terça-feira, março 22

Entrevista de Jorge Simões

foto GH
O presidente da Entidade Reguladora da Saúde (ERS) está preocupado com o acesso dos portugueses aos medicamentos e avança que a ERS está já está a investigar possíveis discriminações.

- Com os cortes de 15% impostos aos hospitais e como PEC IV que pede mais esforço às empresas do sector empresarial do Estado, estamos perto de pôr em causa o acesso e a qualidade dos cuidados de saúde?
Espero bem que não. A linha do acesso de cuidados de saúde aos cidadãos não pode ser cruzada. Até ao momento não temos sinais que essa linha tenha sido ultrapassada. O ponto mais preocupante não é o acesso aos hospitais mas sim o acesso aos medicamentos.

- As recentes alterações na política do medicamento têm prejudicado o seu acesso?
A ERS regula todas as áreas do Ministério da Saúde, excepto a área dos medicamentos. Isso compete ao Infarmed. A questão dos medicamentos apenas será motivo de intervenção da ERS na medida em que possa limitar o acesso dos cidadãos aos cuidados de saúde.

- Têm existido notícias de discriminação financeira no acesso a medicamentos, no caso das doenças raras. É a isso que se refere?
Sim, embora nenhuma entidade, associação, ou doente nos tenha colocado directamente essa questão. Estamos a trabalhar em áreas de possível discriminação, mas não especificamente nas doenças raras.

- Há medicamentos que estão a ser negados, inovadores por exemplo, por razões economicistas?
O Serviço Nacional de Saúde (SNS) tem de fazer um equilíbrio muito difícil. Por um lado ter as portas abertas a tratar todos os doentes, e por outro ter preocupações com aspectos de eficiência. E tem de ter em atenção que há novos medicamentos que não incorporam inovação. É um trabalho de avaliação clínica e económica.

- Quais são então os pontos mais críticos do SNS?
Primeiro o acesso. Ou seja, os cidadãos encontrarem resposta no SNS quer nos cuidados primários, quer nos hospitalares, quer nos cuidados continuados. Um outro problema muito complexo é a questão dos pagamentos directos. Aquilo que nos sai do bolso para a saúde representa 24% das despesas totais em saúde. É um valor relativamente elevado e é necessário ter em atenção que há um limite para o crescimento dos pagamentos directos dos cidadãos.

- O acesso tem piorado?
Se medirmos o acesso pelos tempos de espera e listas de espera, concretamente para cirurgia, aquilo que está publicado é um bom resultado. Se bem que tenhamos ainda listas de espera significativas, têm havido ganhos muito importantes. Mas não deixa de haver respostas tardias para algumas patologias.

- Qual é a solução? Mais convenções?
Em circunstâncias em que há listas de espera significativas faz todo o sentido que o Governo estabeleça linhas próprias para dar respostas ao um problema agudo sentido pela população.

- Qual é que deve ser o papel dos privados?
Não posso ser mais favorável a um papel de cooperação entre o público e o privado. A história do SNS é uma história de relação entre os dois sectores. É uma relação perigosa, tem riscos e por isso deve ser mais regulada.

- Defende a continuação das PPP na saúde?
Não vejo que as PPP sejam nenhum pecado original. Quando o Estado pretende fazer obra e não tem meios financeiros de o fazer, é natural que recorra ao sector privado.O que tem acontecido em quase todas as situações é um deficiente acompanhamento por parte do Estado em relação às PPP.

- Uma das PPP que parece não estar a correr bem é a do Hospital de Braga. A ERS já emitiu mesmo uma recomendação ao grupo Mello Saúde.
Poderá haver um problema relacionado com o acesso dos cidadãos aos cuidados de saúde e estamos a estudar o diferendo entre o Hospital de Braga e o Hospital de S. João. Já abrimos um processo de inquérito sobre esta matéria para averiguar o que está a acontecer.

O actual aumento da carga fiscal afasta novos impostos consignados à Saúde. Jorge Simões acredita que acabar com a ADSE seria uma solução para o subfinanciamento do Serviço Nacional de Saúde (SNS).

- Tem-se falado em impostos especiais consignados à saúde ou co-pagamentos. Já estamos perante essa necessidade?
Entre 1994 e 2005 tivemos um crescimento anual da despesa do SNS superior a 9% ao ano. Foram introduzidas reformas importantes que permitiram um crescimento anual da despesa em cerca de 3%. A situação agora é mais confortável e as medidas que foram tomadas na área do medicamento têm efeito na diminuição da despesa do SNS e dos cidadãos. Mas é necessário continuar a intervir, concretamente nos hospitais. Caso contrário a questão da sustentabilidade volta a estar na ordem do dia.

- A situação do País dá outro enquadramento à despesa e a saúde é das áreas que mais pesa. O actual crescimento da despesa é sustentável?
Não vejo alternativas. A situação financeira do SNS sofre as consequências da situação financeira do País. Uma das hipóteses últimas é a eventual criação de um imposto especial, mas com o actual aumento dos impostos essa é uma hipótese que não se coloca.

- Há quem venha a ditar a insolvência do SNS para muito breve. Partilha dessa opinião?
Não partilho. Os portugueses têm uma relação de empatia, de confiança e de segurança com o SNS. Que alternativa temos? Privatizar? Mas isso não permite uma redução da despesa, pelo contrário.

- Defende o fim da ADSE. Seria a solução para acabar com o sub-financiamento do SNS?
Acho que podia ajudar. Defendo que a ADSE deve ser auto-sustentável. Não devem ser os contribuintes a pagar o subsistema dos funcionários públicos. Esse é um ponto fundamental, que não tema ver com poupança mas com equidade. Essa despesa, que é ainda importante, podia ser canalizada para o SNS que está bem carente de mais receitas, neste caso eventuais transferências do Orçamento do Estado.
entrevista de Catarina Duarte, DE 21.03.11

Depois da penosa arenga do professor Lobo Antunes nada de mais oportuno e estimulante do que esta entrevista do nosso colega professor Jorge Simões, publicada hoje no DE. A palavra a quem sabe destas coisas da Saúde. clara gomes

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2 Comments:

Blogger saudepe said...

Sem nada de original mas sempre com o mesmo rigor e profundidade do costunme.
Só é cego quem não quer ver.
O SNS é actualmente muito mais do que um sistema de saúde.
Quando acabarem com o SNS mais vale entregarem-nos aos espanhóis.
Só um puto despreparado e ignorante como Passos Coelho, armado em liberal de pacotilha, pode abordar com semelhante ligeireza a urgência em entregar o SNS aos privados.
Que melhor pretexto teremos para fazermos a nossa revolta do jasmin.
Porque a dos cravos já era.

9:49 da tarde  
Blogger saudepe said...

«Passos Coelho sabe que quer ser primeiro-ministro, só não sabe para quê. Aceita que o futuro do País passa por uma abrupta, radical e insensata descida do défice, que só pode mergular Portugal numa crise sem fim. Aceita o essencial das propostas alemãs para os países periféricos, que passa pela sua asfixia económica e por uma punição que se aproxima do sadismo. Assim, pode dar as voltas que quiser que, quando tomar posse, se tomar posse, irá aplicar, mais coisa menos coisa, o mesmo que Sócrates. Talvez, aproveitando a crise, ainda acrescente algumas medidas que imprudentemente deixou transpirar na sua proposta de revisão constitucional.»
daniel oliveira

Prefiro um primeiro ministro mitómano e sacana a um puto impreparado e ignorante.

9:56 da tarde  

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