Causas, conheço-as justas e não.
Não poderia ficar indiferente aos comentários que li neste blog referentes à greve dos enfermeiros. Muito menos à colagem que se tenta fazer ao movimento corporativo recente dos professores.
A causa fundamental desta greve é justa, por demasiadas razões:
1. Há mais de uma década que os enfermeiros têm uma formação académica baseada na licenciatura, sendo que a TRU define como base de vencimento cerca de 1200 euros aos funcionários titulares desta formação, dentro da AP.
2. Os enfermeiros, muito por culpa do que creio ser um erro histórico da sua representação sindical, nunca acederam a esta premissa. Ao contrário, por ex., dos professores, automaticamente promovidos à medida que faziam o complemento de licenciatura ou se licenciavam.
3. O papel dos enfermeiros, quer na prestação de cuidados, quer na organização de serviços é absolutamente estrutural num SNS público que se queira eficiente. Muitos destes atritos surgem por muitos médicos não o saberem reconhecer e não conseguirem perceber algo muito simples: se o cérebro pode ser considerado funcionalmente um órgão mais nobre que o fígado, um determinado hepatócito pode ser muito mais importante no funcionamento orgânico que um determinado neurónio.
4. Os papéis funcionais dos diversos intervenientes no SNS estão em constante mutação. Os médicos de hoje não actuam nem se comportam como há 50 anos, tal como os enfermeiros. Seria tempo, creio mesmo, destes últimos assumirem um papel muito mais relevante nos CSP, assumindo o cerne da Medicina Preventiva, permitindo uma organização mais eficiente dos CS, com os médicos actuando em Prevenção secundária, terciária ou Medicina Terapêutica.
5. É tempo de desmistificar o preconceito moral, mais que deontológico ou ético, das greves dos profissionais de saúde. É perfeitamente natural que estes a ela recorram para que acedam a melhores condições remuneratórias, estruturais ou organizativas. Obviamente que há sempre repercussão na população doente. Se esta não existisse a greve não faria sentido. É tempo de terminar este imperativo moral, a meu ver verdadeiramente intolerável e profundamente discriminatório em relação a outros profissionais da AP.
6. Os enfermeiros têm, ainda assim, de prestar cuidados mínimos (um resquício, mas claramente mais consensual, do imperativo descrito). Se assim não fosse bastaria 1 dia de greve para as exigências serem acomodadas. Além disso, pelo facto dos enfermeiros fazerem greve, os Hospitais não fecham. Os médicos, porteiros, auxiliares, cozinheiros, continuam a laborar, mais ou menos de forma condicionada, mas continuam. Se assim não fosse, bastaria 1 dia de greve. Estas são mais 2 diferenças em relação à classe docente (não tem serviços mínimos e as escolas fecham quando fazem greve).
7. Os condicionalismos referidos deveriam levar a uma interpretação cautelosa de um descontentamento tão significativo. A obrigatoriedade de prestar cuidados mínimos é a prova de que o seu labor é essencial. E como tal deveria ser reconhecido e, se descriminado, devê-lo-ia ser de forma positiva.
8. A reivindicação base, que nem deveria ser necessária por decorrer da Lei 12A/2008, obrigaria o estado a actualizar o vencimento de 6000 enfermeiros em cerca de 200 euros, o que perfaria um total de 15 milhões de euros por ano (o vencimento conjunto de um qualquer CA de uma EP).
9. Por que é de actualizar que estamos a falar, não é de aumentar o vencimento, como o MS quer fazer crer. Estes enfermeiros já deveriam auferir este vencimento há muitos anos.
10. Se consigo perceber, ainda mais sendo médico, que haja diferença de vencimentos entre os enfermeiros e os médicos, não consigo perceber, nem aceitar, que aqueles recebam menos que os terapeutas ocupacionais, fisioterapeutas, nutricionistas, assistentes sociais, etc., com os quais trabalham, com similitude de formação académica e profissional. Mais que isso: neste país é possível um enfermeiro, após a licenciatura, 2 anos de trabalho e uma especialização de 2 anos em Medicina Física e Reabilitação, vencer menos que um fisioterapeuta no início da carreira, para tal bastando não ter sido colocado como especialista.
