A emenda pior que o soneto
O “estudo” encomendado pelo grupo José Mello Saúde à Faculdade de Economia da UNL, vale o que vale. Os próprios autores salientam que encontraram “todas as limitações de análise”. Mas nos tempos que correm, algumas Instituições académicas, com públicas dificuldades económicas e de tesouraria, têm de aceitar as encomendas que vêm à rede.
O estudo não teve a idoneidade científica suficiente para indagar há quanto tempo esta maravilhosa gestão privada, não consegue acertar as contas com o Estado.
Falo em contas sérias, escrutináveis, não contas de merceeiro.
Curioso o gráfico comparativo onde constam o H.Amadora-Sintra, HH São Teotónio, H. S. Sebastião – com resultados positivos – e o Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental, HH Santarém, HH Sta Maria, HH S. João, Centro Hospitalar Lisboa Central, Centro Hospitalar Médio Tejo e HH Garcia de Orta – com resultados negativos.
Estes 3 últimos (C. Hospitalar Lisboa Central, C. Hospitalar Médio Tejo e HH Garcia de Orta) todos com resultados negativos superiores a 15 M€!
Isto é, tecnicamente falidos. Quase a necessitar maior apoio do Estado que o BPP!
Os responsáveis pelo estudo parecem ter ignorado (não li as 100 páginas ... a pachorra tem limites!) todo o historial do HH Amadora-Sintra.
A adjudicação do hospital de Amadora-Sintra ao grupo Mello em 1995, foi apressada, mal preparada, em termos de regulação e controlo.
Leonor Beleza, então ministra da Saúde, concluiu o acordo, com o Grupo Mello, 15 dias antes das eleições que ditaram a queda do cavaquismo e início do período guterrista. E, negócio apressado, feito sobre o joelho, originou, inevitávelmente, conflito graves desde o início.
Diz o Povo que cadelas apressadas têm filhos cegos…
Em 2002, com a actual Ministra da Saúde, Drª. Ana Jorge, à frente da Administração Regional de Saúde (ARS) de Lisboa, o litígio com a entidade gestora do hospital, acabou no tribunal arbitral por decisão de LFP, com o Estado condenado a pagar 38 milhões de euros ao grupo Mello. Não sei se este montante entrou nas contas do estudo da Faculdade de Economia da UNL.
Posteriormente, o Ministério Público decidiu processar a ARS - Ana Jorge e 19 outros antigos dirigentes da ARS - por considerar que foram feitos pagamentos indevidos aquele grupo privado. O julgamento ainda não foi marcado…
Criou-se com este processo uma situação com rasgos Kafkianos…
Disse A. Arnaut: "O Hospital Amadora-Sintra foi uma experiência mal-sucedida que gerou conflitos permanentes e que mostra que o Estado não pode delegar as suas competências num sector tão fundamental como os hospitais".
O grupo Mello Saúde tentou por todos os meios obter “custos de exploração mais baixos que os públicos". À custa de restrições do acesso (aumento do tempo de espera para consultas externas que duplicou entre 2004 e 2007), do estrangulamento no desenvolvimento da cirurgia de ambulatório (a cirurgia convencional é mais compensadora em termos de receitas) e, finalmente, do grau de satisfação dos utentes.
Mas há outro facto que deve ser omisso no relatório de encomenda porque o Sr. Salvador Mello não gosta. Em 2007, os hospitais com gestão empresarial (EPE) reduziram o défice para 158 milhões de euros. E este “universo” é, certamente, liminarmente excluído da avaliação do referido relatório.
Estamos todos cada vez mais fartos deste nóvel Estado Providência para os ricos, os detentores de fortunas e os especuladores.
Já chega de extorsão, de usurpação!
Na área social, para mim, são delinquência da mais abjecta.
Sobre a gestão hospitalar privada aconselho o Sr. Salvador a mandar o tão propagandistico relatório (ou será um parecer?) à Comissão que vai começar a estudar as PPP’s na Saúde…
Pode ser que tenham disponibilidade para o ler...
