segunda-feira, maio 23

Desorçamentação da Saúde


O valor do défice apurado pela Comissão Constâncio foi de 9 553 milhões de euros, ou seja, 6,83 % do PIB.
Trata-se do maior défice da zona euro.

O relatório Constâncio detectou uma forte desorçamentação na Saúde: - 1 513 milhões de euros, 1,08 % do PIB:

Prevê-se que a Saúde chegará ao final do ano com um défice de 1 773 milhões de Euros.
Penso que fica desmascarada, em definitivo, a contabilidade criativa do anterior ministro da saúde, Luís Filipe Pereira, que passou o tempo a apresentar balanços positivos das contas dos hospitais SA, chegando a anunciar superavit destes hospitais para o corrente ano .
O défice apurado de 6,83 % do PIB vai implicar, forçosamente, fortes restrições nas tranferências do Estado para a Saúde.
Correia de Campos vai ter menos dinheiro para a gestão do SNS do que o inicialmente previsto.
Vamos ter uma política férrea de contenção de despesas, nomeadamente na área do medicamento e gestão dos hospitais.
O Victor Melícias bem pode reclamar o pagamento das camas não utilizadas.
O projecto das parcerias para a construção de novos hospitais vai conhecer novos impulsos.
Os ventos sopram favoráveis aos empreendimentos privados na saúde.

7 Comments:

Blogger xavier said...

Défice de 6,83% sem autarquias

Faltam receitas e dinheiro para pagar salários, pensões e subsídios desemprego

Antes de divulgar publicamente dimensão do défice orçamental para 2005, Vítor Constâncio, presidente da comissão, foi apresentá-lo ao primeiro-ministro, José Sócrates

Quebra nas receitas provocada por erros nas receitas extraordinárias de 2003 e 2004 custa 400 milhões de euros no Orçamento do corrente ano
"O agravamento do défice é um elemento de alguma surpresa", afirmou ontem Vítor Constâncio, governador do Banco de Portugal. O retrato tirado às contas do Estado é devastador para o Governo de Santana Lopes, ao ponto de assustar políticos e economistas e surpreender Bruxelas um défice de 6,83% do PIB nas contas do Estado, o mais alto da União Europeia. E, ainda assim, não estão contabilizadas as contas das Autarquias e Regiões Autónomas, em ano de eleições. No orçamento apresentado por Bagão Félix faltava dinheiro para pagar salários dos funcionários públicos, pensões dos reformados, subsídios de desemprego, facturas com a saúde...

Vamos por partes. Em relação ao défice de 2,86% do PIB, anunciados em Dezembro pelo então ministro das Finanças, Bagão Félix, faltam nos cofres do Governo nada mais que 5,55 mil milhões de euros, 4,0% do PIB, de acordo com os cálculos do Banco de Portugal. Destes, Bagão tencionava "pescar" dois mil milhões de euros em receitas extraordinárias. O plano, contava com dividendos da Galp, no valor de 548 milhões de euros, outros 500 milhões com a venda de património e mil milhões com a transferência do Fundo de Pensões da CGD e venda de concessões de auto-estradas. Foi tudo por água abaixo.

Falta agora, para além destes milhões, mais 3,58 mil milhões de euros, quase 2,6% do PIB. Como foi possível este monumental "engano" nas cifras para 2005? Isto aconteceu porque o Governo anterior desorçamentou verbas, procedeu a cativação e ignorou despesas.

salários. Alguns exemplos foram, ontem, dados pelo Banco de Portugal. Logo à cabeça, na folha salarial dos funcionários públicos, faltam no orçamento para 2005 cerca de 360 milhões de euros (ver quadro). Ou seja, pouco menos de um mês de salários. O "buraco", aliás, deverá ser ainda superior, já que as contas do Banco de Portugal só se referem a remunerações certas e permanentes. Ou seja, não levou em linha de conta, por exemplo, as progressões automáticas de carreira e as horas extraordinárias.

