terça-feira, outubro 30

OE 2013 - Saúde

Como fica o sector da saúde no Orçamento do Estado?
Considerando o contexto geral do Orçamento do Estado (OE), talvez se possa afirmar que o Ministro Paulo Macedo conseguiu defender o sector: tomando em linha de conta o valor para amortizar a dívida acumulada da saúde, os recursos financeiros previstos para a saúde no OE 2013 são relativamente generosos. 
A amortização da dívida na ordem dos 1.932 milhões de euros é uma boa notícia para os credores dos serviços públicos de saúde. Mas será que dívida a 31/12/2012 será liquidada nos termos da lei ou a amortização diz unicamente respeito à dívida de 2011? Em 2013, será que os serviços de saúde conseguirão honrar os seus compromissos para com os seus fornecedores a tempo e horas ou a manutenção do nível de financiamento significará mais dívida? O OE dá algumas pistas ao reconhecer que a “trajectória de evolução das despesas ainda não está alinhada com o nível de receita disponível”. 
Uma interrogação importante é sobre o impacto efectivo na despesa do acordo com os sindicatos dos médicos e se o respectivo acréscimo da despesa será devidamente compensado pela redução do despesa com as horas extraordinárias e com a contratação em regime de prestação de serviços, assegurando a melhoria dos níveis de produção e de produtividade. Se por um lado o aumento da despesa como resultado do acordo é certo, por outro, a concretização do potencial de poupança está longe de estar assegurada. 
Em 2013, o sector de saúde verá agravada a sua despesa com pessoal pela via da reintrodução de um dos subsídios retirado em 2012. A este agravamento deve ser adicionado o aumento da despesa resultante do acordo com os médicos (e depois serão os enfermeiros, técnicos, auxiliares, etc. !!!). Assumindo que o SNS manterá o mesmo nível de disponibilidade e de produção, com este nível de financiamento será possível cobrir o acréscimo da despesa com pessoal e assegurar o cumprimento da lei dos compromissos?
Na saúde, a redução da despesa tem sido fundamentalmente efectuada por via administrativa através da redução da despesa com o pessoal, medicamentos e afins. Os utentes, o pessoal e os fornecedores é que têm suportado parte substancial dos cortes. O OE prevê um acréscimo de 10M€ para os Serviços Partilhados do Ministério da Saúde mas não fundamenta a contribuição efectiva dos serviços partilhados na redução da despesa e na criação de valor para o sector. De igual modo, o OE não clarifica nem dimensiona a contribuição efectiva das medidas incluídas nos planos de ajustamento dos hospitais EPE na redução da despesa, tornando difícil assumir que não é mera afirmação retórica. 
A construção do Hospital de Lisboa Oriental só poderá ser positiva e com impacto estrutural ao nível da despesa se da concentração de serviços e competências resultar de forma efectiva o encerramento de unidades hospitalares e serviços, redução das dotações de camas e de efectivos. 
Os cortes estruturais na despesa ao nível do medicamento, estimados em 187M€ em 2013, dificilmente poderão ser suportados pelas famílias através da redução das comparticipações. Assim é provável que sejam suportados pela indústria e pela distribuição representando um risco acrescido na desconstrução da cadeia de valor do medicamento (hospitalar e ambulatório), tomando em linha de conta a situação económico-financeira actual de diversos dos seus actores. O agravamento dessa situação poderá ter impactos significativos ao nível da economia e sociedade portuguesa. 
É expectável que o modelo e nível de financiamento dos prestadores se mantenham assumindo um nível de actividade aproximado a 2012. Isto poderá significar que eventuais reformas no sector só tenham impacto nos anos seguintes ou que, de facto, por razões de gestão política, tais reformas serão suavizadas não implicando alterações estruturais. Não é expectável uma melhoria do acesso em qualquer dos níveis de prestação de cuidados. 
As taxas moderadoras serão congeladas ao nível dos cuidados primários o que é bastante positivo. Contudo, no OE não está claro o que acontecerá com as taxas moderadoras nas urgências e outros serviços hospitalares. 
Manuel Carrilho Dias, PwC, Renancença, 18.10.12 

A reforma estrutural de forte impacto prevista para 2013 diz respeito à reorganização e “racionalização” da rede hospitalar do SNS. O relatório da 5.ª avaliação da troika prevê uma redução de despesa de 15%.  Com esta política, é expectável que o acesso aos cuidados se degrade nos próximos anos. Basta observar o que está a acontecer às listas de espera.] link

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2 Comments:

Blogger DrFeelGood said...

