Prescrição & Dispensa
O circuito de prescrição e dispensa de medicamentos aos utentes do SNS funciona com inúmeras dificuldades e troca regular de acusações entre médicos (prescritores) e farmacêuticos (dispensadores).
Numa nota recente do Simédicos “Os custos dos medicamentos” (23.01.07) link , pode ler-se:
(..) Simédicos não tem a pretensão de convencer o Sr. Ministro da conveniência de trilhar outros caminhos, mas os alertas e as sugestões aqui ficam:
1º Consta-se existirem promoções dos grossistas farmacêuticos nas farmácias do tipo compra 50 e entregamos 100, que desconhecemos se já foram investigadas pois, a serem verdade, parecem configurar um crime económico e fiscal. Será por isso que nalgumas farmácias é dispensado um dado genérico em vez do indicado na prescrição médica?
2º Acontece que por vezes o médico prescreve pelo mais barato e o doente é confrontado com a informação de que não está disponível / não está no mercado, apesar de ter AIM e constar no Simposium e na base de dados do SAM. Porque será?
3º Porque será que muitas vezes o médico prescreve a embalagem pequena de um certo medicamento e é fornecida a grande, pois segundo informação dada ao doente a pequena não existe?
4º Porque será que nas duas situações acima descritas, que implicam um maior encargo para o doente e para o SNS, na conferência de receitas elas são validadas e pagas sem qualquer penalização?
5º Porque será que os mesmos fármacos custam bem menos em Espanha e em França?
6º Porque será que o Plano de Reorganização da Farmácia Hospitalar (PRFH) criado pela resolução do conselho de ministros n.º 105/2000, e que previa o alargamento do atendimento das Farmácias Hospitalares aos doentes do ambulatório (dispensa de medicação de distribuição não exclusiva hospitalar) e urgência em horários de 24 horas, com um preço inferior do medicamento uma vez que no circuito de comercialização hospitalar não intervém o retalhista, foi, entretanto, extinto (resolução do CM n.º 136/2006 de 21.09.06) sem que esta medida tivesse sido implementada?
7º Porque é que foi posteriormente concessionada aos associados da ANF a criação de farmácias comunitárias, transplantadas para o interior dos hospitais, na sequência do recente pacto ANF/Governo?
8º Porque é que apenas para essas, e não para todas as exteriores, foi legislado no sentido de começarem a ser dispensados aos doentes medicamentos em unidose, assim disponibilizados na quantidade estritamente necessária ao tratamento, na posologia e duração prescritas pelo médico?
Há razões que a razão não compreende… ou compreende?
Por sua vez, a ANF, através de um estudo da CEFAR, link concluiu:
• do total de receitas comparticipadas pelo SNS, 47,8% continham medicamentos passíveis de substituição;
• a percentagem média de medicamentos prescritos apenas por DCI, por farmácia, foi de 13,4%;
• a percentagem média de medicamentos com autorização de substituição, por farmácia, foi de 54,8% e a percentagem média de medicamentos sem autorização de substituição, por farmácia, foi de 45,3%;
• a prescrição por DCI foi mais elevada nos Hospitais (22,9%);
• a média, por farmácia, de medicamentos passíveis de substituição em que o doente recusou a substituição foi de 33,0%;
• em média, por farmácia, 28,4% dos medicamentos prescritos por DCI + marca comercial ou titular de AIM em que o médico não autorizou a substituição eram medicamentos genéricos.
• apenas 12,9 por cento dos médicos receita medicamentos por DCI, quando tal "é obrigatório por lei (decreto de lei 271, de 2002 - "a prescrição de medicamentos contendo substâncias activas para as quais existam medicamentos genéricos autorizados é efectuada mediante a indicação da denominação comum internacional (DCI) ou do nome genérico" , é "admitido, a seguir a essa indicação, o nome de marca do medicamento ou o nome do titular da autorização de introdução no mercado (AIM), seguida em todos os casos da dosagem da forma farmacêutica e da posologia".
Um estudo Monitorização da Prescrição por DCI e Implemenação da Receita Médica , realizado pelo Infarmed com base na observação de 120.448 receitas no período de Fev a Jul 2004 (prescrição de 255.252 medicamentos com uma média de 2 medicamentos p/ receita), concluiu, entre outras coisas, o seguinte:
•origem das receitas : Centros de Saúde: 61,5%; Consultórios Privados: 18,7%; Hospitais: 12,7%.
• tipo de receitas: renováveis - 25,8%; não renováveis - 74,2%;
• prescrição p/ DCI - 15,1% das receitas; prescrição p/ marca - 84,9% das receitas;
• prescrição p/DCI obrigatória - 70,8% dos casos não cumpriram;
• não autorizaram dispensa de genéricos em 44,1% dos casos;
• prescrição p/DCI obrigatória, só foi autorizada a dispensa de genéricos em 3,1%dos casos;
• não se pronunciaram (=autorização) em 52,9% dos casos;
• autorizados (3,1%) + possibilitaram a substituição (52,9%) = 56% - total de casos em que houve dispensa de genéricos.