Nas pensões, as verbas destinadas aos aumentos anunciados pelo Governo de Santana Lopes não estavam orçamentadas, "em virtude de não ter sido considerada a actualização das pensões", explica o relatório Constâncio. Veja-se o que se passa nas contas da Segurança Social, onde as receitas e as despesas são irreais. Para pagar reformas e subsídios de desemprego, faltam 598,8 milhões de euros. Ou seja, grosso modo, falta metade da verba anual para pagar aos desempregados. As receitas da Segurança Social foram de tal maneira empoladas que existe um excedente de 189 milhões de euros, no OE para 2005 e assinado por Bagão Félix. Pois bem, agora a Comissão Constâncio corrigiu, apurando um défice de 598 milhões de euros. Na frente dos cuidados sociais, não é tudo. Na Caixa Geral de Aposentações (CGA), a segurança social dos funcionários públicos, faltam 228,3 milhões de euros.

Na Saúde, a hemorragia orçamental é difícil de estancar o défice atinge uma profundidade de 1,772 mil milhões de euros, o suficiente para ordenar a construção de uma outra ponte sobre o Tejo. Bagão Félix tinha previsto um défice de 259,7 milhões de euros, mas agora a Comissão Constâncio refez as contas e apurou que afinal o Governo necessita de mais 1,51 mil milhões de euros.

cativações e Dotações. Em geral, o "truque" dos Governos para apresentar baixos défices e "controlo das despesas", quando apresentam os orçamentos, é cativar e inscrever despesas em salários com os funcionários nas dotações provisionais. É que, assim, a verba necessária está no papel das contas, mas não entra no défice, já que à partida não se prevê a sua utilização. A meio do ano, quando a verba é realmente utilizada, acresce ao défice. Nos últimos anos, por exemplo, os aumentos salariais são escondidos nas dotações, mascarando a despesa real. "A verba orçamentada" em 2005, diz o banco central, "representaria uma diminuição de 0,8% em relação a 2004, quando é certo que se verificou um aumento de 2,25%" nos salários "e que haverá um efeito significativo da progressão nos escalões" dos professores do ensino básico e secundário. Contas feitas, o Banco de Portugal optou por registar a falta de 794,1 milhões de euros nas cativações e dotações.

Para diminuir o défice de 2005, Bagão Félix excluiu o Instituto das Estradas de Portugal, a ex-JAE, das contas estatais. "Poupava" assim, centenas de milhões de euros. Mas deixava o Instituto sem dinheiro. O plano era obrigar a empresa a endividar-se na banca. Mas a ex-JAE não pode sair do perímetro das Administrações Públicas, já que as receitas próprias do Instituto estão longe dos 50%, tal como determina a lei. Sendo assim, diz o relatório Constâncio, a reintegração do Instituto nas contas do Estado "implica um aumento de 458,3 milhões de euros" no défice.

receitas. O orçamento de 2005 pode perder pouco mais de 20 milhões de euros em impostos (ver quadro). A descida em IRC, o imposto sobre os lucros das empresas, e em IRS pode atingir os 500 milhões de euros, mas deverá ser compensada pelo bom andamento na captação de IVA. A maior quebra de receita, diz a Comissão Constâncio, surgirá nos dividendos - os lucros das empresas públicas entregues ao Estado. A perda deste tipo de receita deverá atingir os 740,3 milhões de euros, parte dos quais viria da Caixa Geral de Depósitos (CGD). Porque se perde tanto dinheiro? É que a lei permite abater os resultados negativos transitados - de anos anteriores - aos dividendos entregues aos cofres públicos.

"Grave", como adivinhavam já alguns economistas, são as repercussões das medidas extraordinárias usadas em 2003 e 2004 nas contas estatais de 2005. Decréscimos nas receitas, provocadas pela venda de créditos fiscais ao Citibank, e o aumento de despesa pelo facto do pagamento de pensões dos trabalhadores da CGD ser agora efectuada pela CGA , custam ao Orçamento cerca de 400 milhões de euros. Ou seja, receita que se antecipou faz agora falta no exercício orçamental de 2005.

despesa. Como pode o défice descer? Pelo lado dos gastos, Constâncio reconhece que a tarefa é tipo "missão impossível". Para já, o INE está a promover uma revisão do Produto Interno Bruto (PIB), num trabalho idêntico ao que já foi feito em outros países europeus. Em média, este tipo de revisão leva a um crescimento de 5% do produto, cenário no qual o défice, só por esta via, seria de 6,5% do PIB.

