domingo, junho 25

Quem tem Razão ?

Crítica, independência e fundamentação
Passada a espuma dos dias é agora possível ver claro. Uma das medidas emblemáticas do início do Governo, a venda de medicamentos não sujeitos a receita médica (MNSRM) fora das farmácias, apesar do caminho lento que vem fazendo, mantém-se sob o fogo dos detractores iniciais. Aproveitando a janela de oportunidade que lhes foi aberta por uma congregação de académicos, um até aqui respeitado Observatório Português dos Sistemas de Saúde (OPSS) serviu de veículo objectivo às teses da corporação de farmacêuticos. Sem carear evidência, o OPSS escreveu que se tinha observado um aumento generalizado do preço dos MNSRM face ao período prévio à liberalização, declarando que os preços de venda ao público nas lojas eram, na generalidade, superiores aos preços praticados nas farmácias. A informação foi contestada, de imediato, pelo signatário e pelo secretário de estado da saúde, com base em relatório de Junho do Infarmed, divulgado na página desse organismo regulador. Em amostragem obtida de 44 entre 161 lojas, apesar de terem vindo a subir os preços médios desde Setembro de 2005 até Maio de 2006, o balanço de nove meses apontava para uma poupança global para o consumidor de quase 5%. O relatório demonstrava ainda que cadeias de lojas com maior poder negocial praticavam, em regra, melhores preços (em um caso quase 12% mais baixos) que pequenas lojas familiares longe das grandes cidades e com escasso poder para grandes aquisições. Conclusões que não surpreendem, por várias razões: (a) o mercado distribuidor está ainda no início, com apenas 164 lojas; (b) o mercado grossista continua cartelizado com um só agente económico, detendo, controlando, ou influenciando directa ou indirectamente, questão jurídica ainda por resolver, cerca de 60% da distribuição grossista; (c) cada loja tem a sua política, onde preço e proximidade ao cliente são factores combináveis em estratégia de venda.
Questionado sobre as fontes de afirmação tão peremptória de «falhanço dos MNSRM», o responsável pelo relatório escusou-se a divulgá-las. No dia seguinte, a imprensa referiu que a informação havia sido colhida em três grossistas. O grossista conhece o preço a que vende, duvidoso é que conheça o preço a que os seus clientes revendem produtos sem preço fixo. A fragilidade da fonte explica o carácter qualitativo do «afidavit», deitando por terra a sua credibilidade.
Mas há mais: o relatório chega a afirmar que os preços nas lojas «são, na generalidade superiores aos preços nas farmácias». Para quem não acreditar no Infarmed, uma comparação de preços de quatro produtos entre três lojas e três farmácias, publicada por um matutino no dia seguinte, demonstrava que em todas as lojas os preços eram os mais baratos, excepto numa única das três farmácias onde os preços eram não só muito inferiores aos das outras, mas também inferiores aos das lojas. Descontando a frágil representatividade da amostra, significa isto que os preços nas lojas são «na generalidade» superiores aos das farmácias? Bem ao contrário, significa que uma farmácia adoptou uma política de preços agressiva, ou seja, jogou na concorrência, demonstrando que a liberalização funcionou com vantagem para o consumidor.
Em outro «estudo» de outro matutino, na comparação de cinco produtos entre uma farmácia e duas cadeias comerciais o preço observado foi sempre mais baixo nas lojas do que na farmácia, excepto num produto onde era igual. Outros pequenos estudos foram ainda divulgados, todos concluindo no mesmo sentido.

Foi registada a ligeireza e falta de rigor do Relatório do OPSS, neste capítulo. Mas há mais. Sabe-se agora, por informação já tornada pública, que este capítulo do relatório foi redigido por uma personalidade do associativismo farmacêutico. Lendo outros parágrafos compreende-se a marca corporativa genética: a liberalização teria sido adoptada sem estudos prévios, e «desregulou» a profissão de farmacêutico, equiparando estes técnicos de farmácia na responsabilidade técnica das lojas. Basta compulsar as declarações daquela Ordem para se verificar a total coincidência de opinião. Gato escondido com rabo de fora.
Da lista de autores do relatório constam individualidades respeitadas, duas das quais assinalaram conflito de interesses. A referida personalidade do mundo farmacêutico, certamente por lapso, omitiu a referência a conflito de interesses.
O OPSS, por razões de pressa, tolerância excessiva ou falta de rigor, colocou-se em posição hostil ao Governo nesta matéria, sem carrear evidência.
Prejudicou a sua credibilidade e a das instituições universitárias que o suportam.
Toda a crítica é necessária, desde que independente e fundamentada. A crítica à liberalização da venda dos MNSRM feita pelo OPSS não foi independente nem fundamentada.
Ministro da Saúde, semanário expresso 24.06.06

