SNS - Sctor Público / Sector Privado
“A sangria provocada nos quadros dos HHs (Santa Maria, Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental e Hospital Garcia de Orta), terá já provocado a reacção do MS "que se prepara para restringir a acumulação de cargos dos directores de serviço e de médicos com lugares de chefia nos hospitais públicos e privados"”. (Post “Sector Privado em Expansão, de 28.11.2006)
Convenhamos que já não é sem tempo. A acumulação de tais cargos é ilegal desde o Estatuto Hospitalar, publicado em 1967! Mas há duas coisas em que dificilmente acreditaria:
1.ª Que o MS tenha de se preocupar com a sangria: médicos será o que menos falta nos HH agora referidos como alvos do sector privado, principalmente no HSM e generalizadamente nos chamados HH centrais; preocupante seria se a sangria se fizesse em Bragança, na Guarda, em Castelo Branco ou em Portalegre, pois que todos sabemos que, mais do que falta de médicos, temos uma má repartição, não só mas também de médicos, no território;
2.ª Também não acreditaria que fazer passar da lei para a prática dos HH a incompatibilidade dos cargos de direcção resolvesse o problema da promiscuidade do SNS, porque esta existe em todos os níveis da carreira médica, e não só. Centro-me na carreira médica por razões óbvias. Mas ela não tem o exclusivo da promiscuidade: haja em vista que há técnicos de laboratório a trabalhar em (ou que são directores de) laboratórios privados.
Aceitar que técnicos, médicos ou outros, sejam formados pelo Estado e recrutados, em qualquer fase da sua carreira, pelo Sector Privado, parece-me perfeitamente normal. Está conforme com a liberdade de circulação de pessoas e bens – um dos princípios base por que se rege a C.E. – e, antes disso, está de acordo com os direitos reconhecidos pela Constituição. Cabem ao Estado as responsabilidades na área da Educação e Formação. A participação dos HH, públicos ou privados, que participem nesta área, e que, por via disso suportam custos acrescidos, deve ser financiado correspondentemente, não se confundindo com o pagamento das prestações.
Sem ignorar que não sou o semmisericórdia e sem querer afastar o desafio que o saudepe lhe fez, para mim o desperdício é a diferença apurada entre os resultados esperáveis (possíveis de obter) e os obtidos dos recursos utilizados com vista à obtenção dos resultados visados. Qualquer processo produtivo mobiliza uma multiplicidade de recursos, donde deriva que o desperdício pode provir quer dos termos da sua combinação, quer da desadequação (em qualidade ou em quantidade) dos recursos humanos, materiais ou organizacionais utilizados. Por “termos da combinação” pretendo significar o ambiente, sobretudo as condicionantes externas (leis, normas, imposições …), no qual se desenvolve o processo produtivo. Para dar só um exemplo: a permissividade da lei ao abrigo da qual os profissionais liberais podem acumular funções no âmbito do SNS com o exercício profissional privado.
Por que falo eu disto? Apenas para afirmar que é na área dos recursos humanos que o SNS tem o maior desperdício. Por duas razões que não suscitam dúvidas:
- pelo seu peso específico – absorvem a maior percentagem dos recursos;
- porque, sem adesão motivada dos recursos humanos, nenhum projecto de redução do desperdício pode atingir o sucesso desejável.
Importante mesmo, é actuar ao nível das causas; manter as portas fechadas para que os assaltantes não entrem.
Eliminada que fosse a possibilidade de os profissionais trabalharem em acumulação no público e no privado, correríamos o risco de o Sector Público ficar sem médicos? Sinceramente, penso que não.
- primeiro, porque a transição deveria ser voluntária, embora apoiada por incentivos, mas não imposta, para os profissionais já vinculados definitivamente;
- segundo, porque, indiscutivelmente, é no sector público que estão reunidas as melhores condições de segurança, quer de equipamentos necessários perante qualquer intercorrência que não é de excluir, quer de competência e efectividade dos profissionais – e não devemos pensar apenas em médicos – o que nos leva a compreender a selecção de áreas de intervenção;
- depois, porque as grandes oportunidades do sector privado derivam mais da inaceitabilidade das listas de espera (incapacidade de resposta do sector público) do que de outras razões, por mais importantes que sejam as chamadas amenidades, de resto em melhoria nos HH do sector público.
Penso que se encontra aqui a razão justificativa da afirmação –verdadeira – do semmisericórdia de que temos a medicina privada mais cara da Europa; Pudera! Nestas condições, o sector privado não tem concorrência; quem pode tem que lá ir.
