quarta-feira, outubro 22

OE/09 para a Saúde (2)

Entre "A crise e os arrepios dos Liberais de Pacotilha" (sugestão do Joaopedro que, certamente, Ângela Silva e Filipe Santos Costa não vão esquecer na próxima oportunidade), chegam-me os ecos da constatação de JS que, também ele, não se cansa de arrepiar os que, de há muito e persistentemente, o acusaram de vendido aos neoliberais. Citado de cor, diz o PM, uma e outra vez: é porque fomos capazes de por as contas em ordem que podemos apresentar este orçamento de apoio às pequenas empresas e às famílias. Por que razão não aparecem agora a contestá-lo esses que o acusaram de travar o avanço do Estado Social?

Mas a crise e a verdade dos pressupostos fundamentais do orçamento são, obviamente, areia de mais para a minha camioneta . Não é por aí que vai o meu comentário que apenas pretende destacar dois pontos: 1. a continuidade no O.E. para a Saúde de 2008 para 2009 e 2. a revisão das carreiras da saúde.

1. A continuidade no O.E. para a Saúde

Não pretendo ofender afirmando que o Orçamento passou ao lado de AJ, mas tão só referir que a MS não teve de se investir muito nesta tarefa: além de continuidade formal (o que é muito positivo, ajudando à transparência e à compreensão global dos documentos), há continuidade de políticas (1.1) e há continuidade nos recursos afectados (1.2). Haverá também continuidade no controlo da execução orçamental?

1.1– Para demonstrar a continuidade de políticas bastaria uma ligeira leitura do Relatório (ponto V.14.1., tanto em 2008 como em 2009 link). Se não tiverem tempo, fica aqui o enunciado das epígrafes:

Orçamento de 2008:
- Prioridade à concretização de acções de promoção da saúde e de prevenção das doenças previstas no PNS
- Reforma dos Cuidados de Saúde Primários
- Desenvolvimento e Expansão da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados
- Promoção da Flexibilidade da Organização Hospitalar
- Política do Medicamento e da Farmácia
- Planeamento dos Recursos Humanos da Saúde

Orçamento de 2009:
- Promover a Saúde e Prevenir a Doença
- Reformar as Redes de Cuidados Primários e de Cuidados Continuados
- Organização Hospitalar
- Política do Medicamento
- Melhorar os Sistemas e Tecnologias de Informação e Comunicação

Não surpreende que as políticas se mantenham porque a implementação só excepcionalmente caberá num só exercício, mas há a referir que do planeamento dos recursos humanos da saúde (2008) nada constou até agora no domínio da execução, apenas se conhecendo iniciativas ainda não implementadas e que é legítimo duvidar se não vão aguardar (v.g., avaliação dos CA dos HH-EPE). Por outro lado, a omissão desta política no enunciado de 2009 será mais aparente do que real, já que na epígrafe Organização Hospitalar é referida “a revisão das carreiras da saúde e o processo de celebração de convenção colectiva de trabalho (Hospitais EPE)”. Em 2009 destaca-se a maior afirmação para melhorar os sistemas e tecnologias de informação e comunicação que, talvez pela sua instrumentalidade, não terá sido autonomizada em 2008. Tudo diferenças pouco significativas, como se vê.

1.2 – Continuidade nos recursos afectados. Está bem demonstrada no Quadro V.37. Despesa Total Consolidada – MS, já postado pelo Xavier em OE/09, Saúde, mas que aqui se repete apenas para facilitar a consulta:

A impressão que se colhe é a de que os recursos atribuídos pouco terão a ver com as políticas enunciadas para cada ano e, embora sejam sensivelmente as mesmas, deverão ser executadas com os recursos atribuídos, ou melhor, com recursos inferiores aos de 2008. Isto porque a variação de 2,4% corresponde à inflação esperada e para as remunerações do pessoal foi previsto um aumento de 2,9% que vai repercutir em todas as despesas com pessoal (promoções, progressão de escalão, remunerações adicionais, taxa social única), pelo que o crescimento total da despesa nesta rubrica dificilmente será inferior a 5%. O MS e os gestores, a todos os níveis, terão pela frente um apertado desafio.