NOTAS FINAIS:
Primeiro, um necessário acerto dos factos:
A jornalista que assina o artigo em questão não foi a uma conferência de imprensa - recebeu um exemplar do tal relatório de 100 páginas - e foi encarregue de fazer um artigo de cerca de 2000 palavras, sobre o assunto.
De resto, subscrevo no essencial os seus pertinentes comentários sobre a matéria em análise - HH A-S. Todavia, a minha indignação foi maior e levou-me a elaborar o "meu" próprio comentário.
e-pá!
Etiquetas: E-Pá
10 Comments:
É caso para dizer que, só com o título acima e a correspondente foto e notícia que ocupam toda a página 8 (!!!) do Público de hoje (na secção «Portugal» e não na de «Economia»), o grupo José de Mello Saúde já ganhou o dia, ao ter promovido ontem uma conferência de imprensa para apresentar os resultados comparativos de um estudo por si encomendado a um investigador da Universidade Nova em que, entre outras conclusões de todo em todo incontroláveis e inverificáveis, se afirma que o Hospital Amadora-Sintra (gerido por aquele grupo) criou um milhão de euros de valor enquanto o Garcia da Horta (público) «destruiu perto de 24 milhões».
E, por fim, gostava de acrescentar apenas três coisas: a primeira é que a credibilidade de estudos destes devia ficar afectada pela simples evidência de que se, porventura, os seus resultados fossem os contrários, ontem não se teria realizado nenhuma conferência de imprensa para os divulgar; a segunda é que é obra transformar o que podia ser muito bem uma página de publicidade comercial numa página noticiosa com resultados quase idênticos ( sublinho o «quase» para não ofender injustamente a jornalista destacada para este serviço); e a terceira é que, como leitor do Público, e a bem da sempre tão reclamada (para os outros) «transparência», gostaria de obter deste jornal a garantia solene de que nada disto foi tratado com uma agência de comunicação contratada pelo grupo José de Mello Saúde.
Posted by VÍTOR DIAS
Uma verdadeira vergonha este Jornal Público.
O desplante não tem limites. Os neo-liberais de pacotilha tudo compram...Nem no momento da saída prevalece a dignidade, seriedade e ética. Uma história de truques e golpes é agora branqueada por um oportuno "estudo taillor-made"...
Este Governo de José Sócrates não está isento de culpa. Pois pouco depois de ter anunciado o principio da gestão pública dos HH do SNS, decidiu entregar a gestão do HH Universitário de Braga à mesma José de Mello Saúde.
Caro É-pá,
sem ler o estudo é dificil ter opinião, por isso não salto imediatamente para a conclusão que retira (embora também não a rejeite).
Agora, certamente não será A. Arnaut que tem os números correctos ou a capacidade de tirar qualquer conclusão!
O comentário do tambemquero, citando Vitor Dias, contém as palavras essenciais para se poder ter uma opinião honesta (e não um preconceito): incontroláveis e inverificáveis - apenas com a análise (verificação) da informação subjacente ao estudo será possível dizer se as conclusões são ou não distorcidas.
Esperemos pelo link para o estudo.
DIRECTOR DO INEM ADMITE A POSSIBILIDADE DE FAZER UMA AUDITORIA EXTERNA AOS SERVIÇOS
Partidos da oposição falam de "falhas na prestação de socorros às vítimas" e questionam "descoordenação" no funcionamento do serviço de emergência
O presidente do INEM, Abílio Ferreira Gomes, foi ontem bombardeado no Parlamento com as críticas dos deputados com assento na Comissão Parlamentar de Saúde, à excepção do PS, que apontaram o dedo às alegadas falhas na prestação de socorro às vítimas e à descoordenação no serviço.
"Verificou-se a ocorrência de situações trágicas e fatais, excesso de demora no atendimento, chamadas perdidas ou falta de resposta do INEM", disparou o deputado do BE João Semedo, desafiando o presidente do INEM a fazer uma auditoria externa aos serviços. Já o líder da bancada parlamentar do PCP, Bernardino Soares, disse que "é visível que os portugueses sentem uma certa insegurança na emergência médica que corresponde, em muitos casos, a situações de menos capacidade de resposta".