Constâncio reconheceu ontem que terá de existir medidas do lado da receita. Ou seja aumento de impostos, já que a despesa está comprimida. Neste momento, a despesa significa 48,5% do PIB, dos quais as transferências correntes - para pensões, despesas com a Saúde, subsídios de desemprego - representam 22,1% do Produto. Os salários dos funcionários públicos são uma fatia de 15,1% do PIB. Um conjunto de três parcelas como as despesas com os juros da Dívida Pública, investimentos ou com compras tipo "lápis e papel" repre- sentam 11,3% da riqueza.

Constâncio escusou-se a abrir o jogo sobre eventuais medidas que ajudem a resolver os problemas orçamentais. Mas afastou o cenário de recessão caso haja cortes, já que, segundo diz, "a maior parte das poupanças terão de ser efectuadas no interior do Estado". Às empresas lançou um recado "Com as actuais taxas de juro não há razão para que não possam financiar-se e aproveitar a dinâmica de crescimento da procura externa."
DN
Márcio Candoso

1:33 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

Continuo na minha. O Ministro da Saúde deve começar a poupar de imediato do seguinte modo:
1º Acabar com a colegialidade da gestão hospitalar, em todos os hospitais. Deve haver apenas um Director Hospitalar controlado por um sistema adequado de «freios e de equilíbrios». A eficácia do sistema, podem crer, vai melhorar. A responsabilização a gestão é mais efectiva. A solução é muito mais barata.
2º Nomeação deste Director Hospitalar com base na confiança política, para que o processo possa ser célere e reduza o nº de boys, venham eles de onde vierem;
3º Os lugares de direcção intermédia a nível de serviços de apoio geral (Aprovisionamento, Pessoal, Financeiros, Hoteleiros, etc.) deverão ser obrigatoriamente desempenhados por profissionais da carreira de Administração Hospitalar. Nos restantes serviços, de acção médica, promover o desenvolvimento da criação de Centros de Responsabilidade, Dirigidos por médicos e apoiados obrigatoriamente por Administradores Hospitalares de carreira. Esta proposta introduz uma componente de gestão a todos os níveis, sem perda da autonomia e identidade técnica dos serviços de acção médica e é um bom meio de controlar, também por aqui a actividade do Director. Não foi por acaso que os AH foram quase todos afastados destes lugares.
4º Devem ser rescindidos os contratos de todas as admissões de pessoal verificadas, nos dois últimos anos, com preterição de formalidades legais e de todas as admissões políticas efectuadas em todos os HH, em especial nos SA: assessores, consultores, directores de serviços de apoio geral (pessoal, doentes, financeiros, aprovisionamento, etc.)
5º Retirar de imediato as mordomias que foram atribuídas aos membros dos CA dos HH SA;
6º Vender de imediato os carros dos membros dos CA dos HH SA em haste pública

Enquanto nada disto for feito, não poderemos ver com bons olhos qualquer corte em despesas que apenas vão afectar «o mexilhão».

11:09 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

A nossa classe política tem sido incapaz de encontrar qualquer solução que viabilize Portugal.
A solução parece estar em "acabar com os portugueses" ... que pagam impostos.

12:09 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Estamos perante a encenação da versão "O País de Tanga" Part II.
Então há uns meses atrás Sócrates e Constâncio não conversaram sobre a situação financeira do país?
Constância não sabia qual era o valor do défice?
Parece-me tudo muito bem encenado para agora aumentarem os impostos com a nossa quase concordância.
A situação real do país e a sua dramatização vão ser o cenário ideal para na área da saúde se avançar com a reforma até limites nunca pensados por Luís Filipe Pereira.