2. A revisão das carreiras da saúde.

“… visando a continuação da política que visa elevar a sua eficácia, eficiência e qualidade, desenvolver-se-á uma política adequada de recursos humanos, incentivando o bom desempenho das equipas, concretizando a avaliação de desempenho dos membros dos Conselhos de Administração dos Hospitais, desenvolvendo o Sistema de Incentivos do pessoal hospitalar, e concluindo a revisão das carreiras da saúde e o processo de celebração de convenção colectiva de trabalho (Hospitais EPE).” (O.E./2009).

Tal como o Orçamento a prevê, isto é, concretizando-se os condicionamentos nele referidos, poderá dizer-se que a revisão das carreiras da saúde é uma medida acertada na política de Recursos Humanos da Saúde e até da Organização Hospitalar e poderá traduzir-se em ganhos em saúde para a população. Parece-me, no entanto, que, estando as coisas como estão, é grande o risco de as pedras do puzzle não estarem lá na sequência e no tempo necessários. E, se assim for, mais uma vez tudo se traduzirá em desperdício, porque estaremos a pagar melhor a sub-produtividade e a fortalecer a convicção de que esta só se resolve pela via da afectação de maiores recursos. O que vimos noutras oportunidades (programas PERLE, PECLEC e mais ainda no confronto entre a actividade nos blocos privados e nos do SNS) afirmam-me que está a repetir-se – por que não estaria? – com o Programa de Intervenção em Oftalmologia (15 intervenções/dia contra 3 na actividade normal!). Maiores recursos que, como acima referi, o O.E. não disponibiliza. Sendo mais explícito:

- A revisão das carreiras da saúde não se justifica como medida de justiça ou de cariz social: os profissionais da saúde não estão entre os mais mal pagos no conjunto do mercado de trabalho e, se restringirmos este à função pública, já são dos que auferem melhor remuneração e têm melhores perspectivas de emprego;

- A revisão das carreiras da saúde, e de remunerações, não se justifica com o objectivo de promover o aumento do número de profissionais no País: temos aproximadamente o mesmo número de médicos por 1000 H. que a França, cujo sistema de saúde está na vanguarda, e temos desemprego, maior ou menor, nas restantes profissões de saúde;

- A revisão das carreiras da saúde (com o esperável aumento de remunerações), só se justifica nos termos em que o O.E. a prevê, o que quer dizer como peça de um puzzle que, no seu conjunto e através de significativo aumento da produtividade no âmbito do SNS, produza ganhos em saúde com os recursos existentes.

Peças do puzzle como o bom desempenho das equipas, a avaliação de desempenho dos membros dos C.A. dos HH, o sistema de incentivos do pessoal hospitalar, a estrutura das carreiras da saúde e o processo de celebração de convenção colectiva de trabalho não são temas consensuais e exigem por isso cuidadosa e extensa abordagem, além de determinação.

É por essas razões que a entrevista do Secretário de Estado da Saúde (MP) – DE, 06.10.2008 link – e, neste ponto, a política acolhida no O.E. me parecem excessivamente optimistas ou, o que seria pior, correm sério risco de comprometer os objectivos enunciados, ou ainda, sem que peremptoriamente o possa afirmar, não são mais que afirmações sem determinação para as executar.

Aidenos.

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10 Comments:

Blogger e-pá! said...

Caro Aidenos:

A revisão das carreiras médicas têm a ver com muitos parâmetros da funcionalidade e pacificação dos Serviços de Saúde públicos...

Acentuar a tónica sindical - fundamentalmente dirigida a uma
Convenção Colectiva de Trabalho para os HH EPE - é, de certo modo - chamar aos médicos "vendilhões do templo".
Estariamos dispostos a trocar tudo por uns patacos...

