A “parábola do filho pródigo”…
O Decreto-Lei nº 89/2010 de 21 de Julho link que passa a regulamentar o regime de prestação de serviços em unidades do SNS de médicos aposentados [com ou sem recurso a mecanismos legais de antecipação] é mais uma grande efabulação sobre medidas extraordinárias de recrutamento de pessoal escamoteado sobre a bandeira da qualidade, quando na verdade pretende-se prolongar o tempo de serviço, com mínimos custos adicionais.
Diz-se no Portal da Saúde que este Dec-Lei pretende:
• Continuar a dar resposta à escassez de médicos em Portugal;
• Assegurar a manutenção dos cuidados de saúde a todos os cidadãos, desde cuidados prestados pelos médicos de família nos centros de saúde aos cuidados realizados noutros estabelecimentos do SNS;
• Contribuir para consolidar a prestação de cuidados de saúde com qualidade link
Nenhum destes parâmetros tem a ver com a condição de aposentados. São problemas candentes do SNS. A aposentação, nomeadamente aquelas em que o cidadão teve direito por ter reunido as condições legais estabelecidas, não o atinge na sua competência profissional. Portanto, o que está em causa não pode ser a qualidade dos cuidados.
Aposentado ou não, continua a ser médico com as mesmas competências que detinha no dia anterior à sua aposentação.
O verdadeiro problema, neste caso, foi a conformidade [ou inconformidade] da prestação de serviços no SNS com o Estatuto da Aposentação em vigor. Foi precisamente nisso que o presente Dec.-Lei pretendeu mexer, nomeadamente na prestação de serviços através de empresas, no quadro da celebração de contratos entre o SNS e empresas, enquanto pessoas colectivas de direito privado . Com os pés e com um enorme e mistificador alarde social.
Evocar aqui o facto de a nova regulamentação “consolidar a prestação de cuidados de saúde com qualidade" é um mero exercício retórico cada vez mais utilizado pelos legisladores, para esconder alguma coisa. De facto, a qualidade sendo um indicador de difícil mensuração passou a ser pau para toda a obra.
Mas hoje em dia estes malabarismos político-jurídicos escondem sempre alguma coisa. Perante a necessidade de “dar resposta à escassez de médicos em Portugal” optou por tentar recrutar – os médicos aposentados – com uma espécie de trabalho voluntário, com remuneração – em todos os casos – próxima da reforma.
Ora, os médicos aposentados não cometeram nenhum crime ao pedir a sua aposentação [supõe-se que os que o fizeram com recurso à antecipações foram duramente punidos no aspecto pecuniário pela lei], nem com essa condição estão a extorquir benefícios a que não tenham direito. É necessário desmascarar uma insidiosa ideia que se tenta entranhar nos cidadãos de que o aposentado é um gigolo social.
Se, de facto, o SNS vive com dificuldades em “assegurar a manutenção dos cuidados de saúde a todos os cidadãos” como se deixa antever no texto publicado no Portal da Saúde, o caminho escolhido é ínvio, melhor será desastroso. As razões invocadas para a “re-chamada” ao serviço público dos aposentados são a passagem de um atestado de menoridade sobre a melindrosa decisão [para qualquer funcionário] da aposentação. Subentende um passo (importante e pleno de consequências) de ânimo leve e que a um tímido aceno do MS estariam dispostos a transmutarem-se em “filhos pródigos”. Os que saíram do SNS fizeram-no por múltiplas – mas sempre imperiosas - razões. E o Dec.-Lei nº 89/2010 de 21 de Julho nada de novo introduz capaz de alterar essas razões.
Poucos ou nenhuns deverão regressar ao serviço público. E assim, o MS continuará a não controlar o progressivo êxodo [que como sabemos não é exclusivo dos médicos]. O MS continuará a viver o pesadelo de ter de lidar com as insanáveis dificuldades em “assegurar a manutenção dos cuidados de saúde a todos os cidadãos”. Essa dificuldade vai ser progressivamente agravada, mas sob a capa de sacrossantos princípios, isto é, em nome da garantia de que a utilização dos “recursos do SNS é feita de forma clara e transparente”, salve-se a honra do convento. Outra coisa serão os utentes…
Pena é que o Dec.- Lei não estipule a obrigatoriedade de periodicamente [6 em 6 meses, por exemplo] publicar o número de adesões a esta legislação. Servia ao menos para aquilatarmos da verdadeira dimensão do irrealismo e da alienação do MS em relação à gestão de recursos humanos no SNS…
E-Pá!
Diz-se no Portal da Saúde que este Dec-Lei pretende:
• Continuar a dar resposta à escassez de médicos em Portugal;
• Assegurar a manutenção dos cuidados de saúde a todos os cidadãos, desde cuidados prestados pelos médicos de família nos centros de saúde aos cuidados realizados noutros estabelecimentos do SNS;
• Contribuir para consolidar a prestação de cuidados de saúde com qualidade link
Nenhum destes parâmetros tem a ver com a condição de aposentados. São problemas candentes do SNS. A aposentação, nomeadamente aquelas em que o cidadão teve direito por ter reunido as condições legais estabelecidas, não o atinge na sua competência profissional. Portanto, o que está em causa não pode ser a qualidade dos cuidados.
