domingo, maio 27

Partir em busca de Cidadania

foto Odete Pinto, Monserrat

Um dos meus filhos, engenheiro informático com especialização em multimédia, inteligência artificial e vários cursos internacionais, ficou subitamente desempregado "graças" à moda das falências duvidosas. Por mais que tentasse, só lhe apareciam contratos temporários e uns 250/300 contos de salário (e só para a casa-(banco) iam 150 contos.
Vendo a situação, um dia enchi-me daquela coragem que vem do fundo da mágoa e disse a este meu filho: vai-te embora deste país para que os meus 3 netos (2 são gémeos) cresçam numa sociedade melhor e equitativa.
Colocou o curriculum na net e foi logo convidado por uma empresa americana de software, para trabalhar em Madrid. (mudou-se há um ano para Barcelona, a convite de uma empresa de “head hunting”).

Só sei que cheguei a Sta. Eugénia, em Madrid, para começar a tratar da papelada enquanto o meu filho trabalhava, e comecei pelo que estava mais perto, que era o centro de saúde. Fui fazer a inscrição no centro de saúde link e perguntaram-me se queria a consulta para dali a 30 minutos, porque “no queremos que tenga problemas”!. Não há senhas e muito menos bichas. Não há taxas moderadoras, os reformados não pagam remédios. Além disso, nos centros de saúde fazem-se análises, electro-cardiogramas e nalguns até radiografias.
Os Centros de Saúde estão abertos ao sábado e há consultas médicas no domicílio, caso se justifique, além de os medicamentos serem mais baratos. Só não há é baldas de passar receitas de medicamentos sem justificação nem pr’o cão, pr’o gato,.etc....

Há uma pequena/grande diferença, porém. Antes da inscrição formal no centro de saúde, temos que apresentar o comprovativo do recenseamento - fundamental para planificar até as vagas nas escolas) ! Também o recenseamento e o registo na "polícia de estrangeiros" ou na Segurança Social é fácil: um/a funcionário/a (não é porteiro) está à porta e pergunta-nos o que precisamos. Dá-nos os formulários (muito simples) e indica-nos onde seremos recebidos. Tudo isto sem senhas, nem bichas e sem lojas do cidadão. Algum tempo depois recebemos o DNI (documento nacional de identificação) onde, além do respectivo número, consta ainda o nº de contribuinte, o nº de eleitor, de segurança social e de saúde.
Foi com grande aflição que insisti, em princípios de Agosto 2004, que tinha de matricular 3 crianças – 2 na pré-primária e 1 na primária (meus netos). Disseram-me, admirados com a minha incredulidade, que não me preocupasse “no queremos que tenga problemas”!- a partir de 1 de Setembro tudo estaria resolvido, visto que tinha cumprido o meu dever cívico e o recenseamento estava feito. E assim foi. No dia 13 de Set. 2004, as crianças começaram as aulas, sem problemas.
E não é que, sem que ninguém falasse ou pedisse, o meu neto mais velho que ali iniciou o 1º ano de escolaridade, teve aulas exclusivas de castelhano para não ficar prejudicado no aproveitamento escolar, em relação aos colegas?
A administração pública espanhola parece preferir tratar bem os cidadãos e tudo fazer para lhes simplificar a vida para que eles também produzam mais para o país.
É assim que se forja e cimenta o tão celebrado orgulho espanhol.
Acham que eles mostram o orgulho pondo bandeiras nas janelas em tempo de futebóis?
Resumindo, o cidadão sente-se bem tratado e obviamente cumpre com satisfação os seus deveres de cidadania - porque, além do mais, os percebe com clareza (essa generosidade).
Como não há sigilo bancário, entregam o assunto de IRS ao Banco e está o caso arrumado. Ninguém anda a coleccionar facturas de farmácia e quejandos.
Pergunto:
1. A Espanha está na bancarrota ?
2. O Serviço de Saúde espanhol está falido ?
3. É só em Portugal que se gastam milhões com os ingratos cidadãos? Responda quem souber.


Em Espanha, O CIDADÃO, honesto e cumpridor, CONTA!. Em Portugal, contam uns cidadãos (vulgo chico-espertos) ou os todo-poderosos ou os que têm cunhas...

Maria Odete Teixeira Pinto, Alfragide

6 Comments:

Blogger cotovia said...

Somos um país atrasado.
E a culpa é toda nossa.
Basta ver a forma como conduzimos por essas estradasfora. Como gastamos o que temos e não temos. Os políticos que temos. Os autarcas. A taxa de abandono escolar. Somos mesquinhos e de fracas letras.
É no atraso cultural que radicam todos os nossos problemas.

1:02 da manhã  
Blogger Joaopedro said...

(...) os portugueses nunca vão directamente ao assunto, dão voltas e mais voltas antes de lá chegar e sempre velados. Os portugueses fazem o mesmo: aproximam-se indirectamente, percorrem espirais, caminhos ínvios e barrocos até abordar claramente a questão. Tanta precaução indicía uma recusa do enfrentamento. Debaixo da precaução, da cautela, da desconfiança, habita o medo. Temos assim uma sociedade civil não violenta à superfície mas com um medo disseminado protegendo os indivíduos contra uma violência subjacente só parcialmente sublimada. Isto explicaria vários aspectos da sociedade portuguesa: o mito dos “brandos costumes” que reina à superfície escondendo uma violência real subterrânea.(...)
José Gil- "Portugal, Hoje. O medo de existir".

