"O Gestor ...
tem de ser criativo e empreendedor. Não pode ser só técnico” link
Gestão Hospitalar (GH) – Há também um fenómeno curioso que gostaria que analisasse. Existem hoje cerca de dois milhões de pessoas com acesso aos hospitais privados, devido aos seguros. Se nos reportarmos às Urgências vemos que o tempo médio de espera para atendimento é já idêntico ao dos hospitais públicos. Porquê?
Constantino Sakellarides (CS) – O País é o mesmo, não é? As diferenciações não estão nas características intrínsecas entre o público e o privado. Vou exemplificar. O público tem uma grande desvantagem na medida em que tem de estar aberto todos os dias, para toda a gente e para todas as doenças. O público não pode dizer “eu não faço hérnias”, ou “eu não faço cataratas porque não me convém”, ou “eu não quero ter urgências”, etc.
GH – Não pode seleccionar?
CS – Não pode seleccionar nem locais, nem horas, nem pessoas, nem patologias. Tem que fazer tudo.
GH – E deve continuar assim?
CS – Deve continuar assim – mal fora se não continuasse. Agora, as pessoas têm que perceber que há um preço a pagar por isto. As pessoas têm que entender que o público não foi criado para competir com o privado; o público nasceu para responder às necessidades básicas das pessoas.
GH – Mas há públicos que querem competir…
CS – Está bem… se estão a perder clientes! Mas isso não é a questão. O privado é complementar – estou a falar do privado lucrativo, porque também há o privado não lucrativo. O privado lucrativo tem accionistas que têm que zelar pelo seu dinheiro e, portanto, querem tirar mais-valias. E não há nada de errado nisso, o mundo funciona assim! Ora, continuando neste raciocínio, o privado pode dizer: “vou abrir este serviço e esta especialidade porque me interessa”. E não há qualquer problema. Não vejo nenhum mal em uma grávida dizer que quer ter o seu bebe numa maternidade privada, porque quer fazer o parto com aquele médico. O privado assegura isso…
GH – Liberdade de escolha.
CS – Mas outra pessoa pode dizer: “eu vou para o público porque me sinto mais segura. Pode não ser o meu médico a fazer-me o parto, mas eu confio na equipa”. Se eu quiser um quarto privado, com televisão com todos os canais e de alta resolução, não acho mal desde que pague. Mas se eu quero cuidados de qualidade quando preciso deles, a sociedade deve dar-me essa possibilidade sem pagamentos extra.
GH – Concorda com a opinião da ministra Ana Jorge, quando ela diz que os bebés prematuros não devem permanecer nos privados?
CS – Ela como pediatra sabe melhor isso do que eu. Com a ministra posso discutir com a pediatra não! Em todo o caso julgo que há aqui um problema. A garantia da qualidade deve ser igual para todos. Se existe um serviço de pediatra que não é idóneo, então deve ser fechado.
GH – Aí, as instituições também têm responsabilidades.
CS – Exactamente, mas todos sabemos que a nossa sociedade aceita mal os processos de Acreditação e, depois, queixa-se! Os que protestam contra o serviço público e as funções da regulação são os mesmos que abrem, depois, estas coisas pouco idóneas! Volto ao ponto: é este patamar de aceitar regras sociais – sempre, não só quando nos convém! – que caracteriza a sociedade que é capaz de ter aquele serviço de Saúde para todos e com qualidade .
Gestão Hospitalar (GH) – Há também um fenómeno curioso que gostaria que analisasse. Existem hoje cerca de dois milhões de pessoas com acesso aos hospitais privados, devido aos seguros. Se nos reportarmos às Urgências vemos que o tempo médio de espera para atendimento é já idêntico ao dos hospitais públicos. Porquê?
Constantino Sakellarides (CS) – O País é o mesmo, não é? As diferenciações não estão nas características intrínsecas entre o público e o privado. Vou exemplificar. O público tem uma grande desvantagem na medida em que tem de estar aberto todos os dias, para toda a gente e para todas as doenças. O público não pode dizer “eu não faço hérnias”, ou “eu não faço cataratas porque não me convém”, ou “eu não quero ter urgências”, etc.
GH – Não pode seleccionar?
CS – Não pode seleccionar nem locais, nem horas, nem pessoas, nem patologias. Tem que fazer tudo.
GH – E deve continuar assim?
CS – Deve continuar assim – mal fora se não continuasse. Agora, as pessoas têm que perceber que há um preço a pagar por isto. As pessoas têm que entender que o público não foi criado para competir com o privado; o público nasceu para responder às necessidades básicas das pessoas.