Aposentado ou não, continua a ser médico com as mesmas competências que detinha no dia anterior à sua aposentação.
O verdadeiro problema, neste caso, foi a conformidade [ou inconformidade] da prestação de serviços no SNS com o Estatuto da Aposentação em vigor. Foi precisamente nisso que o presente Dec.-Lei pretendeu mexer, nomeadamente na prestação de serviços através de empresas, no quadro da celebração de contratos entre o SNS e empresas, enquanto pessoas colectivas de direito privado . Com os pés e com um enorme e mistificador alarde social.
Evocar aqui o facto de a nova regulamentação “consolidar a prestação de cuidados de saúde com qualidade" é um mero exercício retórico cada vez mais utilizado pelos legisladores, para esconder alguma coisa. De facto, a qualidade sendo um indicador de difícil mensuração passou a ser pau para toda a obra.
Mas hoje em dia estes malabarismos político-jurídicos escondem sempre alguma coisa. Perante a necessidade de “dar resposta à escassez de médicos em Portugal” optou por tentar recrutar – os médicos aposentados – com uma espécie de trabalho voluntário, com remuneração – em todos os casos – próxima da reforma.
Ora, os médicos aposentados não cometeram nenhum crime ao pedir a sua aposentação [supõe-se que os que o fizeram com recurso à antecipações foram duramente punidos no aspecto pecuniário pela lei], nem com essa condição estão a extorquir benefícios a que não tenham direito. É necessário desmascarar uma insidiosa ideia que se tenta entranhar nos cidadãos de que o aposentado é um gigolo social.
Se, de facto, o SNS vive com dificuldades em “assegurar a manutenção dos cuidados de saúde a todos os cidadãos” como se deixa antever no texto publicado no Portal da Saúde, o caminho escolhido é ínvio, melhor será desastroso. As razões invocadas para a “re-chamada” ao serviço público dos aposentados são a passagem de um atestado de menoridade sobre a melindrosa decisão [para qualquer funcionário] da aposentação. Subentende um passo (importante e pleno de consequências) de ânimo leve e que a um tímido aceno do MS estariam dispostos a transmutarem-se em “filhos pródigos”. Os que saíram do SNS fizeram-no por múltiplas – mas sempre imperiosas - razões. E o Dec.-Lei nº 89/2010 de 21 de Julho nada de novo introduz capaz de alterar essas razões.
Poucos ou nenhuns deverão regressar ao serviço público. E assim, o MS continuará a não controlar o progressivo êxodo [que como sabemos não é exclusivo dos médicos]. O MS continuará a viver o pesadelo de ter de lidar com as insanáveis dificuldades em “assegurar a manutenção dos cuidados de saúde a todos os cidadãos”. Essa dificuldade vai ser progressivamente agravada, mas sob a capa de sacrossantos princípios, isto é, em nome da garantia de que a utilização dos “recursos do SNS é feita de forma clara e transparente”, salve-se a honra do convento. Outra coisa serão os utentes…
Pena é que o Dec.- Lei não estipule a obrigatoriedade de periodicamente [6 em 6 meses, por exemplo] publicar o número de adesões a esta legislação. Servia ao menos para aquilatarmos da verdadeira dimensão do irrealismo e da alienação do MS em relação à gestão de recursos humanos no SNS…
4 Comments:
Como bem diz E-Pá!, o verdadeiro problema da aposentação em massa de médicos e não só, foi a conformidade [ou inconformidade] da prestação de serviços no SNS com o Estatuto da Aposentação em vigor.
A grande preocupação de Sócrates, soprado pelos argumentos de uma direita anti-serviço público, foi o de reduzir o papel do Estado sem mais. E aqui, nada mais fácil que cortar a eito no número de prestadores públicos. Não se cuidou de saber onde havia funcionários a mais, a lei era por cada x que saíam só um poderia entrar, valor de x (3:1, 5:1) que foi variando não em função das necessidades do País mas do menor ou maior grau de aversão ao “funcionário público” do decisor político. Assim, utilizou-se o princípio da rasa tratando todos por igual. Necessário era abater no número de funcionários, estivessem onde estivessem, fossem ou não excedentários, prestassem ou não um serviço social imprescindível.
E, aqui chegados, assiste-se a este espectáculo, que antecipa uma maior degradação dos serviços públicos, da saída em massa de profissionais qualificados nas áreas da Saúde, Educação e Justiça, aos quais, ao invés de lhes ser pedido que fizessem mais e melhor, lhes foi dada a ideia que estariam a mais, estendendo uma lei generalista e facilitadora da antecipação da reforma.
Neste particular, a situação dos médicos assume especificidade própria. Com um mercado privado de saúde em forte expansão, estimulado por alguma esquerda que agora grita “Ó da guarda” conhecidas que são as propostas do PSD para as áreas sociais, antecipar a reforma e ir trabalhar para o sector privado, auferindo um duplo rendimento, é uma opção quase que irrecusável.
