domingo, janeiro 3

Estratégia, precisa-se


Cara(o) Cotovia:
Não sei se haverá, sei que até agora não houve, pároco para esta freguesia.
Quero limitar-me à área em que, aqui, é suposto movermo-nos; por isso nada direi sobre o voto de 27 de Setembro e sobre o molho de brócolos que dele saiu, porque dizem que o povo é soberano e sábio, do que eu duvido; nem sobre a continuidade de um PM sobre o qual recaem suspeições como as que impendem sobre JS. Sejam fundamentadas ou não, a Justiça – da qual também não falo – que o diga; o que importa é o efeito demolidor, inegável, que provocam no capital de credibilidade necessário ao bom desempenho da função; neste domínio, o deficit parece bem mais pesado do que o das contas públicas. Mais consistente é o facto, admitido, de se ter mentido ao país, dizendo repetidamente, obviamente por razões eleitorais, que não era necessário orçamento rectificativo (redistributivo lhe vieram a chamar), e de se reconhecer em Dezembro na AR, pelo MF, que a evidência dessa necessidade existia desde Maio. Apesar de tudo, mantiveram-se ambos, como se nada tivesse havido, no exercício dos seus cargos. E também não quero falar dos Midia e da multidão de comentadores que nos apresentam e que todos parecem, agora, empenhados numa campanha de reabilitação de MFL, afirmando e glosando em vários tons, qual deles o mais negro, aquilo que ela dizia antes de 27 de Setembro.

Tudo isso arredado, voltemos à nossa paróquia? O que temos?
1. Um programa de cirurgia da obesidade, que deve ser saudado porque dele alguém beneficiará, mas que transmite, tal como o PIO já fez, a mensagem de que os problemas só se resolvem com a injecção de mais dinheiro. Neste caso e para já estão estimados mais 18 milhões de euros. Seguramente, não se trata de um incentivo à promoção da produtividade; pelo contrário, o SNS ficará mais longe de funcionar como devia.

2. A chamada Reforma dos Hospitais, com nomeação de uma equipa de projecto que dirá o que a reforma vai ser, sem qualquer enunciado de estratégia, mas que, previsivelmente, porá o acento tónico na generalização dos CRI e sem qualquer antevisão de custos implicados e do seu impacto na sustentabilidade do SNS;

3. Uma dotação adicional, creio que de 70 milhões de euros, da qual beneficiarão 15 hospitais, se não erro, porventura em pior situação que os restantes; o que pode parecer prémio à ineficiência.

4. A constatação de novas dívidas, depois do anuncio do propósito de pagamento das então existentes através de um fundo para tal constituído, em parte por afectação de capital social dos HH-EPE, dívidas essas que agora excedem 1.000 milhões.

5. A criação de um novo curso de Medicina no Hospital de Aveiro. Se é verdade que, como diz o Tavisto, o objectivo prosseguido – mais 120 médicos/ano – poderia ser atingido acrescentando 15 alunos a cada uma das 7 Faculdades já existentes (mais duas que, pelo índice internacional, nos caberiam, diz o Senhor Bastonário) não deixa de me espantar a razão da discordância por este assumida: dentro de cinco anos teremos desemprego médico. Se teremos ou não, não poderei afirmá-lo porque depende de muita coisa que se fará ou não; do que não tenho dúvidas é de que esta medida será mais um factor do crescimento da despesa no Hospital de Aveiro.

6. A não avaliação ou substituição conhecidas das equipas de gestão correlacionadas com os pontos 3 e 4. Pelos vistos, são todos bons ou excelentes, como os professores. Os resultados é que não, nem nas escolas nem nos hospitais; e não se conhecem estratégia ou sequer medidas avulsas que vão no sentido de os melhorar, apesar de, ao que parece, estarmos claramente na via da degradação e não da recuperação da sustentabilidade do SNS, pois não será de esperar do orçamento de 2010 a mesma generosidade que houve no 1.º OE da anterior legislatura, quando se tentou, pela primeira vez, um orçamento real para a Saúde.

