domingo, março 27

Mais encanto na hora da despedida

Ana Jorge e secretários de Estado estiveram na CPS horas antes do pedido de demissão do primeiro-ministro.

Um balanço antecipado
Num ambiente que mais parecia de «saída de cena», Ana Jorge e os seus dois secretários de Estado foram mais uma vez à Comissão Parlamentar de Saúde. Contas e recursos humanos estiveram no centro da discussão com os partidos. De manhã era a audição obrigatória da equipa do Ministério da Saúde na Comissão Parlamentar de Saúde (CPS). À tarde era a discussão e votação de resoluções sobre o Plano de Estabilidade e Crescimento (PEC) IV que, já se previa, iriam levar a pedir a demissão do primeiro-ministro. Talvez por isso, a ministra da Saúde, Ana Jorge, levou à audição um discurso que se assemelhou a balanço de mandato, optando por elencar as medidas que pôs em prática e os resultados que obteve com as mesmas. Mas nem assim se livrou das críticas dos partidos da Oposição, nomeadamente no que diz respeito ao trabalho do seu Ministério no campo dos recursos humanos e às contas do Serviço Nacional de Saúde (SNS). Quanto aos recursos humanos, a aposentação dos médicos esteve em evidência. A ministra avançou aos deputados que, até ao momento, já tinham sido autorizados «159 pedidos de médicos para se manterem em funções no Serviço Nacional de Saúde» e que estavam em processo de instrução «mais cerca de 60 pedidos», o que significa o regresso de 219 clínicos ao trabalho no serviço público. E «diariamente estão a chegar novos pedidos», garantiu. Dos já autorizados, «cerca de 67% dizem respeito a situações de reforma», ou seja, a médicos aposentados por tempo de serviço e idade, «sendo que 22%» deles são especialistas em Medicina Geral e Familiar [MGF], explicou a responsável, acrescentando que, à hora da audição, o Ministério da Saúde mantinha a intenção de atrair até final do ano «200 médicos reformados sem antecipação». Mas João Semedo, do Bloco de Esquerda, trazia outros números para a audição. Segundo o deputado, em 2010 aposentaram-se 322 médicos de família e até Fevereiro deste ano reformaram-se mais 103, perfazendo um total de 425. Fazer regressar um grupo de 200 clínicos em que só pouco mais de 20% são médicos de família «é pouco», segundo o deputado, já que isso apenas representa o regresso de cerca de 50 médicos aos cuidados de saúde primários. «É pouco mais do que 10% dos que saíram desde Janeiro de 2010», sublinhou. Ana Jorge contra-argumentou, afirmando que o regresso de 200 médicos ao serviço público este ano, por acordo com o Ministério das Finanças e da Administração Pública, diz apenas respeito aos reformados por tempo de serviço e idade e não aos que solicitaram reformas antecipadas. Para esses, garantiu a ministra, «não há limite neste momento», podendo regressar os que para tal mostrarem vontade.

Contas por apurar

Os números da despesa do SNS também estiveram em destaque, com Ana Jorge a garantir que o Ministério da Saúde se orgulha de, «nos primeiros dois meses de 2011, ter contribuído de forma muito activa para o rigoroso cumprimento do exigente Orçamento do Estado de 2011», e a anunciar que a redução total da despesa nos primeiros dois meses do ano «foi de 6%, em linha com o previsto» naquele instrumento estruturante. E logo na primeira intervenção do Partido Social-Democrata, a cargo de Clara Carneiro, foram questionados os números avançados. A deputada quis saber «o valor exacto» da dívida aos fornecedores e o «prazo médio de pagamento». Isto porque, segundo argumentou, o valor da dívida pode chegar aos «dois mil milhões de euros». Na resposta, Ana Jorge admitiu que nos números da execução orçamental não estão incluídas as dívidas, mas nem a ministra nem os secretários de Estado falaram em valores. Só à saída a governante reconheceu que as contas dos hospitais ainda estavam por encerrar e o secretário de Estado Adjunto e da Saúde, Manuel Pizarro, concedeu que, se forem respeitados os prazos de pagamento a 90 dias, a dívida chega aos 1100 milhões de euros, e por isso não se quis pronunciar sobre o valor avançado pela deputada da bancada social-democrata.

«Tenho feito aquilo que era a minha obrigação»

Faltavam pouco menos de 45 minutos para o início do debate do PEC IV quando terminou a audiência na Comissão Parlamentar de Saúde. Questionada pelos jornalistas sobre se aquele era o seu último dia na pasta da Saúde, Ana Jorge reagiu com sentido de humor: «É o último dia do resto da minha vida, que cada dia é sempre o último do resto dos dias que me faltam viver.» E, no mesmo tom de balanço que dominou a intervenção na audição, a ministra rematou: «Sinto que tenho feito aquilo que era a minha obrigação, que é defender a continuação de um Serviço Nacional de Saúde (SNS) para todos. Todas as medidas que temos tomado, que podem ser consideradas menos populares, foram tomadas para que o SNS seja sustentável e se mantenha como os portugueses o conhecem desde há 30 anos, de acesso tendencialmente gratuito e de qualidade para todos, e disso sou completamente defensora.

tempo de medicina 28.03.11

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