sábado, janeiro 5

Rede primária e emergência pré-hospitalar


Mais que o meu entusiasmo acerca da execução do Programa XVII Governo Constitucional, importa saber se o está ou não a cumprir e se o fizer se é de uma forma satisfatória.

1. Cuidados Continuados

Eu com o meu optimismo e o meu diletantismo, apesar de procurar fundamentar os meus argumentos mesmo que sejam nos números e nas estatísticas "chatas", pelos vistos para si, sem me preocupar com o estudo e a reflexão permanentes, talvez por considerar que dar opinião deve ser uma forma de puro lazer, onde a vocação e o trabalho não têm lugar. Ao contrário de mim você, argumenta que o chorrilho de números só empatam, que o primado da política deve estar presente, mesmo que algumas das opiniões que a sustentam não tenham suporte nem evidência. Enfim vamos lá, como deveria saber os acordos para as unidades de convalescença e média duração e reabilitação, estabelecem as regras para a contratualização, e estipulam que estas unidades devem ter diáriamente a presença de médico, incluindo o fisiatra, bem como de fisoterapeutas, terapeutas ocupacionais e terapeutas da fala, e que existem para além disto indicadores de avaliação conhecidos dos intervenientes. Quanto à estratégia de continuidade e desenvolvimento, você achará que os representantes do Estado serão tão estúpidos que não procurarão diversificar os parceiros. Acha mesmo que o clima é de afrontamento? não terá percebido que a avaliação das Unidades em actividade em 2005 foi realizada por uma Comissão que incluia os representantes das Misericórdias e que antes não funcionava e que apesar das tomadas de posição públicas, O Estado e os parceiros aceitaram os compromissos que levaram a aprovação das referidas portarias e aos acordos.

2. SAP´s, Urgências e Ambulâncias

O nosso atraso na área da emergência pré-hospitalar é conhecido, os poucos recursos que têm dotado esta área tem feito com que tivessemos chegado ao final do século XX, com um ainda incipiente serviço de INEM e com um modelo excessivamente centrado ´por um lado nos médicos e por outro nos bombeiros. A maioria dos médicos em exercício, não dispõe de um currículo pré-graduado nesta área, os internatos da especialidade sempre colocaram esta área para segundo plano e ainda nos Hospitais a Urgência é terra de ninguém, a formação em suporte de vida avançado, trauma, atls, abrange poucos profissionais mesmo nas áreas em que muito ^deles praticam num SMC ou num Polivalente, na MGF escasso tem sido o investimento nesta área e só recentemente se começo a avaliar as necessidades de formação nestas áreas. Aliás o nosso atraso é tanto nesta na área que a maioria dos profissionais de saúde não têm formação em reanimação cardio-respiratória e a maioria dos serviços não dispõem de Desfibrilhadores Automáticos Externos, os CODU'S e os recursos do INEM foram e são escassos.
Não sou perito, mas todos conhecemos alguns bons exemplos de Serviços de Emergência de Grandes Cidades Europeias não centrados nos médicos (SMUR/SAMU francês). Pelo que nesta área, medidas de suporte básico de vida, transporte rápido adequado, acompanhado pelos profissionais com os conhecimemtos e as práticas mais adequadas são essenciais para evitar mortes e lesões evitáveis, pelo que a sua afirmação "Este o grande equivoco. Eles,limitadíssimos na sua acção, são a proximidade, próxima, visível, palpável – passe o pleonasmo. Não têm tecnologia disponível, não estão dimensionados em termos de recursos materiais e humanos, mas são a interface do primeiro embate entre o doente que se julga (mal ou bem) possuído de uma situação urgente e o SNS. E, nas dificuldades, naquilo que os ultrapassa, fazem a triagem possível, metem o doente numa ambulância e transferem-no para um urgência hospitalar. Sem desassossegos." não faz qualquer sentido nos nossos dias e espero que não perdure por muito tempo, até porque de uma forma egoísta muitos de nós estamos na idade de começarmos a ter alguns achaques". O que necessitamos é de cidadãos que saibam reconhecer uma PCR, façam suporte básico de vida, DAE em grandes espaços e serviços de emergência e catástrofe organizados,com ambulâncias, motas, helis, com pessoal treinado, paramédicos, enfermeiros, médicos (os peritos que se entendam na sua combinação) que iniciem os cuidados adequado o mais brevemente possível e já agora que mantenham um programa de formação continuada. Os tempos actuais não se compadecem com " fazem a triagem possível, metem o doente numa ambulância e transferem-no para um urgência hospitalar." pelo menos para mim e para os que me são queridos, familiares ou não. Quanto aos médicos locais, estamos a falar provávelmente de médicos especialistas em medicina geral e familiar, pois se estamos deverá saber que as suas competências não se dirigem para a actividade de emergência, o que não quer dizer que não devam saber operar com um Desfibrilhador, nem que seja um DAE, ou tenham um curso de suporte de vida avançado ou trauma, se formos por aí todos os médicos os deveriam ter independentemente da sua especialidade, mas a sua actividade principal não essa, devem antes prestar cuidados gerais,acessíveis,integrados, continuados, de equipa, holísticos, personalizados, orientados para a família, orientados para a comunidade, coordenados,aos seus pacientes e serem ainda os provedores dos seus pacientes advogando por eles em todos os problemas de saúde e na sua relação com todos os outros prestadores e níveis de cuidados.
São estas características que há muito movem os médicos de família, foi por isso que lhe recomendei a leitura do artigo de Luis Rebelo, conferência inaugural do Congresso de Clínica Geral desse ano, mas como não leu cito "a opção pelos SAP's significou a consagração e subsequente manutenção de 6 ou 12 horas semanais para atendimento de doentes, inscritos ou não no médico ou na unidade de saúde, em actos esporádicos, e como tal à margem dos conceitos de globalização e integração de cuidados. Priveligiaram-se, deste modo, os actos meramente pontuais e, por via regra, deficitariamennte supletivos de consulta personalizada. Numa palavra, optou-se pelo primado da acessibilidade precária imediata e imponderada sacrificando a qualidade da intervenção em Saúde" . Imagine o total de horas dispendidas em SAP's, SASUS, CATUS e quejandos, por esse país fora ao longo dos anos, horas normais e extraordinárias, e as implicações que tiveram nas consultas programadas, nas taxas de cobertura de programas de saúde de grupos vulneráveis, etc., é a isto que os MGF chamam desde há muito "a sapização do país", advogando a transferência dessas horas para atendimento em horas de consulta expressa. Finalmente dizer-lhe que a sua afirmação de que "Mas até o momento, os médicos, quer os organismos representativos, quer as associações científicas que os agrupam, não foram tidos nem achados para essa reforma. Esta seria a reforma dos gestores, da administração, do planeamento, e… dos contabilistas. O contributo dos médicos limitar-se-ia a integrar a Comissão (CTAPRU). Não chega!", não corresponde à verdade, uma ida à página da MCSP, teria bastado para encontrar os CV's dos missionários e teria descoberto que apesar de lá estarem a título pessoal, alguns deles têm CV conhecido enquanto dirigentes sindicais ou de organismos técnico científicos para além de ser presidida pelo actual presidente da APMCG: António Rodrigues(FNAM)(Colégio da OM de MGF); Armando Brito e Sá (APMCG); Moura Reis (SIM); João Rodrigues(FNAM); Henrique Botelho (FNAM).

