terça-feira, maio 31

Programa do PSD para a Saúde

É um retrocesso social gravíssimo link

Correia de Campos defende que “não é impossível” poupar nos gastos coma Saúde. “Não vai ser fácil”, reconhece, mas através dos medicamentos será possível poupar até 120 milhões de euros, só este ano. Um poupança que, contudo, não pode “cortar a inovação”. O antigo ministro da Saúde reconhece ainda que não há grandes ganhos de receita como aumento das taxas moderadoras.

Olhemos para as medidas impostas pela ‘troika’ na área da Saúde: reduzir a despesa pública em medicamentos até 1% em 2013…

Essa é a medida mais importante.

Mas temos ainda um aumento das taxas moderadoras, menos isenções no acesso do SNS com penalização das urgências e das consultas de especialidade, indexação automática das taxas moderadoras à inflação, redução em 2/3 das deduções fiscais em saúde, redução em 30% do custo da ADSE e dos sistemas de saúde de militares e polícias, só para citar algumas. É ou não uma mudança profunda do SNS?

Entre 2006 e 2007 poupámos 660 milhões de euros.

Mas, agora, tudo se complicou: a dívida a fornecedores já ultrapassa os mil milhões de euros, e o esforço terá de ser muito maior.

Não vai ser fácil mas não é impossível. Este ano teremos de poupar em medicamentos 120 milhões de euros, no próximo ano teremos de poupar ainda mais, e, em 2013, teremos de gastar menos 550 milhões de euros.

Como é possível alcançarmos essa meta?

Não podemos prejudicar o futuro e não podemos cortar a inovação, logo devemos prejudicar os medicamentos que já atingiram a maturidade. Devemos deixar uma folga para os medicamentos
que representam inovação que são mais caros. Nos medicamentos com maturação há uma querela que tem de ser resolvida: a de sistematicamente termos processos judiciais para travar a entrada de genéricos.

E quanto ao aumento das taxas moderadoras?

Não é daqui que vem grande receita. As taxas moderadoras significam 110 a 120 milhões de receita num orçamento de nove mil milhões. Quanto à indexação das taxas moderadoras à inflação, como propõe o FMI, eu fi-lo durante os anos em que lá estive. Embora me custasse muito ir ao Parlamento levar “pancada” da ultra-esquerda…

E, também, do seu próprio partido.

Mas isso é normal. Quanto às isenções: existem 55% de isenções, o que é difícil de justificar. As taxas moderadoras devem, ainda, facilitar as consultas nos centros de saúde e em ambulatório, e penalizar os acessos directos aos hospitais. As medidas na saúde estão bem calibradas, são duras mas com ganhos de eficiência é possível chegarmos lá. Por exemplo, com concentração de hospitais. Agora, a ‘troika’ não nos impôs uma mudança do SNS como está no programa do PSD.

Como assim?

O PSD propõe uma coisa que não está bem explicada: o plano nacional de benefícios. Creio que é um pacote mínimo de saúde que há 20 anos fazia escola nos países do terceiro mundo.

É um retrocesso?

Um retrocesso social gravíssimo que divide o país em dois: os do pacote mínimo e os que podem pagar ou ter acesso a um seguro de saúde. A radioterapia está no plano universal de benefícios do PSD?

O programa do PSD não esclarece que tipo de serviços serão incluídos nesse plano mínimo. Se o plano universal de benefícios incluísse o que é hoje o SNS porque falar neste plano universal de benefícios?

Hoje em dia temos mais de dois milhões de portugueses com seguro de saúde o que revela as fragilidades do SNS. São seguros muito parcelares. A despesa com seguros de saúde ascende apenas a seis pontos percentuais do financiamento da Saúde.

Mas porque existem tantos portugueses com seguro de saúde?

Está enganado, o seguro de saúde existe para franjas da população, para trabalhadores por conta de outrem em idade activa.

Leu o programa do PS para a saúde?

Sim, conheço-o muito bem. Até me foi pedida alguma colaboração.

Não ficou espantado por ter apenas uma página quando o programa em 2009 tinha nove páginas e meia? Até o programa da ‘troika’ para a Saúde é mais exaustivo do que o programa do PS.

Não confunda um programa político com um programa de ajuda financeira. O programa do PS não precisava de mais páginas porque as pessoas conhecem bem as políticas de Saúde do PS. Não sou eu que o digo, é a ‘troika’. Por exemplo, o aumento as unidades de saúde familiar.

Essa medida consta do programa do PS. Mas, só para lhe dar um exemplo, não existe nenhuma medida concreta para a reforma das taxas moderadoras.

