domingo, maio 20

Carteira de Serviços

Para prestações garantidas

Numa «aula aberta» que deu no ISCSP, Leal da Costa falou da reforma do sector da Saúde, que mesmo cumprida à risca pode não garantir a sustentabilidade do SNS. A isso não será alheia a decisão de criar uma «carteira de serviços», com redefinição, ao que tudo indica, de exclusões e/ou adições.
Mesmo que as reformas em curso e planeadas sejam cumpridas, «com este modelo de financiamento» e devido às «características de generalidade de que se reveste, provavelmente o Serviço Nacional de Saúde [SNS] não será sustentável». A afirmação é do secretário de Estado Adjunto do ministro da Saúde, Fernando Leal da Costa, na linha, aliás, do que tem dito o titular da pasta, Paulo Macedo. Só que desta vez o substrato destes avisos foi mais bem detalhado.
Na «aula aberta» que foi convidado a leccionar no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP) da Universidade Técnica de Lisboa, no passado dia 15, o secretário de Estado justificou esta «verdade objectiva» da insustentabilidade do SNS com o actual padrão financiador, garantindo que «quem disser o contrário não sabe o que anda a dizer». E aqui surge o «plano de prestações garantidas», expressão contida no item «Saúde» do Programa do XIX Governo Constitucional — sujeita «a todas as especulações», como escreveu em Junho do ano passado Pedro Pita Barros —, e que, como clarificou agora Leal da Costa, tem a ver «exactamente com esta matéria [modelo de financiamento]», sem colocar «em causa o princípio constitucional de haver um SNS geral, universal e tendencialmente gratuito», mas «tendo em conta», ressalvou, «as condições socioeconómicas das pessoas».
Respeitando o guião programático do Governo, «temos de garantir que tudo aquilo que é absolutamente indispensável não deixa de ser prestado às pessoas», prosseguiu Leal da Costa, para depois lembrar que «neste momento o SNS já não é geral», porque, por exemplo, os cuidados dentários «não são de um modo geral prestados de forma universal e tendencialmente gratuita pelos serviços públicos — e se calhar há exclusões bem mais justificadas do que esta».
Carteira para uso externo e interno
Esta alusão permite antever o traçado da linha das prestações garantidas, cujo plano estará a ser pensado, tudo leva a crer, embora sem confirmação, em conjunto com «a definição de uma carteira de serviços», que segundo o secretário de Estado Adjunto do ministro da Saúde é «expressamente referida», e «não por acaso», no Programa do Governo. [Curiosamente, no documento oficial que é público não encontrámos tal expressão (ndr).]
Leal da Costa apontou a transposição da directiva comunitária de cuidados transfronteiriços como uma das razões — não a única — para a criação desse pacote de serviços, processo que disse estar já em curso. Como sublinhou, «temos de definir um preço para a carteira porque, se não o fizermos, isso levanta problemas que se prendem com o recurso a outras instituições que não do SNS», mesmo «dentro do território nacional». Além disso, acrescentou, «porque somos dos países mais generalistas em termos de prestação de cuidados, um qualquer cidadão português se for tratar-se a outro país» da União Europeia «tem direito à mesma carteira de serviços que teria em Portugal». Ora, concluiu, «se somos mais generalistas que os outros países, estamos sempre a perder». Daí que não seja difícil adivinhar que o até aqui enigmático «plano de prestações garantidas» assuma o formato de uma carteira em que algumas exclusões e, quiçá, adições vão ter guarida, na certeza de que, como garantiu o governante, «não estamos dispostos a abdicar do SNS, porque precisamos dele».
Tempo de Medicina 21.05.12 

O plano de prestações garantidas (pag. 78, programa XIX Gov) a servir de instrumento de racionamento às prestações de saúde do serviço público. Cá temos a direita neoliberal de novo a tentar utilizar a crise económica e financeira como álibi perfeito para a destruição do SNS-
Preparemo-nos para os hospitais públicos com gestão contratualizada à iniciativa privada ou social, com imposição de uma Carteira de serviços a prestar às populações, associados a níveis de despesa acordados, (número de consultas, por especialidade, por ano, número de cirurgias) e exclusões de serviços à medida dos orçamentos achados convenientes pelo MS.

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