Retribuição dos profissionais (EIG, SA/EPE).
B - Experiências inovadoras de gestão (EIG) e empresas públicas (SA/EPE)
EIG e Regime Remuneratório Experimental (RRE)
Face ao que era necessário fazer em 1996 (“modificações” anteriormente referidas) a convicção da impossibilidade de mudança global gerou uma tensão que foi resolvida pelo reconhecimento de que o “terreno” estava propício para “lançar sementes” – experiência limitadas para avaliar, aprender e melhorar, contaminar as restantes unidades, e depois replicar em HH e CP.
Os efeitos do Novo Sistema Retributivo e as melhorias anteriormente introduzidas em carreiras aconselhariam, caso tivessem sido devidamente avaliados, a estabilização de gastos com pessoal e não o aumento do número de pessoas e do custo/hora que vieram a verificar-se.
Vivia-se um ambiente de expansão económica, mesmo de alguma euforia, em que o País e o Governo sentiam maior propensão para aumentar os recursos e oferecer benefícios (“dar mais”) que para racionalizar ou efectuar mudanças com potencial de conflito. Verificou-se estabilidade governamental, embora nem sempre na Saúde, onde assistimos, no mesmo Governo, a mudança substancial da política de saúde.
O clima criado, de abertura e de estudo de reforma do SNS e do sistema de saúde, permitiu uma reflexão de âmbito vasto (todos os serviços) e alargada a todos os interessados (peritos, políticos, representantes dos profissionais e dos doentes). Aquele clima possibilitou que as experiências fossem objecto de trabalho de análise mais profundo com vista à sua prévia consensualização e aceitação. Foi assim possível ultrapassar a mera reivindicação, a retórica vazia de conteúdo quanto aos profissionais (ex. “maior activo do hospital” mas recrutamento de tarefeiros e a prazo) e criar um quadro legal que viabilizasse cada uma das experiências.
Defendia-se actuação proactiva e inovadora que apostasse no desenvolvimento e satisfação dos profissionais, numa perspectiva de prazo longo, de associação à gestão/comprometimento com os objectivos do serviço e do hospital. Essa actuação devia encontrar sustentação no quadro legal e no trabalho concreto da gestão, moldando o ambiente em que os profissionais trabalham, facilitando o bom desempenho e motivando-os à responsabilização e à obtenção de melhores resultados. Estas experiências apoiaram-se nos seguinte fundamentos (orientações), independetemente do grau de concretização atingido:
a) Permitir novo estatuto e regime (CIT para novos recrutamentos, adesão livre dos funcionários) em coexistência com os vigentes até então (FP), introduzindo novas formas de retribuição em função dos resultados (incentivos) e com base na avaliação;
b) Adequar o número de profissionais às necessidades das Unidades: “Mapa” anual associado ao papel e à produção contratada com o hospital (menos rígido e estruturado que o “Quadro”); inserção dos profissionais em grandes áreas (CR) e em dotação global por grupos (versus plafond por categoria em cada especialidade/serviço); maior rapidez nos concursos de pessoal (admissão e promoção);
c) Experimentar formas de substituição de trabalho para maior eficiência (garantia de igual segurança e qualidade) e melhorar a flexibilidade de uso de profissionais, perante variações da procura e da disponibilidade (ex. doença). Também eliminar os obstáculos à melhoria de coordenação entre serviços e entre grupos profissionais (ex. BO com horários e regimes diversos que não permitem eficiência);
d) Manter os representantes dos profissionais associados à mudança num quadro legal claro (Acordo de Empresa) onde qualquer ajustamento às carreiras e à retribuição seria definido e acordado;
e) Integrar profissionais na definição da estratégia e na criação de cultura e clima organizacional que favoreça o reconhecimento do mérito, a responsabilização e o desenvolvimento integral de todos (profissionais, gestores, doentes e outros clientes) – visava-se a mudança de orientação de objectivos profissionais para alinhamento com os objectivos do Serviço e Hospital;
f) Estimular o desenvolvimento, a participação e o envolvimento dos profissionais através de: sugestões; maior responsabilidade e participação na decisão (ex. quando a mudança respeita ao seu posto de trabalho) e em Grupos de melhoria e de redução de desperdício; difusão de informação (ex. boas práticas e novidades); formação e actualização (relações interpessoais, gestão, aspectos científicos e técnico-profissionais – ex. protocolos);
g) Eliminar progressivamente os problemas de qualidade no trabalho dos profissionais: melhoria de condições (instalações e equipamentos, informatização), melhoria de funcionamento (processos e simplificação de burocracias) e de qualidade de vida (ex. prevenção de acidentes).