AIDENÓS
Convenhamos que já não é sem tempo. A acumulação de tais cargos é ilegal desde o Estatuto Hospitalar, publicado em 1967! Mas há duas coisas em que dificilmente acreditaria:
1.ª Que o MS tenha de se preocupar com a sangria: médicos será o que menos falta nos HH agora referidos como alvos do sector privado, principalmente no HSM e generalizadamente nos chamados HH centrais; preocupante seria se a sangria se fizesse em Bragança, na Guarda, em Castelo Branco ou em Portalegre, pois que todos sabemos que, mais do que falta de médicos, temos uma má repartição, não só mas também de médicos, no território;
2.ª Também não acreditaria que fazer passar da lei para a prática dos HH a incompatibilidade dos cargos de direcção resolvesse o problema da promiscuidade do SNS, porque esta existe em todos os níveis da carreira médica, e não só. Centro-me na carreira médica por razões óbvias. Mas ela não tem o exclusivo da promiscuidade: haja em vista que há técnicos de laboratório a trabalhar em (ou que são directores de) laboratórios privados.
Aceitar que técnicos, médicos ou outros, sejam formados pelo Estado e recrutados, em qualquer fase da sua carreira, pelo Sector Privado, parece-me perfeitamente normal. Está conforme com a liberdade de circulação de pessoas e bens – um dos princípios base por que se rege a C.E. – e, antes disso, está de acordo com os direitos reconhecidos pela Constituição. Cabem ao Estado as responsabilidades na área da Educação e Formação. A participação dos HH, públicos ou privados, que participem nesta área, e que, por via disso suportam custos acrescidos, deve ser financiado correspondentemente, não se confundindo com o pagamento das prestações.
Sem ignorar que não sou o semmisericórdia e sem querer afastar o desafio que o saudepe lhe fez, para mim o desperdício é a diferença apurada entre os resultados esperáveis (possíveis de obter) e os obtidos dos recursos utilizados com vista à obtenção dos resultados visados. Qualquer processo produtivo mobiliza uma multiplicidade de recursos, donde deriva que o desperdício pode provir quer dos termos da sua combinação, quer da desadequação (em qualidade ou em quantidade) dos recursos humanos, materiais ou organizacionais utilizados. Por “termos da combinação” pretendo significar o ambiente, sobretudo as condicionantes externas (leis, normas, imposições …), no qual se desenvolve o processo produtivo. Para dar só um exemplo: a permissividade da lei ao abrigo da qual os profissionais liberais podem acumular funções no âmbito do SNS com o exercício profissional privado.
Por que falo eu disto? Apenas para afirmar que é na área dos recursos humanos que o SNS tem o maior desperdício. Por duas razões que não suscitam dúvidas:
- pelo seu peso específico – absorvem a maior percentagem dos recursos;
- porque, sem adesão motivada dos recursos humanos, nenhum projecto de redução do desperdício pode atingir o sucesso desejável.
Importante mesmo, é actuar ao nível das causas; manter as portas fechadas para que os assaltantes não entrem.
Eliminada que fosse a possibilidade de os profissionais trabalharem em acumulação no público e no privado, correríamos o risco de o Sector Público ficar sem médicos? Sinceramente, penso que não.
- primeiro, porque a transição deveria ser voluntária, embora apoiada por incentivos, mas não imposta, para os profissionais já vinculados definitivamente;
- segundo, porque, indiscutivelmente, é no sector público que estão reunidas as melhores condições de segurança, quer de equipamentos necessários perante qualquer intercorrência que não é de excluir, quer de competência e efectividade dos profissionais – e não devemos pensar apenas em médicos – o que nos leva a compreender a selecção de áreas de intervenção;
- depois, porque as grandes oportunidades do sector privado derivam mais da inaceitabilidade das listas de espera (incapacidade de resposta do sector público) do que de outras razões, por mais importantes que sejam as chamadas amenidades, de resto em melhoria nos HH do sector público.
Penso que se encontra aqui a razão justificativa da afirmação –verdadeira – do semmisericórdia de que temos a medicina privada mais cara da Europa; Pudera! Nestas condições, o sector privado não tem concorrência; quem pode tem que lá ir.
AIDENÓS
6 Comments:
É conhecida a incapacidade de muitos hospitais fazerem a plena rentabilização da capacidade instalada, nomeadamente dos Blocos Operatórios.
Parece-me que é aqui, na incapacidade de ultrapassar esta dificuldade, que se alicarça o problema das Listas de Espera.
Quem trabalha nos hospitais ouviu sempre dizer que as listas de espera são uma invenção do pessoal médico para fazerem/manterem clientela dos consultórios privados.
É evidente que outros problemas explicam como o aumento da procura de cuidados de saúde.
A questão que eu queria pôr é se a "sangria" de determinadas especialidades médicas para o sector privado não irá comprometer o normal funcionamento de determinadas especialidades hospitalares?
Assim como o elevado grau de especialização de determinados médicos (estou a lembrar-me por exemplo da cirurgia cardíaca) não poderá igualmente prejudicar o desempenho hospitalar.
