segunda-feira, setembro 20

Utilizador - Pagador



1. - A Constituição de 1976, veio estabelecer que “todos têm direito à protecção da saúde” a realizar “pela criação de um serviço nacional de saúde universal, geral e gratuito”.
A lei do Serviço Nacional de Saúde (1979) , prevê que o acesso ao SNS deve ser garantido a todos os cidadãos independentemente da sua condição social ou económica. O financiamento da saúde passa a ser assegurado pelo Orçamento Geral do Estado deixando de ser efectuado com base em fundos sociais.
A revisão da Constituição em 1989, mudou o “serviço nacional de saúde” “gratuito” para “tendencialmente gratuito”
Em 1990, o Governo introduziu taxas moderadoras no SNS com excepção para grupos de risco e economicamente desfavorecidos.

2. – Após 25 anos de funcionamento, o SNS tem constituído um dos principais instrumentos de democratização da sociedade portuguesa, contribuindo, de forma decisiva, para a elevação dos padrões de saúde dos portugueses, conforme comprova a evolução dos principais indicadores da saúde.
No inicio dos anos 70, Portugal apresentava a taxa de mortalidade infantil de 58.6 por mil nascimentos (5.0 em 2001), 8.000 médicos (à volta de 33.000 em 2001), 37% de partos hospitalares (99% em 2001).
Portugal ocupa o 12.º lugar na tabela da avaliação dos cuidados de saúde da Organização Mundial de Saúde (OMS- ano 2000), à frente de países com economias muito desenvolvidas como a Inglaterra (18.º lugar), a Suécia (23.º lugar) eos Estados Unidos (em 37.º lugar).

3. - Santana Lopes, em comunicado à Nação, anunciou a intenção de criar taxas moderadoras diferenciadas de acordo com o rendimento dos utentes para financiar as prestações de cuidados de saúde. Trata-se de aplicar o principio do utilizador pagador às prestações de saúde.

4. - Vital Moreira num artigo publicado no Diário Económico, intitulado "Utilizador Pagador", em 16.09.04, considera que “A regra do utilizador-pagador vigora desde sempre como princípio de financiamento dos serviços públicos que se traduzem em prestações individuais, quer nas tradicionais “utilities” – como a água, a electricidade, as telecomunicações, os transportes públicos, os serviços postais –, quer noutros serviços, como a justiça e os serviços notariais, entre outros. No entanto, este principio não deverá, ser aplicado às prestações de saúde de forma a não prejudicar o direito universal à Saúde dos utentes, o qual não poderá depender da sua capacidade económica sob pena de negá-lo, sendo socialmente mais justo o seu financiamento através dos impostos”.

5. - Num outro artigo intitulado "Consciência Social", publicado no Diário Económico de 16.09.04, Paulo Kuteeve Moreira refere que “Os cidadãos de algumas regiões da Suècia, quando visitam o seu clínico geral do Serviço Nacional de Saúde (SNS), poderão ter que pagar mais de €15. Esse valor poderá duplicar numa visita a um médico especialista em contexto hospitalar. Há, porém, um valor anual máximo de contribuição individual. O estado cobre toda a despesa individual acima desse valor garantindo cobertura total ás famílias com rendimentos baixos. Muitos outros estados europeus adoptaram sistemas sistemas semelhantes de contribuição individual na utilização dos serviços de saúde públicos e aquisição de medicamentos: a Áustria, a Bélgica, a França, a Alemanha, a Irlanda, a Suiça, a Finlândia e, mais recentemente, a Inglaterra”.

6. - Em relação à posição de Paulo Moreira, há a referir que Portugal é o país da Europa em que os cidadãos mais contribuem para o orçamento da saúde (cerca de 35%).
A Suécia possui um sistema fiscal equitativo em que as fugas ao fisco são reduzidas. O estado estabelece um"plafond" para a despesa dos cidadãos com a saúde garantindo o pagamento da despesa verificada acima desse tecto.
Uma vez que, os cidadãos portugueses já contribuem mais para a despesa da saúde do que os cidadãos suecos, a transposição para Portuigal do modelo defendido por Paulo Moreira significaria o aumento da despesa do estado com a saúde ao garantir o pagamento da despesa dos cidadãos portugueses acima do "plafond" estabelecido.
Oxalá Portugal, pudesse beneficiar de um sistema fiscal tão eficiente e de um "plafond" a limitar o nível máximo de despesa dos portugueses com a saúde como acontece na Suécia.
Parece-nos assim descabido a invocação do exemplo do sistema de saúde da Suécia para defender a aplicação das taxas moderadoras diferenciadas em Portugal, como o faz Paulo Moreira.
7. - A Lei 56/79, definiu que é o Estado que deve assegurar o direito à protecção da saúde e que o acesso é gratuito e garantido a todos os cidadãos, independentemente da sua situação económica e social e que o SNS envolve todos os cuidados integrados de saúde, compreendendo a promoção e vigilância da saúde, a prevenção da doença, o diagnóstico e tratamento dos doentes e a reabilitação médica e social.

Entendemos, que a aplicação do princípio utilizador-pagador às prestações de saúde significa pôr em causa a universalidade do direito dos utentes de acesso ao Serviço Nacional de Saúde, tendo o Governo de Santana Lopes por principal objectivo, ao anunciar esta medida, não o aumento das receitas do SNS mas o desvio da procura dos utentes de maior capacidade económica para o sector privado, de molde a reduzir a capacidade do estado à prestação de cuidados assistenciais ao sector da sociedade de mais fracos recursos.