terça-feira, julho 6

A Empresarialização dos Hospitais

I - Os Hospitais do SNS:

1. - Os hospitais são organizações complexas produtoras de serviços altamente diferenciados com mão de obra intensiva , os quais se consubstanciam em centenas de produtos intermédios e finais.

Os hospitais são grandes consumidores de recursos, 3 430 865 milhares de euros, ou seja 52,2% do orçamento de exploração do SNS do ano de 2002 (Totaldas verbas da Saúde: 6 531 405 milhares de euros)(1).

O financiamento dos hospitais é suportado, quase exclusivamente, pelo orçamento geral do estado (93,2%) sendo os restantes 6,8% provenientes das receitas próprias realizadas pelos hospitais (4,8% referente à venda de serviços e cerca de 2% referente à cobrança de taxas moderadoras).

O financiamento dos hospitais foi efectuado durante largos anos pela globalidade dos encargos assumidos - pagamento retrospectivo, em que, o estado, assumia o papel de pagador e prestador.
Este sistema foi um forte indutor do crescimento das despesas e da ineficiência hospitalar, tanto em termos técnicos como económicos.

Antes da criação dos hospitais SA, já haviam sido implementadas várias medidas com o objectivo de alterar este modelo de financiamento, através da combinação do pagamento retrospectivo (50%) com o pagamento pela produção contratualizada (50%)

2. - Quanto aos recursos Humanos há grandes desequilíbrios, coexistindo situações de excesso de oferta com situações de insuficiência.

Os hospitais têm, na maioria dos casos, médicos a mais e horas de presença activa a menos.

Em relação ao pessoal de enfermagem verifica-se uma falta grave de efectivos o que se traduz na prática de um elevadíssimo número de horas de trabalho extraordinário (cerca de 30%, segundo estudo da ARS de Lisboa).

3. - Quanto à qualidade dos serviços hospitalares, aferida pela opinião dos utentes, verifica-se que a sua satisfação é maior em relação aos prestadores directos de cuidados, nomeadamente médicos e enfermeiros e claramente negativa em relação às condições físicas, de organização e de gestão, incluindo as condições de marcação e de espera das consultas e das intervenções cirúrgicas.

II - A reforma da rede hospitalar:

1. - Justificação para a reforma da gestão dos hospitais:
falta de eficiência, autonomia, responsabilização, qualidade e baixa produtividade.

2. - Empresarialização dos hospitais?

O projecto de empresarialização dos hospitais do ministro da saúde, traduziu-se na implementação das seguintes medidas :

- Criação de um novo modelo de gestão hospitalar – criação dos hospitais SA
- Criação de um novo modelo de contratação e financiamento das prestações de saúde.
- A criação de um sistema de incentivos aos profissionais

a) - A criação de um novo modelo de gestão hospitalar – criação dos hospitais SA

Antes da criação dos hospitais SA, a rede do SNS era constituída por 91 hospitais ( 19 Centrais; 39 - Distritais; 21 - de Nível UM; 3- Universitários; e 9 - Psiquiátricos), cujo estatuto jurídico era de Instituição Pública com autonomia administrativa e financeira, pertencentes ao SPA - Sector Público Administrativo.
O ministro da saúde, Luís Filipe Pereira transformou, duma assentada, o estatuto jurídico de trinta e quatro hospitais do SPA em sociedades anónimas de capitais exclusivamente públicos (2).
O projecto de António Campos previa a transformação de hospitais do SPA em empresas públicas EP (sector público empresarial).

Não vemos justificação para a adopção do modelo SA, nem para a transformação simultânea de 34 hospitais, a não ser a de equilibrar as contas do estado, mediante a reclassificação de uma importante fatia da despesa pública (o montante referente ao financiamento destes 34 hospitais).

b) - A criação de um modelo contratual de financiamento:

A prossecução deste objectivo significa que os pagamentos aos hospitais deverão passar a ser efectuados de acordo com uma tabela de preços pré-estabelecidos numa base unitária (doente tratado, número de cirurgias) para a produção contratualizada de forma a constituir um poderoso incentivo ao aumento da eficiência técnica e um instrumento de controlo do crescimento dos preços.

O Ministro da Saúde criou regras de financiamento para os Hospitais SA, que limitam a prestação de cuidados à produção contratada, ou seja, aos "plafonds" financeiros e orçamentais. Porque se os hospitais SA, ultrapassarem a produção contratualizada serão fortemente penalizados, recebendo apenas uma parte dos custos, tendo de suportar a parcela mais importante dos mesmos, que no caso do internamento e das consultas é de cerca de 70%.

c) - Criação de um sistema de incentivos aos profissionais:

Com o objectivo de transformar o tradicional sistema de remuneração de base salarial, através da previsão de uma majoração da remuneração base, atribuída aos profissionais em função da avaliação do desempenho individual e dos resultados de gestão do serviço/hospital onde os profissionais desenvolvem actividade.

O combate à inércia, que caracteriza o sistema público de prestação de cuidados, deverá ser efectuado com base na criação de um conjunto de incentivos dos profissionais, calculados em função do desempenho e da sua contribuição para o aumento da produção dos serviços hospitalares.

As medidas iniciadas pela Unidade de Missão nesta matéria são ainda incipientes.

Conclusão:

1. - A prossecução destes objectivos requer a introdução de profundas alterações na organização dos hospitais de molde a adequa-los ao novo modelo empresarial, nomeadamente em relação ao sistema de informação, operacionalização do controlo económico financeiro e a adopção de novas técnicas de gestão dos recursos humanos.

2. - A melhoria da produtividade e da qualidade dos serviços hospitalares, só será exequível através da alteração da cultura existente , mediante o desenvolvimento da motivação e o estabelecimento de objectivos claros e precisos, de forma a desenvolver no pessoal hospitalar a capacidade de enfrentar novos desafios e a desenvolver uma nova cultura de eficiência.

Combater os males tradicionais da gestão hospitalar: A inércia e o corporativismo, mediante a introdução de uma cultura de eficiência sem, no entanto, deixar de tratar bem os doentes e maximizar o bem estar social.

O projecto de Empresarialização dos Hospitais de Luís Filipe Pereira, tem falhado por ter sido orientada, prioritariamente, por critérios economicistas com desprezo por outros aspectos importantes como a necessidade de envolvimento dos profissionais da saúde e a alteração da cultura existente mediante a introdução de novas condições de competitividade.

O resultado desta política está à vista: conflitualidade grave e permanente, desmotivação dos profissionais em prejuízo da qualidade dos cuidados de saúde.

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(1) Total das verbas da Saúde - 6 531 405 milhares de euros, que representam 18,8% da despesa total do Estado e 5,3% do PIB do ano de 2002.

(2) Hospitais SA: C. H. Alto Minho. HD Barcelos, HD Guimarães, CH V. Real e Peso da Régua, HD Bragança, HD V.N. Famalicão, HD Vale do Sousa, S. Sebastião de Vila da Feira, HD Viseu, HD Amarante, CH Cova da Beira, ULS Matosinhos, H Santo António, HD Aveiro, HD Leiria, HD Santarém, HD Figueira da Foz, CH Médio Tejo, H. Santa Marta, HD Santa Cruz, HD Pulido Valente, H. S. F. Xavier, H. Egas Moniz, HD Almada
HD Barreiro, HD Setúbal, HD Beja, HD Portimão, IPO Coimbra, IPO Porto , IPO Lisboa.