À medida que o sector público for transferindo a responsabilidade das prestações de cuidados para o sector privado, perderá, penso eu, naturalmente, a sua posição como sector onde se pratica o último estado de arte da prestação de cuidados. Esta situação causará também grandes modificações no mercado da saúde.
O que me parece é que quando a exploração dos hospitais do SNS tiver uma quota importante de prestadores privados, as condições de desenvolvimento das profissões: formação, especialização, remuneração , etc, irão piorar (depois de um período inicial de atracção de vacas gordas.
Sabemos que em Inglaterra e aqui ao lado, em Espanha, existem hospitais/clínicas dotadas da mais moderna tecnologia e recorrendo às melhores práticas. E sabemos como são geralmente procuradas. A questão que se coloca é a de sabermos como se fará a prestação de cuidados - em condições de acessibilidade e igualdade - em relação aos que não disponham de recursos para recorrerem a hospitais privados. Deverá o Estado convencionar serviços com os privados por forma a garantir aqueles princípios fundamentais? Mas se o fizer, isso não significará o fim do Serviço Nacional de Saúde, tal como hoje o entendemos? Creio que a resposta a ambas as perguntas é "sim".
Mas há opiniões de técnicos, nomeadaemte médicos, segundo as quais ficará mais barato ao Estado contratar serviços com privados do que prestá-los directamente nos hospitais públicos.
Estamos sempre confrontados com o duas realidades diferentes: a iniciativa privada naturalmente na busca da remuneração dos seus investimentos e a iniciativa pública orientada pelo princípio da máximização da satisfação dos doentes apenas limitada pela escasses de recursos.
As mudanças fazem-se sentir. O Serviço Nacional de Saúde deve ceder o passo a um Sistema Nacional de Saúde onde seja possível encontrar pontos de equilíbrio e complementaridades entre o Público e o Privado, assegurando-se o acesso universal e a igualdade. E naquilo que os privados possam e devam fazer de forma mais eficiente que o Estado, este deve optar pela contratualização.
As mudanças são possíveis e desejáveis mas exige-se seriedade, elevado conhecimento, responsabilidade e regulação (controlo).
A especialização dos médicos há-de continuar a fazer-se se a concorrência a isso obigar.
como bem se entende não é "escasses" mas sim escassez.
A Parceria Semmisericórdia / Aidenós, foi a melhor coisa que aconteceu à Saudesa nos últimos tempos.
Não vemos em nenhum lugar acontecer um debate tão aprofundado e oportuno sobre a Saúde.
Agradecemos ao semmisericórdia / Aidenós os ensinamentos e o brilhantismo das análises.
Não me parece ser a "estrela" dum Sistema Nacional de Saúde que deva ser a orientadora para a melhoria do nosso Serviço Nacional da Saúde. Este deve quanto a mim permanecer com os mesmos princípios já definidos e bem definidos. Não é a por certo o pretendido equilíbrio entre o sector público e o privado que vai deixar de reservar para o sector público o mais oneroso em termos de prevenção da doença, de rastreio, de tratamentos médicos ou cirúrgicos dispendiosos.
Capacidade económica têm os privados, para a aquisição de equipamentos tecnologicamente desenvolvidos, mas que são para os disponibilizar no atendimento dos seus "clientes ricos" e complementar a sua rentabilidade com as convenções "chorudas" com o Estado.
Por outro lado os privados continuarão a "escolher" os casos que mais rentabilidade e sustentabilidade dão à sua empresa.
Como? Exemplo duma Companhia de Seguros que protela e acaba por não se responsabilizar pela admissão dum sinistrado nos seus Serviços Clínicos pelo facto de ser previsível um tratamento prolongado em regime de internamento sem necessidade de intervenção cirúrgica. A mesma Companhia de Seguros, num outro caso em que o tratamento cirúrgico "está á cabeça", com um internamento previsível de curta duração, é a primeira a contactar os Serviços Públicos para "recuperar" o sinistrado para os seus Serviços Clínicos.
Dois pesos e duas medidas.
Será assim o futuro dum "sistema" dito nacional?
Acho que o Aidenós falhou nesta sua análise.
A "desnatação", como refere o Siracusa no seu oportuno comentário, dos nossos melhores profissionais dos HHs públicos, atraídos pelos $$$ das empresas privadas, poderá trazer enormes dificuldades ao funcionamento dos nossos HHs.
Se atendermos que existem carências graves de médicos de determinadas especialidades e que a formação de um médico especialista leva longos anos a fazer-se, podemos compreender as preocupações do secretário de estado expressas na conferência nacional dos hospitais.
Como diz o joao pedro: "a falta de recursos humanos de determinadas especialidades pode ser também indutor do desperdício."
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