quarta-feira, setembro 10

Crise das urgências


Então não se sabia já que havia empresas de “out sourcing” a cobrar cem euros à hora pela prestação de trabalho médico? E que a organização de muitas das equipas de urgência dos HH do SNS são verdadeiras mantas de retalhos? link
O que é novidade é a pública indignação do bastonário da OM, dos administradores hospitalares e do MS .

A situação que actualmente se vive tem por base uma grave distorção. Como se sabe, os médicos (horário completo) estão obrigados a prestar 12 horas da carga horária semanal nas urgências. Todas as horas prestadas além destas 12 horas são pagas como trabalho extraordinário. Dada a falta de pessoal, os médicos acabam por fazer um número exagerado de horas nas urgências, pagas como trabalho extraordinário o que agrava os custos e compromete a qualidade da prestação destes serviços.

Uma das soluções para tentar contornar este problema foi a criação de equipas fixas de médicos «intensivistas» (especialistas em urgências) em full-time de forma a libertar os especialistas para as consultas e os serviços das diversas especialidades (hospital de Santa Maria) link.
Os críticos deste modelo acusam as administrações hospitalares de pretenderem com esta medida reduzir essencialmente os custos através da substituição de equipas de especialistas, altamente diferenciadas, por médicos menos habilitados, que só prestam serviço nas urgências, sem salvaguardar devidamente a qualidade das prestações .

Sem qualquer contributo importante para a discussão, o bastonário da OM, como é seu timbre, limita-se a disparar em todas as direcções. Não se esquecendo de lembrar que "não foram os médicos que inventaram a empresarialização dos hospitais".
Não senhora.
Depois de terem inventado as listas de espera, que mais poderiam aspirar!
Para apaziguar as coisas, a ministra da saúde comprometeu-se a regular a situação dentro em breve .
A dedicação exclusiva do pessoal médico, vinculado ao serviço público, poderia ajudar. Se não tivesse a oposição da classe médica rendida às virtudes do mercado.
E ninguém ousaria criticar aquela prática restritiva, numa altura em que a administração Bush acaba de nacionalizar a Fannie Mae e a Freddie Mac, duas megas empresas privadas do crédito hipotecário.

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12 Comments:

Blogger e-pá! said...

Caro Xavier:

O post sobre a crise das urgências acabou por percorrer vários atalhos secundários e finalmente ignorou o cerne da questão – o custo das urgências (económico, físico e psicológico).

Essa dos médicos terem inventado as listas de espera... é de bradar aos céus…

A primeira razão para o aparecimento – e o nem sempre correcto aproveitamento político da questão – das listas de espera são variações imprevistas na procura.
Interessa aqui perguntar: a quem cabia prever, planear os serviços, dimensionar as capacidades?

A segunda razão é um bom motivo. Tem a ver com a melhoria da qualidade e o alargamento do leque de indicações dos serviços cirúrgicos para diferentes patologias, bem como a sua progressiva segurança e, ainda, a eficiência dos resultados. Isto, nos sistemas de saúde modernos.
Em terceiro lugar, a melhoria da acessibilidade, num serviço “universal, equitativo e tendencialmente gratuito”. Este modelo origina sempre listas de espera, bem como aqueles que se baseiam em seguros de saúde públicos. Haverá sempre, para as cirurgias programadas, alguns níveis de restrições, quer em pessoal quer em instalações, que, em última análise criam listas de espera.

Mas, meu caro Xavier:
As listas de espera cirúrgicas não são uma invenção, nem um privilégio, dos médicos portugueses. Elas existem em mais de metade dos países sa OCDE e, por exemplo, aqui ao lado, em Espanha, são longas ( largas, diriam eles…).

Os mecanismos de redução das mesmas listas baseados em subcontratações ou programas especiais (PECLEC / SIGIC) raramente deram resultados, mas os gestores de motu próprio insistem nesta solução.
Na Nova Zelândia onde as listas de espera também têm crescido, mudou-se recentemente de agulha. Em vez de disponibilizar recursos e dinheiro a rodos, que se verificaram terrivelmente ineficazes, começou-se pôr em prática soluções baseadas em ganhos na área da gestão das organizações de saúde. ( J.L. Foote, N.H. North e D.J. Houston, «Towards a systematic understanding of a hospital waiting list» (Journal of Health, Organisation and Management, Vol. 18, n.º 3, 2004): pp. 140-54.).

