sexta-feira, novembro 24

Avaliar para não Desperdiçar

A propósito de negligência médica e seguros, Pedro Nunes, bastonário da OE, decidiu brindar-nos com este discurso irresponsável: link
«O que tem acontecido até agora é os médicos serem responsabilizados por culpas alheias”. A partir de 1 de Janeiro, os médicos podem até utilizar as verbas do seguro para processarem o Governo ou as administrações hospitalares. Com a introdução da limitação de compra de medicamentos inovadores para controlar a despesa dos hospitais, é possível que os médicos se inibam de prescrever medicamentos que poderiam ser mais eficazes.
Resultado? “O médico pode ser considerado culpado por não ter usado uma tecnologia que não está disponível no hospital e aí a culpa não é dele, mas sim de quem não autorizou essa tecnologia”.

Em tese, continua o médico, pode até acontecer que, se um doente colocar um médico em tribunal por não lhe ter proporcionado uma determinada terapêutica que não chegou ao hospital por razões financeiras, esse médico accione judicialmente o conselho de administração ou o ministro da Saúde, por ter assinado um despacho a proibir, salvo excepções, a compra de medicamentos. O bastonário, no entanto, desvaloriza esta hipótese, dizendo esperar “que os políticos tenham sensibilidade e sensatez”.»
DE 24.11.06

É difícil encontrar tanta estupidez junta.
Os medicamentos hospitalares vão passar a ser avaliados pelo Infarmed. Se através desta avaliação se concluir que são eficazes (mais eficazes do que as terapêuticas disponíveis), o Infarmed proporá a sua aquisição aos hospitais.
Pretende-se com este processo que o Estado deixe de comprar os medicamentos que nada adiantam ao processo de tratamento dos doentes, poupando recursos que podem ser aplicados na aquisição de nova tecnologia, de eficácia devidamente comprovada, permitindo, assim, aos doentes do SNS o acesso permanente aos medicamentos mais eficazes.
Esta racionalização da utilização do medicamento contribuirá decisivamente para a redução do desperdício hospitalar.
Quanto aos novos seguros, senhor bastonário, não os desperdice a fazer política que os prémios são caros.

6 Comments:

Blogger tonitosa said...

Este post nem parece do Xavier. Está mesmo zangado com o Bastonário?
Em minha opinião ele não deixa de ter alguma razão.
Caro Xavier,
Olhe que há caos (que geralmente não saem do interior dos HH) em que os maus cuidados prestados são o resultado de alguma irresponsabilidade dos gestores e da própria tutela.
Ainda não há muito tempo, em determinado hospital, se correu o risco de não haver desfibrilhadores porque o CA hesitou, hesitou e hesitou, até decidir a aquisição de novo equipamento para substituir o que estava permanentemente a avariar.
Pergunto: em caso de morte por falta de adequada intervenção, a quem caberia a responsabilidade?
O Xavier certamente não ignora que os HH SA's (pelo menos alguns) fizeram seguros exactamente para cobertura de riscos desta natureza e outros julgados adequados. Esses seguros, aliás, abrangiam os próprios médicos.
Coma sabemos, tem havido casos de doentes do foro psíquico que se suicidam lançando-se pelas janelas dos HH. Pergunta-se: não devem ser responsabilizaods os HH por esse facto se se provar que as janelas não dispunham de adequado sistema de segurança?
Assim, não sei se estamos perante tanta estupidez junta!

11:48 da tarde  
Blogger xavier said...

É preciso separar as coisas.

Há muitas falhas nos nossos HHs.
Há falhas de todos os profissionais, induzidas ou não por diversas circunstâncias.

Mas não é isso que está em causa neste discurso do bastonário.
A guerra é outra.

Tem a ver, em meu entender, estritamente, com a gestão do medicamento.

O trabalho hospitalar é feito em equipa. No circuito hospitalar do medicamento (prescrição e dispensa) intervêm diversos profissionais (médicos, farmacêuticos e enfermeiros).

A introdução dos novos medicamentos tem sido feita até aqui pelos próprios hospitais.
Com a utilização dos critérios mais dispares. Muitas vezes sem critérios. Com forte influência da Indústria (informação médica, actividade dos DIMs).

A nova tecnologia não tem sido portanto avaliada segundo uma metodologia previamente definida, de forma uniforme em todos os hospitais, por peritos devidamente habilitados, com publicação das análises efectuadas.
Alguém já viu a documentação utilizada nos hospitais para avaliação dos medicamentos?

A centalização desta avaliação, se devidamente organizada, pode trazer racionalidade pode trazer racionalidade ao processo, traduzida em ganhos de eficácia terapêuica e poupança de milhares de euros.

É contra esta contrariedade, contra esta retirada de poder, contra esta decisão, que o bastonário da OM reage com este seu discurso sonso.

Talvez concorde neste ponto com o Tonitosa.
O discurso do bastonário da OM não é estúpido mas sonso.

12:32 da manhã  
Blogger tonitosa said...

