A Integração dos Cuidados de Saúde (2)
O Prof. Manuel Delgado brilha pela síntese e clareza do seu texto sobre integração de cuidados e sobre a reforma dos CSP (USF).link
Aponta as «vantagens evidentes» das USF: maior acessibilidade, cumprimento de programas, satisfação de profissionais e cidadãos.
Refere com elegância (problemas):
Excessiva lentidão na implementação;
Inexistência de continuidade de cuidados – «atomização dos cuidados» e suas consequências negativas para o doente, para o SNS e para os profissionais envolvidos;
Problemas graves na referenciação de e para os CSP.
Conclui bem pela necessidade de «nova visão estratégica… sobre integração de cuidados…» referindo que «… reformas e programas têm MESMO que colocar o doente no centro do sistema» (o sublinhado é meu).
Nada contra. Trata-se de cumprir algumas das prescrições da Lei de Bases, que tem já 17 anos de incumprimento.
Política de saúde (Base II):
«…d) Os serviços de saúde estruturam-se e funcionam de acordo com o interesse dos utentes e articulam-se entre si e ainda com os serviços de segurança e bem-estar social;
e) A gestão dos recursos disponíveis deve ser conduzida por forma a obter deles o maior proveito socialmente útil e a evitar o desperdício e a utilização indevida dos serviços.»
Níveis de cuidados (Base XIII):
«…2) Deve ser promovida a intensa articulação entre os vários níveis de cuidados de saúde, reservando a intervenção dos mais diferenciados para as situações deles carecidas e garantindo permanentemente a circulação recíproca e confidencial da informação clínica relevante sobre os utentes.»
Características do SNS (Base XXIV):
«O Serviço Nacional de Saúde caracteriza-se por:
…b) Prestar integradamente cuidados globais ou garantir a sua prestação.»
Não subscrevemos as soluções que parece defender no penúltimo parágrafo do seu óptimo texto.
OPA sobre CSP: A experiência de integração vertical (hospital que detém CSP e cuidados continuados) que parece defender não apresentou, até agora, benefícios visíveis em:
Redução de desperdício (vide custos dos cuidados hospitalares e CSP);
Integração de cuidados (integração logística-administrativa apenas);
Resultados na saúde.
Hospitalocentrismo: Os seus «modelos de afiliação entre médicos de família e médicos hospitalares» mais não fazem que voltar o sistema de saúde (o SNS em particular) para o hospital, cativando e influenciando os CSP para o servirem. O que faz sentido é o contrário:
Aumentar o poder «resolutivo» dos CSP, com a colaboração dos médicos hospitalares através de cooperação (ensino e formação, difusão de inovações clínicas, consultoria de especialistas nos centros de saúde, por exemplo), de acordos de referenciação (admissão, alta) e de protocolos clínicos conjuntos;
Reforçar o «gatekeeping» responsabilizando os CSP pela escolha e pelo pagamento das prestações resultantes da sua referenciação – fomentando assim a escolha pelos CSP dos melhores hospitais e, na medida do possível e conveniente, substituindo cuidados que agora são realizados em meio hospitalar.
Há CSP que «mandam os doentes para hospitais por tudo e por nada» como há hospitais que retêm demasiado os doentes nas consultas e que nada fazem para evitar ou diminuir a afluência inapropriada à urgência.
Reconhece-se que o artigo é uma pedrada no charco, ao lembrar que os doentes continuam desaparecidos em muitas declarações, que parecem traduzir excessiva preocupação com os profissionais em vez de «centrar no doente»:
Como MD gostava de ver, entre o muito trabalho EXCELENTE produzido pela Missão, alguns textos visando a integração de cuidados e a melhoria em processos de tratamento (protocolos clínicos, recomendações sobre os aspectos de serviço e relação);
Não será preocupante que os «profissionais se identifiquem com a actual reforma por ser entendida como necessária e ser GERIDA PELA PRÓPRIA CLASSE» (o sublinhado é meu)? Não é por ser a melhor solução para os doentes e por produzir resultados ao nível dos restantes países Europeus, não apenas melhores que o terceiro-mundismo de muitos dos CS em que trabalhamos?