Reagindo ao desafio do BE, Abílio Gomes revelou que já estava em curso uma auditoria ao Sistema Integrado de Atendimento e Emergência Médica e ao Centro de Orientação de Doentes Urgentes (CODU) de Lisboa e Vale do Tejo. "Foi instaurada uma auditoria interna ao novo software em operação desde Março deste ano", esclareceu aquele responsável, não fechando a porta à realização de uma auditoria externa à actividade do INEM. Ao PÚBLICO, o deputado do PS Paulo Pedroso disse que o presidente do INEM deixou implícito o compromisso de fazer chegar ao Parlamento o resultado da autoria interna, o que permitirá perceber as razões que levam as pessoas a desligar as chamadas.
Abílio Gomes refutou a existência de chamadas não atendidas pelo CODU de Lisboa e Vale do Tejo, argumentando que "o que existe são chamadas que, sendo registadas na central telefónica, são abandonadas ou desligadas pelo contactante na origem". Estas, precisou, "representam 14 por cento do total de chamadas". Há dias, no Parlamento, a ministra da Saúde falou de uma percentagem bem menor: cinco por cento.
Questionado por Carlos Miranda (PSD), o presidente do INEM reconheceu atrasos na aquisição de "três helicópteros de socorro hospitalar" a instalar em Aguiar da Beira, Macedo de Cavaleiros e Ourique, e que, de acordo com o deputado, já deveriam estar ao serviço das populações."O Ministério da Saúde está a instrumentalizar o INEM, com vista a concentrar todos os benefícios em 2009", insurgiu-se Carlos Miranda.
Ontem, os deputados tiveram acesso ao anteprojecto da proposta de lei que vai regulamentar a utilização dos desfibriladores automáticos externos para que aqueles aparelhos, que permitem salvar vidas em muitas situações de paragem cardíaca, possam vir a ser manuseadas por toda a gente, desde que façam a respectiva formação. Na reunião, o presidente do INEM anunciou a criação de carreiras de técnicos de emergência que, no futuro, vão passar a substituir ou a completar as actuais equipas constituídas por médicos e enfermeiros.
JPÚBLICO, 04.12.2008, Margarida Gomes.
***
A história dos 3 helicópteros e as divergências internas sobre a sua utilização já vêm desde a anterior direcção do INEM.
Agora são helicópteros de socorro hospitalar. Assim seja, embora não se explicite o âmbito de actuação...
Deixando a definição das possíveis utilizações de lado, a actual carência destes meios de evacuação rápida a serem colocados em áreas relativamente desprotegidas de cuidados uegentes diferenciados e com dificuldades aceso a HH's com SUP (Aguiar da Beira, Macedo de Cavaleiros e Ourique), mostra, passado quase um ano, como a política de CC foi: "andar com o carro à frente dos bois".
Andou todo o Mundo a discutir se primeiro fecha e depois equipa-se, ou vice-versa. Hoje, ultrapassado este dilema, continua a não haver, na rede pré-hospitalar, um equipamento deficitário.
O anúncio da criação de carreiras técnicas de emergência, medida acertada, não pode vir a colidir com a necessidade de meios medicalizados de intervenção no terreno.
Por outro lado é preciso acertar e credibilizar os números para não gerar confusões. Não pode a ministra afirmar que as chamadas desligadas, ou deixadas cair, são de 5% e o presidente do INEM adiantar um outro número: 14%.
Se não estamos perante a situação patética de ontem, no mesmo Telejornal, onde o 1º. Ministro afirmava que os portugueses terial maiores disponibilidades financeiras por via da descida das taxas de referência do BCE e, em consequência da Euribor e, minutos depois, Teixeira dos Santos vir anunciar que o ano de 2009 vai ser muito difícil...vai exigir sacrifícios!
Em que ficamos?
Finalmente, o INEM, ainda em fase de integração na rede pré-hospitalar de urgência/emergência, têm-se revelado um verdadeiro "bombo de festa" para a Oposição parlamentar...