10:30 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Constâncio acaba de anunciar o Estado de Sítio.
Cresceu a ameaça em relação aos direitos sociais, mesmo com um governo socialista em exercício.

Costuma-se dizer: Quando não há dinheiro não há vícios.
Pois sem dinheiro não há democracia.

10:46 da tarde  
Blogger xavier said...

Caro Avelino,
Correcto.
O caso das contas dos SA´s com superavits ilustra bem a forma de estar do anterior ministro em relação a um SNS super deficitário.
Nem os SA´s poderiam gerar lucros em 2005,a não ser através de uma ficção contabilística do LFP, nem o défice estimado por LFP estava correcto (como o relatório Constâncio veio a provar).

9:03 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

A crise orçamental e os sacrifícios que ela impõe

O valor do défice orçamental anteontem anunciado pelo governador do Banco de Portugal põe bem em evidência a gravidade da crise das finanças públicas que Portugal enfrenta. O nosso país tem o mais alto défice da zona euro, da UE 15 e até da UE 25. Tem o défice mais alto da OCDE. Corremos o risco de ser transformados num (mau) exemplo pela Comissão e castigados de acordo - isto é, de forma exemplar. Podemos perder o Fundo de Coesão. Podemos ter o rating da República - e, por arrastamento das empresas- revisto em baixa pelas agências internacionais. Isto significa que o custo do financiamento do Estado e por contágio do sector privado sobe, um péssimo resultado, dado o enorme endividamento externo acumulado.
É supérfluo discutir de quem é a culpa. Os governos da década de 90 foram muito despesistas, e os governos PSD-CDS não foram capazes de começar a regularizar a situação. A recessão mais o crescimento fraco compuseram o quadro. Por isso, o peso dos gastos públicos foi subindo progressivamente de 42 por cento do PIB em 1990, para 45 por cento em 1995, para 46 por cento em 2002 (sendo de notar que o aumento entre 1995 e 2002 teria sido muito maior sem a enorme queda das taxas de juro da dívida pública então verificada) e para 48,4 por cento em 2004.
Mas o que é fundamental é discutir e sobretudo pôr em prática soluções. O objectivo do Governo - não mais de três por cento no final as legislatura, sem receitas extraordinárias - é só moderadamente ambicioso. Se olhássemos para o médio/longo prazo concluiríamos que o envelhecimento da população torna imperioso que contas públicas sejam excedentárias o mais depressa possível. Mas, apesar de só moderadamente ambicioso, é um objectivo muito difícil. Em qualquer caso, seria irrealista esperar que os órgãos da União Europeia que gerem o Pacto de Estabilidade possam tolerar durante muitos anos défices orçamentais portugueses superiores a três por cento, sem aplicar penalidades pesadas ao nosso país.
Partindo do défice de 6,8 por cento do PIB anunciado pelo governador do Banco de Portugal, será extremamente difícil que ele não tenha de descer cerca de 4 pontos de percentagem do PIB até ao fim de 2009.
A dimensão do problema sugere que dificilmente poderá se atacado com eficácia sem actuar simultaneamente sobre as receitas e as despesas públicas. Nós, como a generalidade dos economistas e muitos cidadãos, gostaríamos de que o reequilíbrio fosse conseguido através da contenção/redução da despesa. O problema das finanças públicas portuguesas não é o de as receitas serem demasiado baixas; o problema é o de as despesas serem demasiado altas. A teoria económica e a observação empírica, aliás, mostram que os saneamentos das finanças públicas conseguidos com maior êxito se concentram na despesa.
Os custos ou a contenção nas despesas e os aumentos das receitas imporão sacrifícios à maioria da população e terão efeitos adversos sobre o crescimento económico a curto prazo, embora melhorem as possibilidades de progresso económico a médio e longo prazo. Mas infelizmente não há alternativas que permitam evitar esses custos do ajustamento orçamental.