Não incluo nesta resenha os processos em curso (ou adiados?) de revisão de carreiras dos profissionais de saúde que, no contexto que o país vive, me parecem de gritante inoportunidade, mas que, dependendo do seu conteúdo (vg exigir ou não o regime de exclusividade aos profissionais), poderiam, no longo prazo, ter impacto altamente positivo.

Para concluir, um voto para 2010: estratégia precisa-se; no SNS e nos serviços e instituições que nele se integram.

Aidenos

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6 Comments:

Blogger Joaopedro said...

Prémio ineficiência 2009

Depois de terem esgotado o Fundo de Apoio aos Pagamentos do Serviço Nacional de Saúde, devem fechar o ano com dívidas de mil milhões de euros. Para começar a resolver este problema, o Governo teve de reforçar o capital social dos hospitais EPE com 70 milhões de euros.

Eis a Lista dos Felizes contemplados:
Centro Hospitalar Barreiro Montijo recebe 8 milhões e o de Coimbra 2 milhões. Setúbal tem direito a 8,4 milhões de euros.

Lisboa Central fica com 3,4 e o Médio Tejo 3 milhões de euros. Já Barlavento Algarvio recebe 4,4 milhões. O Hospital de Faro tem 9,4 milhões, à Póvoa de Varzim e Vila do Conde chegam 4 milhões.

O Hospital de Barcelos recebe 1 milhão e o de Santarém recebe 6 milhões de euros.
O Hospital Garcia da Horta fica com 5.4 milhões, o de Aveiro com 8 milhões. Já a Unidade Local de Saúde da Guarda vai receber 2 milhões, a do Alto Minho apenas 1 milhão e a do Baixo Alentejo 4 milhões de euros.

Os grupos privados da saúde estão cada vez mais perto do assalto decisivo perante a inépcia, incapacidade deste Governo socialista.

3:44 da tarde  
Blogger saudepe said...

Tirando a introdução um tanto reacionária, estou de acordo no essencial com a análise do aidenós.

Este Governo tem desenvolvido uma cruzada de boas intenções.
Faltam resultados.
E até a obesidade necessita de um programa especial.
Os interesses das corporações (saúde, professores, justiça) estão a arrastar-nos para o abismo.

3:51 da tarde  
Blogger tambemquero said...

Os centros privados de tratamento da obesidade fi caram de fora do Programa de Tratamento Cirúrgico da Obesidade (PTCO), que ontem foi celebrado entre o Ministério da Saúde e 19 hospitais públicos, que se propõem realizar 3000 cirurgias/ ano, já a partir de 2010.
O programa, que arranca na próxima semana, aposta na redução do tempo de acesso a consultas multidisciplinares para tratamento da obesidade grave e pretende garantir o acesso à cirurgia de obesidade “em tempo adequado” e reforçar o papel do Serviço Nacional de Saúde na resposta às necessidades da população.
Manuel Pizarro, secretário de Estado da Saúde, enalteceu as virtualidades deste programa, que vai reduzir significativamente os níveis de espera dos doentes para a realização de uma cirurgia da obesidade.
O PTCO, cujo modelo segue as recomendações ditadas pela Comissão Nacional de Apoio ao Tratamento Cirúrgico da Obesidade (CNATCO), vai, assim, impor um “prazo máximo de espera provável de sete meses”. A partir de agora, sustenta o secretário de Estado, “nove meses passa a ser o tempo máximo de resposta a dar a um doente com obesidade grave”.
O objectivo “é aumentar em 65 por cento as cirurgias realizadas anualmente pelos hospitais públicos”.
O programa determina que os hospitais que não cumpram os nove meses para a marcação da cirurgia ficam obrigados a enviar a partir do sétimo mês um vale-cirurgia para o doente, o que lhe permite optar por uma unidade do sector privado.
“A abertura do PTCO ao sector privado só vai acontecer depois de esgotada a capacidade de resposta do sector público”, declarou, por seu lado, o coordenador do programa. Pedro Gomes explicou que “o programa visa potenciar a resposta dos hospitais públicos na resposta à cirurgia da obesidade”. António Sérgio, presidente da Sociedade Portuguesa de Cirurgia da Obesidade, concorda com os termos do PTCO mas discorda do facto de os centros privados de tratamento da obesidade terem fi cado de fora. “Os centros prepararam-se, apetrecharam-se, e agora vêm-se excluídos e isso está errado”, declarou António Sérgio ao PÚBLICO. Apesar de considerar que o programa “está bem feito”, o cirurgião, que integrou a CNATCO, entende que lhe falta ambição. “O programa é pouco ambicioso em termos de números.” E porquê? Porque os valores encontrados foram ditados pelos hospitais públicos.
Para o director clínico da Ordem do Carmo (Porto), as unidades privadas avançaram com números mais ambiciosos. “Por exemplo, o Instituto Cuf e a Ordem do Carmo avançaram com 40 cirurgias da obesidade/ mês, enquanto o Hospital Particular do Algarve propôs fazer 30 cirurgias”, disse, afirmando que é com alguma expectativa que aguarda pelos resultados do programa. Isto porque, notou António Sérgio, há hospitais públicos que “não se adaptaram à realidade”.

