Ainda o Controlo Orçamental do SNS
Atingir e manter o equilíbrio orçamental do SNS é sempre importante, independentemente do condicionalismo em que nos situemos. Mas é muito mais no contexto global que atravessamos, marcado pelas dificuldades actuais e que prometem manter-se ou agravar-se (Presidente do BCE dixit) e por todo o quadro de insuficiências e insatisfação que conhecemos. Por isso, tal como para o Xavier e para muitos outros (Post “Sob Control” link), foi de algum alívio verificar que a execução orçamental do SNS está controlada – Boletim mensal da DGO que, na matéria, transcreve o relatório da ACSS –. Digo apenas que foi de algum alívio porque os relatórios de 1º semestre são pouco significativos (também pouco credíveis?), pois que, ao ritmo da AP, as consequências das decisões, incluindo das inscrições orçamentais, tardam a produzir-se e em pequena parte se produzem ou são constatadas dentro do 1º semestre. Também porque na própria informação publicada há indícios que reforçam o que acabo de referir e que adiante concretizarei. Além disso, essa informação publicada, se tem alguma credibilidade, permite outras inferências, para além do importante efeito tranquilizador que deriva da existência de um saldo orçamental de 142,2 Milhões e parece-me que também elas merecem ser realçadas.
2. Vejamos primeiro a informação.
Quadro 7.- Execução financeira consolidada do Serviço Nacional de Saúde (Período: Janeiro a Junho de 2008) (€ Milhões).
Fonte: Reelaborado a partir do Quadro 7, da Administração Central do Sistema de Saúde, IP.
Notas: * A coluna “2007 – universo comparável” corresponde ao universo “Sector Público Administrativo” em Junho de 2008 . *A taxa de variação homóloga acumulada (tvha) compara os valores de 2008 com os valores do universo comparável de 2007
Fonte: Reelaborado a partir do Quadro 7, da Administração Central do Sistema de Saúde, IP .
Notas: *A taxa de variação homóloga acumulada (tvha) compara os valores de 2008 com os valores do universo comparável de 2007; (a)- Não inclui a Diabettes Mellitus e inclui os encargos com as Unidades Locais de Saúde. ; (b)- Inclui encargos c/ as Unidades Locais de Saúde. © Inclui o Hospital Fernando da Fonseca, Hospital da Cruz Vermelha, da Prelada, o CMFRSul e não inclui as Farmácias hospitalares;(d) Não inclui encargos com medicamentos e meios complementares de diagnóstico e terapêutica das Unidades Locais de Saúde. ; (e) Inclui despesa com Protocolos com Subsistemas, Parcerias, IPSS e outros serviços oficiais e ainda ConvençõesInternacionais.
3. A simples leitura destes quadros sugere-me as seguintes observações:
3.1 – Antes de mais, importa referir que a execução orçamental continuaria com saldo positivo se, mantendo-se tudo o resto inalterado, o financiamento directo do O.E. tivesse sido igual ao do período comparável de 2007. Ou seja, esse financiamento aumentou 101,5 Milhões (-11,1+112,6 investimento e transferências correntes, respectivamente. Sem esse aumento o saldo, ainda positivo, teria sido de 40,7 Milhões.
3.2 – A especialização dos exercícios. Por este princípio, as receitas como as despesas, devem ser constatadas no exercício em que se produziram a fim de salvaguardar a verdade e a transparência da prestação de contas. Este princípio parece respeitado no quadro 1, onde constam as receitas separando o próprio ano e anos anteriores (excepto, naturalmente, para as transferências do O.E. e para o subsídio de investimento). O mesmo não sucede relativamente à despesa, com evidente sacrifício daqueles objectivos de verdade e transparência que deviam estar presentes e não estão. A menos que tivéssemos de concluir que toda a despesa é do próprio ano, o que a Apifarma e os restantes Fornecedores do SNS não nos perdoariam.
3.3 – O ritmo da Administração Pública. Não considerando as excepções referidas (transferências e investimento) ficaríamos com o seguinte quadro resumo:
Não é preciso especular, basta ler. Em 2008 tudo piorou: os montantes cobrados e o ritmo da cobrança. Os montantes de anos anteriores equiparam-se aos do próprio ano decorrido todo o 1º semestre (48,61%). E a verdade será que acompanhar e vigiar a execução orçamental exige outro ritmo sob pena de as medidas adequadas só serem tomadas tardiamente (V. redução dos preços dos genéricos, a partir de Outubro mas cujos efeitos só serão sensíveis em 2009, e as alterações introduzidas nas tabelas da convenção de alguns MCDT, também em redução, já que excediam significativamente a compensação paga aos serviços do SNS). Uma maior exigência nesta área é razoável, tanto como necessária. Quase perguntaria: afinal, para que servem a empresarialização e as novas tecnologias da informação se nem contabilidade atempada conseguimos fazer? E aqui nem a grande corporação pode ser acusada!
3.4 – Gratuitidade no SNS. Mesmo que se considerem apenas os montantes de transferências do OE e a dotação para investimentos (haveria para acrescer outros, v.g. pagamentos da ADSE e de outros subsistemas com financiamentos públicos), encontramos um volume de 95,63% de receitas directa ou indirectamente provenientes do O.E (95,28% em 2007), o que significará que a gratuitidade tendencial do SNS se mantém e que a revisão operada das taxas moderadoras não a diminuiu.