Um aspecto importante a considerar é o da distribuição dos sacrifícios a suportar. É difícil evitar que até os pobres tenham de ser afectados, embora tudo deva ser feito para aliviar o peso dos ajustamentos que sobre eles tenham de recair. Será fundamental tornar muito claro que o quinhão de sacrifícios a impor aos mais privilegiados é adequado.
Não cremos que a urgência do problema, as resistências generalizadas a cortes drásticos nos vários tipos de despesas e a (in)capacidade das autoridades permitam não recorrer também ao aumento das receitas. As medidas a encarar para conseguir o aumento do peso das receitas públicas deverá ser, segundo a nossa ordem de prioridades, as seguintes: (a) o combate à evasão fiscal; (b) a subida das receitas por utilização das Scut; (c) a maior racionalização dos incentivos fiscais e dos esquemas de deduções na base tributária ou na colecta; e, por último, (d) a subida das taxas de alguns impostos.
De entre estas medidas, merecem alguns comentários as que se referem ao combate à evasão fiscal e às subidas das taxas de alguns impostos.
Os que não querem enfrentar o problema seriamente apontam sempre o combate à evasão e fuga fiscais como a solução para se chegar ao necessário equilíbrio orçamental. É indiscutível que esse combate deve ter a prioridade máxima. Regras éticas óbvias a isso obrigam, e obrigariam mesmo se a situação financeira do Estado fosse confortável. Mas, infelizmente, os dados mais fiáveis apontam para que mesmo o sucesso razoável - oxalá - na luta contra a fuga aos impostos trará apenas uma ajuda modesta ao problema do défice. Segundo estimativas não muito seguras, mas das mais autorizadas, não será razoável admitir que as cobranças proporcionadas pelo mais eficaz combate à evasão fiscal possa ir além de uns dois por cento do PIB nos próximos quatro anos. Cremos, aliás, que, sob esse aspecto, tem havido uma melhoria considerável na administração fiscal nos últimos tempos.
Os aumentos das taxas de impostos devem ser a solução de último recurso e só serão admissíveis com a introdução prévia ou simultânea de uma disciplina muito mais rigorosa sobre o crescimento da despesa. Esses aumentos só podem ser encarados em relação à tributação indirecta. Ninguém pensa que eles possam ser muito significativos nas taxas do IRS e do IRC. Nos impostos indirectos, a primeira alternativa é, na nossa opinião, a de subir as taxas dos impostos especiais sobre o consumo (impostos sobre produtos petrolíferos, sobre os automóveis e sobre o tabaco). Mas o acréscimo de receita proporcionado por essas subidas, embora significativo, não seria provavelmente suficiente. Se as taxas dos impostos referidos aumentassem todas elas 20 por cento, aquele acréscimo poderia ser da ordem de 0,5 por cento do PIB. Embora esses aumentos possam ser também justificados por razões não fiscais (engarrafamentos e poluição no caso dos automóveis e dos produtos petrolíferos, saúde no caso do tabaco), é fácil antever que eles provocariam resistências fortíssimas da parte dos contribuintes. Paradoxalmente, é de admitir que o aumento das taxas do IVA levante menos resistências, embora atinjam mais contribuintes e possam ter efeitos económicos mais negativos. O agravamento das taxas do IVA virá assim provavelmente a ser um mal necessário. Em todo o caso, cabe observar que o aumento das taxas do IVA, em 2002, não resultou em aumentos substanciais da receita desse imposto e contribuiu mais para a crise económica do que se o agravamento tivesse caído sobre os impostos especiais de consumo, que incidem, em maior proporção que o IVA, sobre mercadorias com mais alto conteúdo de importações. Será de acrescentar ainda que Portugal foi em 2002, juntamente com a Dinamarca e a Suécia, um dos três países da União Europeia dos 15 com carga fiscal do IVA mais pesada.
Mesmo que, pelas vias que acabam de ser referidas, se consigam razoáveis aumentos da receita, para se chegar ao défice de três por cento do PIB em 2009, será indispensável que o peso das despesas totais no PIB não aumente, ou tenha mesmo de cair 1 ou 2 pontos de percentagem do PIB. Em face de perspectivas de crescimento do PIB que são muito pouco animadoras, isso significa que dificilmente se poderá escapar a um crescimento real dos gastos públicos extremamente baixo em comparação com o que, desde o 25 de Abril, se tem observado em outros períodos de igual duração.