Para além do facto do documento sobre as urgências ter estado em discussão pública alguns meses, são conhecidos pareceres e opiniões favoráveis,do Colégio da OM de Medicina Intensiva, do Colégio da OM de MGF. Quanto aos SAP´s desde 1990 que a APMCG, se tinha pronunciado sobre eles no documento "Um Futuro para a Medicina de Família em Portugal", e são muitos os artigos e pronunciamentos na área da MGF contra a sua continuação, aliás a reforma dos CSP, criação das USF's e o dos Agrupamentos dos CS, apontam para isso mesmo. Aliás estes não consagram qualquer unidade de urgência básica ao contrário dos anteriores diplomas de 1999 e 2003. Como sabe, penso eu, a própria Unidade de Missão para os Cuidados de Saúde Primários, tem mesmo uma posição mais radical uma vez que se pronunciou contrária a existência de consultas abertas dos CS nos Hospitais chamados de nível I.
Avicena

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1 Comments:

Blogger e-pá! said...

Caro Avicena:

O seu bem organizado e pertinente texto sobre a rede primária e a emergência pré-hospitalar, merece-me, porque nas entrelinhas sou visado, alguns comentários.

Assim:
1. Cuidados Continuados Integrados

1.a) para cobrir e apoiar o avanço significativo do nº. camas da RNCCI (média e longa duração), estou convicto que o número de médicos fisiatras, disponíveis em Portugal, não chega.
Pelo que será melhor verificar o que se passa.
1.b) continuo convicto que o sector social (IPSS e Miseriórdias) mantem-se hegemónico, nesta rede, apesar da sua expansão.

Penso que trabalha próximo, ou tem acesso fácil, aos centros de dados relativos à Saude em Portugal.
Aproveito, esta convição para lhe fazer uma pergunta, com a maior naturalidade e interesse pessoal.
Estarão disponíveis dados que quantifiquem o ratio de canmas do sector social (IPSS e Misericórdias) e sector público (MS e MTSS)?

2. SAP´s, Urgências e Ambulâncias

Sobre as questões que levanta sobre a emergência pré-hospitalar, guardo-me para mais tarde, já que existe algum conflito inter-profissional sobre esta questão, não totalmente derrimido. Resumindo: não me parece oportuno "esgalhar" este assunto agora.
Todavia, e desde já, deixo-lhe no ar uma questão de números referente
aos exemplos de Serviços de Emergência de Grandes Cidades Europeias não centrados nos médicos (SMUR/SAMU francês) que ecvocou e referentes, particularmente, à situação de Paris.
Tem uma vaga ideia da quantidade de ambulâncias privadas nesta cidade e como isso tem influenciado toda a política de serviços de emergência pré-hospitalar parisienses?

3. Concluindo
Percebe, agora, por que não foi aprovada qualquer legislação que defina com precisão e rigor o "acto médico"?

Nota Final:
"chorrilho de números só empatam, que o primado da política deve estar presente, mesmo que algumas das opiniões que a sustentam não tenham suporte nem evidência".
É uma ideia enviesada. Sirvo-me dos números para construir conclusões, formatar opiniões, delinear planos, como qualquer mortal.
Uma vez convicto, raramente, ou só, esporadicamente os cito. Passo à fase seguinte - assertiva.
Mas, antes disso, uso-os, interpreto-os, questiono-os e, creia, respeito-os (embora já me tenham enganado algumas vezes).

Conheçe, com certeza , o aforismo brasileiro sobre as estatísticas.
Eles dizem (cito de memória):
"As estatísitcas são como os bikinis. Mostram muito mas tapam (ou escondem) o essencial."

11:21 da tarde  

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