Aliás, as nuances dos CA dos HH's EPE, relativamente ao recrutamento de pessoal (atravás do CIT), são, na essência, as mesmas do que as utilizadas nos HH's privados.
Aliás, a "dança" de gestores que, p. exº., trocam o H. da Luz pelo HH A-S, já começou.
Pelo caminho não se mudou, com certeza, de métodos. Então, é premente essa Convenção Colectiva de Trabalho, para os HH's EPE's, para os CS, para a carreira de Saúde Pública, etc.
Ou defende, também, a existência de uma "carreira única"?

Mas há outra vertente da revisão das carreiras médicas. Tem a ver com os processos de formação que condicionam a qualidade dos serviços a prestar no seio do SNS.
Tem a ver com a verificação e discussão (por que não?) de competências na área do conhecimento, técnica e no desempenho.
Tem a ver com a avaliação desses profissionais enquanto servidores públicos. Tem a ver com a qualidade dos cuidados prestados e o nível dos resultados a atingir.

Não sei onde foi deduzir que as carreiras médicas visavam: "promover o aumento do número de profissionais no País."?

Mas, voltemos ao que é mais importante nas carreiras.
É, também, um estímulo ao trabalho, nomeadamente, ao trabalho em equipa, o tal que dá "melores indíces de produtividade" no seio do SNS. Ou o método será a chibatada para os indolentes?
Por outro lado, promove a formação contínua, desenvolvendo capacidades, potencializando a colaboração interpares, interdisciplinar e com os outros profissionais da Saúde, fornecendo perspectivas de progressão.

Em que lugar estarão as publicações médicas no estrangeiro em revistas indexadas?

Finalmente, os Serviços ou os CRI's (continuam no papel com o olimpico desprezo dos gestores), necessitam de ser hierarquizados para serem funcionais. "Tudo ao monte e fé em deus" era a táctica futebolística dos clubes de futebol ultra-amadores e perdedores.

Por último, e tendo a ver com a questão da liderança entre os profissionais de saúde e, mais longe, nas instituições de saúde.
A liderança vive a paredes meias com a competência, o reconhecimento do saber e o desempeno - as boas práticas.
Por outro lado, o líder deve ser sociável - humano, como se costuma dizer - e ter um inabalável formação ética.
As carreiras servem para desenvolver estas condições científicas, técnicas e humanas.

O tema do recente Congresso da EAHM realizado em Graz, interessa a todos:
“New Leadership for New Challenges”...


Associação Europeia de Gestores Hospitalares (EAHM) realizou o seu último Congresso, o vigésimo segundo, nos dias 25 e 26 de Setembro, na cidade de Graz, na Áustria.
O tema da conferência foi:
“New Leadership for New Challenges”.
Andamos todos no mesmo barco...

A paulatina decadência das carreiras médicas verificada no tempo de JS/CC é, também, um desafio e não será a "crise financeira" que as deverá travar.
Quando muito uma eventual recessão económica poderá prejudicá-las, como, de resto, todo o País.

8:32 da manhã  
Blogger tambemquero said...

dejá vu
Será que vamos ter antecipação das eleições da ANF de Set para Março?

8:34 da manhã  
Blogger xavier said...

Ontem houve dificuldades com funcionamento da caixa de correio da netcabo e consequente prejuízo da colocação de comentários.
As nossas desculpas pelo ocorrido.

10:35 da manhã  
Blogger tambemquero said...

O número de camas na Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados é de quase três mil, o que representa um aumento de mais de 30% face a 2007. Até ao fim do ano, o objectivo é chegar às quatro mil.

Implementada há dois anos, a RNCCI tem como principal objectivo a recuperação da autonomia das actividades de vida diária da população idosa e dependente. A meta traçada a dez anos é dotar a Rede com cerca 15 a 16 mil lugares de internamento, de forma a cobrir 80% das necessidades identificadas, explicou, ontem, o secretário de Estado Adjunto e da Saúde, no Porto, durante a assinatura de acordos para a criação de mais 90 camas na região Norte.

São, agora, cerca de 800 os lugares disponíveis nesta região que, segundo o Relatório de Monitorização do Desenvolvimento da RNCCI, referente ao primeiro semestre deste ano, é uma das que apresenta uma cobertura (medida pelo número de camas por cem mil habitantes com mais de 65 anos) mais deficitária a nível nacional.