Ontem, tive oportunidade de comentar o que se estava a passar na contratação de médicos para os serviços de urgências.

Hoje, sou surpreendido pelas listas de espera enfiadas no mesmo saco, numa lógica de que tudo pode servir para atacar o grupo profissional médico.
Só faltou acrescentar a habitual aleivosia: as listas de espera são fabricadas pelos médicos para auferirem maiores rendimentos…!!!

10:33 da manhã  
Blogger xavier said...

Caro e-pá!

A intenção do post era discutir as urgências...

Já que resolveu pegar por aí, relembro-lhe a propósito o que se passou recentemente com os doentes em espera para cirurgia das cataratas.
Quando autarcas de vários municípios do país tomaram a decisão de levar os seus munícipes a Cuba e o hospital do Barreiro decidiu contratar uma equipa do país vizinho para despachar a lista de espera de oftalmologia, a OM, até então em profundo silêncio, decidiu sair a terreiro com criticas duras a estas iniciativas. O MS aproveitou também o ensejo para expiar culpas no cartório, e decidiu que era a altura de lançar o PIO.

Há vários factores ligados à existência de listas de espera e que têm a ver com a melhor ou pior gestão de recursos. Mas temos de concordar que esta questão muito especial, é marcada por uma forte componente político profissional (conflitos de interesses, muitos deles mal resolvidos)

Quando hoje vemos, especialmente desde que Ana Jorge é ministra, a classe médica atirar em tudo o que mexe (funcionamento das urgências, abertura de universidade de medicina, controlo de assiduidade, funcionamento dos Cuidados de Saúde Primários, modelo de gestão dos hospitais, sistema remuneratório, carreiras médicas, carreiras médicas, carreiras médicas), como se este grupo profissional fosse um factor exógeno e não tivesse tido, desde sempre, um papel dominante na gestão do sistema.

O que me parece é que face ao programa de reformas, legitimamente decidido por este Governo, essencial para o reequilibrio do nosso sistema de saúde quer económico, financeiro, acessibilidade ou de qualidade dos cuidados, é claro que a classe médica demonstra, cada vez menos envolvimento e mais empenho na luta de volta ao passado.

12:06 da tarde  
Blogger Clara said...

De notar que o Despacho n.º 47/SEAS/ 2006 (penso que ainda em vigor), estabelece o seguinte:

(...)3. O trabalho médico no Serviço de Urgência (SU) é realizado por equipas multi-especializadas, que devem ser tendencialmente estáveis quanto à sua composição nominal.

4. O Conselho de Administração do hospital deve promover a constituição de equipas dedicadas constituídas por médicos que afectem parte ou a totalidade do seu horário semanal de trabalho ao SU, com carácter definitivo ou temporário.

5. A integração em equipas dedicadas nos termos do número anterior está dependente do acordo do médico e não deve ser inferior a 6 meses.


As normas existem. O problema é passá-las à pratica e fazê-las cumprir.

12:12 da tarde  
Blogger e-pá! said...

Caro Xavier:

Os médicos não têm capacidade, nem têm o intuito, de se aproveitar da situação da actual ministra ser médica.
Mas a insinuação faz-nos inquirir se tal já terá passado com outros protagonistas. Deixo a pergunta em suspenso.
Nota: em 34 anos de regime democrático é o 2º. ministro médico....

"...como se este grupo profissional fosse um factor exógeno e não tivesse tido, desde sempre, um papel dominante na gestão do sistema..

Caro Xavier:
Desde o fim da eleição dos Directores Clínicos dos HH's que a gestão do sistema tem estado entregue noutras mãos.
Ou oriundos de uma clique constituída na ENSP ou por filiação partidária. Até coronéis já estiveram envolvidos na gestão hospitalar.

Finalmente, não há recuo possível para o passado. Deixe-me ser um pouco idealista mas julgo que o futuro é (ou deve ser) para todos...

12:40 da tarde  
Blogger Médico Explica said...

