quarta-feira, julho 30

Em defesa do Serviço Público


A questão da exclusividade veio acentuar o clima de crispação que se vive no sector da saúde. Com efeito, esta matéria constitui a “pedra de toque” de muitas das dificuldades e constrangimentos que o SNS tem vindo a defrontar ao longo dos últimos anos. As reacções (habituais) denunciam a má consciência de muitos dos actores que pretendem perpetuar um modelo que privilegia o interesse particular em detrimento dos interesses dos cidadãos.
A postura destemperada e despropositada dos dirigentes dos grupos privados revela bem a percepção do risco em que se encontram. Os ataques à Ministra, as tentativas de denegrir e desvalorizar a gestão dos HH’s públicos fazem parte de uma estratégia concertada que visa evitar que os planos delineados no consulado de LFP se desmoronem por completo. Com Ana Jorge está cada vez mais difícil retalhar e “assaltar” o sistema público. Fica assim comprometido o objectivo fundamental de capturar os indispensáveis fluxos financeiros que viabilizem os megalómanos projectos privados. Com efeito os planos de negócios de algumas destas iniciativas empresariais incorporaram, implicitamente, a predação do SNS. A “aventura” empresarial embora tenha sido barrada com o creme das “influências” tem visto os seus resultados, frustrantemente, comprometidos desde que Ana Jorge chegou. Se o desempenho económico e financeiro de muitos destes grupos fosse público e transparente, escrutinado livremente (como acontece na rede pública) e não subsistissem as almofadas de amortecimento dos grupos financeiros que os suportam tudo seria muito diferente. Infelizmente existem, ainda, muitas pessoas que se deslumbram pela aparência de muito dinheiro e de alguns “powerpoints” high-tech.
Todos sabemos que o sector privado não sobreviveria sem a muleta do Estado. É por isso que o “ataque” sistemático ao sistema público é um desiderato fundamental. A pior coisa que poderia acontecer aos “negócios privados” seria consolidar um modelo de serviço público eficiente, acessível e humanizado. A estocada final seria dada pela “dedicação exclusiva”. Esta restringiria a possibilidade de cirurgiões que trabalham de manhã no sector público pudessem “oferecer” resposta cirúrgica, imediata, à tarde no sector privado ou de operarem, em unidades convencionadas do SIGIC, doentes gerados em lista de espera nos HH’s onde trabalham. Dificultaria também a prescrição de MCDT’s para as clínicas convencionadas onde trabalham ou têm sociedades. Criaria muitos obstáculos à transferência (em estado de necessidade) de doentes oncológicos (por fim do capital do seguro) para o hospital público de referência. Inibiria o desplante de “acumulações” de responsabilidades geradoras de conflitos de interesses de enorme gravidade nos dois sectores. Tornaria muito difícil o “encaminhamento” dos doentes privados para a administração de terapêuticas dispendiosas. Comprometeria decisivamente o papel de “back-office” dos HH’s públicos bem como o seu inestimável papel na “angariação” de clientes. A “dedicação exclusiva” comprometeria, igualmente, o prestígio adquirido nos HH’s públicos.
Actualmente, encontram-se reunidas todas as condições para afirmar uma linha política clara de defesa do serviço público, subordinada a uma matriz de valores de isenção, rigor, profissionalismo e serviço ao cidadão. Separando o trigo do joio. Premiando a ética em detrimento da “comercialização patológica” do sistema de saúde dominada pelo oportunismo, pelo lucro fácil e pela captura do Estado. Desmascarando a “eficiência e a qualidade” marketing-oriented de que são lapidar exemplo a mentira dos baixos preços geradores a médio prazo de elevadas frequências e de prestação de cuidados desnecessários. Se houver coragem política e resistência “às pressões” poderemos chegar a Outubro de 2009 confiantes de que o SNS resistirá.
Pensador

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4 Comments:

Blogger Hospitaisepe said...

Excelente análise do Pensador.
Oxalá Ana Jorge tenha saúde e apoio político para levar por diante esta sua política de saúde.
Finalmente, com a legislatura adiantada, conseguimos ter uma política de saúde à PS.

10:27 da manhã  
Blogger cotovia said...

Cavaco Silva interrompe as férias para falar hoje à Nação.
O suspense é total.
Nenhum dos assessores deixou escapar a mais pequena pista capaz de mitigar a ansiedade que nos vai mortificar todo o dia até às 20.00.
Todos nos temos apercebido que os portugueses não têm prestado tanta atenção às mensagens do PR como este gostaria.
Talvez por isso, todo este aparato comunicacional.
A não ser que, CS, desta vez, tenha algo de muito importante a dizer aos portugueses.
Aguademos.

11:03 da manhã  
Blogger Tá visto said...

Ana Jorge jogou forte ao lançar o repto para se avançar no sentido de dedicação exclusiva e, assim entendo das suas palavras, de colocar a meta da separação de sectores entre 10-15 anos.
Se a reacção das corporações foi a que foi, imagine-se como os grupos económicos estarão a manobrar nos bastidores do poder. Terá a Ministra o apoio de Sócrates? E, da Direita à Esquerda o que pensam os partidos políticos? É que ficou tudo calado num silêncio ensurdecedor. E tal mutismo surpreende tendo em conta que, à excepção do CDS, todos eles, num ou noutro momento, reconheceram haver necessidade de separar sectores apontando a promiscuidade público/privado como o principal vício do nosso sistema de saúde. Não descobriram a pólvora seca diga-se, pois há vários estudos, internos e externos, sobre o funcionamento do SNS que chegaram a essa mesma conclusão.
Temos pois um diagnóstico feito há longos anos e ausência de coragem política para aplicar a terapêutica adequada. Esperemos que desta seja de vez pois o doente pode não sobreviver à doença.

6:53 da tarde  
Blogger cotovia said...

Afinal o inusitado aparato comunicacional de CS não foi para discursar à Nação. Mas sim aos deputados da AR, responsãveis pela aprovação do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores.
Para dizer o que disse não era preciso semelhante espalhafato.

10:47 da tarde  

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