Porquê?
Agora é que o saudepe fez um comentário a que “tiro o chapéu”. Gostei muito (mas não sou o PKM. Tal como o saudepe não é ninguém que tenha trabalhado com o PKM pois seria muito deselegante atendendo aos comentários e insultos que lhe tem dirigido neste blogue. Mas gostei deste seu post.).
E assim foi, de facto, saudepe. Mas poucos deram a cara por essa posição quando aconteceu: Ou seja, porque é que Sócrates não acabou de vez com todas as PPP com gestão clínica? Sobretudo quando o principal argumento para denunciar unilateralmente o contrato com o Grupo Mello foi... “o sucesso” dos hospitais EPE” que assim dispensava a necessidade de recorrer aos privados para gerir hospitais do SNS... ou será que saudepe não queria dizer bem isto? Pode esclarecer-nos neste debate aberto e interessante que o xavier está a permitir?
Notamos a habitual estratégia de tentar descredibilizar os autores em vez de fazer outro estudo que comprove este errado ou falseado. Os argumentos que os anónimos do blogue utilizam para descredibilizar este estudo (concordo que devia ter “aspas” assim: “estudo”) podiam ser, infelizmente, dirigidos a todo e qualquer "estudo" financiado pelo Governo que, mais grave, utiliza erário dos nossos impostos. Pelo menos, neste caso, o Grupo Mello pagou do seu bolso e, se de facto o estudo não tem qualidade, eles é que ficaram a perder. Mas o facto é que os dados para se analisar da mais-valia do projecto, que durou 13 anos (! O projecto piloto mais longo de sempre?...) existem e devem ser analisados com espirito aberto.
Xavier, é claro que o C. Hospitalar Lisboa Central, o C. Hospitalar Médio Tejo e HH Garcia de Orta, todos com resultados negativos superiores a 15 M€,
estão tecnicamente falidos. Não sabia? Alguém neste blogue consegue provar o contrário?
Tambemquero, Vitor Dias?, a agencia de comunicação esteve envolvida quase de certeza absoluta. Mas consta-se que é a mesma que trabalha para o Sócrates. Choca-o? Mais um contra-senso?
Inimigo publico, cheio (ou cheia) de rancores. Como vai ser em Braga?
Tanta prosa sobre PKM leva-me a recordar esse magnífico actor, um incomparável diseur de poesia, um homem da satira, que tive o prazer e a honra de conhecer nos meios teatrais da capital.
E a dedicar a PKM, o...
MANIFESTO ANTI-DANTAS
Basta pum basta!!!
Uma geração que consente deixar-se representar por um Dantas é uma geração que nunca o foi. É um coio d'indigentes, d'indignos e de cegos! É uma resma de charlatães e de vendidos, e só pode parir abaixo de zero!
Abaixo a geração!
Morra o Dantas, morra! Pim!
Uma geração com um Dantas a cavalo é um burro impotente!
Uma geração com um Dantas ao leme é uma canoa em seco!
O Dantas é um cigano!
O Dantas é meio cigano!
O Dantas saberá gramática, saberá sintaxe, saberá medicina, saberá fazer ceias pra cardeais, saberá tudo menos escrever que é a única coisa que ele faz!
O Dantas pesca tanto de poesia que até faz sonetos com ligas de duquesas!
O Dantas é um habilidoso!
O Dantas veste-se mal!
O Dantas usa ceroulas de malha!
O Dantas especula e inocula os concubinos!
O Dantas é Dantas!
O Dantas é Júlio!
Morra o Dantas, morra! Pim!
O Dantas fez uma soror Mariana que tanto o podia ser como a soror Inês ou a Inês de Castro, ou a Leonor Teles, ou o Mestre d'Avis, ou a Dona Constança, ou a Nau Catrineta, ou a Maria Rapaz!
E o Dantas teve claque! E o Dantas teve palmas! E o Dantas agradeceu!
O Dantas é um ciganão!
Não é preciso ir pró Rossio pra se ser pantomineiro, basta ser-se pantomineiro!
