sexta-feira, novembro 28

Aos papéis


Segundo o DE (27.11.09), o «Ministério da Saúde está a ter cada vez mais dificuldade em conhecer a despesa dos HH com medicamentos. O secretário de Estado da Saúde, Francisco Ramos, admitiu que o Governo “vai tomar medidas” para obrigar todos os hospitais a enviarem para o Infarmed dados sobre consumos de medicamentos. »

Já aqui havíamos referido as dificuldades crescentes relativamente à recolha desta informação.
A título de exemplo, em Set 2007, setenta HH do SNS enviaram dados de informação sobre consumos ao Infarmed, representando 88% da despesa total dos HH com medicamentos.
Em Set 2008 apenas 51 HH enviaram dados ao Infarmed, representando 56% da despesa total com medicamentos (quadro acima).
A degradação do sistema de recolha (em fase experimental há dois anos) é por demais evidente.
Face a esta situação, FR decidiu tomar medidas. Para fazer funcionar um sistema de recolha e tratamento de dados que qualquer chefe de repartição medianamente preparado deveria ser capaz de manter a funcionar.
Ironicamente, a informação referente à dispensa de medicamentos em farmácias oficina (pese embora o maior volume de dados e número de pontos de recolha), é, incomparavelmente, mais fiável e actualizada que a dos HH do SNS.

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13 Comments:

Blogger Antunes said...

É estranho que esta situação aconteça, uma vez que este projecto de informação foi desenvlvido por um dos assessores de Francisco Ramos.

8:27 da manhã  
Blogger saudepe said...

A política do medicamento tem sido, desde início, um dos maiores calcanhares de aquiles do XVII governo constitucional.
Efectivamente há decisões tomadas por este Governo nesta área que são muito dificeis de explicar.
Como por exemplo a "nova metodologia de estabelecimento de preços dos medicamentos, aprovada em 2006, resultante de um acordo com a indústria farmacêutica - através da média de preços do grupo: França, Espanha, Itália e Grécia, que substituiu a anterior baseado no preço mais baixo apurado nos países do grupo constituído pela Itália, França e Espanha.

Em segundo lugar, o aumento extraordinário de preços, decidida em junho pelo secretário de estado adjunto e da Saúde.

A contenção de gastos com medicamentos foi sendo feita nos últimos anos através de medidas administrativas de redução de preços dos medicamentos .
No terreno, ou seja, a tomada de medidas sobre a prescrição e dispensa de medicamentos, pouco ou nada foi feito.

Esgotadas as medidas administrativas do que é que estavam à espera?!...
A derrapagem dos gastos tornou-se inevitável!
Pró ano estão anunciadas novas medidas, ainda pouco estudadas.
Volta-se a apostar em medidas radicais para lançar, uma vez mais, a confusão.

9:01 da manhã  
Blogger Clara said...

O governo admitiu a subida do preço de 121 medicamentos, justificando-a pela necessidade de proteger alguns medicamentos antigos.
Esta subida é uma cedência a algumas grandes farmacêuticas, que ameaçaram retirar produtos do mercado para serem substituídos por outros mais caros.

No entanto, João Semedo afirma que as subidas de preços também afectaram medicamentos novos e que não houve informação às pessoas, que só se aperceberam da subida de preços no momento da aquisição.

9:20 da manhã  
Blogger tambemquero said...

Hospitais empresarializados?

As “falências” de hospitais EPE são inevitáveis. Mas em contexto de economia social, nada se perde, tudo se transforma.

A economia é uma ciência social. Na matriz de pensamento social-democrata inspirada em Galbraith, que assumo, qual a origem das dificuldades sentidas para implementar os ideais da social-democracia inerentes a várias reformas cujos projectados planos de longo-prazo são abandonados a “meio-caminho”? Reflictamos sobre uma situação nacional que nos sugere a complexidade da prossecução de objectivos sociais na saúde.

Em concreto, quantos cidadãos, jornalistas ou analistas notaram o elevado número de “acordos modificativos” dos contratos-programa de hospitais EPE realizados desde fins de 2007?

Na essência, estes acordos alteraram valores relativos a produção contratada e pagamentos. De forma oposta a uma lógica supostamente “empresarial” vários desses acordos promovem, entre outros fenómenos estranhos para a gestão em saúde, a garantia do pagamento de produção não-realizada (!) a valores variáveis. Sempre que os volumes de produção realizada pelo hospital “x” (i.e.: no seu serviço de urgência ou outro) forem inferiores aos valores contratados/planeados (até ao limite de 50% dos valores contratados), o Estado assume o pagamento de cada unidade não produzida pelo preço de 27,5% do preço contratado. Ou seja, garantem-se receitas a hospitais “empresarializados” para equilibrar a relação entre custos fixos e produção marginal através de uma intervenção estatal, no mínimo, incoerente do ponto de vista da filosofia “empresarial”.