Sobre os estudos do Infarmed e do OPSS, Pedro Pita Barros, num artigo do DE (23.06.06), questiona: «Quem tem razão?» link
Segundo PB nenhum dos relatórios permite distinguir entre dois efeitos : a liberalização de preços e a venda dos medicamentos não sujeitos a receita médica fora das farmácias.
Um estudo da Faculdade de Economia da UNL, (Maio de 2006), referido por PB, conclui que a liberalização, por si, parece ter libertado uma pressão para subida de preços, anteriormente regulamentados.
Mas PB conclui que «a existência de significativa diversidade de actuações das entidades que vendem este tipo de medicamentos sugere que a concorrência poderá vir a desenvolver-se e a beneficiar os consumidores».

7 Comments:

Blogger Farmaceutico de Oficina said...

Já não há pachorra para discutir tanta insensatez; temos que ir trabalhar... para continuar a pagar salários ao Sr Ministro;

O papel das farmácias como “retalhistas” penso que pouco a pouco está a ser esclarecido , por muito que custe ao Nosso Ministro e à sua equipa...

Em relação a Farmácias como parte integrante do nosso sistema de Saúde

Vamos trocar mais umas seringas a toxicodependentes de borla e assim evitar a disseminação do vírus HIV; Vamos continuar com doentes do Protocolos dos diabéticos dispensar as tiras e Lancetas sem qualquer margem. Recolhendo a parte da comparticipação por conta do Estado...

Como porta sempre aberta a que os cidadãos recorrem quando tem qualquer problema de saúde, antes de irem para as filas dos Centros de Saúde ou das Urgências; vamos continuar com o nosso trabalho de ouvir e encaminhar os utentes sem cobrar qualquer taxa moderadora ou “consulta”, fazendo uma pré triagem e acalmando os espíritos...que no dia a dia a nós recorrem...


Pensava que os responsáveis da Saúde deste país que estes pequenos contributos valessem alguns magros “cêntimos” na margem dos produtos que comercializamos, mas não.... cada uma das 2700 Farmácias independentes, continuam a conspirar para boicotar o acesso dos consumidores a medicamentos mais baratos e a boicotar a política de Sua Excelência o Ministro da Saúde deste País... Chamem a Polícia!!!

Cumprimentos

10:35 da manhã  
Blogger tonitosa said...