Não é preciso disfarçar-se pra se ser salteador, basta escrever como o Dantas! Basta não ter escrúpulos nem morais, nem artísticos, nem humanos! Basta andar com as modas, com as políticas e com as opiniões! Basta usar o tal sorrisinho, basta ser muito delicado, e usar coco e olhos meigos! Basta ser Judas! Basta ser Dantas!
Morra o Dantas, morra! Pim!
O Dantas nasceu para provar que nem todos os que escrevem sabem escrever!
O Dantas é um autómato que deita pra fora o que a gente já sabe o que vai sair... Mas é preciso deitar dinheiro!
O Dantas é um soneto dele-próprio!
O Dantas em génio nem chega a pólvora seca e em talento é pim-pam-pum.
O Dantas nu é horroroso!
O Dantas cheira mal da boca!
Morra o Dantas, morra! Pim!
O Dantas é o escárnio da consciência!
Se o Dantas é português eu quero ser espanhol!
O Dantas é a vergonha da intelectualidade portuguesa!
O Dantas é a meta da decadência mental!
E ainda há quem não core quando diz admirar o Dantas!
E ainda há quem lhe estenda a mão!
E quem lhe lave a roupa!
E quem tenha dó do Dantas!
E ainda há quem duvide que o Dantas não vale nada, e que não sabe nada, e que nem é inteligente, nem decente, nem zero!
Vocês não sabem quem é a soror Mariana do Dantas? Eu vou-lhes contar:
A princípio, por cartazes, entrevistas e outras preparações com as quais nada temos que ver, pensei tratar-se de soror Mariana Alcoforado a pseudo autora daquelas cartas francesas que dois ilustres senhores desta terra não descansaram enquanto não estragaram pra português, quando subiu o pano também não fui capaz de distinguir porque era noite muito escura e só depois de meio acto é que descobri que era de madrugada porque o bispo de Beja disse que tinha estado à espera do nascer do Sol!
A Mariana vem descendo uma escada estreitíssima mas não vem só, traz também o Chamilly que eu não cheguei a ver, ouvindo apenas uma voz muito conhecida aqui na Brasileira do Chiado. Pouco depois o bispo de Beja é que me disse que ele trazia calções vermelhos.
A Mariana e o Chamilly estão sozinhos em cena, e às escuras, dando a entender perfeitamente que fizeram indecências no quarto. Depois o Chamilly, completamente satisfeito, despede-se e salta pela janela com grande mágoa da freira lacrimosa. E ainda hoje os turistas têm ocasião de observar as grades arrombadas da janela do quinto andar do Convento da Conceição de Beja na Rua do Touro, por onde se diz que fugiu o célebre capitão de cavalos em Paris e dentista em Lisboa.
A Mariana que é histérica começa a chorar desatinadamente nos braços da sua confidente e excelente pau de cabeleira soror Inês.
Vêm descendo pla dita estreitíssima escada, várias Marianas, todas iguais e de candeias acesas, menos uma que usa óculos e bengala e ainda toda curvada prá frente o que quer dizer que é abadessa.
E seria até uma excelente personificação das bruxas de Goya se quando falasse não tivesse aquela voz tão fresca e maviosa da Tia Felicidade da vizinha do lado. E reparando nos dois vultos interroga espaçadamente com cadência, austeridade e imensa falta de corda... Quem está aí?... E de candeias apagadas?
- Foi o vento, dizem as pobres inocentes varadas de terror... E a abadessa que só é velha nos óculos, na bengala e em andar curvada prá frente manda tocar a sineta que é um dó d'alma o ouvi-la assim tão debilitada. Vão todas pró coro, mas eis que, de repente, batem no portão sem se anunciar nem limpar-se da poeira, sobe a escada e entra plo salão um bispo de Beja que quando era novo fez brejeirices com a menina do chocolate.