Quanto à autonomia de gestão, ficou previsto: estatuto próximo do de empresa (“instituto público de natureza empresarial”); instrumentos de financiamento e contratualização (contrato-programa integrando o orçamento, objectivos e metas assistenciais e de qualidade); instrumentos de auditoria e fiscalização; mecanismos de avaliação e responsabilização (ex. CA e gestores podem cessar funções por simples não cumprimento dos objectivos).
Relativamente à coordenação externa, seja a relacionada com a continuidade de cuidados ou com a articulação de serviços em aspectos de gestão (ex. partilhar equipamentos de alta diferenciação, trabalhos/projectos comuns) defendia-se o reforço da perspectiva de sistema. A proximidade da ARS à experiência e o apoio do MS garantiam o cumprimento pleno das servidões impostas pelo SNS: resposta em emergência, ensino e investigação, articulação de cuidados e cooperação dentro do SNS; respeito integral do previsto no planeamento e nas redes de hierarquia e complementaridade técnica (RRH).
Foi também objecto de experiência a integração vertical de cuidados (ULS de Matosinhos).
Nos cuidados primários iniciaram-se experiências de funcionamento e remuneração experimental (RRE), baseadas na adesão voluntária de MF e em grupos de cuidados. Essas experiências apresentaram bons resultados quanto ao número de actos e cobertura da população verificando-se aumento da remuneração dos médicos, pequenas alterações nos restantes grupos profissionais, poucos/nenhuns resultados em prescrições (medicamentos e MCDT).
As alterações na retribuição promovidas pela Dr.ª Manuela Arcanjo (pagamento no SU “como se” estivesse em exclusividade) representaram mais uma machada na adequação do sistema de retribuição visto que:
– Foram previstas sem qualquer contrapartida de produção ou qualidade, pelo que representam mero aumento de despesas;
– Reforçaram o carácter “interessante” para alguns especialistas do trabalho em SU;
– Representaram um golpe severo no regime de exclusividade e na equidade de pagamento entre níveis de cuidados (CP/HH).
Hospitais SA e EPE
Os hospitais SA representaram diferenças mais de oportunidade, após EIG, e de estilo (incrementalismo e experimentação vs “big bang”) – porventura ambas justificadas no tempo em que foram decididas. De facto e face às EIG não se verificaram grandes mudanças no modelo SA. Consolidou-se definitivamente o modelo de empresa e generalizou-se a um número razoável de unidades, criando massa crítica e maior capacidade de influenciar os restantes hospitais. A sua aplicação teve alguns percalços porque:
– Criou-se um ambiente de divisão (a favor/contra, SA versus SPA) e promoveu-se a alteração de regras (estatísticas, contabilísticas) que prejudicaram a comparação e consolidação no SNS;
– Resultou em menor autonomia e maior controlo/intromissão dos órgãos centrais (face a EIG);
– Possibilitou o “furar” das regras de planeamento (desenvolvimento, criação ou diminuição de serviços), devido à disponibilidade do capital social e ao eclipse das ARS/Agências Regionais (também pela nomeação de alguns CA com nula/reduzida experiência em gestão de saúde).