GH – Mas há públicos que querem competir…
CS – Está bem… se estão a perder clientes! Mas isso não é a questão. O privado é complementar – estou a falar do privado lucrativo, porque também há o privado não lucrativo. O privado lucrativo tem accionistas que têm que zelar pelo seu dinheiro e, portanto, querem tirar mais-valias. E não há nada de errado nisso, o mundo funciona assim! Ora, continuando neste raciocínio, o privado pode dizer: “vou abrir este serviço e esta especialidade porque me interessa”. E não há qualquer problema. Não vejo nenhum mal em uma grávida dizer que quer ter o seu bebe numa maternidade privada, porque quer fazer o parto com aquele médico. O privado assegura isso…
GH – Liberdade de escolha.
CS – Mas outra pessoa pode dizer: “eu vou para o público porque me sinto mais segura. Pode não ser o meu médico a fazer-me o parto, mas eu confio na equipa”. Se eu quiser um quarto privado, com televisão com todos os canais e de alta resolução, não acho mal desde que pague. Mas se eu quero cuidados de qualidade quando preciso deles, a sociedade deve dar-me essa possibilidade sem pagamentos extra.
GH – Concorda com a opinião da ministra Ana Jorge, quando ela diz que os bebés prematuros não devem permanecer nos privados?
CS – Ela como pediatra sabe melhor isso do que eu. Com a ministra posso discutir com a pediatra não! Em todo o caso julgo que há aqui um problema. A garantia da qualidade deve ser igual para todos. Se existe um serviço de pediatra que não é idóneo, então deve ser fechado.
GH – Aí, as instituições também têm responsabilidades.
CS – Exactamente, mas todos sabemos que a nossa sociedade aceita mal os processos de Acreditação e, depois, queixa-se! Os que protestam contra o serviço público e as funções da regulação são os mesmos que abrem, depois, estas coisas pouco idóneas! Volto ao ponto: é este patamar de aceitar regras sociais – sempre, não só quando nos convém! – que caracteriza a sociedade que é capaz de ter aquele serviço de Saúde para todos e com qualidade .
marina caldas, GH n.º 41
Etiquetas: Entrevistas
3 Comments:
A ministra da Saúde deixou ontem os líderes dos dois sindicatos médicos apaziguados, ao demonstrar uma "abertura completa" para apresentar uma nova proposta de diploma da revisão das carreiras e garantir que a avaliação de desempenho será adaptada à especificidade da profissão. Decidida ficou mesmo a constituição de um grupo de trabalho, com representantes dos sindicatos e do ministério, que vai elaborar o sistema de avaliação de desempenho específico para os médicos, adiantou Mário Jorge Neves, da Federação Nacional dos Médicos.
Presente no encontro, como os sindicalistas tinham reclamado, a ministra acabaria por responder afirmativamente às três exigências nucleares dos sindicalistas: comprometeu-se a integrar num único diploma os princípios gerais a que deve obedecer a revisão das carreiras e as questões ligadas à qualificação médica, aceitou que o novo documento não integre matérias que são do âmbito da contratação colectiva (como a questão do horário de 40 horas e a idade para a dispensa de fazer urgência) e não pôs de parte a hipótese de haver uma contratação colectiva única (que abranja também os médicos com contratos individuais de trabalho). Esta última questão é a que se afigura mais complexa, porque haverá lacunas e obstáculos a tal harmonização na lei da administração pública. Mas ficou decidido que os advogados dos sindicatos e os advogados do ministério vão estudar em conjunto as formas legais de tornear este problema. Até ao final da semana será marcada nova reunião. Alexandra Campos
A ministra Ana Jorge demonstrou uma abertura completa para negociar com os sindicatos médicos
JP 04.03.09
Vamos ver...
José Sócrates, decidiu jogar forte rumo a nova maioria.
Talvez uma nova oportunidade de salvação do SNS, no ano em que comemora 30 anos.
Duas "ideias-força" foram transmitidas pelo Prof. Constantino Sakellarides nesta entrevista à GH.
Estas concepções são extremamente importantes para compreendermos o posicionamento e a estratégia do SNS, ao fim de 30 anos de existência.
1º.) "O sector privado é complementar..."
Na verdade, independentemente, dos conceitos sociais sobre o papel do Estado como prestador de cuidados de saúde, as opções entre o sector público e o privado, estão fortemente condicionadas pelo factor económico dos cidadãos. Neste momento, o desenvolvimento de onerosos projectos privados é um jogo contra a corrente.
Mas o carácter complementar de uma função é sempre uma ilha no meio do Oceano. Isto é, um sistema universal terá sempre falhas, áreas de resposta deficiente, demoras, etc.
Este é o campo de acção complementar, onde se movimentam diversas e diferenciadas motivações: responder onde o sistema público falhou, captar por analogia, por assimilação, por antecipação e, depois, por habituação ou por técnicas de captação de "simpatia", doentes para outros cuidados, diferenciar-se em situações da medicina de conforto, etc.
Agora, dar o salto a partir desta situação restrita, para um papel de pivot na prestação de cuidados de saúde aos portugueses - mesmo com o crescimento das vendas de seguros de saúde - é megalomania, para não se chamar ostentação.