Xavier,
Esta sua análise parece-me pertinente. E pode muito bem ser a razão para esta tomada de posição da OM.
A matéria de introdução de novos medicamentos é complexa e se aquilo que refere não o é...pelo menos por vezes parece sê-lo.
Penso que a introdução de novos fármacos deve sobretudo poder contar com a decisão de pessoas acima de toda a suspeita. E também não pode passar por longos e complicados processos burocráticos, tão carcaterísticos dos nossos decisores.
É tempo de acabarmos com a permanente suspeição e para isso têm que ser encontradas soluções que passem, sobretudo e em minha opinião, por regras claras e transparentes, seguidas de actuação implacável quando haja condutas eticamente reprováveis.
Se aqueles que muitas vezes criticamos actuações dúbias, nos temos por pessoas honestas, temos que admitir que outros o serão tanto como nós (estou a falar em abstracto, como é óbvio).
Mas há casos, e sempre haverá. Simplesmente a culpa, como sabemos, quase sempre morre solteira.
E não será pelo facto de a decisão sobre a introdução de novos medicamentos ser centralizada que deixará de se fazer sentir (pelo menos de forma tentada) a influência da Indústria. Muitas vezes, aliás, por intermédio de decisores de topo.

12:58 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Exige-se confiança nos Institutos públicos que gerem os dinheiros e as "coisas" públicas, sejam elas "medicamentos" ou "luvas cirúrgicas" sobre as quais falei há dias na minha caixa de desabafos.
Mas para que a confiança exista devem os institutos trabalhar para que ela seja criada. A informação e a formação o diálogo e o pedido de opinião, que raramente têm existido (reconheço de difícil implementação) são factores importantes para o alicerçar dessa confiança entre quem tem o poder de escolher e gerir e os que vão utilizar os produtos por outros escolhidos.
Talvez por isso esta desconfiança e este querer corporizar o que na minha opinião deve ser "cooperatizado". Mas "cooperatizado" depois duma escolha científica, dialogante e isenta de pressões, dos produtos ditos imprescindíveis para a actividade clínica e que são muitos. Não me refiro aqui ao modo da comparticipação pelo Estado, tão só a sua disponibilização comparticipada ou não por ele.
Os antibióticos são os mais problemáticos dentro do grupo dos medicamentos. Em que mais se exige um controlo institucional superior (Infarmed) e de base (hospitalar e ambulatório).
Mas enquanto que no campo Hospitalar esse controlo "educacional" é de mais fácil implementação com a existência das Comissões de Farmácia e Antibióticos e com protocolos actualizados por Serviços, já no regime ambulatório este controlo é de difícil efectivação.
Sem uma formação sólida de base por parte dos médicos e farmaceuticos no campo da utilização destes fármacos, com a "pressão" constante da indústria farmacêutica, com a medicina defensiva e a competitividade privada instalada, a utilização indevida de antibióticos é presa de difícil detenção.

5:04 da tarde  
Blogger xavier said...

A avaliação da nova tecnologia do medicamento é apenas uma pequena parte do universo mais vasto da gestão do medicamento.

A prescrição médica deve ser cada vez melhor informada, para aumentar a qualidade das decisões: eficácia terapêutica, racionalidade económica.

Os novos sistemas de prescrição "on line" já disponibilizam aos prescritores um vasto conjunto de informação que os poderá ajudar a decidir pela melhor solução.

E as melhores soluções terapêuticas coincidem quase sempre com as melhores decisões económicas.

É também indispensável a criação de protocolos terapêuticos que não são mais do que o acordo clínico sobre um conjunto das melhores práticas em relação à prescrição de medicamentos.
Mas Protocolos para cumprir e que, por isso, necessitam de ser permanentemente avaliados.

Quanto à prescrição do ambulatório terá naturalmente de ser avaliada o que requer sistemas de informação a funcionar com fiabilidade e actualidade.

Precisamos de ter informação actualizada e fiável sobre quanto custa ao SNS o tratamento do doente de ambulatório, quanto gasta em medicamentos, por patologia e por médico.

Esta informação permitir-nos-à estabelecer comparações para chegarmos à conclusão de quem utiliza as melhores práticas.

Na gestão não deverá haver lugar a desconfianças mas sim a um esforço conjunto para encontrar e implementar as melhores práticas.

No trabalho científico de avaliação da nova tecnologia também não deve haver lugar a desconfianças.
Há simplesmente bons e maus institutos. Bons e maus gestores.

Tomemos com exemplo de um bom Instituto a actuação do NICE do RU. É evidente que muitas das suas decisões causam inúmeras reacções, inclusivé, como aconteceu recentemente, de elementos do Governo dos EUA em defesa da sua Indústria Farmacêutica.

E as corporações, o poder das corporações não são práqui chamados. Mas existem. É mais um problema de gestão a resolver.

Esta intervenção do bastonário da OM, cheia de insinuações despropositadas, não tem nada de cooperante, parecendo mais um conjunto de declarações dirigidas para dentro, tentando ir ao encontro de algum núcleo duro da OM.

9:33 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Plenamente de acordo, Xavier.
Assim seria fácil, se todos se entendessem, se houvesse cooperação ao invés da defesa de interesses de classe despropositados e caducos.
Mas...

1:50 da manhã  

Enviar um comentário

<< Home