O programa do PS tem 35 páginas e os estrategas da comunicação do PS entenderam que não era preciso especificar as medidas que eram bem conhecidas. Entendo que um partido que quer inverter o ciclo político, como o PSD, tenha feito um programa com mais de 100 páginas. Apesar de ter tantas páginas é omisso sobre saúde mental, cardiovasculares, oncologia, emergência médica, cirurgia do ambulatório, saúde reprodutiva da mulher, saúde oral, HIV, unidades móveis de saúde, cuidados continuados, saúde dos migrantes.

Fez esse mesmo levantamento para o programa eleitoral do PS?

Não é preciso.

O seu grau de exigência muda consoante o partido que avalia?

Não é um problema de duplo critério. Por exemplo, há um plano de saúde mental, há um plano oncológico nacional e um plano de prevenção das doenças cardiovasculares que estão em funcionamento. Isto nem precisa de ser referido, é um dado adquirido.

Só os partidos da oposição é que têm obrigação de explicar, ao pormenor, o que defendem?

A oposição é que tem de dizer o que quer fazer em relação a estes planos que estão em curso.

Correia de Campos, DE 30.05.11

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2 Comments:

Blogger tambemquero said...

A frase de Paulo Portas, há dias, segundo a qual o CDS se encontra agora mais à esquerda do que o PSD nunca poderia ter sido proferida até agora sem ser tomada como simples boutade política O que a tornou inesperadamente credível não foi nenhuma deslocação do primeiro para a esquerda mas sim uma notória deriva do segundo para a direita. Quais são as implicações desta transfiguração política?

(…) Tudo mudou com a chegada da Passos Coelho à liderança do PSD. Embora os sinais viessem de trás designada mente desde a proposta de Marques Mendes, há uns seis anos, de privatização substancial do sistema de pensões foi com o atual líder que apareceu uma agenda caracterizadamente neoliberal na esfera social e não somente na esfera económica. Desde o polémico projeto de revisão constitucional de há um ano até ao presente programa eleitoral em vista das eleições de 5 de Junho, tornaram-se claros os contornos da ofensiva laranja contra o “acquis social” pós revolução de 1975. Dela fazem parte, entre outros aspetos, o estabelecimento de um teto nas contribuições para o sistema público de pensões, desviando o resto para fundos de pensões privados a redução do SNS a um programa básico de cuidados de saúde, lançando o resto no mercado, ao mesmo tempo que se propõe a chamada liberdade de opção entre o sistema público e o privado, à custa do orçamento, o mesmo se propondo para o ensino, que seria rapidamente privatizado a expensas do Estado.

Quando o líder do PSD se permite dizer, aliás sem receio de contestação, que o seu programa eleitoral é bem mais radical do que o programa da troika, ele não quer referir-se somente às medidas de ajustamento orçamental e financeiro mas também ao programa de privatizações e, bem entendido, à referida reconfiguração dos três pilares básicos do Estado social que são a educação a saúde e a segurança social. O PSD conseguiu o que desde o verão de 2010 era o seu objetivo prioritário, ou seja, fazer tudo para forçar o pedido de ajuda externa, para depois utilizar as condições políticas daquela para alavancar uma ofensiva em forma contra o nosso Estado social. Antes de combater a crise orçamental, o PSD está sobretudo interessado em servir se dela para acionar o seu próprio programa económico, social e ideológico.

Como se não bastasse o fundamentalismo liberal em matéria económica e social, o líder do PSD resolveu inesperadamente juntar uma dose de reacionarismo ideológico, ao ensaiar um despudorado flirt com a cruzada da direita católica contra a despenalização do aborto. (…)

Ao ultrapassar o CDS pela direita, o qual adotou posições menos aventureiras e mais prudentes em qualquer dos referidos domínios, o PSD não questiona somente a dimensão social e o liberalismo moderado da sua herança política e doutrinária, por mais indefinida que esta fosse. Reposiciona-se também no nosso espectro político-partidário, baralhando as tradicionais fidelidades ideológicas e sociológicas Decididamente, o nosso sistema político não precisava de mais este fator de imprevisibilidade e de instabilidade…’

vital moreira, JP 30.05.11

12:16 da manhã  
Blogger tonitosa said...

Esta análise tipo entrevista de C. Campos é bem o exemplo de falta de seriedade política. Então se o que está a ser feito se traduz no programa do PS nem deveria o PS fazer campanha, com anúncio do que vai fazer aqui e acolá.
Estas tiradas de CC defacto só dão vontade de rir. Veja-se como são encaradas as taxas moderadoras em contradição com a análise de M. Pizarro.
Quanto a seguros, C. Campos devia/deve saber que uma grande maioria daqueles que têm seguro de saúde omitem esse facto quando vão aos hospitais públicos e por outro lado as seguradoras devem milhões de euros aos mesmos hospitais e esta situação é que tem que acabar.

11:12 da manhã  

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