os cidadãos americanos podem ser privados dos seus direitos fundamentais por decisão governamental irrecorrível para os tribunais; é saber, enfim, se os estrangeiros que vivem na América, ou que se acham detidos em bases militares americanas, têm direito a ver respeitados os seus Direitos Humanos internacionalmente reconhecidos, porque são seres humanos dotados de direitos naturais inalienáveis, ou podem ser tratados pelos EUA como o eram os escravos do antigo Império Romano, isto é, como coisas (e, portanto, sem direitos).
O teste decisivo da Democracia Americana, no início do século XXI, serão as duas decisões judiciais do próximo mês de Julho. Temos de estar muito atentos.
Artigo de Diogo Freitas do Amaral
Visão de 08.06.04
Comentário:
O desfecho das próximas eleições presidenciais dos EUA são de fulcral importância para a Europa.
Trata-se de uma ideia inúmeras vezes repetida.
Poder-se-à, no entanto acrescentar: Sáo decisivas para o futuro da Democracia.
O terrorismo é um fenómeo milenar.
O que aconteceu no 11 de Setembro, ultrapassou todos os limites do que era previsível em termos de crueldade humana.
Reagir, eficazmente, ao terrorismo sem comprometer as conquistas da nossa civilização, onde se insere a nossa Democracia, é um desafio gigantesco do nosso tempo.
O caminho da vingança conduzir-nos-à a um beco sem saída nem retorno. Há que procurar outras novas soluções.
Não se dialoga com terroristas.
Há no entanto, que estudar o terrorismo, na busca das melhores soluções.
Com G.W.Bush, apenas podemos esperar o caminho da vingança.
2. -A decisão do Supremo Tribunal dos EUA, sobre os recursos interpostos por dois prisioneiros de Guantánamo, põe à prova os limites da nossa Democracia.
Guantánamo : O teste decisivo.
Já começaram os dois julgamentos perante o Supremo Tribunal dos EUA, sobre recursos interpostos por dois indivíduos detidos na base militar de Guantánamo- um cidadão americano, e um estrangeiro.
O primeiro alega que - privado da assistência de advogado e do direito de ser ouvido em sua defesa por um tribunal- está a ser gravemente ofendido nos seus direitos civis como cidadão americano.
O segundo tem um caso mais difícil de patrocinar, mas bem mais importante para os defensores da causa dos Direitos Humanos em qualquer parte do mundo; o direito à assistência de advogado e o direito de acesso a um tribunal, por parte do suspeito da prática de um crime que se encontra detido, são direitos privativos dos cidadãos americanos, conferidos apenas a estes pela Constituição dos EUA de 1776, ou são "direitos naturais", reconhecidos a todos os seres humanos pela Declaração Universal dos Direitos Humanos, da ONU, de 1948 ?
Os dois indivíduos encarcerados na base militar de Guantánamo, há mais de um ano, argumentam como qualquer um de nós o faria: consideram o direito à assistência de advogado e o direito a um processo equitativo (fair trial) como direitos individuais inalienáveis, incluídos no conteúdo essencial do bloco principal dos direitos humanos, e inseparáveis do próprio conceito de democracia. Invocam ainda a seu favor a 3.ª Convenção de Genebra, de 1949, sobre prisioneiros de guerra. Aguardam, naturalmente, que o Supremo tribunal Federal dos EUA - fiel à sua inegável tradição democrática e liberal - se mantenha coerente com o seu passado e conceda a tutela jurisdicional efectiva aos dois seres humanos que dele esperam justiça.
Porém, e para grande escândalo dos meios jurídicos e forenses norte-americanos, o Promotor Público (equivalente ao nosso Ministério Público), agindo segundo instruções directas da Casa Branca e do Departamento de Justiça, tem vindo a defender uma concepção radicalmente diferente.
Depois do desprezo mostrado pela Administração Bush pela ONU e pelo Direito Internacional, depois da mentira colossal que procurou fundamentar a "guerra preventiva" contra o Iraque, depois das restrições às liberdades individuais estabelecidas em leis antiterrorismo e em decisões administrativas do Presidente dos EUA, a lamentável "cavalgada das valquírias" negadora do Estado de Direito, sustenta as seguintes teses perante o Supremo:
- Guantánamo, apesar de ser uma base militar americana, não se encontra em território nacional, pelo que não lhe é aplicável a Constituição Americana (atenção, Açores).
- Os detidos de Guantánamo não são "prisioneiros de guerra", mas meros "combatentes ilegais", pelo que não beneficiam da protecção jurídica das Convenções de Genebra;
- - Os Direitos Humanos consagrados e protegidos pelo Constituição Americana não são extensivos a estrangeiros, porque só os cidadãos americanos (num país de forte imigração) têm direito à protecção da Constituição dos EUA;
- - Os estrangeiros detidos em Guantánamo não podem invocar a seu favor a Declaração Universal dos Direitos Humanos, porque, em questões de segurança nacional, pelo menos, o direito interno (legislação antiterrorista) prevalece sobre o Direito Internacional.
Nunca uma Democracia se permitiu ir tão longe na defesa dos conceitos antidemocráticos! As teses que estão a ser defendidas pelo Promotor Público junto do Supremo Tribunal dos EUA só têm paralelo nos estados totalitários, designadamente a Alemanha Nazi e a União Soviética.
O que agora está em causa (e o Supremo americano já anunciou que iria decidir em finais de Julho) não é apenas, como se percebe, o destino individual daqueles dois recorrentes.
O que verdadeiramente está em causa, para a América e para o Mundo, é saber se uma Democracia de base electiva tem de agir de forma democrática, ou pode actuar de forma totalitária; é saber se os cidadãos americanos podem ser privados dos seus direitos fundamentais por decisão governamental irrecorrível para os tribunais; é saber, enfim, se os estrangeiros que vivem na América, ou que se acham detidos em bases militares americanas, têm direito a ver respeitados os seus Direitos Humanos internacionalmente reconhecidos, porque são seres humanos dotados de direitos naturais inalienáveis, ou podem ser tratados pelos EUA como o eram os escravos do antigo Império Romano, isto é, como coisas (e, portanto, sem direitos).
O teste decisivo da Democracia Americana, no início do século XXI, serão as duas decisões judiciais do próximo mês de Julho. Temos de estar muito atentos.
Artigo de Diogo Freitas do Amaral
Visão de 08.06.04
Comentário:
O desfecho das próximas eleições presidenciais dos EUA são de fulcral importância para a Europa.
Trata-se de uma ideia inúmeras vezes repetida.
Poder-se-à, no entanto acrescentar: Sáo decisivas para o futuro da Democracia.
O terrorismo é um fenómeo milenar.
O que aconteceu no 11 de Setembro, ultrapassou todos os limites do que era previsível em termos de crueldade humana.
Reagir, eficazmente, ao terrorismo sem comprometer as conquistas da nossa civilização, onde se insere a nossa Democracia, é um desafio gigantesco do nosso tempo.
O caminho da vingança conduzir-nos-à a um beco sem saída nem retorno. Há que procurar outras novas soluções.
Não se dialoga com terroristas.
Há no entanto, que estudar o terrorismo, na busca das melhores soluções.
Com G.W.Bush, apenas podemos esperar o caminho da vingança.
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