Temos pois que esta lei é patética e poucas consequências práticas irá ter. Quem decidiu sair está de saída e se nada de objectivo for feito em defesa dos Serviços Públicos muitos mais continuarão a bater com a porta.
Publicado regime para contratação de médicos aposentados
Condições «não são minimamente apelativas»
As regras para os médicos reformados trabalharem no SNS não vão resolver as carências provocadas pelos mais de 500 pedidos de aposentação antecipada feitos só este ano. Quem o diz são os sindicatos, que estão preocupados com o futuro do SNS a partir de Setembro.
Já são conhecidas as regras que possibilitam a contratação de médicos aposentados por parte das instituições do Serviço Nacional de Saúde (SNS). Contudo, as condições impostas pelo diploma, publicado no Diário da República do passado dia 21, não são do agrado dos sindicatos médicos.
Sérgio Esperança, actual presidente da Federação Nacional dos Médicos (Fnam) explicou ao «Tempo Medicina» que as condições oferecidas aos clínicos já aposentados e aos que pediram a reforma antecipada em 2010 «não são minimamente apelativas» para que eles equacionem voltar ao SNS. É que, segundo argumenta o sindicalista, o diploma não apresenta nada mais do que condições financeiras, não existindo qualquer «outro tipo de incentivos» para aliciar os clínicos a regressar ao trabalho no sector público.
O decreto-lei, que estará em vigor nos próximos três anos, fixa que quem pediu a reforma antecipada será remunerado «de acordo com a categoria e o escalão detidos à data da aposentação», sendo que esta fica «suspensa no período de duração de contrato», lê-se no documento. Já os clínicos que se encontram aposentados, se quiserem voltar a trabalhar no SNS terão de escolher entre o vencimento e a pensão de reforma.
«TM» também tentou contactar Carlos Arroz, secretário-geral do Sindicato Independente dos Médicos (SIM), o que não foi possível até ao fecho desta edição. Mas, ao Diário de Notícias de dia 22, o sindicalista garantiu que as instituições do SNS «não vão conseguir contratar ninguém» se só oferecerem estas condições. E essa possibilidade deixa os sindicatos «preocupados com o que poderá ocorrer nos próximos meses», admitiu Sérgio Esperança ao nosso Jornal. Isto porque quem pediu a reforma antecipada este ano — cerca de 500 médicos, segundo os números avançados por Carlos Arroz ao DN —, ainda continua a trabalhar, mas os pedidos de reforma devem começar a ser deferidos pela Caixa Geral de Aposentações «lá para Setembro, Outubro». É nessa altura, diz Sérgio Esperança, que o «SNS irá sofrer algumas perturbações», com menos clínicos no terreno. Carlos Arroz disse mesmo àquele diário que em 2011 o número de utentes sem médico de família irá chegar ao milhão.
A estas regras, acrescenta-se o facto de ter de ser o Governo a determinar o número de médicos aposentados «que podem ser contratados num determinado ano», lê-se no diploma, sendo que terá de passar pela ministra da Saúde a autorização para a contratação, mediante o pedido da instituição da saúde interessada.
O decreto-lei proíbe ainda «o exercício de funções ou a prestação de cuidados» no SNS por parte de médicos aposentados, se estes estiverem contratados por empresas.
Negociação que não chegou a ser
O anúncio foi feito por Ana Jorge na ida à Comissão Parlamentar de Saúde, no dia 18 de Março deste ano. O Governo ia aprovar nesse mesmo dia, em Conselho de Ministros, medidas excepcionais para fazer frente ao elevado número de pedidos de aposentação antecipada por parte dos médicos (edição de 22/03/10).
Contudo, como contou Sérgio Esperança ao nosso Jornal, a negociação do diploma não correu como os sindicatos esperavam. É que ao contrário do que tanto SIM como Fnam exigiam, «o que houve foi uma audição» para apresentação do documento «e não uma negociação colectiva» como exigia a matéria em causa, argumentaram os sindicatos. «Da parte do Ministério da Saúde não havia intenção de negociar, nem foram atendidas as nossas propostas», lamenta o presidente da Fnam, acrescentando que «o Ministério da Saúde terá de «arcar com as responsabilidades inerentes à implantação destes critérios».
TM 26.07.10
Uma [...talvez insolente] pergunta aos juristas:
O art. 8º. do Dec.-Lei 89/2010 de 21 de Julho, do MS, excepciona as IPSS's?
Os médicos especialistas dos hospitais de Santa Maria e Pulido Valente, em Lisboa, vão ter de reorganizar o seu horário diurno, nos dias úteis, uma medida que pretende limitar o pagamento de horas extraordinárias na urgência interna.
A informação foi confirmada à agência Lusa por um membro do conselho de administração do Centro Hospitalar de Lisboa Norte, que agrega aquelas duas unidades, quando confrontada com uma notícia da TVI, avançando que estes dois hospitais iam deixar de ter médicos especialistas a fazer urgências internas.
De acordo com a fonte da Lusa, o conselho de administração deliberou, no passado dia 15, que "as escalas de urgência interna nos dias úteis [passassem a ser] elaboradas de forma a assegurar interinamente o período das 20:00 às 08:00".
DN 24.07.10
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