3.5 – O investimento. É inquestionavelmente verdade que o investimento do SNS regrediu no semestre de 2008 relativamente a 2007. Não só nos Subsídios recebidos do O.E. (-30,1%) como também no auto-financiamento (diferença entre as despesas de imobilizações e os subsídios de investimento: 24,4 Milhões em 2007 e apenas 13,1 em 2008). O total das imobilizações, qualquer que tenha sido a origem dos fundos, foi de 61,3 Milhões em 2007 (1,57% da despesa total) e apenas 38,9 Milhões em 2008 (só 0,97%), ou seja, uma variação homóloga acumulada negativa de 36,5%. Neste ponto não pode, no entanto, esquecer-se que os processos de investimento são particularmente longos e atingem o ponto de constatação da despesa maioritariamente no 2º semestre (sendo provável que o auto-financiamento venha atingir maior expressão). Do mesmo modo que deverá ter-se presente que a estratégia do MS, para contornar as limitações orçamentais, assentou em canalizar sobretudo através das PPP, os maiores investimentos no SNS, os da área hospitalar, mas não só.
3.6 – Os Subcontratos. Esta rubrica, no seu conjunto, ascendeu em 2008 a 2.876,9 Milhões, ou seja, supera dois terços do Total da despesa do SNS, pois representa 71,66% do Total. Nela se integram como sub contas as rubricas mais pesadas do SNS, Medicamentos, MCDT e HH-EPE, que, só por si, pesam, respectivamente, 18,24%, 8,96% e 38,66% do Total da despesa. Se montante pago aos HH-EPE parece controlado (variação homóloga acumulada de 1,9%), os Medicamentos e os MCDT apresentam, entre todas as rubricas do SNS, as mais elevadas Tvha, respectivamente 4,2 e 5,1%. O que é grave porque incidem sobre montantes muito elevados. Têm assim que considerar-se oportunas, só pecando por tardias, as medidas tomadas e já acima referidas (v. ponto 3.3).
3.7 – Despesas com o Pessoal. Como sabemos, 729 Milhões, 18,16% da despesa total, não corresponde ao total das Despesas com o pessoal do SNS, já que sendo os HH-EPE (e outras entidades com idêntico estatuto) pagos por Subcontratos, de acordo com os respectivos contratos programa, os recursos humanos ao seu serviço estão abrangidos nos montantes subcontratados. Seria desnecessário referi-lo, mas fica à cautela não vá alguém distrair-se.
Aidenos
Etiquetas: Aidenós
4 Comments:
Excelente post numa área que sendo muito importante é difícil e escorregadia.
Interessantes as conclusões quanto à gratuitidade (não afectada) e quanto á necessidade de mais gestão para efectivar a receita.
O que pensa o Tonitosa sobre o conteúdo deste post?
Vidanova
Caro Vida Nova,
Respondo à pergunta suscintamente: concordo de um modo geral com este texto do Aidenós.
Como ele, tenho dúvidas sobre o "controlo" da execução orçamental do SNS.
E tenho dificuldade em compreender que, com tanto controlo, as dívidas da saúde continuem a agravar-se, conforme outro dos posts deste blogue.
Entretanto, com tanta competência em matéria de Despesa Pública e controlo do défice, os pobres vão sendo cada vez em maior número, como se pode verificar pelas afirmações de um insuspeito apoiante do actual governo, inseridas no JN, como segue:
"Classe média entre os novos pobres a pedir ajuda à Misericórdia de Lisboa"
O número de pessoas a recorrer aos serviços de emergência social da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa aumentou 6% só no primeiro semestre do ano. De acordo com o provedor da instituição, mais pela classe média em dificuldades que "pelos pobres tradicionais".
E pelos vistos, mais uma vez a espada está já apontada às cabeças dos trabalhadores do Estado.
O sistema de saúde português recebeu 10 notas negativas do maior observatório independente dos sistemas de saúde, o Health Consumer Powerhouse .
Um relatório do observatório, que funciona junto da Comissão Europeia, colocou Portugal na cauda da Europa no que toca à assistência médica.
O sistema de saúde português é insuficiente ou falha nos cuidados dentários, nas cirurgias às cataratas e nas consultas com o médico de família. A taxa de mortalidade por enfarte e o acesso a médicos especialistas recebem também nota negativa.
O estudo explica que o sistema de saúde português é insuficiente ou falha porque os serviços não dispõem de seguro para o erro médico e porque não existe um ranking de qualidade dos hospitais. O relatório afirma também que é difícil aos cidadãos terem acesso ao registo dos médicos. Portugal recebeu também nota negativa no tratamento de infecções graves e no acesso a médicos especialistas. O observatório deu ainda «cartão vermelho» ao acesso às cirurgias em 90 dias.
O sistema de saúde português ficou classificado no 19º lugar num ranking de 29 países. Malta, Eslovénia e Grécia ficaram ao mesmo nível de Portugal.
O observatório deu nota positiva à assistência telefónica à população, garantida pela Linha Saúde 24, e à mortalidade Infantil. Portugal teve também nota positiva no programa de Vacinação.
O Editorial da publicação dá uma vaga imagem de conjunto europeia link.
Bem, este relatório referente a 2007(período CC) foca muitos assuntos que - em 2008 - ou estão na agenda do MS, ou em vias de resolução, ou já foram resolvidos como é o mediático caso das "cirurgias das cataratas".
Julgo que a situação referente a 2008, embora não tenha evoluído radicalmente, melhorou, nomeadamente, em relação às listas de espera cirúrgicas. Não será assim no acesso às consultas de especialidades.
Situação semelhante vive-se no Reino Unido, servido por um enorme sistema público de Saúde (NHS), em tempos de mudança e difícil de gerir.
A classificação da Austria em primeiro lugar é, para mim, uma surpresa. Tinha a sensação que o melhor sistema era o francês.
De qualquer maneira, é um documento denso - 55 pág.s - que deve merecer a atenção dos decisores políticos e gestores na área da Saúde.
Adenda:
Por lapso não mencionei que o texto principal foi retirado da TVI-notícias, de hoje.
As minhas desculpas.
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