Nos SA assistimos ao modo como empresas “como as outras”, com Assembleia Geral, Conselho Fiscal e etc., viram esvaziar-se parte da autonomia (daí também parte da sua responsabilidade…) com o papel preponderante da Unidade de Missão substituindo-se, por vezes, aos CA e intrometendo-se indevidamente na gestão dos hospitais. O modelo SA foi alvo de acusações, algumas das quais não tinham nem a substância nem a importância que foram então alardeadas:
– Salários e regalias excepcionais para os gestores;
– Politização de cargos;
– Intromissões abusivas na autonomia profissional (ex. pedido de demissão da D. Clínica do H. Viseu);
– Alguns recrutamentos pouco sustentados e inflação de remunerações;
– Gestão de pessoas sem regras e uniformidade (“abusos, prepotência, desprezo de direitos”, etc.).
A pretendida conversão dos funcionários públicos em CIT no prazo de um ano fracassou. Verificou-se o reeditar sucessivo da promessa não cumprida de institucionalização de incentivos. Não chegou a ser concluído um Acordo Colectivo de Trabalho que regulamentaria carreiras, retribuição e outros aspectos. Daqui resultou: aumentos na remuneração base nalgumas especialidades e áreas geográficas; assimilação dos benefícios da FP (ex. forma de pagamento do trabalho extraordinário); facilidades que foram concedidas para execução do programa de recuperação de listas de espera no interior dos hospitais.
Nos cuidados primários as experiências de RRE continuaram, verificando-se o bloqueio pelos profissionais das modificações previstas – indesejável pois os CP eram (são) o sector-chave da reforma da saúde.
As EPE vieram reconhecer e ratificar uma conclusão óbvia e já algo tardia: o estatuto normal dos hospitais deve ser o de empresa, com as limitações e especificidade que a sua natureza e integração no SNS justificam.
Não se encontram diferenças significativas nos 2 modelos (SA vs. EPE) no que respeita aos recursos humanos.
As USF reproduzem o modelo RRE fundado no estatuto de FP e em retribuição que assenta em regime especial exigindo o cumprimento de requisitos (ex. intersubstituição) prevendo incentivos (cf. população abrangida e produção).
Comentários breves à evolução verificada (1996-2006)
Visto que nos propomos analisar em próximo post a “situação actual” sublinhamos aqui apenas 4 aspectos:
– Os três modelos de gestão (EIG, SA e EPE) defendem a empresa/“quase empresa” como estatuto para o hospital e o contrato individual de trabalho (CIT) como o regime normal dos profissionais;
– Verificou-se um desenvolvimento substancial no que respeita à melhoria da gestão dos hospitais com tendência para maior atenção e rigor na prestação de informação, mais responsabilização/prestação de contas dos gestores (abandono do método eleitoral e da intromissão abusiva dos Grupos profissionais) e maior preocupação com a qualidade (acreditação) e satisfação dos doentes;
– Manteve-se a tendência dominante de reivindicação permanente de “mais”: maior remuneração, mais regalias, melhores condições de trabalho e de aposentação, mais pessoas, …;
– A coexistência de estatutos e regimes de pessoal traduz a necessidade mas também a dificuldade de mudar – a restrição das modificações às novas contratações limita o potencial de melhoria mas ainda assim o conflito de regimes e estatutos é preferível à simples continuidade (FP/AP).
Este período demonstrou, ao contrário do que muitas vezes transparece, a identidade dos fundamentos invocados nos modelos de intervenção (EIG, SA, EPE) o que indicia, a nosso ver, o enorme consenso existente nos 2 partidos com maior representação na AR – que poderia fundamentar um acordo de regime em pontos essenciais de reforma da Saúde.
Semmisericórdia
Face ao que era necessário fazer em 1996 (“modificações” anteriormente referidas) a convicção da impossibilidade de mudança global gerou uma tensão que foi resolvida pelo reconhecimento de que o “terreno” estava propício para “lançar sementes” – experiência limitadas para avaliar, aprender e melhorar, contaminar as restantes unidades, e depois replicar em HH e CP.