As referências à autonomia e ao trabalho de equipa são bem vindas. Mas por que não também à responsabilização pelos resultados na saúde, nos custos, etc., ao incentivo às boas práticas clínicas e ao combate à falta de produtividade, ao desleixo e ao deficiente atendimento dos doentes?
João Semana
Refere com elegância (problemas):
Excessiva lentidão na implementação;
Inexistência de continuidade de cuidados – «atomização dos cuidados» e suas consequências negativas para o doente, para o SNS e para os profissionais envolvidos;
Problemas graves na referenciação de e para os CSP.
Conclui bem pela necessidade de «nova visão estratégica… sobre integração de cuidados…» referindo que «… reformas e programas têm MESMO que colocar o doente no centro do sistema» (o sublinhado é meu).
Nada contra. Trata-se de cumprir algumas das prescrições da Lei de Bases, que tem já 17 anos de incumprimento.
Política de saúde (Base II):
«…d) Os serviços de saúde estruturam-se e funcionam de acordo com o interesse dos utentes e articulam-se entre si e ainda com os serviços de segurança e bem-estar social;
e) A gestão dos recursos disponíveis deve ser conduzida por forma a obter deles o maior proveito socialmente útil e a evitar o desperdício e a utilização indevida dos serviços.»
Níveis de cuidados (Base XIII):
«…2) Deve ser promovida a intensa articulação entre os vários níveis de cuidados de saúde, reservando a intervenção dos mais diferenciados para as situações deles carecidas e garantindo permanentemente a circulação recíproca e confidencial da informação clínica relevante sobre os utentes.»
Características do SNS (Base XXIV):
«O Serviço Nacional de Saúde caracteriza-se por:
…b) Prestar integradamente cuidados globais ou garantir a sua prestação.»
Não subscrevemos as soluções que parece defender no penúltimo parágrafo do seu óptimo texto.
OPA sobre CSP: A experiência de integração vertical (hospital que detém CSP e cuidados continuados) que parece defender não apresentou, até agora, benefícios visíveis em:
Redução de desperdício (vide custos dos cuidados hospitalares e CSP);
Integração de cuidados (integração logística-administrativa apenas);
Resultados na saúde.
Hospitalocentrismo: Os seus «modelos de afiliação entre médicos de família e médicos hospitalares» mais não fazem que voltar o sistema de saúde (o SNS em particular) para o hospital, cativando e influenciando os CSP para o servirem. O que faz sentido é o contrário:
Aumentar o poder «resolutivo» dos CSP, com a colaboração dos médicos hospitalares através de cooperação (ensino e formação, difusão de inovações clínicas, consultoria de especialistas nos centros de saúde, por exemplo), de acordos de referenciação (admissão, alta) e de protocolos clínicos conjuntos;
Reforçar o «gatekeeping» responsabilizando os CSP pela escolha e pelo pagamento das prestações resultantes da sua referenciação – fomentando assim a escolha pelos CSP dos melhores hospitais e, na medida do possível e conveniente, substituindo cuidados que agora são realizados em meio hospitalar.
Há CSP que «mandam os doentes para hospitais por tudo e por nada» como há hospitais que retêm demasiado os doentes nas consultas e que nada fazem para evitar ou diminuir a afluência inapropriada à urgência.