11. Se tudo isto não é motivo para fazer uma greve, não sei, francamente, o que seja.
AM
A causa fundamental desta greve é justa, por demasiadas razões:
1. Há mais de uma década que os enfermeiros têm uma formação académica baseada na licenciatura, sendo que a TRU define como base de vencimento cerca de 1200 euros aos funcionários titulares desta formação, dentro da AP.
2. Os enfermeiros, muito por culpa do que creio ser um erro histórico da sua representação sindical, nunca acederam a esta premissa. Ao contrário, por ex., dos professores, automaticamente promovidos à medida que faziam o complemento de licenciatura ou se licenciavam.
3. O papel dos enfermeiros, quer na prestação de cuidados, quer na organização de serviços é absolutamente estrutural num SNS público que se queira eficiente. Muitos destes atritos surgem por muitos médicos não o saberem reconhecer e não conseguirem perceber algo muito simples: se o cérebro pode ser considerado funcionalmente um órgão mais nobre que o fígado, um determinado hepatócito pode ser muito mais importante no funcionamento orgânico que um determinado neurónio.
4. Os papéis funcionais dos diversos intervenientes no SNS estão em constante mutação. Os médicos de hoje não actuam nem se comportam como há 50 anos, tal como os enfermeiros. Seria tempo, creio mesmo, destes últimos assumirem um papel muito mais relevante nos CSP, assumindo o cerne da Medicina Preventiva, permitindo uma organização mais eficiente dos CS, com os médicos actuando em Prevenção secundária, terciária ou Medicina Terapêutica.
5. É tempo de desmistificar o preconceito moral, mais que deontológico ou ético, das greves dos profissionais de saúde. É perfeitamente natural que estes a ela recorram para que acedam a melhores condições remuneratórias, estruturais ou organizativas. Obviamente que há sempre repercussão na população doente. Se esta não existisse a greve não faria sentido. É tempo de terminar este imperativo moral, a meu ver verdadeiramente intolerável e profundamente discriminatório em relação a outros profissionais da AP.
6. Os enfermeiros têm, ainda assim, de prestar cuidados mínimos (um resquício, mas claramente mais consensual, do imperativo descrito). Se assim não fosse bastaria 1 dia de greve para as exigências serem acomodadas. Além disso, pelo facto dos enfermeiros fazerem greve, os Hospitais não fecham. Os médicos, porteiros, auxiliares, cozinheiros, continuam a laborar, mais ou menos de forma condicionada, mas continuam. Se assim não fosse, bastaria 1 dia de greve. Estas são mais 2 diferenças em relação à classe docente (não tem serviços mínimos e as escolas fecham quando fazem greve).
7. Os condicionalismos referidos deveriam levar a uma interpretação cautelosa de um descontentamento tão significativo. A obrigatoriedade de prestar cuidados mínimos é a prova de que o seu labor é essencial. E como tal deveria ser reconhecido e, se descriminado, devê-lo-ia ser de forma positiva.
8. A reivindicação base, que nem deveria ser necessária por decorrer da Lei 12A/2008, obrigaria o estado a actualizar o vencimento de 6000 enfermeiros em cerca de 200 euros, o que perfaria um total de 15 milhões de euros por ano (o vencimento conjunto de um qualquer CA de uma EP).
9. Por que é de actualizar que estamos a falar, não é de aumentar o vencimento, como o MS quer fazer crer. Estes enfermeiros já deveriam auferir este vencimento há muitos anos.
10. Se consigo perceber, ainda mais sendo médico, que haja diferença de vencimentos entre os enfermeiros e os médicos, não consigo perceber, nem aceitar, que aqueles recebam menos que os terapeutas ocupacionais, fisioterapeutas, nutricionistas, assistentes sociais, etc., com os quais trabalham, com similitude de formação académica e profissional. Mais que isso: neste país é possível um enfermeiro, após a licenciatura, 2 anos de trabalho e uma especialização de 2 anos em Medicina Física e Reabilitação, vencer menos que um fisioterapeuta no início da carreira, para tal bastando não ter sido colocado como especialista.