Os efeitos do Novo Sistema Retributivo e as melhorias anteriormente introduzidas em carreiras aconselhariam, caso tivessem sido devidamente avaliados, a estabilização de gastos com pessoal e não o aumento do número de pessoas e do custo/hora que vieram a verificar-se.
Vivia-se um ambiente de expansão económica, mesmo de alguma euforia, em que o País e o Governo sentiam maior propensão para aumentar os recursos e oferecer benefícios (“dar mais”) que para racionalizar ou efectuar mudanças com potencial de conflito. Verificou-se estabilidade governamental, embora nem sempre na Saúde, onde assistimos, no mesmo Governo, a mudança substancial da política de saúde.
O clima criado, de abertura e de estudo de reforma do SNS e do sistema de saúde, permitiu uma reflexão de âmbito vasto (todos os serviços) e alargada a todos os interessados (peritos, políticos, representantes dos profissionais e dos doentes). Aquele clima possibilitou que as experiências fossem objecto de trabalho de análise mais profundo com vista à sua prévia consensualização e aceitação. Foi assim possível ultrapassar a mera reivindicação, a retórica vazia de conteúdo quanto aos profissionais (ex. “maior activo do hospital” mas recrutamento de tarefeiros e a prazo) e criar um quadro legal que viabilizasse cada uma das experiências.
Defendia-se actuação proactiva e inovadora que apostasse no desenvolvimento e satisfação dos profissionais, numa perspectiva de prazo longo, de associação à gestão/comprometimento com os objectivos do serviço e do hospital. Essa actuação devia encontrar sustentação no quadro legal e no trabalho concreto da gestão, moldando o ambiente em que os profissionais trabalham, facilitando o bom desempenho e motivando-os à responsabilização e à obtenção de melhores resultados. Estas experiências apoiaram-se nos seguinte fundamentos (orientações), independetemente do grau de concretização atingido:
a) Permitir novo estatuto e regime (CIT para novos recrutamentos, adesão livre dos funcionários) em coexistência com os vigentes até então (FP), introduzindo novas formas de retribuição em função dos resultados (incentivos) e com base na avaliação;
b) Adequar o número de profissionais às necessidades das Unidades: “Mapa” anual associado ao papel e à produção contratada com o hospital (menos rígido e estruturado que o “Quadro”); inserção dos profissionais em grandes áreas (CR) e em dotação global por grupos (versus plafond por categoria em cada especialidade/serviço); maior rapidez nos concursos de pessoal (admissão e promoção);
c) Experimentar formas de substituição de trabalho para maior eficiência (garantia de igual segurança e qualidade) e melhorar a flexibilidade de uso de profissionais, perante variações da procura e da disponibilidade (ex. doença). Também eliminar os obstáculos à melhoria de coordenação entre serviços e entre grupos profissionais (ex. BO com horários e regimes diversos que não permitem eficiência);
d) Manter os representantes dos profissionais associados à mudança num quadro legal claro (Acordo de Empresa) onde qualquer ajustamento às carreiras e à retribuição seria definido e acordado;
e) Integrar profissionais na definição da estratégia e na criação de cultura e clima organizacional que favoreça o reconhecimento do mérito, a responsabilização e o desenvolvimento integral de todos (profissionais, gestores, doentes e outros clientes) – visava-se a mudança de orientação de objectivos profissionais para alinhamento com os objectivos do Serviço e Hospital;
f) Estimular o desenvolvimento, a participação e o envolvimento dos profissionais através de: sugestões; maior responsabilidade e participação na decisão (ex. quando a mudança respeita ao seu posto de trabalho) e em Grupos de melhoria e de redução de desperdício; difusão de informação (ex. boas práticas e novidades); formação e actualização (relações interpessoais, gestão, aspectos científicos e técnico-profissionais – ex. protocolos);
g) Eliminar progressivamente os problemas de qualidade no trabalho dos profissionais: melhoria de condições (instalações e equipamentos, informatização), melhoria de funcionamento (processos e simplificação de burocracias) e de qualidade de vida (ex. prevenção de acidentes).
