As razões da FNAM
Em defesa dos interesses dos
médicos, da carreira médica e do SNS
A Federação Nacional dos Médicos
(FNAM) na sequência das decisões tomadas pelo seu Conselho Nacional, do diálogo
desenvolvido com as restantes organizações médicas e da ausência de quaisquer
resultados da reunião efectuada com a equipa ministerial a 6/6/2014, tomou a
decisão de desencadear o processo reivindicativo que irá conduzir à realização
de uma greve nacional dos médicos. As questões fundamentais que determinam a
convocação da greve são as seguintes:
1- No último ano tem-se assistido
a uma nova ofensiva anti-médico e anti-SNS por parte desta equipa ministerial,
criando uma situação que globalmente assume uma gravidade ainda maior do que
aquela que determinou a realização da maior greve médica há 2 anos atrás. Esta
ofensiva assenta nos seguintes factos concretos:
a) Publicação de uma portaria
sobre uma suposta categorização dos serviços e estabelecimentos hospitalares
que estabelece a eliminação de serviços e de especialidades hospitalares, o
encerramento de 27 maternidades e de vários hospitais.
b) Elaboração de um projecto
disfarçado de condutas éticas que visa amordaçar as denúncias de todos os
profissionais de saúde e aplicar-lhes processos disciplinares e criminais.
c) Paralisação integral da
actividade da Comissões Paritárias dos ACT.
d) Paralisação integral da
Comissão Tripartida, a quem estão atribuídas legalmente funções de
acompanhamento da aplicação do acordo.
e) Boicote sucessivo aos
calendários e cronogramas da avaliação do desempenho, acompanhado de uma
campanha de múltiplos órgãos de gestão de estabelecimentos de saúde que afirmam
que esta avaliação existe por pressão das organizações sindicais. A
desonestidade política dessa campanha atinge níveis degradantes quando todos
sabemos que essa avaliação é uma imposição da legislação geral da Administração
Pública e que tem como único objectivo possibilitar a progressão nas posições
remuneratórias em cada categoria.
f) Bloqueio organizado na quase totalidade dos
hospitais à negociação dos respectivos regulamentos internos no que se refere à
organização do trabalho médico.
g) Ilegalidades em múltiplos Centros de Saúde
impondo o aumento das listas de utentes aos médicos que não aderiram ao novo
regime de trabalho das 40h.
h) Ilegalidades nos recentes concursos de
progressão na carreira médica ao tentarem impor o horário das 40 horas a quem
não solicitou a respectiva adesão.
i) Arbitrariedades e ilegalidades na aplicação
da legislação laboral relativa aos regimes de folgas e descansos compensatórios
e às formulas de pagamento das horas extraordinárias.
j) Ilegalidades na abertura do procedimento de
recrutamentos de médicos de família, criando atrasos inadmissíveis na colocação
dos recém especialistas em medicina geral e familiar.
l) Não realização do concurso
aberto para os jovens especialistas até Maio de 2014, conforme compromisso
assumido com as organizações sindicais médicas na reunião da Comissão Tripartida
de 4 de Abril de 2014.
m) Aplicação ilegal a cerca de
300 médicos nos Centros de Saúde, com a categoria de clínicos gerais, do regime
das 40 horas, sem qualquer acréscimo salarial e em clara violação do seu
estatuto laboral adquirido por via do DL nº 73/90.
n) Implementação de programas informáticos
(exº PEM) que têm tornado o trabalho médico num caos infernal.
o) Indicadores absurdos através
de uma contratualização imposta a nível dos ACES, UCSP e das USF.
p) Perseguições a dirigentes
sindicais e despedimento de uma dirigente sindical da FNAM no Hospital de
Leiria que se mantiveram impunes apesar de insistentes denúncias públicas e de
solicitações de intervenção do ministro, que desde há largos meses até hoje não
quis dar qualquer resposta objectiva como se comprometeu.
q) Impedimentos diversos à
criação de novas USF modelo A e criação de sucessivos obstáculos à passagem ao
modelo B.
r) Encomenda, a um grupo de
trabalho, de um relatório sobre integração dos cuidados de saúde que visa a
destruição da medicina geral e familiar e dos próprios Cuidados de Saúde
Primários, além de assumir proporções escandalosas ao propor a criação de mais
7500 lugares para as clientelas partidárias ao abrigo de supostos “gestores dos
doentes crónicos”. Outro aspecto que não pode ser escamoteado é que nesse grupo
de trabalho existem elementos que são funcionários de grupos económicos
privados com vultuosos negócios na área da saúde.