6 Comments:
Caro Xavier: penso que não é correcto colocar estes três documentos em pé de igualdade.
Os estudos do Infarmed e do Cefar são trabalhos científicos, feitos com base em elementos disponíveis para quem os quiser consultar e segundo metodologias claras.
O texto do Simédicos é apenas um documento político para consumo interno, com informações erradas, generalizações deliberadamente falaciosas e também ingenuidades engraçadas. Serve para o fim a que se destina (afirmação do Simédicos no interior da classe, atirar farpas ao Ministro da Saúde, Indústria Farmacêutica e ANF) e para mais nada.
Ao contrário do Infarmed e do Cefar, o Simédicos com este texto não acrescenta informação nova e fica-se apenas por especulações reincidentes.
Em relação ao seu comentário, Xavier, acaba por ser a linha mais interessante do post: de facto, não se pode ser pároco numa paróquia com regras tão absurdas... a questão da prescrição é um problema perante o qual nenhum MS deveria poder assobiar para o ar (como CC tem feito, enquanto se entretém a produzir falhanços legislativos e processuais para chatear a ANF) e é a causa de tudo o que as três entidades escreveram.
Não foi o SIMÈDICOS que inventou a greve selfservice???
Como o Vladimiro disse, parece-me um documento de tentativa de afirmação dentro da classe médica.
O texto do simédicos é recente contendo acusações graves relativamente ao processo de dispensa.
Por tratar-se de um documento recente com acusações graves, pensei que merecia ser analisado.
Pensei também que a melhor forma de o fazer seria confrontá-lo com a melhor informação disponível sobre a matéria.
Foi isso que fiz.
O curto comentário, além de uma provocação, poderá ser entendido, por cada um, como entenderem. Para mim foi um desabafo.
nota:Este comentário estava atrás do comentário do guidobaldo. Ao fazer a correcção ortográfica passou para depois.
Alguns factos indesmentíveis:
As Farmácias Portuguesas nunca foram uma parte do problema do sistema de saúde português.
As Farmácias Portugueses garantem e fornecem aos portugueses um bom acesso a produtos farmacêuticos a um nível de serviço aceitável.
O circuito de distribuição despensa funciona bem as margens mais baixos da Europa, com um nível de serviço entre os melhores do mundo.
As Farmácias Portuguesas não intervém em nenhum ponto do processo na produção do preço final de uma especialidade farmacêutica comparticipada. O preço dos medicamentos aprovado pelo MS e a DGE é um preço político e concertado, que não traduz os verdadeiros custos de produção fabril e matérias primas, só assim se justifica que produtores com sistemas de custos completamente díspares consigam aprovar preços de venda a armazenista exactamente IGUAIS sejam genéricos sejam similares. Onde anda a AdC no momento de aprovação dos preços de medicamentos?
A taxa de substituição de genéricos andará entre os 16 e 20 %, a maioria faz-se por substituição tácita e não por verdadeira autorização de substituição do médico. (Apenas 3,1% dos casos.)
Como o ministro prometeu um novo modelo de receita médica em que a substituição tácita deixará de ter lugar está-se mesmo a ver qual o impacto no mercado dos genéricos e na despesa do Estado desta medida...
As medidas de abaixamento generalizado dos preços em dois anos consecutivos em 6%, com abaixamento concomitante da margem da distribuição não vem resolver nenhum problema de fundo, apenas penalizam duplamente as Farmácias. São medidas que não poderão continuar indefinidamente por razões obvias. Aliás o aumento de consumo de Janeiro de 2007 relativamente a Janeiro de 2006 será certamente superior a 2 dígitos!!!
Caro Xavier: fez muito bem em trazer o assunto à baila. As acusações são de facto graves e merecem ser discutidas.
No entanto, embora o texto seja recente, o seu conteúdo não é novo: ciclicamente aparece alguém com idiotices destas. Pelo que percebo dos textos do Guidobaldo e do Eduardo Faustino, estamos todos já na outra fase - não vale a pena perder muito tempo a rebater quem está propositadamente a falar sozinho, pelo que mais vale aproveitar o mote para referir os principais problemas do sistema.
Um grande abraço
«Não é fácil ser páraco numa freguesia destas»
Pelo contrário!
É fácil quando se instalam guerrinhas fúteis, ocultando os verdadeiros problemas, e deixando impor o princípio "dividir para reinar".
Aliás esta mentalidade, funesta, está instalada em toda a sociedade e é aproveitada pelo Governo, que à vez vai diabolizando os funcionários públicos, os juízes, professores, médicos, polícias, notários, futebolistas... recolhendo o agrado, à vez, de todas as outras partes.
Só isso explica a esquizofrenia a que assistimos: todos, à vez, dizem que isto está a "bater no fundo" e as sondagens continuam a dar-lhes a maioria.
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