Pior só Lisboa e Vale do Tejo, onde existem apenas 96 camas para cem mil idosos, ou seja, um lugar para 1041 utentes. Francisco Ventura Ramos reconhece que, nas grandes cidades, é mais difícil arranjar espaços para criar este tipo de unidades, mas sublinhou que o "esforço nacional" deverá traduzir-se, já no próximo ano, num total de sete mil lugares de internamento e "centenas" de equipas de apoio domiciliário.

No primeiro semestre deste ano, a Rede cresceu 33%, apresentando o Algarve e o Centro as taxas mais altas de cobertura. Entre os diversos tipos de unidades, verifica-se que são as de longa duração e manutenção que dispõem de maior oferta (67 camas por cem mil habitantes).

Do total de 8133 utentes referenciados para a Rede, 58% foram admitidos, o que significa que 3.416 foram rejeitados porque não cumpriam os critérios pré-estabelecidos e que passam essencialmente pela reunião de informação clínica, funcional e social que permita avaliar a necessidade de cuidados continuados de saúde e de apoio social.

Mais de metade dos 4717 utentes admitidos foi encaminhada para unidades de média duração e reabilitação e de longa duração e manutenção. As doenças vasculares agudas são o diagnóstico de um terço dos doentes que deram entrada nas unidades da Rede, seguindo-se a fractura do colo do fémur e a insuficiência cardíaca.

Tiveram alta 3.262 utentes, sendo que a grande maioria (67%) foi para casa, por não ter sido identificada necessidade de suporte. Há, porém, 14% que precisam de apoio domiciliário e 11% transferidos para outras unidades.

A expansão dos cuidados continuados representou, este ano, um investimento de 30 milhões de euros
JN 20.10.08

11:43 da manhã  
Blogger e-pá! said...

Uma nota à margem do OGE/MS:

Ontem, quando lia o Público (20.10.2008), uma chamada de 1ª página, prendeu-me a atenção.

"O Ministério Público acusou 12 pessoas por um esquema que durante vários anos lesou o Serviço Nacional de Saúde, facturando serviços de análises e radiologia que nunca se realizaram. Os laboratórios envolvidos funcionavam no mesmo prédio onde estava a Unidade Convencionada de Saúde de Guimarães e tinham responsáveis comuns. Entre os acusados estão dois médicos, uma farmacêutica e um ex-responsável pela Sub-região de Saúde de Braga".

E, as minhas perguntas são:

a) não falamos demasiado de desperdícios nos HH's quando eles poderão andar, cá fora, à rédea solta?

b) quanto desperdícios andarão, por aí, travestidos de "burla qualificada", "corrupção activa", "falsificação de documentos" e "branqueamento de capitais" (acusações do MP aos Laboratórios prevaricadores)?

12:27 da tarde  
Blogger Joaopedro said...

NÃO HAVIA NECESSIDADE!
Financiamento dos projectos PPP, designadamente dos novos hospitais PPP: 112 milhões de euros.
Pró ano há mais. Sempre a subir. Durante dez (gestão) e trinta anos(edificio).
Nós gostamos de andar sempre contra ciclo. Contra a maré.
Só que nos nossos dias as caravelas são outras.
O naufrágio é na mesma certo.

8:46 da manhã  
Blogger aidenós said...

Caro É-Pá:

Obrigado pelo seu extenso comentário em que evidencia a multiplicidade de aspectos envolvidos pela problemática das carreiras dos profissionais de saúde e de cuja relevância ninguém tem dúvidas. Tomo-o, portanto, como confirmação dos receios referidos no último parágrafo do meu texto, onde defendo que as coisas devem vir na sequência e no tempo certos.

Merece-me acordo de generalidade, mas também as seguintes observações.

“Vendilhões do templo” e “patacos”: eu não fui por aí, mas já que fala nisso, quando é que qualquer greve terminou sem “patacos”?