Sendo que a eventual ocorrência de um elevado numero de “acordos modificativos” denuncia algum “optimismo exagerado” no planeamento da procura dos serviços hospitalares, a verdade é que este é um instrumento de correcção socialmente justificado uma vez que, de contrário, as unidades entrariam, a curto-prazo, em processo de falência técnica.

Porém, este processo questiona o propagado sucesso dos hospitais EPE. Sem estes discretos “acordos modificativos” um grande número de unidades estaria, neste momento, em situação financeira ainda mais grave que a actual.

Então, que vantagens trouxe esta “empresarialização” dos hospitais para além da desorçamentação no ‘déficit’ público? Se uma unidade (hospital ou serviço) não tem a procura programada, ano após ano, será viável? E porque havemos de financiar, com os nossos impostos, o que não se produziu de facto?

Estes acordos deturpam o principio de que haveria lugar a “remuneração apenas dos actos e serviços efectivamente realizados” conforme a “filosofia” original dos hospitais EPE. A incoerência parece ser provocada pelo receio político- partidário de provocar a efectiva falência de algumas unidades. Mas a verdade é que algumas “falências” de hospitais EPE são inevitáveis como aconteceu em Inglaterra onde se assumiu o principio, socialmente justificado, de que um hospital que não tem procura por parte da população terá que transferir os seus recursos para outros níveis onde se verifique procura efectiva (i.e.: cuidados primários ou de longa-duração). Essa transferência pode dar-se através do processo de “falência” uma vez que neste contexto da economia social, nada se perde, tudo se transforma. Os profissionais transferem-se para outros níveis de apoio social e o financiamento é redireccionado para onde a população necessita. Não há lugar a desemprego de profissionais e os cidadão passam a ter outras respostas sociais.

Assim, podemos questionar porque se protegem, em Portugal, hospitais/serviços que não têm procura que justifique o seu funcionamento enquanto a população circundante não tem garantias de cuidados pós-agudos? Por razões exclusivamente eleitoralistas dos partidos que vão passando pelo governo da saúde desde, pelo menos, 1996?

É este contexto de políticas de saúde (‘policies’ em inglês) subjugadas às estratégias partidárias ( ‘politics’) que reforça a constatação de que temos que “mudar de vida”... Citando João Lopes no JN recentemente: “uma democracia que se demite de interrogar o seu sistema global de funcionamento corre o risco de se fragilizar.” Também o SNS.
PKM, DE 27.11.08

9:39 da manhã  
Blogger e-pá! said...

MS - BALDA INSTITUCIONAL...

Na discussão do OGE a ministra Ana Jorge não conseguiu quantificar as dívidas a dívida do MS, o que se tornou numa situação penosa, ao responder: "não sei!"
Tendo lançado a bola para o Secretário de Estado Francisco Ramos o mesmo sugeriu que fossem os deputados a fazerem as contas.
No mais puro estilo guterrista, disse:
"basta fazer as contas para saber o montante das dívidas".

Agora em relação aos medicamentos, onde se verificam enormes "derrapagens" em relação à evolução dos consumos, nomeadamente, com o disparar do crescimento das despesas, o Governo atrapalhado e, novamente, pela voz de Francisco Ramos, diz que “vai tomar medidas”, para obrigar todos os hospitais a enviarem para o Infarmed dados sobre consumos de medicamentos...

Este contexto, lamentável, acaba de ser explorado, por PKM, para exteriorizar um oculto desejo:
"As “falências” de hospitais EPE são inevitáveis...".
Faltou acrescentar: só a do BPP, não!

E, se este homem obcecado pelas health policies, retirasse o cavalinho da chuva, antes que o mesmo se constipe e consuma mais medicamentos?

10:44 da manhã  
Blogger Joaopedro said...

Ensandeceu!
Até onde o brio oportunista deste investigador internacional da saúde pode ir?
PKM, deseja ardentemente a falência dos HH EPE para os entregar ao seu ex-patrão Salvador e aos demais grupos privados.
Talvez fosse melhor decretar a falência do SNS, e transformar todo o SNS num mar de PPP.