JP 30.12.09

6:54 da tarde  
Blogger aidenós said...

Caro Saudepe:

Nada me penalizaria retirar a introdução do texto. Não a teria escrito se tivesse de mostrar alinhamento fosse com quem fosse; não é o caso. Mas reaccionário por quê ?

- Por afirmar que houve suspeitas e que estas reduziram a credibilidade de J.S. ?
Então, para dar só um exemplo,não se demitiu A. Vitorino há anos, deixando a Justiça dar o seu veredicto sobre uma questão de que já poucos se lembrarão, de qual saiu ilibado e prestigiado, sem qualquer dúvida para ninguém?

- Por afirmar que, sendo repetidamente negada, a necessidade de um orçamento rectificativo era conhecida pelo Governo desde Maio ? Ouvi-o de TS na AR.

- Por dizer que muitos comentadores, depois de 27 de Setembro, parecem ter mudado de agulha e sustentam agora posições assumidas por MFL ? Estou só a constatar, mas admito que outros tenham outra opinião.

A questão estará aqui; é que nem eu, nem certamente o Saudeepe, podemos classificar de reaccionárias ideias ou atitudes de que não gostamos ou que gostaríamos que tivessem sido diferentes. Mas, "é a vida".

2:04 da manhã  
Blogger saudepe said...

Caro Aidenós,

Depois de ler o seu comentário reconheço que errei.

Não gostei da sua introdução.

JS comcorreu às recentes eleições em condições dificilimas. O povo mesmo assim elegeu-o.
Tudo o que agora se argumenta sobre desgaste é blá blá de oposição sem ideias, incapaz de constituir alternativa.

O Tavsto hoje num admirável comentário resumiu assim a triste situação que vivemos:

«Tenho para mim que o principal problema reside um pouco em cada um de nós. É evidente que as politicas contam e muito, mas sem uma sociedade civil exigente é difícil melhorar a qualidade dessas mesmas políticas e mudar o estado da Nação. E, há que reconhecer, temos uma sociedade civil amorfa e resignada, que convive facilmente com a corrupção, o nepotismo, a mentira e a falta de carácter de quem a governa ou administra a justiça. Não vale a pena citar nomes ou processos mediáticos, mas se as situações que ocorreram entre nós nos últimos anos tivessem ocorrido noutros países as consequências teriam sido seguramente outras.»

Se ser exigente não significa ofender, as minhas sinceras desculpas ao colega aidenós cujas intervenções aqui no saudesa muito aprecio.

4:40 da tarde  
Blogger aidenós said...

Caro Saudepe:

Não tinha que pedir desculpas, pois não considerei inamistoso, antes distraído, o seu Comentário. Errar acontece a qualquer, reconhecer o erro é que nem sempre. Fico a considerá-lo ainda mais.
Também apreciei muito o Comentário que cita, do Tavisto, como de resto sempre acontece.
Feliz e produtivo (também no Saudesa) 2010!

11:12 da tarde  

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