“Não sei onde foi deduzir que as carreiras médicas visavam: promover o aumento do número de profissionais no País." Caro É-Pá: quem é que não sabe que a retribuição esperada é motivação poderosa, embora não a única, nas escolhas profissionais? Se aumentar o número de profissionais no País fosse mesmo necessário, essa seria uma boa razão para a revisão das carreiras dos profissionais. O que eu afirmei é que não é esse o caso.

“Desperdício no SNS”, nos HH ou à margem deles: nem sequer na conjuntura actual, de grave crise como sabemos, haveremos de concordar que o desperdício, seja qual for a forma que este assumir, é criminoso e deve ser combatido? Será aceitável a tolerância com o desperdício?

6:57 da tarde  
Blogger e-pá! said...

Caro Aidenos:

"Tomo-o, portanto, como confirmação dos receios referidos no último parágrafo do meu texto, onde defendo que as coisas devem vir na sequência e no tempo certos."

As carreiras dos profissionais de Saúde são como os filhos...
Nunca os chegaremos a ter se nos agarrarmos aos obstáculos (por mais pequenos que sejam) ou a conveniências pessoais (mais ou menos egoístas)...ou, passarmos a vida à procura de momentos ideais (daqueles qu não nos estorvam!).

A definição (negociação) das carreiras - já em fase de gestação no MS - é uma premente necessidade funcional estratégica do SNS. Não vou repetir argumentos (fundamentalmente os extra-sindicais). A argumentação que vejo aduzida, em muitos lados, assemelha-se ao estilo MFL - quanto ao TGV e ao novo aeroporto...etc.
Trata-se de fazer abortar tudo o que seja despesa ou gere custos e ficavamos à espera que a crise finasse de longeva decrepitude!

Melhores carreiras profissionais nunca serão um desperdício...
Pelo contrário!
Receio, porém, que nunca sejam consideradas oportunas.
Mas isso, como sabemos, é outra história.

12:27 da manhã  
Blogger tambemquero said...

Estou a viver tempos difíceis. O meu chefe perguntou-me um dia destes: “E agora, que vão fazer os liberais?”. Pouco depois, encontrei um amigo sindicalista que quis saber a minha opinião sobre o fracasso do neo-liberalismo. Responder a um e a outro teria sido titânico. Não é fácil convencer pessoas arreigadas aos seus preconceitos, mesmo que estes relevem de razões distintas. Por isso, prefiro confessar-me aos leitores. Que pode fazer um liberal em tempos tão turbulentos como que os que vivemos, para mais estando sob suspeita o ideário que defendo e a agenda política que, se pudesse, não hesitaria em pôr em prática? Fiz esta pergunta ao meu grande amigo e ‘compagnon de route’ Rafael Termes pouco antes de morrer, faz alguns anos. Respondeu-me: “Perseverar! Não se dar por vencido, imaginar maneiras de persuadir e de convencer os outros”.

Foi exactamente o que fiz juntamente com Termes, que já tinha 80 e muitos e pouca paciência para parvoeiras. Apesar disso, ainda o convenci a leccionar durante alguns anos um curso no El Escorial, a fim de fazer a apologia do liberalismo, tal como o persuadi a escrever para vários suplementos que editei nos anos em que fui director do jornal económico Expansión entre 1999 e 2002. A um dos seus artigos chamou “Viva o Capitalismo!”. A outro “Viva o Pensamento Único!”, no qual elogia a falácia socialista que diz que, desde a revolução conservadora de Ronald Reagan e Margaret Thatcher, os liberais estão descontrolados. Mentira, nunca tal aconteceu, mas pareceu-me um bom pretexto para, caso isso fosse verdade, exercer o direito à reivindicação.