Quanto à autonomia de gestão, ficou previsto: estatuto próximo do de empresa (“instituto público de natureza empresarial”); instrumentos de financiamento e contratualização (contrato-programa integrando o orçamento, objectivos e metas assistenciais e de qualidade); instrumentos de auditoria e fiscalização; mecanismos de avaliação e responsabilização (ex. CA e gestores podem cessar funções por simples não cumprimento dos objectivos).
Relativamente à coordenação externa, seja a relacionada com a continuidade de cuidados ou com a articulação de serviços em aspectos de gestão (ex. partilhar equipamentos de alta diferenciação, trabalhos/projectos comuns) defendia-se o reforço da perspectiva de sistema. A proximidade da ARS à experiência e o apoio do MS garantiam o cumprimento pleno das servidões impostas pelo SNS: resposta em emergência, ensino e investigação, articulação de cuidados e cooperação dentro do SNS; respeito integral do previsto no planeamento e nas redes de hierarquia e complementaridade técnica (RRH).
Foi também objecto de experiência a integração vertical de cuidados (ULS de Matosinhos).
Nos cuidados primários iniciaram-se experiências de funcionamento e remuneração experimental (RRE), baseadas na adesão voluntária de MF e em grupos de cuidados. Essas experiências apresentaram bons resultados quanto ao número de actos e cobertura da população verificando-se aumento da remuneração dos médicos, pequenas alterações nos restantes grupos profissionais, poucos/nenhuns resultados em prescrições (medicamentos e MCDT).
As alterações na retribuição promovidas pela Dr.ª Manuela Arcanjo (pagamento no SU “como se” estivesse em exclusividade) representaram mais uma machada na adequação do sistema de retribuição visto que:
– Foram previstas sem qualquer contrapartida de produção ou qualidade, pelo que representam mero aumento de despesas;
– Reforçaram o carácter “interessante” para alguns especialistas do trabalho em SU;
– Representaram um golpe severo no regime de exclusividade e na equidade de pagamento entre níveis de cuidados (CP/HH).
Hospitais SA e EPE
Os hospitais SA representaram diferenças mais de oportunidade, após EIG, e de estilo (incrementalismo e experimentação vs “big bang”) – porventura ambas justificadas no tempo em que foram decididas. De facto e face às EIG não se verificaram grandes mudanças no modelo SA. Consolidou-se definitivamente o modelo de empresa e generalizou-se a um número razoável de unidades, criando massa crítica e maior capacidade de influenciar os restantes hospitais. A sua aplicação teve alguns percalços porque:
– Criou-se um ambiente de divisão (a favor/contra, SA versus SPA) e promoveu-se a alteração de regras (estatísticas, contabilísticas) que prejudicaram a comparação e consolidação no SNS;
– Resultou em menor autonomia e maior controlo/intromissão dos órgãos centrais (face a EIG);
– Possibilitou o “furar” das regras de planeamento (desenvolvimento, criação ou diminuição de serviços), devido à disponibilidade do capital social e ao eclipse das ARS/Agências Regionais (também pela nomeação de alguns CA com nula/reduzida experiência em gestão de saúde).
Nos SA assistimos ao modo como empresas “como as outras”, com Assembleia Geral, Conselho Fiscal e etc., viram esvaziar-se parte da autonomia (daí também parte da sua responsabilidade…) com o papel preponderante da Unidade de Missão substituindo-se, por vezes, aos CA e intrometendo-se indevidamente na gestão dos hospitais. O modelo SA foi alvo de acusações, algumas das quais não tinham nem a substância nem a importância que foram então alardeadas:
– Salários e regalias excepcionais para os gestores;
– Politização de cargos;
– Intromissões abusivas na autonomia profissional (ex. pedido de demissão da D. Clínica do H. Viseu);
– Alguns recrutamentos pouco sustentados e inflação de remunerações;
– Gestão de pessoas sem regras e uniformidade (“abusos, prepotência, desprezo de direitos”, etc.).