Agora completamente emendado revela à abadessa que sabe por cartas que há homens que vão às mulheres do convento e que ainda há pouco vira um de cavalos a saltar pla janela. A abadessa diz que efectivamente já há tempos que vinha dando pela falta de galinhas e tão inocentinha, coitada, que naqueles oitenta anos ainda não teve tempo pra descobrir a razão da humanidade estar dividida em homens e mulheres. Depois de sérios embaraços do bispo é que ela deu com o atrevimento e mandou chamar as duas freiras de há pouco com as candeias apagadas. Nesta altura esta peça policial toma uma pedaço d'interesse porque o bispo ora parece um polícia de investigação disfarçado em bispo, ora um bispo com a falta de delicadeza de um polícia d'investigação, e tão perspicaz que descobre em menos de meio minuto o que o público já está farto de saber - que a Mariana dormiu com o Noel. O pior é que a Mariana foi à serra com as indiscrições do bispo e desata a berrar, a berrar como quem se estava marimbando pra tudo aquilo. Esteve mesmo muito perto de se estrear com um par de murros na coroa do bispo no que se mostrou de um atrevimento, de uma insolência e de uma decisão refilona que excedeu todas as expectativas.
Ouve-se uma corneta tocar uma marcha de clarins e Mariana sentindo nas patas dos cavalos toda a alma do seu preferido foi qual pardalito engaiolado a correr até às grades da janela gritar desalmadamente plo seu Noel. Grita, assobia e rodopia e pia e rasga-se e magoa-se e cai de costas com um acidente, do que já previamente tinha avisado o público e o pano cai e o espectador também cai da paciência abaixo e desata numa destas pateadas tão enormes e tão monumentais que todos os jornais de Lisboa no dia seguinte foram unânimes naquele êxito teatral do Dantas.
A única consolação que os espectadores decentes tiveram foi a certeza de que aquilo não era a soror Mariana Alcoforado mas sim uma merdariana-aldantascufurado que tinha cheliques e exageros sexuais.
Continue o senhor Dantas a escrever assim que há-de ganhar muito com o Alcufurado e há-de ver que ainda apanha uma estátua de prata por um ourives do Porto, e uma exposição das maquetes pró seu monumento erecto por subscrição nacional do "Século" a favor dos feridos da guerra, e a Praça de Camões mudada em Praça Dr. Júlio Dantas, e com festas da cidade plos aniversários, e sabonetes em conta "Júlio Dantas" e pasta Dantas prós dentes, e graxa Dantas prás botas e Niveína Dantas, e comprimidos Dantas, e autoclismos Dantas e Dantas, Dantas, Dantas, Dantas... E limonadas Dantas- Magnésia.
E fique sabendo o Dantas que se um dia houver justiça em Portugal todo o mundo saberá que o autor de Os Lusíadas é o Dantas que num rasgo memorável de modéstia só consentiu a glória do seu pseudónimo Camões.
E fique sabendo o Dantas que se todos fossem como eu, haveria tais munições de manguitos que levariam dois séculos a gastar.
Mas julgais que nisto se resume literatura portuguesa? Não Mil vezes não!
Temos, além disto o Chianca que já fez rimas prá Aljubarrota que deixou de ser a derrota dos Castelhanos pra ser a derrota do Chianca.