O esquecimento da ministra da saúde na nomeação de PKM para integrar o último grupo de trabalho que vai estudar as PPP da Saúde fez com que, em definitivo, PKM se radicalizasse.

11:56 da manhã  
Blogger Hospitaisepe said...

A primeira avaliação das instituições públicas e privadas de saúde em Portugal começará a produzir resultados em Junho de 2009.
Siemens e Joint Commission Internacional são os avaliadores.

Os primeiros resultados da avaliação inédita que a Entidade Reguladora da Saúde (ERS) vai fazer aos principais hospitais públicos e privados em Portugal devem ser divulgados em Junho, mas a avaliação arranca já em Janeiro com 37 hospitais.
DE 27.11.08

Sobre os objectivos deste ranking tem razão o rezingão quando escreve:

«A ERS (e o seu actual presidente) parecem ter como visão forçar a construção de um putativo sistema concorrencial público-privado “inventando” uns rankings destinados a comparar o “pão ralado com a limalha de ferro” com um único propósito: criar na opinião pública a convicção de que o SNS não presta, é ingovernável e insustentável. Desse modo, se procura condicionar os poderes públicos a ceder na transferência de fluxos financeiros que sustentem os diferentes tipos de “aventuras empresariais privadas” no sector da saúde. Para esse desiderato vão contando com meia dúzia de “opinion-makers” replicadores de opiniões suportadas em evidência de plástico e de alguns diligentes jornalistas muito mal preparados.»

12:59 da tarde  
Blogger xavier said...

Houve muito tempo, houve tempo suficiente, para montar um sistema de informação fácil de explorar, fiável, eficaz, sobre o consumo hospitalar de medicamentos.

Quanto a mim as dificuldades do sistema implementado devem-se não à entidade responsável pela sua exploração, o infarmed, que dispõe de técnicos competentíssimos, mas sim do MS que coordenou o desenvolvimento do projecto.

5:23 da tarde  
Blogger tambemquero said...

Concorrências…

O Ministério da Economia reconheceu como Projecto de Interesse Nacional (PIN) a construção de um hospital privado em Vila do Conde, com um investimento de 90 milhões de euros e a abertura de 120 camas hospitalares com bloco cirúrgico, refere uma notícia do Sol (22/11/08).
Nada de novo, se o Governo não tivesse anunciado, em Outubro, a construção de um hospital público na mesma cidade e que irá substituir os actuais hospitais de Vila do Conde e Póvoa de Varzim.
Refere também a notícia que o novo hospital privado, além do reconhecimento como PIN pelo Governo recebeu da autarquia um conjunto de benefícios fiscais, que o presidente da Câmara, o socialista Mário de Almeida, caracteriza como «uma situação excepcional», pois «trata-se de um investimento na área da saúde com enormes efeitos positivos na região».
Não há fome que não dê em fartura e, para a população, acreditamos nos tais efeitos positivos que fala o autarca. Ficamos, entretanto, a aguardar a forma como será resolvida a questão da «angariação» de mais 862 postos de trabalhos, entre os quais médicos, que a região não tem. É que as previsões apontam para que o hospital privado esteja pronto em 2010, três anos antes do previsto para o novo hospital público de Vila do Conde. De certeza que não serão tarefeiros…

Tempo de Medicina 01.12.08

É mesmo de ficar perplexo.
Por vezes não acredito naquilo que leio.
A confirmar-se esta notícia não posso deixar de lamentar a hipocrisia do primeiro ministro e da senhora ministra da saúde.
Duma forma ou doutra, este governo continua a acarinhar o processo de privatização da saúde através da promoção da transferência de importantes fluxos financeiros para o sector privado.

7:34 da tarde  
Blogger tonitosa said...

Parece que a equipa do Ministério da Saúde está a perder o controlo da situação (se alguma vez o teve) em vários domínios da Saúde. Nos gastos com medicamentos, no controlo da dívida, na actuação do INEM, etc..
Quanto ao que se passa nos HH EPE's a situação não é brilhante. Basta ler o comentário do tambemquero para vermos os caminhos que aqueles hospitais levam.
Há três anos foram grandes as expectativas. Mudança de Ministro, novos Gestores - todos altamente competentes - passagem de SA's a EPE's, carros desportivos, etc., foram motivos para grande euforia. Se por um lado chegavam os "iluminados" para substituir os "incapazes", por outro lado, com o novo modelo o futuro estaria grantido.
Hoje, no entanto, é o que se vê. E nem as artimanhas para financiar a "não produção", nem as quebras administrativas dos preços dos medicamentos foram capazes de mudar o rumo às coisas.
Tenho bastante simpatia por Ana Jorge e pouca ou nenhuma por F. Ramos.
Acho que parte dos problemas de Ana Jorge têm muito a ver com a sua "incapacidade" para ter remodelado totalmente a equipa do Ministério.
E agora...creio que já é tarde!