Curioso ...ou não...
Há 2 ou 3 dias atrás vi publicado um comentario salvo erro sobre o post Declaração de Tallinin(2), em que se faz referencia a um comentario de um sindicato médico e no qual é chamada a atenção para o papel e responsabilidade dos senhores administradores hospitalares na questão do mercado de trabalho para as urgências...
Incómodo...não?
Pois a resposta foi a dos manuais: focar e desviar a atenção e as críticas para os médicos, esses individuos parasitas do sistema e causa de todos os males...Não haverá possibilidade de haver hospitais sem médicos? Hum...talvez pouco conveniente:sem medicos, sem hospitais, sem administradores, credo cruzes, isso não!
Irra, que isto é pior ainda do que explicar medicina a intelectuais!

2:11 da tarde  
Blogger xavier said...

Caro é-pá
No hospital, em que o Administrador Hospitalar dava umas passeatas pelo jardim para fazer escoar o tempo (lembra-se?), quem é que comandava o barco?

Do que estamos a falar é de politics, dura e crua, que tanto aflige o nosso amigo PKM.
Em relação ao nosso sistema de saúde, sinceramente, não acha que tem sido a classe médica a comandar as coisas, desde sempre.

A capacidade de influenciar a decisão política não se mede pelo número de ministros

Ao nível das unidades da rede hospitalar, faça um esforço para se lembrar do que acontecia nos hospitais onde prestou (presta) serviço. Quem realmente comandava o barco?

Neste sector só se faz o que a classe quer ou consente. O mesmo é dizer que só haverá continuidade para a reforma da Saúde se a classe assim o entender.
Para já estão contra quase tudo: empresarialização dos HHs (no pressuposto que o modelo SPA ainda não está esgotado), reestruturação das urgências, reforma dos cuidados primários, alargamento do numerus clausus, remuneração indexada à produtividade, regime de exclusividade.
Tudo bem desde que não se mexa em nada.

É evidente que sem médicos não há sistema. Se somos o 12.º melhores do mundo é porque temos profissionais de saúde de nível elevado.
Não se trata de fomentar a guerra . Nem a classe médica está isenta de críticas e de culpa. Nem é nenhum Tabu.

4:01 da tarde  
Blogger e-pá! said...

Caro Xavier:

Longe de mim querer alimentar uma guerra no interior do SNS.
Há problemas prioritário e urgentes e as guerras consomem muito tempo. Sabe-se quando se começa, nunca se sabe qunado acaba...
Além disso, muitos dos meus grandes amigos são, p. exemplo, administradores hospitalares...e, verdade seja dita, as minhas discussões sobre o SNS só esporadicamente são com médicos.

Mas gostava de comentar algumas afirmações:

"...Em relação ao nosso sistema de saúde, sinceramente, não acha que tem sido a classe médica a comandar as coisas, desde sempre..."

Tem de concordar que desde a empresialização dos HH's (SA ou EPE's) a resposta é NÃO TEM SIDO! (foi por isso que referi a eleição dos Directores Clínicos...)

"A capacidade de influenciar a decisão política não se mede pelo número de ministros..."

Estar no Poder, ou ter amigos próximos no poder (somos intrinsecamente corporativos....), sempre ajuda...
Nem imagina a sensação que têm os provincianos, enraizados no Interior quando ouvem dizer:
"ontem fui a João Crisostomo e resolvi logo o assunto.".
Esta história dos ministros é como o dinheiro. Só por si não dá felicidade. Mas ajuda...

" Não se trata de fomentar a guerra . Nem a classe médica está isenta de críticas e de culpa. Nem é nenhum Tabu."

O SNS não sobrevive a uma guerra intestina. O problema é salvaguardar competências, integrar, discutir, informar, mobilizar.
Claro que os médicos como qualquer outros grupos profissionais estão isentos de culpas dos erros que vamos cometendo.
O problema é outro e nem é tabu (Cavaco é que gosta de tabus):
Ninguém gosta de ser o bombo da festa.
Tanta porrada no mesmo sítio, cansa quem ouve, deve cansar quem diz e perde a credibilidade.

Entendamos o SNS de outra maneira, isto é, sem tutores comportamentais, sem atitudes moralistas, sem repetitivos conciliábulos de maldicência.
Trabalhemos com competência e dedicação e teremos resultados.

Entretanto, cito (sem qualquer intenção perjurativa) aquela regra da selva:
"em bando, juntos, mas cada macaco no seu galho..."

4:55 da tarde  
Blogger Clara said...