E as pinoquices de Vasco Mendonça Alves passadas no tempo da avózinha! E as infelicidades de Ramada Curto! E o talento insólito de Urbano Rodrigues! E as gaitadas do Brun! E as traduções só pra homem do ilustríssimos excelentíssimo senhor Mello Barreto! E o frei Matta Nunes Moxo! E a Inês Sifilítica do Faustino! E as imbecelidades do Sousa Costa! E mais pedantices do Dantas! E Alberto Sousa, o Dantas do desenho! E os jornalistas do Século e da Capital e do Notícias e do Paiz e do Dia e da Nação e da República e da Lucta e de todos, todos os jornais! E os actores de todos os teatros! E todos os pintores das Belas-Artes e todos os artistas de Portugal que eu não gosto. E os da Águia do Porto e os palermas de Coimbra! E a estupidez do Oldemiro César e o Dr. José de Figueiredo Amante do Museu e ah oh os Sousa Pinto hu hi e os burros de cacilhas e os menos do Alfredo Guisado! E (o) raquítico Albino Forjaz de Sampaio, crítico da Lucta a quem Fialho com imensa piada intrujou de que tinha talento! E todos os que são políticos e artistas! E as exposições anuais das Belas-Arte(s)! E todas as maquetas do Marquês de Pombal! E as de Camões em Paris; e os Vaz, os Estrela, os Lacerda, os Lucena, os Rosa, os Costa, os Almeida, os Camacho, os Cunha, os Carneiro, os Barros, os Silva, os Gomes, os velhos, os idiotas, os arranjistas, os impotentes, os celerados, os vendidos, os imbecis, os párias, os ascetas, os Lopes, os Peixotos, os Motta, os Godinho, os Teixeira, os Câmara, os diabo que os leve, os Constantino, os Tertuliano, os Grave, os Mântua, os Bahia, os Mendonça, os Brazão, os Matos, os Alves, os Albuquerques, os Sousas e todos os Dantas que houver por aí!!!!!!!!!
E as convicções urgentes do homem Cristo Pai e as convicções catitas do homem Cristo Filho!...
E os concertos do Blanch! E as estátuas ao leme, ao Eça e ao despertar e a tudo! E tudo o que seja arte em Portugal! E tudo! Tudo por causa do Dantas!
Morra o Dantas, morra! Pim!
Portugal que com todos estes senhores conseguiu a classificação do país mas atrasado da Europa e de todo o Mundo! O país mais selvagem de todas as Áfricas! O exílio dos degredados e dos indiferentes! A África reclusa dos europeus! O entulho das desvantagens e dos sobejos! Portugal inteiro há-de abrir os olhos um dia - se é que a sua cegueira não é incurável e então gritará comigo, a meu lado, a necessidade que Portugal tem de ser qualquer coisa de asseado!
Morra o Dantas, morra! Pim!
*
José de Almada Negreiros
Poeta d'Orpheu
supérfluo ... mas imperdoável!
"...leva-me a recordar esse magnífico actor..."[*]
[*] Como é óbvio referia-me ao saudoso Mário Viegas.
e-pá,
Essa do Dantas aplicada ao PKM é mesmo despropositada. Se a aplicasse ao saudepe ou a um ou outro camarada bloguer faria mais sentido uma vez que se trata de pessoas que durante décadas estiveram envolvidos no Poder do SNS e, mais relevante, na formação dos dirigentes deste SNS. O tal SNS que permite o enriquecimento ilicito a uma minoria e nos coloca a todos sob os efeitos de ser um dos sistemas mais caros da Europa, que força classe média a recorrer ao privado e a seguros (e pagar outra vez pelo que já tinha pago em impostos), que promove a injustiça social, por exemplo, mantendo a classe “alta” feliz com acesso imediato, ilimitado e gratuito graças às suas redes sociais (vulgo ‘cunhas’) que lhe facilitam o “acesso” a custo zero e à frente de toda a “gentinha” e que permite que gente verdadeiramente ignorante e mediocre assuma posições de “gestão” por nomeação política.
Sim! Estes:
“Portugal que com todos estes senhores conseguiu a classificação do país mas atrasado da Europa e de todo o Mundo! O país mais selvagem de todas as Áfricas! O exílio dos degredados e dos indiferentes! A África reclusa dos europeus! O entulho das desvantagens e dos sobejos! Portugal inteiro há-de abrir os olhos um dia - se é que a sua cegueira não é incurável e então gritará comigo, a meu lado, a necessidade que Portugal tem de ser qualquer coisa de asseado!” Exactamente, e-pá. Estamos de acordo!
Por isso, o Dantas nunca poderia ser o PKM pois nuca esteve, nem estará, no Poder.
Compreendemos que o e-pà odeie o PKM (sabe-se lá o motivo) mas o vosso Dantas deve ser o Salvador de Mello (ou o pai), Sócrates, Santana Lopes ou o repugnável Paulo Portas.
Enxergue-se e não deturpe o génio de Negreiros.
Caro postador:
Basta pum basta!!!
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