s) Elaboração de um projecto de
revisão do Internato Médico com claros objectivos de destruir a formação médica
de qualidade e de criar um amplo universo de médicos indiferenciados sob o
pretexto não demonstrado de fortes limitações na capacidade formativa dos
serviços.
t) Degradação progressiva da
formação médica e ausência de qualquer política de investimento do Ministério
da Saúde nesta área tão delicada.
u) Publicação recente (23/5), sem
qualquer negociação com as organizações médicas, de uma nova portaria que viola
os conteúdos funcionais das especialidades de medicina geral e familiar, da
medicina do trabalho e da saúde pública estabelecidos nos Acordos Colectivos de
Trabalho.
v) Boicote à contratação colectiva e ao
próprio direito de negociação sindical com a publicação de portarias e
despachos contendo matérias que exigiam essa negociação e que, por isso, deviam
estar inseridos em decretos-lei e em clausulado dos acordos colectivos de trabalho.
2-Devido à acumulação sucessiva
de graves problemas resultantes das ilegalidades cometidas pelas instancias
ministeriais e pelas administrações por si nomeadas para os serviços públicos
de saúde, realizou-se a 30/4/2014 uma reunião das duas organizações sindicais
médicas com o Ministro da Saúde, após múltiplas solicitações durante 5 meses. Nessa
reunião, o Ministro da Saúde não assumiu nenhum compromisso de solução dos
diversos problemas suscitados, demonstrando qual a essência da sua postura
política efectiva.
3- Entretanto, colocam-se graves
problemas com projectos ministeriais que visam esvaziar as competências legais
da Ordem dos Médicos a nível ético, deontológico, técnico e científico, de que
a recusa ministerial em negociar um diploma do Acto Médico é o exemplo mais
escandaloso. Sendo matérias de negociação que não cabem às organizações
sindicais é forçoso sublinhar que têm delicadas implicações no desempenho,
globalmente considerado, da profissão médica.
4- O Ministério da Saúde é o
exclusivo responsável pela preocupante deterioração da situação actual, numa
escalada de medidas que impõem uma imediata e enérgica resposta da generalidade
dos médicos.
5- O Ministro da Saúde,
confrontado com a agudização dos diversos problemas na reunião de 30/4/2014,
não só não tomou qualquer medida de resolução como ainda tomou a iniciativa de
publicar mais portarias e despachos à revelia da contratação colectiva e da negociação
sindical. Na reunião efectuada no dia 6/6/2014, voltámos a ouvir as mesmas
argumentações indefinidas, remetendo tudo para um futuro sem qualquer data. Mais
uma vez, ali na reunião, não assumiu qualquer compromisso concreto e
temporalmente definido. A emissão posterior de um comunicado do Ministério da
Saúde a falar de violações de acordos por decidirmos avançar para a greve
constitui um exemplo elucidativo e preocupante de desorientação e de cinismo
político. Quem tem estado sistematicamente a violar as matérias constantes do
acordo assinado há cerca de 2 anos tem sido o Ministro da Saúde e os seus
nomeados nas várias instâncias ministeriais. Os factos são muitos e graves e
facilmente demonstram esta situação perversa.
6- A política governamental de
desmantelamento progressivo do Serviço Nacional de Saúde (SNS) e de negação do
direito à saúde para um número crescente de cidadãos exige atitudes enérgicas e
de firme oposição. Chegámos a um nível de deterioração global da situação neste
delicado sector da vida nacional que não permite outras saídas senão na base
conflitual, situação conflitual essa que procurámos evitar a todo o custo, mas
que a equipa ministerial tudo fez para tornar inevitável através de sucessivas
medidas de provocação política. As questões suscitadas e que determinam o
actual conflito mostram que a resolução dos problemas que atingem os médicos
está intimamente ligada à salvaguarda do direito à saúde da generalidade dos
cidadãos.
E nesse sentido também dirigimos
um apelo aos cidadãos para mostrarem a sua posição solidária com esta luta, tal
como aconteceu há 2 anos com a anterior greve nacional dos médicos.
A Comissão Executiva da FNAM, Porto, 09.06.2014
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