10:10 da tarde  
Blogger rezingão said...

Hesitações…

Confesso que hesitei, longamente, sobre se deveria ou não comentar o mais recente artigo, publicado, pelo ilustre lente PKM, no Diário Económico. A dúvida que me assaltava advinha do facto de ainda perpassar pelo meu espírito o sofrido apelo, feito pelo próprio, e publicado no SaudeSA no passado dia 15 de Novembro em que referia: …”Reitero o pedido para que ignorem os meus artigos no DE. Eles não vos servem de nada. Bem haja o ou a "joão pedro" que deve ser ouvido ou ouvida nessa mesma sugestão”…
Este apelo encerrava, em si mesmo, uma forte vontade de discrição, de reserva, de um desejo expresso de opinar de soslaio. Percebemos que esta vontade cabia, por inteiro, no desabafo que, dias depois, viria a ser expresso pela líder do PSD quando referiu …”às vezes a interrupção da democracia durante seis meses pode ser útil”…Na verdade PKM com o seu instinto de antecipação intelectual mais não tinha expresso que a vontade de MFL. Por outro lado PKM enfatizou no referido apelo: …” Eles não vos servem de nada”…Também aqui antecipou porque, na verdade, este seu último artigo cumpre, igualmente, por antecipação esse impulso visionário. De facto, os artigos de PKM, publicados no DE, de pouco nos servem tal a fragilidade dos conceitos, o emaranhado das reflexões e as estonteantes hipérboles especulativas que encerram. Relevamos até, num gesto de democrática elegância, qualquer comentário à qualidade da escrita percebendo que as competências do autor são alheias ao domínio da língua mater.
No seu último artigo PKM afirma que as “falências” de hospitais EPE são inevitáveis. Elucubra, a este propósito, sobre o pensamento de Galbraith. Nesta referência aproxima-se (surpreendentemente) de um ideário que lhe é muito adverso pelo menos no que respeita ao cepticismo sobre as extravagâncias da teoria económica e à defesa do investimento em bens públicos.
No entanto, rapidamente, desliza para a especulação politiqueira quando diz: …” Em concreto, quantos cidadãos, jornalistas ou analistas notaram o elevado número de “acordos modificativos” dos contratos-programa de hospitais EPE realizados desde fins de 2007?”…
Aventura-se, como é seu hábito, na insinuação sobre os processos de decisão política e de gestão empresarial. Fala então de instrumentos de profilaxia da tão “excitante” falência técnica. Esquece-se, como sempre, convenientemente dos “megas acordos modificativos”, encapotadamente, designados de orçamentos rectificativos que, ao longo de muitos anos, os diferentes governos (incluindo o seu preferido) foram, sucessivamente, aplicando.
Ficamos contudo, mais tranquilos por vermos, que neste artigo, já mostra conhecer a relação do sector empresarial do Estado com o respectivo défice. Registado este avanço no conhecimento adianta: …” Se uma unidade (hospital ou serviço) não tem a procura programada, ano após ano, será viável? E porque havemos de financiar, com os nossos impostos, o que não se produziu de facto?”…Conhecerá PKM a diferença entre custo e preço? Conhecerá a discriminação dos actos, procedimentos, funções e serviços dos HH’s? E qual a correlação entre custos de produção e preços de aquisição?
Na parte final (apressada) do artigo refere: …” Essa transferência pode dar-se através do processo de “falência” uma vez que neste contexto da economia social, nada se perde, tudo se transforma. Os profissionais transferem-se para outros níveis de apoio social e o financiamento é redireccionado para onde a população necessita. Não há lugar a desemprego de profissionais e os cidadãos passam a ter outras respostas sociais”…Como é possível que alguém que se reclama do pensamento e do conhecimento sobre o sistema de saúde português profira este tipo de afirmação?
Termina com a recorrente alusão às razões “exclusivamente eleitoralistas” evocando de novo a repetida e fastidiosa menção à diferença entre …”políticas de saúde (“policies” em inglês”) subjugadas às estratégias partidárias (“politics”)”…
Confesso, que perante este último artigo, esmorece a motivação para um debate animado em torno das quinzenais aparições de PKM.