«o Ministro Paulo Macedo conseguiu defender o sector: tomando em linha de conta o valor para amortizar a dívida acumulada da saúde, os recursos financeiros previstos para a saúde no OE 2013 são relativamente generosos. »

Paulo Macedo não foi colocado à toa no Ministério da Saúde. Conhecendo-se, como conhecemos melhor agora, o Governo de estarolas de Passos Coelho, Miguel Relvas, Victor Gaspar e Álvaro Santos Pereira.
Paulo Macedo tem por missão reformar profundamente a Saúde (co-pagamentos; privatização de unidades de saúde- aliviar o Estado da prestação directa; "opting out" e desenvolvimento do mercado de seguros), mas dando tempo às multinacionais que operam na Saúde para que possam adaptar-se/ reconverter-se às novas condições de negócio.(não devemos esquecer donde vem Paulo Macedo)
Pagar as dividas aos laboratórios (tal como também defende a troika)integra-se nesta estratégia.
Não devemos deixar-nos enganar pela ideia que Paulo Macedo é um defensor do SNS e que a sua politica tem por objectivo fazer os ajustamentos possíveis, melhorar a eficiência, sem prejuízo do que é essencial.
Nada de mais errado!
Vamos conhecer o verdadeiro Paulo Macedo na próxima reforma da rede hospitalar.

3:20 da tarde  
Blogger DrFeelGood said...

O léxico que Passos Coelho introduziu na Língua portuguesa, criando novas expressões e mudando a semântica de outras já existentes, ajuda a mostrar o rumo (ou a falta dele) do Governo desde que tomou posse. É altura de abrir o dicionário e traduzir o Passês para o Português.

Desvio colossal: Quando chegou ao Governo, Passos disse ter encontrado um desvio colossal nas contas públicas. Nunca se chegou a provar a existência do tal desvio. Mas à conta disso tirou aos portugueses metade do subsídio de Natal em 2011, o que mais tarde até viria a mostrar-se desnecessário já que acabou por transferir as pensões dos bancários para o défice. Desvio colossal passou a designar um desvio de existência duvidosa.

Malabarices: Quando preparava o Orçamento para 2012, Passos anunciou que o documento não teria "malabarices" como aconteceu no passado. A meta do défice de 2011 foi conseguida com o fundo de pensões da banca e a meta deste ano será atingida com a receita extraordinária da concessão da ANA. Malabarices passou a designar contabilidade orçamental criativa.

Custe o que custar: É o Governo a dizer ao que vinha. É uma adaptação idiomática do ‘mais papista do que o Papa' ou do ‘mais troikista do que a troika'.

Coiso: A política do ‘custe o que custar' fez disparar o desemprego, ou melhor, o coiso, usando o vernáculo do ministro Álvaro Santos Pereira.

Piegas: Quando as pessoas começaram a queixar-se do coiso, Passos mandou-os emigrar e pediu aos que cá ficassem que deixassem de ser piegas. Piegas é o indivíduo que se queixa de não ter trabalho.

Sair do lombo: Os sacrifícios "estão-nos a sair do lombo", disse então Passos Coelho. Lombo passou a designar a carteira dos portugueses, cada vez mais vazia com o aumento de impostos.
Porcaria na ventoinha: Em Julho, Passos garantia que o Governo não estava, na altura, "a preparar qualquer aumento de impostos" e que recusava "pôr porcaria na ventoinha para assustar os portugueses". Dois meses depois anunciou mais impostos. Em Passês, ‘porcaria na ventoinha' significa aumentar impostos.

Regabofe: "Ainda há quem pense que, passada a crise, o regabofe pode voltar. Enganam-se!". Era Passos Coelho a falar sobre a regra de ouro, ou seja, o limite ao défice na Constituição. Regabofe é sinónimo de políticas expansionistas.

Que se lixem as eleições: Quando os deputados do PSD se aperceberam da falta de Regabofe e do impacto da austeridade nas sondagens ficaram assustados. ‘Que se lixem as eleições' passou a designar uma mensagem de tranquilidade de um líder político.

Viragem económica: Mas era preciso dar ânimo ao partido. Passos anuncia então o fim da recessão para 2013. Mas a troika e Orçamento para 2013 mostram que vamos continuar em recessão. Viragem económica passou a designar um modelo macroeconómico concebido no calor da festa do Pontal.

Refundação: Com a economia a afundar, eis que Passos nos propõe um novo vocábulo: Refundar. Não se assuste que não vamos afundar de novo. No dicionário de Passos Refundação é tão só rever a Constituição: Trocar o conceito de tendencialmente gratuito na saúde e na educação por co-pagamentos (pagar em função dos rendimentos) e talvez dar aos cidadãos uma maior liberdade de escolha na gestão da sua pensão de velhice durante a idade activa. Não é uma ideia descabida e só peca por vir tarde. Mas esta é uma discussão que só fará sentido no dia em que o Governo, pela via fiscal, repuser todo o poder de compra que os portugueses perderam durante o programa da ‘troika'. Se o Estado fica com mais de metade do meu salário não posso autofinanciar a minha saúde, a educação dos meus filhos e a minha reforma. Até lá o melhor é mesmo o Governo continuar a inventar palavras, que é aquilo que até agora tem sabido fazer melhor.
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Pedro Sousa Carvalho, DE 30.10.12

4:06 da tarde  

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