Reconhece-se que o artigo é uma pedrada no charco, ao lembrar que os doentes continuam desaparecidos em muitas declarações, que parecem traduzir excessiva preocupação com os profissionais em vez de «centrar no doente»:
Como MD gostava de ver, entre o muito trabalho EXCELENTE produzido pela Missão, alguns textos visando a integração de cuidados e a melhoria em processos de tratamento (protocolos clínicos, recomendações sobre os aspectos de serviço e relação);
Não será preocupante que os «profissionais se identifiquem com a actual reforma por ser entendida como necessária e ser GERIDA PELA PRÓPRIA CLASSE» (o sublinhado é meu)? Não é por ser a melhor solução para os doentes e por produzir resultados ao nível dos restantes países Europeus, não apenas melhores que o terceiro-mundismo de muitos dos CS em que trabalhamos?
As referências à autonomia e ao trabalho de equipa são bem vindas. Mas por que não também à responsabilização pelos resultados na saúde, nos custos, etc., ao incentivo às boas práticas clínicas e ao combate à falta de produtividade, ao desleixo e ao deficiente atendimento dos doentes?
João Semana
9 Comments:
Não posso estar mais de acordo com Joao Semana.
Tenho muitas dúvidas quanto à qualidade de cuidados nas USF, como as tenho em relação aos CS; naturalmente salvaguardando as honrosas excepções.
Será que os melhores médicos - os que têm "nome" e "saber de experiência feito" se dedicam às USF? E que equipamentos são na verdade disponibilizados para que seja feito o melhor diagnóstico ao utente?
Não estamos a exagerar na "consulta por telefone" e na repetição da receita médica sem observação do utente?
Aliás nos SU's começa a verificar-se que, entre os médicos de serviço, predominam os "aprendizes"! E parece que são cada vez mais frequentes os casos de diagnóstico incorrecto.
Neste artigo são afloradas hipóteses interessantíssimas.
Vou citar uma directamente e outra por "arrastamento" (ambas interligadas).
1º.) "reforçar o gatekeeping";
2º. ) citação colateral que MD já tinha referido no seu anterior artigo: "70 e 80% dos cuidados prestados ao nível da medicina familiar deveriam ser resolutivos"
Assim, seria importante saber:
- qual a % de casos "resolvidos" no âmbito dos CSP, em Portugal;
- a introdução do "gatekeeping" compulsivo e uma avaliação dos custos directos e indirectos (nos cuidados primários e secundários) e os resultados;
Finalmente, o SNS não é, estruturalmente, "hospitalocêntrico".
Tornou-se.
E seria - dentro da concepção do utente como a centralidade do Sistema - importante, também, encontrar as profundas e verdadeiras razões.
Mais um relatório! Mais uma "boa justificação": agora está melhor...porque antes estava mal; ou seja, continua mal mas isso não é importante?!...
"Lisboa, 22 Nov (Lusa) - O ministro da Saúde escusou-se hoje a comentar o relatório do Tribunal de Contas que aponta falta de rigor nas contas de 2006 do SNS, mas afirmou-se "optimista" face aos "progressos" na gestão financeira nas entidades do sector.
O relatório do TC hoje entregue no Parlamento conclui que "a informação económico-financeira consolidada do Serviço Nacional de Saúde, quer de 2005 quer de 2006, continua a não dar uma imagem verdadeira e apropriada da situação financeira" do SNS, nem "dos resultados do conjunto das entidades que integram o SNS".
A metodologia de consolidação "não garante que o resultado dessa informação seja exacto e integral", assinala o relatório sobre o "Acompanhamento da Situação Económico Financeira do SNS de 2006", com a data de 15 de Novembro.
Em declarações aos jornalistas no Parlamento, o ministro da Saúde, Correia de Campos, argumentou que ainda não leu o relatório, manifestando-se disponível para ir ao Parlamento "sempre o que o Parlamento o quiser".
Sobre as contas de 2005, Correia de Campos afirmou "ter razões" para "estar satisfeito", acrescentando estar "optimista" quanto à "capacidade de gestão" nas entidades do Ministério da Saúde.
O relatório do TC assinala que a informação económico financeira consolidada do SNS "continua a não dar uma imagem verdadeira e apropriada" da situação financeira do SNS "quer de 2005, quer de 2006".
