Olá, sr. Socialismo !
Vêm aí tempos difíceis para os pragmáticos. Terá começado um período dominado por românticos e prática discursiva da subjectividade?
Muitos analistas esperam, da nova equipa ministerial, uma alteração de enfoque discursivo para as políticas de Saúde. Nesse sentido, vale a pena partilharmos dois temas que poderão contribuir para a análise de algumas tensões que vão influenciar e, potencialmente, delimitar esse desenvolvimento.
Um primeiro tema, será se a nova prática discursiva abandonará a utilização do conceito de Sistema Nacional de Saúde substituindo-o, primordialmente, pelo conceito de Serviço Nacional de Saúde. A substituição, a ocorrer, não tem efeitos meramente semânticos pois, dos pontos de vista conceptual, ideológico e até jurídico, exprime duas visões distintas no que diz respeito, sobretudo, às alternativas a oferecer às populações e aos fluxos de investimento e financiamento dos serviços prestados. Esta distinção merece toda a atenção uma vez que será um sinal importante para a redefinição dos ‘dossiers’ e prioridades até meados de 2009. Para os investidores e parceiros das organizações do sector público este não é um tema insignificante e a opção ideológica começará a tornar-se clara após o esclarecimento nas primeiras aparições discursivas da nova equipa. Por outras palavras, vamos observar uma prática discursiva de defesa do Serviço Nacional de Saúde fechado sobre si mesmo? Ou, em contraste, vamos assistir a uma prática discursiva de defesa dos interesses das populações através da promoção de novas respostas promovidas em parceria pelos sectores não-lucrativo (social ou terceiro sector) e privado conforme assumido desde 2002 até faz agora alguns dias? A tensão discursiva entre as definições de Serviço Nacional de Saúde e Sistema Nacional de Saúde será central na opção ideológica assumida.
Um segundo tema a observar, será saber se a nova prática discursiva abandonará a promoção do conceito da intervenção intersectorial e multi-profissional. Se, por um lado, nos merece grande admiração a estatura humanista da nova srª ministra da Saúde, por quem nutro enorme simpatia pessoal, por outro lado, a entrega do poder político a um membro de um dos grupos profissionais da saúde deverá deixar-nos curiosos e atentos às circunstâncias que poderão enfraquecer a capacidade de resistir às pressões da sua própria profissão assim como dificultar a dinâmica de liderança e promoção da participação das outras profissões da saúde nos processos de modernização organizacional iniciados pela anterior equipa ministerial. Ou seja, até que ponto será possível promover o ambiente de paz e harmonia pré-eleitoral que se pretende e que terá justificado a opção do primeiro-ministro nesta fase crucial das reformas? Eis um desafio às competências técnicas de liderança e comunicação estratégica da nova equipa ministerial. O ‘novo’ discurso poderá apaziguar as populações locais, se lhes prometer o que é exigido. Porém, pode não ser suficiente para apaziguar as tensões internas do próprio sistema de Saúde...
Durante várias décadas do séc. XX, a discussão das políticas de saúde e a avaliação económica elaborada para o contexto dos sistemas de Saúde esteve centrada nos tratamentos e tecnologias de diagnóstico e apoio na doença. Contudo, desde meados dos anos de 1990 passou a ser reconhecido que muitas medidas e intervenções, com efeitos na promoção da saúde das populações, encontram-se em outros sectores como o ambiente, o planeamento urbanístico, a educação, os programas de higiene e segurança no trabalho, a adopção de comportamentos de alimentação saudável, a melhoria dos salários mais baixos, melhoria das estruturas de apoio social ou melhorias no ambiente físico em que os cidadão vivem. Esta nova abordagem internacional seria desejável para Portugal. Curiosamente, António Negri, na sua obra recente intitulada “deus, sr. Socialismo”, discute o novo papel da ideologia socialista na Europa. A Saúde, em Portugal, poderá fomentar esse debate?
Vêm aí tempos difíceis para os pragmáticos. Terá começado um período dominado por românticos e prática discursiva da subjectividade?
PKM, DE 07.02.08
Muitos analistas esperam, da nova equipa ministerial, uma alteração de enfoque discursivo para as políticas de Saúde. Nesse sentido, vale a pena partilharmos dois temas que poderão contribuir para a análise de algumas tensões que vão influenciar e, potencialmente, delimitar esse desenvolvimento.