A pretendida conversão dos funcionários públicos em CIT no prazo de um ano fracassou. Verificou-se o reeditar sucessivo da promessa não cumprida de institucionalização de incentivos. Não chegou a ser concluído um Acordo Colectivo de Trabalho que regulamentaria carreiras, retribuição e outros aspectos. Daqui resultou: aumentos na remuneração base nalgumas especialidades e áreas geográficas; assimilação dos benefícios da FP (ex. forma de pagamento do trabalho extraordinário); facilidades que foram concedidas para execução do programa de recuperação de listas de espera no interior dos hospitais.
Nos cuidados primários as experiências de RRE continuaram, verificando-se o bloqueio pelos profissionais das modificações previstas – indesejável pois os CP eram (são) o sector-chave da reforma da saúde.
As EPE vieram reconhecer e ratificar uma conclusão óbvia e já algo tardia: o estatuto normal dos hospitais deve ser o de empresa, com as limitações e especificidade que a sua natureza e integração no SNS justificam.
Não se encontram diferenças significativas nos 2 modelos (SA vs. EPE) no que respeita aos recursos humanos.
As USF reproduzem o modelo RRE fundado no estatuto de FP e em retribuição que assenta em regime especial exigindo o cumprimento de requisitos (ex. intersubstituição) prevendo incentivos (cf. população abrangida e produção).
Comentários breves à evolução verificada (1996-2006)
Visto que nos propomos analisar em próximo post a “situação actual” sublinhamos aqui apenas 4 aspectos:
– Os três modelos de gestão (EIG, SA e EPE) defendem a empresa/“quase empresa” como estatuto para o hospital e o contrato individual de trabalho (CIT) como o regime normal dos profissionais;
– Verificou-se um desenvolvimento substancial no que respeita à melhoria da gestão dos hospitais com tendência para maior atenção e rigor na prestação de informação, mais responsabilização/prestação de contas dos gestores (abandono do método eleitoral e da intromissão abusiva dos Grupos profissionais) e maior preocupação com a qualidade (acreditação) e satisfação dos doentes;
– Manteve-se a tendência dominante de reivindicação permanente de “mais”: maior remuneração, mais regalias, melhores condições de trabalho e de aposentação, mais pessoas, …;
– A coexistência de estatutos e regimes de pessoal traduz a necessidade mas também a dificuldade de mudar – a restrição das modificações às novas contratações limita o potencial de melhoria mas ainda assim o conflito de regimes e estatutos é preferível à simples continuidade (FP/AP).
Este período demonstrou, ao contrário do que muitas vezes transparece, a identidade dos fundamentos invocados nos modelos de intervenção (EIG, SA, EPE) o que indicia, a nosso ver, o enorme consenso existente nos 2 partidos com maior representação na AR – que poderia fundamentar um acordo de regime em pontos essenciais de reforma da Saúde.
Semmisericórdia
Etiquetas: Semisericórdia
3 Comments:
Ao Semmisericordia,
Muito Bom. Mais uma vez de forma clara, precisa e concisa abordou importantes aspectos da gestão da Saúde e em particular dos modelos de Gestão Hospitalar.
Concordo na generalidade, e na especialidade, com os "factos" que assinalou e permito-me destacar o que refere quanto à intromissão na gestão, que eu próprio aflorei num comentário anterior.
Não há muito mais a dizer, mas aqui deixo um pequeno contributo.
Refiro em primeiro lugar ao pagamento em SU a todos os clínicos pelo salário do regime de exclusividade. Foi, a meu ver, uma medida com graves repercussões nos custos das Urgências. Mas nem de todo injusta. Efectivamente, o valor hora de trabalho extraordinário de um médico em regime de não exclusividade não me parece que "valha" menos do que o de um outro colega que, no seu horário normal de trabalho, pratica o regime de exclusividade, e é remunerado por isso.