Questionado pelos jornalistas sobre a falta ou os atrasos na entrega de informação consolidada por parte das entidades do sector, Correia de Campos admitiu que "isso existe" mas sublinhou "os progressos" conseguidos nesse campo.
"Isso existe, é possível que sim, mas deixem-me salientar os progressos que se fizeram", afirmou, referindo que o ministério sabe já "com bastante aproximação", dos resultados consolidados de Agosto e Setembro.
Na sequência da leitura do relatório, que considerou ser "arrasador" para o ministro da Saúde, o Bloco de Esquerda solicitou hoje com carácter de urgência a presença de Correia de Campos, bem como do presidente do Tribunal de Contas, Guilherme de Oliveira Martins, na comissão de Saúde."
Recordemos mais uma vez o que dizia CC, sobre as contas da Saúde, no tempo do seu antecessor!
A propósito to relatório do TC sobre as Contas da Saúde, do jornal SOL on line, retirei o seguinte comentário de um leitor:
"É a pouca vergonha.Esta gente não conhece os valores da verdade, da dignidade, da seriedade. É a lei do "vale tudo!" Como é possível tanta falta de senso, de mentira: Mentem, mentem, mentem... não são dignos de ser respeitados e deveriam ser responsabilizados e colocados no sítio certo. Há muita gente que por muito menos lá está... E a nossa Saúde vai de mal a pior! O nosso ministro da doença é simplesmente o descalabro!
1959Pinto, em 2007-11-22 22:39:33"
É este o estado das coisas. Com grande descaramento veio o Senhor Ministro fazer comparações com o relatório do tempo do seu antecessor. Mas afinal há quantos anos está CC em funções? Será que um agravamento de mais de 40% das dividas da Saúde não envergonha este governo e os dirigentes por si nomeados?!
Na sua recente visita aos Estados Unidos, José Sócrates e respectiva comitiva, hospedaram-se num luxuoso hotel.
Ao fim da tarde José Sócrates pega no telefone, liga ao serviço de quartos e diz:
- TU TI TU TU TU TU.
A funcionária não compreende o que quer dizer José Sócrates e, pensando que se trata de uma mensagem cifrada, avisa o FBI.
Num ápice, apresentam-se dois agentes do FBI que, postos ao corrente de tudo, mas não conseguindo decifrar a mensagem, decidem chamar a CIA.
Os serviços secretos mandam dois agentes ao hotel, os quais começam logo a investigar e a tentar decifrar a mensagem, mas sem qualquer resultado.
Entretanto, José Sócrates volta a telefonar e todos o ouvem repetir:
- TU TI TU TU TU TU.
Desesperados, os agentes resolvem recorrer ao tradutor oficial da Embaixada dos EUA, em Portugal.
Um caça supersónico do Pentágono desloca-se ao aeroporto de Figo Maduro, e o tradutor é conduzido, sem mais delongas, aos Estados Unidos.
Chegado ao hotel e posto ao corrente da situação, o tradutor disfarça-se de criado, vai aos aposentos de José Sócrates e......descobre o mistério:
O Primeiro-ministro português queria dizer, no seu inglês técnico (da Universidade Independente):
" two tea to 222"
Caro Tonitosa,
E eis que o Tribunal de Contas começa a entreabrir a porta do armário.
E o que vemos?
Ena! Tantos esqueletos!!!
Os brilhantes gestores EPE que substituiram a pândega dos SA (que os houve, reconheçamos!) revelam a verdadeira face!...
Só com a rotação democrática se conhecerá a dimensão do desastre CC (Correr prá Cama).
Não por o PSD ser 'moralmente' superior ao PS, mas por ser, decididamente, superior a 'este' PS...
A um partido sem qualquer sentimento de consciência social e completamente empenhado em fazer ascender ao poder os compadres, as comadres e os respectivos bichos de estimação...
Quem sofre? O cidadão! Mas esse não tem cartão rosa ou, tendo-o, não integra a nomenklatura reinante...