Um primeiro tema, será se a nova prática discursiva abandonará a utilização do conceito de Sistema Nacional de Saúde substituindo-o, primordialmente, pelo conceito de Serviço Nacional de Saúde. A substituição, a ocorrer, não tem efeitos meramente semânticos pois, dos pontos de vista conceptual, ideológico e até jurídico, exprime duas visões distintas no que diz respeito, sobretudo, às alternativas a oferecer às populações e aos fluxos de investimento e financiamento dos serviços prestados. Esta distinção merece toda a atenção uma vez que será um sinal importante para a redefinição dos ‘dossiers’ e prioridades até meados de 2009. Para os investidores e parceiros das organizações do sector público este não é um tema insignificante e a opção ideológica começará a tornar-se clara após o esclarecimento nas primeiras aparições discursivas da nova equipa. Por outras palavras, vamos observar uma prática discursiva de defesa do Serviço Nacional de Saúde fechado sobre si mesmo? Ou, em contraste, vamos assistir a uma prática discursiva de defesa dos interesses das populações através da promoção de novas respostas promovidas em parceria pelos sectores não-lucrativo (social ou terceiro sector) e privado conforme assumido desde 2002 até faz agora alguns dias? A tensão discursiva entre as definições de Serviço Nacional de Saúde e Sistema Nacional de Saúde será central na opção ideológica assumida.
Um segundo tema a observar, será saber se a nova prática discursiva abandonará a promoção do conceito da intervenção intersectorial e multi-profissional. Se, por um lado, nos merece grande admiração a estatura humanista da nova srª ministra da Saúde, por quem nutro enorme simpatia pessoal, por outro lado, a entrega do poder político a um membro de um dos grupos profissionais da saúde deverá deixar-nos curiosos e atentos às circunstâncias que poderão enfraquecer a capacidade de resistir às pressões da sua própria profissão assim como dificultar a dinâmica de liderança e promoção da participação das outras profissões da saúde nos processos de modernização organizacional iniciados pela anterior equipa ministerial. Ou seja, até que ponto será possível promover o ambiente de paz e harmonia pré-eleitoral que se pretende e que terá justificado a opção do primeiro-ministro nesta fase crucial das reformas? Eis um desafio às competências técnicas de liderança e comunicação estratégica da nova equipa ministerial. O ‘novo’ discurso poderá apaziguar as populações locais, se lhes prometer o que é exigido. Porém, pode não ser suficiente para apaziguar as tensões internas do próprio sistema de Saúde...
Durante várias décadas do séc. XX, a discussão das políticas de saúde e a avaliação económica elaborada para o contexto dos sistemas de Saúde esteve centrada nos tratamentos e tecnologias de diagnóstico e apoio na doença. Contudo, desde meados dos anos de 1990 passou a ser reconhecido que muitas medidas e intervenções, com efeitos na promoção da saúde das populações, encontram-se em outros sectores como o ambiente, o planeamento urbanístico, a educação, os programas de higiene e segurança no trabalho, a adopção de comportamentos de alimentação saudável, a melhoria dos salários mais baixos, melhoria das estruturas de apoio social ou melhorias no ambiente físico em que os cidadão vivem. Esta nova abordagem internacional seria desejável para Portugal. Curiosamente, António Negri, na sua obra recente intitulada “deus, sr. Socialismo”, discute o novo papel da ideologia socialista na Europa. A Saúde, em Portugal, poderá fomentar esse debate?
Vêm aí tempos difíceis para os pragmáticos. Terá começado um período dominado por românticos e prática discursiva da subjectividade?
PKM, DE 07.02.08
Muito oportuno.
8 Comments:
Apesar das qualidades ímpares e experiência da nova ministra da Saúde, Ana Jorge, a entrega do poder político a um membro da “Grande Corporação” irá certamente enfraquecer a «capacidade de resistir às pressões de classe e assim dificultar a dinâmica de liderança e a participação das outras profissões da saúde nos processos de modernização organizacional iniciados pela anterior equipa ministerial.»
José Sócrates, tal como já o havia feito com o "Compromisso para a Saúde", mediante o qual entregou, como se costuma dizer, o ouro ao bandido, também agora num momento de aflição sucumbe ao poder da grande corporação, entregando a condução do processo de reformas à classe mais visada.
Com esta decisão perdemos todos: SNS, utentes e o próprio Sócrates que não se livra de levar chumbada nas próximas eleições.
O relatório sobre a reorganização das urgências tem falhas graves. A nova ministra devia encomendar dois novos estudos um com a visão do terreno, da população, e outro dos profissionais da saúde, numa perspectiva multidisciplinar
Paulo Kuteev-Moreira, professor da Escola Nacional de Saúde Pública
Jornal de Notícias 04.01.08
Aí está um dos grandes herdeiros da remodelação do MS.