Até há bem pouco tempo, Manuel Delgado era chamado a comentar nos meios de comunicação social sobre os mais diversos assuntos da Saúde.
Pois bem. Depois da recente mudança verificada na APAH., passámos a contar com uma dupla de comentadores, tipo Dupond e Dupond: o presidente e o vice.
Se a moda pega...

11:13 da tarde  
Blogger rezingão said...

Há que reconhecer que o dia de hoje foi esquisito. Não sabemos se por efeito do início da experiência com o mega acelerador de partículas ou se por qualquer outra razão. Começando pelo fim, a selecção faz uma das suas melhores exibições, com o Deco em grande forma. Começa a ganhar e acaba a perder por 2-3. O PR faz um comunicado inédito mostrando-se abespinhado com declarações proferidas por um dos Ministros mais aziagos deste governo. O deputado Paulo Pedroso regressa, do “exílio” interno, e dá uma entrevista, tipo lança-chamas, sugerindo (se necessário) uma coligação com o PSD. Neste partido, o ex-líder Menezes contra-ataca, rasteirinho, levando ao extremo a sede de vingança. Manuela Ferreira Leite persiste em não perceber como foi atirada aos lobos pelo Prof. Marcelo e vai tendo, como cavaleiro andante, o inenarrável António Borges. Este, por sua vez, parece ensaiar uma qualquer doutrina sobre como conciliar a sua velha máxima de “menos Estado e melhor Estado” com a nacionalização da Fannie Mae e da Freddie Mac nos EUA. O Rui Tavares, do Público, continua à espera de perceber (tal como cerca de mais de 9 milhões de Portugueses) se o PSD de MFL é liberal, conservador, social-democrata ou outra coisa qualquer quejanda, capaz de fundamentar alguma diferença na comparação com o pragmatismo de José Sócrates. O Mário Crespo arrasta na SIC Notícias o seu penoso sofrimento por ter de continuar a fazer de pivot, num canal de notícias, num país (irritantemente) governado por socialistas. A espaços socorre-se de filósofos sociais, neo-catastrofistas (tipo Medina Carreira e Joaquim Aguiar) assim como quem toma um Alka-Seltzer para aliviar a tamanha azia que lhe invade a alma. O Prof. João César das Neves profetiza a recessão técnica, em Portugal. Entretanto o petróleo não pára de cair e “fecha” em Londres nos 98 dólares. Um grupo de malfeitores lesa o Estado em mais de 250 milhões de Euros com importação ilegal de álcool, assistimos durante anos a um mega-julgamento e, no final, um desgraçado (apenas) tem prisão efectiva. Um juiz liberta um criminoso que dispara cinco tiros dentro de uma esquadra de polícia.
É tão difícil viver em Portugal…

11:37 da tarde  
Blogger Joaopedro said...

A nacionalização da Fannie & Freddie pela administração Bush, traz os nossos liberais de serviço à beira de um ataque de nervos. link link
E logo a América.
Entre nós, ainda não há muito tempo, aconteceu que o Estado sentiu necessidade de fazer destacar quadros da Caixa Geral de Depósitos, numa operação de salvamento do BCP.

Para espanto da canalhada liberal ainda vamos ter oportunidade de assistir a nova operação de salvamento por parte do Estado, quem sabe, desta vez, de um hospital privado em risco de falência.

8:48 da manhã  
Blogger Joaopedro said...

Quanto a esse senhor que mais parece uma personagem dos episódios do menino Tonecas, melhor fora que fosse dar "explicações" das suas teorias da conspiração para ... o site do café da coxa.
Sobre o tema das urgências...nada.
Ele há cada um...

9:04 da manhã  
Blogger helena said...

Tantas verdades juntas...ferem, concerteza.

Então não ficou provado que um dos factores importantes para a existência de longas listas de espera de oftalmologia é a manutenção dos elevados preços de mercado destas cirurgias.

Até que o Hospital do Barreiro teve a coragem de contratar uma equipa espanhola que em pouco tempo derreteu a lista de espera daquele hospital.
Inevitavelmente, depois desta tremenda ousadia, o destino desta colaboração estava traçado.
Reduzí-la a pó.
É impressionante, como mesmo aqui, é dificil abordar alguns temas mais dificéis, protagonizados pela classe médica.

9:30 da manhã  

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