Sou ignorante. Na verdade acho que sou mesmo ignorante!
Da leitura que fiz do estudo do Infarmed tenho dificuldade em concluir que os preços dos 15 MNSRM seleccionados tenham baixado.
Ou na verdade não consigo ser capaz de interpretar o que significam os "índices de preços" que constam dos quadros do mesmo estudo.
Com base nesse estudo o OPSS é acusado de "suspeito" pelo Governo/MS. Por mim nem discuto esse facto. Mas pergunto: e o Infarmed? Não pode ser acusado de suspeito? Um Organismo que no próprio dia ( ou no anterior)em que o OPSS divulgou o seu relatório (e só nesse dia o fez) surge com conclusões contrárias, às daquele Observatório não actuou sob "encomenda"? Não actuou como sendo a "voz do dono"?
Pode não o ter feito com essa missão(?) mas mais uma vez...à mulher de César...
Repare-se que o Infarmed parece pouco seguro ou pelo menos demonstra "timidez" nas suas conclusões. Do seu relatório pode ler-se: "O preço destes medicamentos sofreu uma redução com a entrada em vigor do Decreto-lei 134/2005, de 16 de Agosto. No entanto a evolução mensal tem vindo a demonstar um aumento crescente do preço destes medicamentos."
Mas o relatório diz também que nem sempre as entidades situadas nos primeiros 15 lugares das listas dos que mais venderam (quantidades e valor), apresentam preços mais baixos.
Mas há algumas coisas que vale a pena questionar:
Em primeiro lugar a rápida evolução dos preços aproximando-se dos preços de Agosto de 2005 à medida que o mercado se foi expandido. E quando chegou às 33 entidades constata-se mesmo um índice de preços superior a 100, ou seja, um aumento dos preços.
O estudo do Infarmed paresenta pelo mesno um dado estranho e que retira fiabilidade ao mesmo ao apresentar em Maio dados relativos a apenas 18 entidades quando nos meses anteriores a amostra abrangeu 33 e 34 entidades.
Os dados da evolução mensal (quadro 1.1.)dizem-nos ainda que os meses mais recentes (Fevereiro a Maio) correspondem a 58,27% das vendas totais da amostra e que a média simples dos índices de preços nesses quatro meses situa o índice de preços já muito próximo do 100 (99,75) sendo de notar que em Março de 2006, quando foi recolhida informação no maior número de locais de venda, o índice de preços - 100,3 - permite concluir que no mês em causa foram praticados preços superiores aos de Agosto de 2005.
Depois pode constatar-se que os dados apresentam valores pouco coerentes. A evolução das vendas nos meses de Fevereiro, Março e Abril de 2006 parece algo "errante" se atendermos ao número de entidades, de locais de venda, de embalagens vendidas e de valores das vendas.
É tecnicamente aceitável tirar conclusões com base em dados que parecem incoerentes?
Podemos ainda fazer uma leitura e interpretação dos dados dos quadros seguintes.
Eu, que não sou capaz de concluir da leitura integral de todos os quadros apresentados que houve uma queda generalizada dos preços dos medicamentos do Top 15, tenho que reconhecer a minha ignorância.
Tenho esperança que neste blog sejam prestados, por outros colegas, os esclarecimentos que me convençam a concordar com o Infarmed.

4:22 da tarde  
Blogger coscuvilheiro said...

Há uns meses atrás o vivóporto escreveu aqui na saudesa que CC ia ficar para a história como o Ministro das Farmácias.

Pois bem, por este andar, CC arrisca-se a ser cognominado como o ministro dos Postos de Venda de MNSRM.

8:35 da tarde  
Blogger tonitosa said...

Este comentário foi removido por um gestor do blogue.

11:02 da tarde  
Blogger tonitosa said...

E não fica bem a CC e a FR, que fizeram parte do OPSS, poderem sequer deixar transparecer a ideia de que estudos sérios eram os do seu tempo.
Por mais que estes agora sejam críticos do Governo!

11:05 da tarde  
Blogger xavier said...

Em relação ao comentário do Manuel Monarca AV, apenas uma pequena nota.
Segundo entendi do artigo do ministro, CC não se socorreu do estudo de Pita Barros.
Este economista é que refere um 3.ª estudo (além dos estudos do Infarmed e OPSS) da faculdade de economis da UNL que contraria em parte a tese de descida de preços de CC e do Infarmed.

11:34 da tarde  
Blogger Peliteiro said...

«Sabe-se agora, por informação já tornada pública, que este capítulo do relatório foi redigido por uma personalidade do associativismo farmacêutico».

Não me parece correcto nomear publicamente alguém sem lhe colocar, frontalmente, um nome. É como falar com uma pessoa sem lhe fitar directamente os olhos. Não é de Homem.

Julgo que CC se referia ao Profº Batel Marques.
Ora que eu saiba o Prof.º não pertence à Direcção da OF, nem da ANF, nem sequer de nenhuma das Cooperativas de distribuição; ou seja, o conflito de interesses que CC julga necessário divulgar é o facto de Batel Marques ser Farmacêutico. CC considera então que um Farmacêutico não se deve pronunciar sobre medicamentos!
Do mesmo modo, então, por exemplo, uma personalidade da administração hospitalar não se deve pronunciar sobre gestão hospitalar, uma personalidade médica não se deve pronunciar sobre doenças, etc, etc, sob pena de isso constituir conflito de interesses.

Para CC as melhores decisões em saúde são aquelas sustentadas em opiniões sem qualquer ligação à experiência concreta. É assim que tem feito - mais uma vez cito o absurdo estudo da AdC sobre as Farmácias - e é assim que a sua política, as suas previsões, as suas expectativas se revelam, progressivamente, um fracasso.

12:00 da manhã  

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