Como disse, e bem, o inefável Milton Friedman, hoje ninguém defende a titularidade pública dos meios de produção, que constitui o cerne do socialismo. A redução da dimensão do sector público é uma coisa muito recente, mas a despesa do Estado face ao PIB continua excessiva. Mais: o nível dos impostos em muitos países desenvolvidos continua a ter um carácter quase confiscatório. A maioria dos adversários do capitalismo são pouco escrupulosos com os dados, e outros nem escrupulosos são, no entanto, sucumbiram à máquina propagandística da Esquerda. Talvez o meu chefe – sobre o meu amigo sindicalista não tenho dúvidas – esteja convencido de que fomos governados pelo liberalismo durante décadas e que este, por fim, fracassou, como bem o demonstra a crise financeira internacional, o colapso das bolsas e as massivas intervenções públicas. Ora, seria importante negar este raciocínio. Não há actividade económica mais controlada do que a bancária, nem maior regulação do que aquela a que está sujeito o sector financeiro. Não são os liberais que devem pedir desculpa pelo colapso destas últimas semanas, e sim os estadistas que não souberam fazer o seu trabalho. Aliás, nem sequer o meu amigo sindicalista sabe fazer bem o seu trabalho. Membro do comité de uma empresa em dificuldades, dá o tudo por tudo para evitar que esta feche e para impedir despedimentos, os quais podiam ajudar a empresa a manter-se em funcionamento nesta época de vacas magras para depois reemergir mais forte e poder ampliar o número de fábricas. Mas toda a gente sabe o que são os sindicatos: tumores malignos. Juan José Güemes, conselheiro de Saúde da Comunidade de Madrid, disse-me um dia que com os salários dos sindicalistas, que são mais de mil, davam para construir um hospital com 450 camas. Güemes usa cabelo comprido e é um pouco ‘snob’, é certo, mas diz a verdade. Os membros dos comités das empresas, e os sindicalistas em geral, não defendem os interesses dos trabalhadores. Quando muito tentam salvar o coiro. Salvo raras excepções, o trabalho não é uma coisa que puxe muito por eles. E se o que dizem sobre o liberalismo fosse verdade – que rege o sistema económico e as relações laborais –, há muito que estariam na rua a pedir esmola. Ora, a realidade não é essa. O meu amigo sindicalista, tal como muitos outros, continua a alimentar o conto do vigário, mas tem o desplante de me perguntar o que acho do aparente “fracasso do neo-liberalismo”.

Pessoalmente, defendo que o liberalismo não só não fracassou como nem pode, “geneticamente”, fracassar porque confia nas pessoas e na natureza humana. Numa economia socialista clássica, ou numa economia moderna que tenha a tentação de enveredar pelo socialismo, não se oferece nada que não tenha sido previamente determinado pela procura. Ou seja, impera o racionalismo, o qual, por sua vez, proíbe as temíveis incertezas e correspondentes actos de fé, indispensáveis a um sistema amplamente expansivo e inovador como o capitalismo. Assim sendo, pergunto-me como podemos preterir o capitalismo – que obedece aos altos e baixos da espontaneidade humana, e que tem defeitos e virtudes – pelos ditames de um comité de empresa?

Miguel Ángel Belloso, DE 23.10.08

Este não é de pacotilha.
Embora da casta dos duros, dos ditos autênticos, vejam a pobreza dos argumentos.
É caso para dizer: O neo liberalismo já era.

8:56 da manhã  
Blogger tambemquero said...

Na sequência da dotação orçamental relativa a 2009 de 3,5% para os medicamentos comparticipados dispensados nas farmácias e de 4,5% para os medicamentos usados em meio hospitalar, a Apifarma, afirmou, em comunicado do passado dia 16, esperar que «esta inscrição orçamental signifique, em primeiro lugar, uma melhoria do acesso dos doentes aos novos medicamentos e uma consciencialização, por parte do Governo, de que o medicamento é a sua tecnologia de saúde mais custo-efectiva e que deve, sobretudo, ser encarada como um investimento na melhoria dos níveis de saúde de todos os portugueses».
No mesmo comunicado a Apifarma refere que estes são valores «superiores às dotações inscritas em 2008 e aproximam-se de uma tendência incontornável em todo o Mundo, onde o mercado de medicamentos cresce a uma média de 6% ao ano, com Espanha a crescer 6,3% em 2008 e, estimadamente, 7,6% em 2009».
TM 22.10.08

A Afifarma o que pensa é que o alargamento das metas significa maiores lucros para os laboratórios.

6:46 da tarde  

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