quarta-feira, outubro 1

Compadrio


Sobre o denominado Lisboa gate (casinhas da CML), escreveu recentemente com o seu habitual humor e talento, VPV no JP:
…«De qualquer maneira, o que principalmente espanta neste episódio é inocência da autoridade. Uma inocência genuína e profunda. Que um funcionário (eleito ou não eleito) distribua como quem distribui uma mercê propriedade da câmara, ou seja, do contribuinte, não perturba a cabeça de ninguém. Então um favorzinho, que não custa nada, é agora um crime? Os portugueses sempre se trataram assim: com um "jeitinho" aqui em troca de um "jeitinho" ali. E a administração do Estado fervilha de grupinhos de influência e de pressão que promovem, despromovem, transferem e demitem - e vão, muito respeitosamente, ganhando o seu dinheirinho por fora, com uma assinatura e um carimbo. Ética de serviço? Quem ouviu falar nisso? »

O compadrio, prática nacional, ("cronysm" para os americanos), atinge todos os sectores de actividade em prejuizo da competitividade da nossa economia.
No lugar dos melhores são os jeitosos que todos os dias vemos triunfar na nossa sociedade, empurrados por uma qualquer mão invisível.
Se quer ter uma noção da dimensão do fenómeno, experimente fazer um levantamento à sua volta.

3 Comments:

Blogger Joaopedro said...

Isto é um país da Barbuda.
E as nomeações dos AH não fogem a este quadro de compadrio que impera no nosso país.
Quando se discute a viabilidade da nossa economia, devia-se colocar no topo da discussão este factor cultural que tem um enorme responsabilidade no nosso atraso.

3:47 da tarde  
Blogger tambemquero said...

Que o compadrio político é um cancro nas economias é algo empiricamente constatável. E frequentemente noticiado.
Mas falta avaliar o seu impacto na gestão e na própria criação de riqueza. Parte dessa lacuna foi, agora, preenchida por uma investigação académica dirigida pelos professores Raj Desai e Anders Olofsgard para o Brookings Institution norte-americano.
A conclusão é arrasadora: o compadrio político é antieconómico. O estudo, intitulado ‘Do Politically connected firms undermine their own competitiveness?’, demonstra com base num inquérito, entre 2000 e 2005, a um universo de 10 mil empresas em 40 países, na maioria do chamado mundo em desenvolvimento, que o compadrio político é prejudicial à economia, pois “fomenta a ineficiência, desincentiva a inovação, torna mais míope o planeamento, corrompe a competitividade e distorce a concorrência nos mercados”.
Relação cinzenta
Raj Desai sublinhou-nos que o perfil deste cancro é extensível para além do chamado Terceiro Mundo: “Muitos países que são democráticos e mais desenvolvidos do que a maioria da nossa amostra sofrem deste mal. A relação entre democracia e compadrio é cinzenta”.
Relação dúbia particularmente agravada em países onde a sociedade civil é fraca, a separação e equilíbrio de poderes é insuficiente ou recente, a justiça é débil, o «lobbying» não é transparente e os grandes grupos económicos e financeiros possuem redes informais de quadros que entram e saem da política, conseguindo um poder de influência desproporcionado.
Estas redes de talentos são mais sofisticadas do que as típicas redes familiares e corporativas (por exemplo, altos quadros militares ou de partido único) dos países onde dominam cleptocracias e ditaduras. O estudo refere mesmo que “nos países da OCDE, as firmas com ligações políticas frequentemente representam posições significativas de capitalização de mercado”.
Captura do Estado
A literatura económica popularizou o termo de “captura do Estado” por estes mecanismos de obtenção de favores com valor económico (atribuição de monopólio, tolerância aos carteis, restrições de mercado a concorrentes, açambarcamento de concursos públicos, subsídios e créditos publicamente garantidos legislados “por medida”, isenções “cirúrgicas”).
Os beneficiários deixam o Estado refém de interesses particulares – quer dos políticos como dos empresários ou banqueiros – para obterem rendas ilegítimas actuais ou futuras.
No caso dos políticos de carreira, os benefícios traduzem-se em financiamentos políticos ou favores aos próximos (por exemplo, criação de emprego artificial) e quanto aos que optam pela “mobilidade” entre a cadeira política (que pode ser ministerial, parlamentar ou em agências de regulação e fiscalização) e o lugar privado beneficiam, em regra, de consultoria, advocacia de negócios ou mesmo lugares cimeiros de administração passado algum tempo.
O tema é muitas vezes confundido com a corrupção dos agentes do Estado. Mas os americanos distinguem o compadrio político da corrupção (em regra, os subornos «comem» 1,8% das vendas e 2,5% dos contratos governamentais, refere Desai) e também do «lobbying» legalmente estabelecido e sujeito a escrutínio.
Por essas razões a actuação legal e ética face ao compadrio e à corrupção deverão ter perfis distintos, ainda que, em muitas situações, as duas realidades se misturem.

Jorge Nascimento Rodrigues

3:52 da tarde  
Blogger Hospitaisepe said...

A bem da higienização, era bom que se fizesse a denúncia pública de inúmeros casos de compadrio da nossa gestão hospitalar.

1:06 da manhã  

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