O fim aproxima-se!
BENEFICIÁRIOS DA ADSE RECORREM MAIS A CONSULTAS MÉDICAS DE ESPECIALISTAS
Os beneficiários do subsistema de saúde para funcionários públicos (ADSE) recorrem mais a consultas médicas da especialidade do que os restantes utentes do Sistema Nacional de Saúde, afirmou ontem o economista da Universidade Nova de Lisboa, Pedro Pita Barros no primeiro dia da 10.ª Conferência Nacional de Economia de Saúde, em Lisboa.
Pita Barros concluiu que, apesar de o acesso facilitado a cuidados de saúde, ser beneficiário da ADSE não estimula maior procura de serviços, mas há diferenças. Nos cidadãos que apenas podem recorrer ao sistema público 69 por cento das suas consultas são de clínica geral e as restantes da especialidade (31 por cento); nos beneficiários da ADSE a proporção é de 51 por cento de consultas de clínica geral e as restantes da especialidade (49 por cento).
Mas será que este acesso facilitado a consultas da especialidade, mais caras, trouxe aos beneficiários da ADSE melhorias de saúde face aos restantes cidadãos? De acordo com a análise do economista, não. Comparados os resultados sobre o estado de saúde auto-avaliado, com base no último Inquérito Nacional de Saúde, não há diferenças. Não havendo ganhos de saúde ficou então a questão: valerá a pena manter um subsistema que dá benefícios adicionais a 13 por cento de portugueses mas é pago com os impostos de toda a população?
O director da ADSE, Luís Pires, defendeu ontem que acabar com o subsistema "seria um mau negócio para o Estado". Por ano custa cerca de 900 milhões de euros, mas se terminasse teria que se "continuar a gastar este dinheiro e deixaria de se ter as contribuições dos beneficiários".
Os funcionários públicos contribuem com 1,5 por cento dos seus ordenados, mas a grande fatia vem do orçamento de Estado, 64 por cento, segundo números apresentados pela investigadora Sofia Nogueira Silva, da Universidade Católica do Porto, o que representa oito por cento dos gastos públicos em saúde.
A directora da Espírito Santo Saúde, Isabel Vaz, defendeu a manutenção da ADSE, porque o actual custo por beneficiário continua a ser menor do que um prémio de seguro no sector privado. E são cada vez mais os portugueses que recorrem a seguros de saúde "por insatisfação com o sistema público". "Os seguros de saúde têm crescido 14 por cento ao ano."
Público, 23.11.2007 por Catarina Gomes.
Ora bem. Temos aqui largo pano para mangas. A começar pela leitura dos números...
Se porventura o e-pá é (como aqui tem sido referido) um especialista em comichões será este João Semana um especialista em comixões ou um médico de medicina familiar que não gostava do ministro ?
Ah pois é !
AINDA SOBRE A ADSE
Todos conhecemos o caminho. É preciso não atacar de supetão os direitos sociais.
Convém começar pelos “regimes especiais” que, entre nós, designamos por “subsistemas”. No caso vertente a ADSE.
Primeira curiosidade: o subsistema já exista antes do Sistema.
Depois é preciso encontrar suportes técnicos, económicos e…veja-se lá – sociais! Primeiro, deve-se colocar em dúvida a sustentabilidade deste subsistema a médio prazo. Se ela estiver assegurada na próxima década, não se afligir. O governo admite projecções longas, quase a atingir um século (ver Estradas de Portugal) e a essa distância ninguém tem estudos prospectivos credíveis. Qualquer um pode dizer o que lhe vêm à cabeça.
