Rábula do Solstício
No solsticio de Inverno, o sol nasce mais a sul e os dias são ensombrados e curtos.
Na tradição ocidental, é também a época da matança dos porcos.
Os romanos criavam-nos, engordavam-nos e banqueteavam-se com as suas carnes, fígados, morcelas e torresmos.
Os gregos, pelo contrário, tinham por hábito, matá-los e depois sacrificá-los aos deuses.
Maomé não os podia ver e interditou a sua degustação aos islâmicos.
Era, portanto, um cerimonial datado, historicamente conotado, muito ligado à nossa civilização.
Com a evolução dos tempos toda esta azáfema, toda a ritualidade que envolvia esta tradição eminentemente rural, desde o aido, onde era “engordado” à força de sobras, à degola com faca de bico de duplo gume, ao silenciamento com o “fueiro” na boca, à sangria, aos alguidares, à chamuscadela com carqueja, ao “desmanche” e finalmente o pendurar exibicionista no chambaril, com o “véu” exposto nas patas dianteiras, desapareceu.
Nasceram os matadouros industriais e os “recos” morrem a tiro ou de electrocussão. É tudo limpo, asséptico, quase não se vê sangue.
As festividades que rodeavam estes rituais transferiram-se nas idas aos talhos ou, mais recentemente, às grandes superfícies comerciais, onde as carnes estão expostas artisticamente, sangrantes, vermelhas, para seduzirem o consumidor.
Morrem umas tradições, nascem outras, nem tudo se perde. O solsticio de Inverno é, hoje, dominado pela previsão orçamental para o ano que há-de vir.
Não há um ritual tão elaborado nem tanta impregnação artesanal. Toda esta parafernália pode ser substituída por um gestor e um computador. E, em vez das salgadeiras, tudo se condensa num CD prenhe de números, estatísticas, gráficos e quadros.
O ritual da matança era uma exaltação à convivialidade no mundo rural. As famílias e os vizinhos reuniam-se, fraternalmente, e 3 dias depois celebrava-se a tradição com uma refeição comunitária “a cachola”.
Hoje, o solsticio de Inverno, extirpado da tradicional matança, sendo artesanalmente mais pobre, é mais expedito, mas mantém-se cruento.
Destes cerimoniais, prevaleceram alguns ritos: a degola, a sangria e a chamuscadela.
A silenciosa degola dos postos de trabalho aos rigores orçamentais;
A incoercível sangria do desemprego.
O pestilento chamuscar de justas ambições.
Ah! Um novo elemento. Entretanto, descobriu-se a anestesia. A anestesia social administrada ad hoc nos Centros de Emprego, diluída num soro de flexibilidade.
Acabou-se a “cachola”. Cada um come para o seu lado. Uns carne do lombo, outros linguiças, outros ossos da “cabeçada”…
Comem, engordam, até ao próximo solisticio.
É-Pá
Na tradição ocidental, é também a época da matança dos porcos.
Os romanos criavam-nos, engordavam-nos e banqueteavam-se com as suas carnes, fígados, morcelas e torresmos.
Os gregos, pelo contrário, tinham por hábito, matá-los e depois sacrificá-los aos deuses.
Maomé não os podia ver e interditou a sua degustação aos islâmicos.
Era, portanto, um cerimonial datado, historicamente conotado, muito ligado à nossa civilização.
Com a evolução dos tempos toda esta azáfema, toda a ritualidade que envolvia esta tradição eminentemente rural, desde o aido, onde era “engordado” à força de sobras, à degola com faca de bico de duplo gume, ao silenciamento com o “fueiro” na boca, à sangria, aos alguidares, à chamuscadela com carqueja, ao “desmanche” e finalmente o pendurar exibicionista no chambaril, com o “véu” exposto nas patas dianteiras, desapareceu.
Nasceram os matadouros industriais e os “recos” morrem a tiro ou de electrocussão. É tudo limpo, asséptico, quase não se vê sangue.
As festividades que rodeavam estes rituais transferiram-se nas idas aos talhos ou, mais recentemente, às grandes superfícies comerciais, onde as carnes estão expostas artisticamente, sangrantes, vermelhas, para seduzirem o consumidor.
Morrem umas tradições, nascem outras, nem tudo se perde. O solsticio de Inverno é, hoje, dominado pela previsão orçamental para o ano que há-de vir.
Não há um ritual tão elaborado nem tanta impregnação artesanal. Toda esta parafernália pode ser substituída por um gestor e um computador. E, em vez das salgadeiras, tudo se condensa num CD prenhe de números, estatísticas, gráficos e quadros.
O ritual da matança era uma exaltação à convivialidade no mundo rural. As famílias e os vizinhos reuniam-se, fraternalmente, e 3 dias depois celebrava-se a tradição com uma refeição comunitária “a cachola”.
Hoje, o solsticio de Inverno, extirpado da tradicional matança, sendo artesanalmente mais pobre, é mais expedito, mas mantém-se cruento.
Destes cerimoniais, prevaleceram alguns ritos: a degola, a sangria e a chamuscadela.
A silenciosa degola dos postos de trabalho aos rigores orçamentais;
A incoercível sangria do desemprego.
O pestilento chamuscar de justas ambições.
Ah! Um novo elemento. Entretanto, descobriu-se a anestesia. A anestesia social administrada ad hoc nos Centros de Emprego, diluída num soro de flexibilidade.
Acabou-se a “cachola”. Cada um come para o seu lado. Uns carne do lombo, outros linguiças, outros ossos da “cabeçada”…
Comem, engordam, até ao próximo solisticio.
É-Pá
0 Comments:
Enviar um comentário
<< Home