A questão que se põe a seguir é a de identificar as despesas em que deveria haver maiores apertos. Para responder a essa questão, deverá começar por olhar-se para a estrutura dos dispêndios públicos apresentada no quadro seguinte:
Estes números tornam claro que, não poderá deixar de se actuar sobretudo nas despesas com pessoal, nas prestações sociais e nas despesas de investimento. Nos demais tipos de gastos, também são necessárias poupanças, mas os seus efeitos serão exíguos. Nos juros da dívida pública, o mais provável é mesmo que se venham a verificar aumentos. Com a crise económica e de desemprego que o país está a atravessar, não seria de admirar que o mesmo tivesse de vir a acontecer nos subsídios a empresas.
Tem sido muito discutida a necessidade de reduzir o peso em relação ao PIB das despesas do pessoal, quer pela via de travagens nas admissões, quer pela da contenção do nível das remunerações. Não há espaço aqui para apresentar as várias razões, de grande peso, que justificam muito mais rigor nessas despesas. A sua contenção terá de ser uma das principais prioridades do programa de ajustamento orçamental, quanto mais não seja porque as soluções alternativas teriam consequências ainda mais negativas. Uma das prioridades será certamente a de suspender as promoções automáticas.
A disciplina nas despesas de segurança e protecção social encontra obstáculos bem mais melindrosos. É que entre essas despesas encontram-se os gastos com medicamentos, com pensões e com subsídios de desemprego. Embora reconheçamos que tudo deverá ser feito para não tocar muito nesses tipos de despesa, não vemos maneira de também nelas não ter de ser imposta uma disciplina muito mais severa do que até aqui. É pura e simplesmente impossível sustentar o ritmo de crescimento observado nos últimos anos no peso dos gastos com segurança e prestações sociais, que passou de 14 por cento do PIB em 2000 para 15,1 por cento em 2002 e para um valor estimado de 17,9 por cento do PIB em 2004. Será forçoso analisar medidas como: (a) mais limitações aos gastos com medicamentos; (b) maior rigor no combate às fraudes, associadas aos subsídios de doença e de desemprego; (c) aproximação mais efectiva entre as condições da Caixa Geral de Aposentações (que em termos comparativos são das mais generosas do mundo) e as do sistema da Segurança Social, nomeadamente nas pensões mais elevadas, que são muito mais suportadas pelos impostos pagos pelos contribuintes do que pelas dos beneficiários (incluindo contribuições da entidade patronal que fossem semelhantes às do sistema da Segurança Social); (d) e mesmo, embora, como um dos últimos recursos, a revisão do sistema de subsídios de desemprego, por forma a que ele possa proteger o número crescente de desempregados, sem agravamentos de despesa, praticamente impossíveis de suportar.
Consideremos por fim as despesas de investimento. Também elas não poderão escapar à maior austeridade orçamental, salvo na medida em que sejam indispensáveis como contrapartida em projectos financiados por fundos da União Europeia. Há algumas despesas classificadas como investimento - incluindo as que são efectuadas ao nível das autarquias locais - que são pouco mais que desperdícios. E mesmo quando assim não sucede, não haverá, com os constrangimentos orçamentais dos próximos anos, condições para manter níveis de despesas públicas de capital de quase cinco por cento, como em 2004. O país continua a precisar de infra-estruturas, mas precisa mais de investimentos directamente produtivos, que prometam boa eficácia. Os atrasos de Portugal em relação à Europa, em matéria de infra-estruturas, são hoje muito menores do que há uma década, mas apesar disso, nos últimos anos, a economia portuguesa tem estado a divergir em relação à média europeia, ao contrário do que acontecia quando as insuficiências estruturais eram mais acentuadas.
J. Silva Lopes e L. Miguel Beleza
JPúblico

4:40 da tarde  

Enviar um comentário

<< Home