PKM, não se contenta com um, quer mais dois estudos.
Por isso é que este país nunca irá a parte alguma.
Gasta o orçamento todo em estudos.
Mais um artigo corajoso. Numa altura em que alguns se agarram às cadeiras e outros andam esbaforidos em almoços e telefonemas a ver se são promovidos pela nova ministra (ou pelo novo sec. de estado enviado pela central) ainda há gente independente que dá a cara pelas causas realmente importantes. Ainda por cima um homem que foi ao longo dos últimos quase três anos, muitas vezes, defensor e crítico de CC com conta peso e medida e de forma construtiva e leal.
È interessante vermos também a actualidade dos temas levantados neste texto. Precisamente um dia depois da publicação no de deste texto, Manuel Alegre lança o repto no jornal o Público: qual o Futuro do Socialismo em Portugal? Qual o Futuro do socialismo no PS? Qual o Futuro do socialismo na politica de saúde?
Também gostei de ler o ‘Adeus, Sr. Socialismo’ de Negri.
O problema mais grave não foi, para alguns, a substituição do Minsitro da Saúde. O problema foi um homem da ENSP e não médico ter dado o lugar a um médico (neste caso uma médica).
O velho ódio de estimação entre os AH e os Médicos voltou à ribalta.
Não podem uns com os outros...e nada há a fazer.
Foram-se tolerando por razões de estratégia mas os médicos nunca viram com bons olhos os Administradores-Delegados e os Administradores sempre aspiranm a serem "o dirigente máximo" dos hospitais.
Por razões de sobrevivência foram-se tolerando.
Uma maneira cobarde de fazer política. À sombra do partido. Entregar o cartão? É o entregas! Contestatário à pala do partido.
Acredita que, se deixasse o PS e fundasse uma força política, podia ir buscar muitos dos votos que recebeu há dois anos?
Não tenho grande certeza de que isso funcione assim. Por exemplo, na eleição presidencial, houve uma grande pressão da direcção do PS para que eu abandonasse o partido. Não me senti nessa obrigação nem moral nem política, estava a fazer algo que era transparente e de acordo com a Constituição. Mas estou convencido de que, se tivesse cedido a essa pressão, essa chantagem, porventura, muita gente que esteve comigo, e que foi comigo até ao fim, não teria ido. Porque as pessoas têm com os partidos políticos uma ligação sentimental e, muitas vezes, quase religiosa, mística. Estão contra, mas romper não.
Se chegar a um momento de ruptura, entrega o cartão?
A política é feita de encontros e desencontros. Se chegasse à conclusão de que o PS se tinha tornado um elemento pernicioso para a democracia e para a vida pública, claro que rompia. Mas não estou convencido disso. Penso que se podem criar processos que abram janelas dentro e fora dos partidos. Ou pelo menos que essa experiência deve ser feita até ao limite.
JP 08.02.08
Com esta ministra da saúde (médica) poderão ser prosseguidas algumas das iniciativas já lançadas ou em vias de ?
- Implementação das Ambulâncias SIV?
- Novos serviços em Farmácias comunitárias?
- Implementação de avaliadores de produtividade (julgo o "pontómetro" ter sido o início da mudança no método de trabalho e disciplina em instituições públicas)?
- Reforma dos CSP (num molde errado mas ainda assim uma mudança)?
- Equidistância quanto às reivindicações das diferentes classes profissionais?
São apenas algumas das situações em que quero ver o desenrolar desta história
'joão pedro' pode dar-nos indicações de quanto custou o 1º estudo para a requalificação dos SU? É que se consta que não custou nada.
Mais um estudo, ou até dois, resolviam a dificuldade de assumir um programa que, como publicou PKM nos finais de 2006, quando o relatório estava em discussão pública, não se devia basear numa visão parcial dos conceitos de urgência e emergência que ignora um grande número de componentes do SNS e das comunidades locais. O resultado foi o que se viu.
O problema, em portugal,, não é mais estudos. Os ingleses, espanhóis, alemães etc., por exemplo, estudam muito mais que nós. O problema é a mediocridade dos estudos feitos em Portugal.
O estudo da CATRPU teve custos, como é evidente. Quantas horas de trabalho precisou o grupo alargado até chegar ao relatório final?
Quase toda a gente chegou à conclusão que o estudo está bem elaborado.
Cometeram-se erros de implementação.
Será necessário perder mais tempo na elaboração de mais estudos?
Penso que não.
O tempo é de decisão política e arte de implementação.
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