11. Se tudo isto não é motivo para fazer uma greve, não sei, francamente, o que seja.
AM
Etiquetas: s.n.s. 2
5 Comments:
Plenamente de acordo.!
E mt obg por dar valor à classe de enfermagem... umas palavras mt sábias e que dignificam estes profissionais.
Depois de ler este artigo fico contente por existir em Portugal algumas pessoas que conseguem perceber a greve dos enfermeiros!... *at
obrigado!!!
Acho que mta gente nao percebe os motivos da nossa luta e mto menos percebe que neste momento nao existe uma revalorizaçao adequada à evoluçao da nossa profissao. Nos apostámos na nossa formaçao,apostamos na qualidade dos cuidados m dp n somos valorizados. Para nao falar em colegas com 10 ou mais anos de profissao que recebem o mm ou menos k colegas que estao a entrar. Onde esta o reconhecimento? a revaloriaçao?
Assim n ha quem aguente!!!!!
Acima de td obrigado pelas palavras de compreensao. ainda acho que ha pessoas k n percebem as razoes da nossa luta. N percebem que n somos reconhecidos, nem valorizados e k isso se reflecte nos nossos salarios.ninguem nos valorizou a licenciatura, nem os mestrados e doutoramebntos que tiramos posteriormente. Cabe na cadeça de alguem haver colegas com 10 ou mais anos de profissao a receberem o mm que os colegas entrados? Para que serve assim a valorizaçao académica? Apostamos nos cuidados de qualidade m ninguem nos sabe reconhecer a qualidade!!!! mtas vezes é preciso emigrar para conseguir ter essa percepçao. K pena!
A dirigente do Sindicato dos Enfermeiros Portugueses (SEP) Fátima Monteiro acusou hoje a ministra da Saúde de "desonestidade intelectual" sustentando "não ser verdade" que um protocolo assinado com o setor privado preveja um salário inferior.
"Isso é uma falsa questão, não é verdade. A convergência com o setor privado foi um grande passo", afirmou a sindicalista Fátima Monteiro.
A sindicalista considera as afirmações de Ana Jorge uma “desonestidade intelectual” porque - frisa - a proposta do governo prevê 1200 euros faseados em três anos para a entrada de carreira, enquanto no setor privado, no âmbito deste acordo, “ninguém entra agora a ganhar menos de 1070 euros”.
"Nesse acordo, um colega do privado ganha mais 50 euros do que o que aufere quem ingressa na função pública atualmente, que recebe 1.020 euros", sustentou a sindicalista.
A responsável do SEP comentava declarações da ministra da Saúde, Ana Jorge, que terça feira estranhou o facto de o sindicato ter assinado um contrato coletivo de trabalho com os hospitais privados que prevê um escalão de entrada na carreira com um salário de 900 euros. "O mesmo sindicato que connosco não está a aceitar a proposta que nós lhe estamos a fazer dos 1200 euros (180 euros mensais a mais) à entrada de carreira, que é igual a todos os licenciados da administração pública, com o setor privado está a aceitar 900 euros", afirmou então Ana Jorge.
Os enfermeiros cumprem hoje o terceiro dia greve, uma paralisação que termina quinta de manhã e visa lutar por atualizações salariais e a valorização da carreira dos profissionais de enfermagem.
I, 31.03.10
AM, obrigado pelas suas palavras, fico muito contente em ler estas afirmações, ainda mais vindas de um médico (sabe ao que me refiro, sem quaisquer achas para a fogueira =) ).
De facto é uma tremenda injustiça, e creio que só À semelhança dos colegas da Finlândia, fazer greve por tempo indeterminado, e sem cuidados mínimos, o governo iria vergar.
abraços!
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