A seguir a equidade. Não a do “Sistema” que é obvia, mas a equidade entre os trabalhadores. Todos devem ter direitos iguais poderá ser o lema. Portanto, deixa de haver “trabalhos pesados” ou “penosos”. Não há turnos (diurnos/nocturnos); não há a perigosidade de contactos com substâncias tóxicas, doenças, etc; não há o risco de tarefas pesadas (daquelas de usar capacete) ou sujeitas a intempéries. Nada disso. “Nivelar” tudo pelo mais simples, i.e., pelos menores custos. Um coveiro e um administrador bancário devem ser tratados de igual para igual. Como se ambos tivessem a mesma “esperança de vida”.
E assim, a mole de gente que se arrasta desde a madrugada pelas portas dos CS, deve contar com a fraterna companhia dos funcionários do Estado. Por se não partilharmos isso, estamos a cometer discriminação.
Há, um outro pormenor. As contribuições dos FP para o subsistema. Subsidiam em cerca de 36% o subsistema (8% dos gastos públicos em Saúde). Isto, parecendo alguma coisa, em nada alivia o SNS. Retira-se o ADSE aos FP e a partir daí não são de supor mais custos. Isto é, os actuais beneficiários da ADSE passam-se de armas e bagagens para os seguros ou para o sector privado. Cheios de vícios e mal habituados em questões de acesso, não se sujeitarão às condições gerais do SNS.
A dificuldade é manter as receitas (1,5% dos ordenados). Inventar uma taxa que modere o acesso – actual e/ou futuro (não importa). Desconta-se 1,5% porque não há condições para suprimir a taxa. Pode ser anunciado que servirá para melhor a qualidade dos serviços e dos cuidados. Como não existe indicadores seguros e fiáveis sobre os índices qualitativos, pode ser anunciado o que vier no momento à cabeça. Cuidado! temos um inquérito “auto-avaliado” sobre o estado de saúde. Será mesmo “estado” ou satisfação?
E a partir daqui é possível construir a derrocada.
No sistema público 69% das consultas são de clínica geral? Sabemos do que estamos a falar?
Que tipo de consultas: transcrição de prescrições, pedidos de exames complementares, renovação de baixas, sessões de ensino para a saúde, visitas "ad limina" (como o beija-mão dos bispos ao Papa)?
Vamos, p. exemplo, à região Centro. Temos cerca de 1 milhão de consultas externas hospitalares a par de 1 milhão de urgências (hospitalares). Neste milhão de “urgências” quantas consultas de clínica geral – por patologia aguda ou de rotina – cabem neste “esforço” hospitalar? À volta de 40%?. E desses que percentagem são da ADSE?
Com tais distorções vale a pena acrescentar ao consumo, aquilo a que se chama diferenças ou é preciso melhores dados.
Dizer que a ADSE dá benefícios adicionais aos seus aderentes (a 13% da população) à custa do Orçamento de Estado é lançar uma acha para a fogueira.
Benefícios quantificáveis? Podem ser 8% ( a contribuição para os gastos públicos em Saúde), ou serão mais? E já agora poderão ser menos?
A capacidade de lidar exibindo alguns malabarismos com números, índices, indicadores, estatísticas, com inquéritos de “auto-avaliação”, impressiona-me.
Tanto, como a incapacidade em apreender a realidade profunda da prestação de cuidados, na sua globalidade. Seja no SNS que, por definição, já é de todos, seja nos subsistemas, como a ADSE.
Melhor seria, com outra metodologia, auditar os números e requalificar os benefícios.
Começar de novo…
Já agora o poema de Ivan Lins e Vítor Martins:
“Começar de novo e contar comigo
Vai valer a pena ter amanhecido
Ter me rebelado, ter me debatido
Ter me machucado, ter sobrevivido
Ter virado a mesa, ter me conhecido
Ter virado o barco, ter me socorrido
Começar de novo e contar comigo
Vai valer a pena ter amanhecido
Sem as suas garras sempre tão seguras
Sem o teu fantasma, sem tua moldura
Sem suas escoras, sem o teu domínio
Sem tuas esporas, sem o teu fascínio
Começar de novo e contar comigo
Vai valer a pena já ter te esquecido
Começar de novo”.
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