Trabalho extraordinário é para mim uma daquelas situações em que o "velho slogan" - a trabalho igual, salário igual - tem plena aplicação (princípio, como sabemos, raramente aplicado!)
O que teria sido justo, razoável e desejável, era que a "igualização" se fizesse pelo valor correspondente ao horário normal das 35 horas semanais, com os respectivos suplementos legais.
Respeitava-se, assim, o princípio geralmente aplicado na Administração Pública e nas Empresas.
Mas a medida viria a ter ainda mais graves repercussões no funcionamento dos serviços em consequência das tentativas posteriores de "não cumprimento" com uma "regulamentação" confusa e, em meu entender de "rectidão" duvidosa.
Pressionados pelos médicos com recurso a greves, "ameaças de greve" e recurso aos tribunais, mas também com a consciência da injustiça que vinha sendo praticada (com argumentos quase sempre pouco consistentes)os gestores dos HH SA's, (creio que na totalidade) acabaram por regularizar a situação. Mas não puderam evitar os custos financeiros da medida de que havia um elevado "passivo" acumulado.
E essas consequências financeiras continuam a pesar fortemente nos custos hospitalares.
Um outro aspecto que me merece alguma reflexão tem a ver com o muito que ficou por fazer nos HH SA's, apesar do muito que também foi feito.
Não é facil mudar estilos e formas de gestão, regras e princípios, em organizações fortemente influenciadas por uma cultura de defesa de interesses de classe.
O tempo foi curto mas, como diz o Semisercicordia, as interferências externas condicionaram a gestão e até certo ponto "desresponsabilizaram" os gestores pela falta de decisões importantes.
Assim se ficou à espera da definição de regras de remuneração e progressão no âmbito dos CIT por forma a permitir aos "funcionários públicos" fazer opção pelo CIT e recrutar novos colaboradores em condições claras de carreira e retribuição. A Unidade de Missão, preocupada com coisas eventualmente menores, nomeadamente jogos de poder, não foi capaz de avançar na contratação colectiva, como não foi capaz de desenvolver um sistema de incentivos, eventualmente menos elaborado, mas nem por isso menos justo e viável.
Viveu-se demasiado na "realidade virtual" (como se a informática milagrosamente tudo resolvesse!).
Ao mesmo tempo não foi possível estabelecer algumas regras de harmonização nas práticas salariais dos vários SA's de que resultaram situações de "compra de serviços" médicos e de enfermagem a preços manifestamente especulativos.
Os contratos-programa, e as restrições financeiras a eles asociadas foram outro dos graves entraves a uma verdadeira gestão empresarial, e foram-no quer quando negociados com o IGIF quer com a Unidade de Missão (apesar de tudo um pouco melhor com a UM).
Mas uma coisa me parece certa: qualquer mudança desta envergadura só é possível com tempo, rigor, motivação dos agentes envolvidos e clareza de princípios superiormente definidos.
Paciência, muita paciência e rectidão nas decisões dos responsáveis e gestores (a todos os níveis)são ingredientes indispensáveis para o sucesso da mudança. A médio prazo os resultados aparecerão. Mas as alterações frequentes de políticas e modelos não deixam de criar dificuldades adicionais às organizações e aos seus responsáveis.
Um acordo de regime, surge, por isso como uma exigência de interesse nacional. Mas a sua concretização apresentar-se-á tanto mais difícil quanto a ecolha de responsáveis de topo (e não só) for orientada pela satisfação de clientelas político-partidárias.
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
O semmisericórdia cabe incontestavelmente entre as maiores estrelas da Administração Hospitalar.
Dificilmente vemos entre os técnicos que directamente o apoiam, um elemento tão preparado e com tanta capacidade na abordagem destas matérias.
Dr, António Correia de Campos, depois de ler este comentário faça o favor de telefonar ao semmisericórdia a convidà-lo para seu colaborador.
Olhe que a guerra vai ser longa e dura e vai necessitar de ter nas suas fileiras os melhores da Administração Hospitalar.
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