9:37 da manhã  
Blogger ricardo said...

O sistema de Saúde Espanhol não está falido como o nosso, fundamentalmente, por duas razões:
a) - A existência de um PIB forte com crescimento acima da média europeia;
b) Um Serviço Nacional de Saúde melhor organizado que o nosso, portanto menos ineficiente.

9:46 da manhã  
Blogger e-pá! said...

As políticas sociais dos sucessivos governos portugueses... trouxeram-nos situações caricatas como as relatadas.

E, outras, por exº.:

Dados da OCDE, referentes à pensão mínima mensal.

- Portugal: 271€ - 35 anos de descontos – idade da reforma 65 (H/M);
...
- Espanha: 393€ - 15 anos de descontos - idade da reforma 65 (H/M)...

Se calhar, nunca tivemos uma verdadeira política de solidariedade social e, neste momento, somos os mais "apressados" em destruir o vazio... com que, no "ledo e cego engano", temos vivido.

Tentamo-nos comparar com o País de Cervantes, mas sabemos ser cá, que nos fartamos de esgrimir contra os moinhos de vento...

Uma especialidade portuguesa:
- destruir o que não se conseguiu construir...,
i. e., um "processo" Kafkiano de governar que, na gíria política portuguesa, poderá apresentar-se, como:
"reestruturar", "reorganizar", "reformar", etc...

10:32 da manhã  
Blogger Unknown said...

Caros

Uma visita ao Portugal real e profundo permitir-vos-á encontrar dezenas de centros de saúde (sede e extensões) que metem no chinelo qualquer CS Catalão o link remete-nos para um CS catalão e não um madrileno. Poderia começar contar-vos uma história verdadeira e dizer " Na Páscoa estive no Algarve entalei um dedo e encontrei um CS inaugurado em 1995, que funciona 24 horas por dia sete dias por semana(SAP), com dois médicos 24 horas, 2 enfermeiros 24 horas, RX convencional 24 horas digitalizado e acessível ao SU do Hospital de referência (Faro), em ECG 12 derivações com desfibrilhador ligado por modem à Unidade de Cuidados Coronários do tal hospital de referência, doseamento de troponina, possibilidade de fazer fibrinólise, com ar condicionado, etc... Mas também temos dos outros, edifício da caixa antiga, a chover lá dentro com pacientes a esperar pelos corredores da escada com se encontram na área metropolitana de qualquer cidade. CS sem filas, com atendimento na hora, temos muitos e não são só aqueles que já têm USFs encontrem-nos por aí, mas também dos outros, onde não há médico de família, ou se os há chegam atrasados ou saem cedo, esperasse muitos meses por uma consulta, não há qualquer programação da actividade, não há consulta no dia e os profissionais (todos) resmugam ou rspondem nos mal. Estes exemplos não fazem de nós nem os melhores nem os piores, não temos que andar sempre a baloiçar entre "bestas e bestiais". Mas lá nas Espanhas, sejam a castelhana Madrid ou autonómica Catalunha, também existem diferenças, quem nunca ouviu falar na Platorma dos 10 minutos, http://www.diezminutos.org/? As diferenças entre nós e eles são muitas, lá indepentemente da agenda política de cada autonomia, o sector de financiamento público é hegemónico, o trabalho dos profissionais "é barato" de acordo com o estudo publicado pela Confederação de Sindicatos Médicos (CESM Granada) em 2004 um médico de família, do quadro com uma média de 21 anos de serviço com exclusividade, 50 horas semanais com urgência ganhava uma média de 4.128,14€ mensais/53.653,98€ anuais brutos e um médico especialista 4.399,07€ mensais/56.881,27 anuais brutos, não há constrangimentos orçamentais olhe-se para a construção de Hospitais com muitas camas, emblemáticos, modernos e assinados, como o que o Siza vai desenhar para Toledo ou o programa de construção de CHARES do governo andaluz, centros hospitalares de alta resolução com internamento, cirurgia ambulatório, imagiologia com TAC de 16 cortes, consultas da especialidade, para comunidades que não ultrapassam os 30.000 a 50.000 habitantes, PIB a crescer 4.1% no primeiro trimestre e 3,4% de previsão anual. Vá lá não coninuem a bater com a mão no peito, este ano vamos ter cartão do cidadão no continente, o tal que vai substituir uma série de cartões, finalmente vamos ter lá para o final de Junho uma base única nacional para o cartão de utente. Auto-estima e orgulho quanto baste, basta de sentirmos que ficamos em último quando ficamos em segundo lugar numa competição europeia ou mundial.

1:59 da manhã  
Blogger odete pinto said...

É sempre muito bom ouvir dizer bem e saber que há instuições, neste caso da Saúde, que são exemplares.

Oxalá sejam cada vez menos excepções e mais a generalidade!

12:03 da tarde  

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