Muitas vezes confunde-se o carácter complementar pelo supletivo. Mas supletivo é o caminho que, p. exº., alguns HH's privados estão a apostar no sector oncológico. Como o investimento e a inovação pública, devido a circunstâncias económicas e problemas orçamentais do País tem sido reduzida, a oportunidade de suprir, substituir, nasce e tende a implantar-se. Este o grande risco.
2º.) "As pessoas têm que entender que o público não foi criado para competir com o privado"...
São cada vez mais frequentes as tiradas de "gestores de sucesso" (!) de HH's públicos, relativamente ao desenvolvimento estratégias de competição com o sector privado.
Em primeiro lugar esta estratégia é uma profunda deriva do substrato funcional do SNS.
Depois a competição traz no bojo a exaltação do antagonismo. O que pode ser fatal para os utentes do SNS.
Finalmente, haverá sempre a tendência para a imitação, que é sempre pior do que o original, isto é, a atracção pela emulação.
Temos verificado o enunciado desta filosofia de gestão, nomeadamente, no H. S. João (Porto), inclusive, perante altos responsáveis do MS.
Na verdade, o que pode estar em causa é o conceito de “empresialização” dos HH's públicos.
Não faltará muito para andarmos na senda do “empreendorismo”.
Os utentes neste mercado - gostaria de o caracterizar como se verifica também em relação à Educação como um "quase-mercado" -dependem de inúmeros factores subjectivos, como:
as opiniões da família e dos amigos, a distância entre a residência familiar e a instituição, a reputação da instituição, as opções dos colegas, etc.
A concorrência publica/privada, que com alguma insistência se vem alvitrando não possui qualquer racionalidade económica.
Isto para além de estar completamente de acordo com a afirmação do Prof. Constantino Sakellarides de que o SNS não foi criado para competir - é um sistema que no âmbito nacional pretende - sem o conseguir na totalidade como é lógico - ser universal.
ORDEM DOS ENFERMEIROS PROTESTA CONTRA ESTUDO DA ENTIDADE REGULADORA DA SAÚDE (ERS) E DESAFIA A ERS A FORMULAR NOVO TRABALHO
…”Após apreciação do «Estudo do Acesso aos Cuidados de Saúde Primários do SNS», uma iniciativa da Entidade Reguladora da Saúde (ERS) e que se encontra disponível no site da ERS, a Ordem dos Enfermeiros torna público o seu veemente protesto sobre o conteúdo desse documento, considerando-o redutor. Recorde-se que cuidados de saúde englobam o contributo multidisciplinar de vários profissionais, pelo que não são sinónimo de cuidados médicos.
Para o Conselho Directivo da Ordem dos Enfermeiros, o estudo em causa «é um atentado público, por enviesamento da questão de partida e de omissão na consulta aos utentes», refere o protesto formal da OE. Ou seja, na análise formulada pela ERS, não foi tida em linha de conta a prestação de cuidados por outros grupos profissionais que contribuem para o desempenho global dos centros de saúde, nomeadamente os cuidados de Enfermagem. Da mesma forma, também não foram consideradas as opiniões dos utentes.
Aos utentes «foi negada a possibilidade de se pronunciarem sobre as respostas em saúde que efectivamente lhe são dispensadas e a que têm direito. Apenas uma visão estreita não avalia as respostas que diariamente os enfermeiros asseguram às crianças, a jovens, adultos e idosos, entre muitos outros grupos de intervenção, nos centros de saúde e no domicílio», pode ler-se no protesto.
Assim sendo, «a Ordem dos Enfermeiros desafia a Entidade Reguladora da Saúde a colmatar com novo estudo a necessária análise do conjunto das variáveis que influenciam o acesso aos Cuidados de Saúde Primários, garantindo que utentes e profissionais sobre elas se pronunciem». Só assim se poderá elaborar um documento com «grande utilidade ao nível do planeamento em saúde (...), mas sobretudo para dar ao país um verdadeiro contributo para a análise do acesso aos CSP no SNS, eixo em que assenta a reforma da saúde”…
…/…
Se alguém tinha dúvidas sobre o papel e dos propósitos da ERS este “estudo” vem comprovar aquilo, que há muito, se suspeitava. Uma Entidade inútil, não isenta, perdida e mal preparada. Em boa verdade a ERS parece ter como único eixo estratégico criar condições para abrir espaço para o sector privado. O famigerado SINAS é disso um excelente exemplo. Para além disso o que vemos? Uma confrangedora falta de preparação teórica, técnica e científica. Um deambular hesitante por caminhos pouco claros. Pelo meio a produção de uns “estudos” para compor o ramalhete.
Se todos estivermos, convenientemente, atentos não será difícil antecipar as cenas dos próximos capítulos…
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