10:14 da tarde  
Blogger SNS -Trave Mestra said...

O funcionamento de um sistema de informação não pode estar dependente da vontade dos HH em enviar informação quando lhes apetece.
A informação tem que circular independentemente dos estados de espirito dos CA dos HH.
O dr. Curujeira devia saber isso quando coordenou a equipa responsável pela implementação deste sistema.
Agora temos o ridiculo do seu patrão ter que sair a terreiro com ameaças aos CAs numa tentativa de fazer desentupir o sistema.
Mas afinal que pais é este?
Um país de saloiada e de chicos espertos que vão fazendo pela vida.

2:28 da tarde  
Blogger tambemquero said...

O Mundo ao contrário

Algumas notícias e outros dados conhecidos nos últimos dias fazem pensar estarmos à beira de uma das alterações mais profundas do mercado farmacêutico de ambulatório português dos últimos 30 a 40 anos.

No passado dia 22, a ministra Ana Jorge foi à sessão solene de encerramento do Congresso Nacional das Farmácias dizer duas frases-chaves para que essa alteração se inicie. São elas:
«O trabalho de negociação com os parceiros que tem sido desenvolvido ao longo deste ano tornou evidente o consenso de que não é indispensável a intervenção do Governo na fixação das margens de cada agente económico no sector do medicamento.
«Ao Estado deve continuar a competir a responsabilidade de fixar os preços máximos dos medicamentos, garantindo e salvaguardando o direito ao acesso do cidadão, competindo aos restantes agentes económicos definir as margens adequadas ao seu negócio.»

Esta declaração «liberal» ou liberalizadora, contendo, desde logo, uma mentira evidente (o «consenso» referido não existe, segundo apurámos falando com responsáveis do sector), vinda da ministra que se desdobra em declarações de defesa do SNS, escolhida para a função, dizem abalizados comentadores políticos, por ser conotada com a «ala esquerda» do PS, parece, assim, estranha, e soou como uma fatalidade. Mais: nesse dia, a agência de comunicação da ANF (a LPM) emitiu um comunicado, cujo último parágrafo diz o seguinte:
«No encerramento do 9.º Congresso Nacional das Farmácias, a ministra deixou ainda expressa a intenção de o Ministério da Saúde continuar a cooperar com as farmácias na implementação das medidas em falta do Compromisso com Saúde, assinado entre a ANF e o Governo em Maio de 2006, nomeadamente a prescrição de medicamentos pelo nome genérico (DCI), a dispensa de medicamentos hospitalares nas farmácias, a liberalização das importações paralelas, e a dispensa em dose individualizada.»

Primeira perplexidade

Debalde procurámos no discurso de Ana Jorge estas referências concretas. Elas não estão lá, nem foram ditas como «bucha» pela governante; primeira perplexidade. Segunda: nos dias seguintes, os órgãos de Comunicação Social citaram este comunicado amplamente e nada foi desmentido, ao menos até ao momento. Porquê?
Que quer Ana Jorge, ou melhor, o Governo, dizer com o antes citado? Resumamos, para os leitores menos identificados com o essencial do sector farmacêutico: nas últimas décadas, o Governo tem fixado quase tudo na área do medicamento, desde os preços e comparticipações do Estado até às margens de comercialização dos vários intervenientes (empresas farmacêuticas, distribuidores, armazenistas e farmácias). Porquê? Porque tem sido consenso político que, sendo o Estado o grande pagador dos medicamentos prescritos e dispensados em ambulatório, deve regulamentar esses aspectos em pormenor, evitando distorções graves de mercado.
Ora, ao que parece, algo fez com que o actual poder socialista se prepare para quebrar este equilíbrio de décadas, criando um «desequilíbrio» de consequências imprevisíveis.
Que queremos nós dizer com isto?
Fruto de uma impressionante e bem calculada estratégia de longo prazo, a Associação Nacional das Farmácias (ANF) detém, no seu majestoso grupo empresarial (ver www.anf.pt), capacidades que lhe permitem partir de alguns factos sólidos para um conjunto de ilações.

Os factos

Os factos, primeiro. Através da AllianceHealthcare (ex-Unichem), o «grupo ANF» tem, formalmente, 30% da área de distribuição sob controlo directo, garantindo fontes do sector que, informalmente embora, o grupo controla também um conjunto de pequenas-médias empresas e cooperativas (significando mais 20 ou 30% deste subsector); no armazenamento, a situação é ainda mais dramática para qualquer lógica de concorrencialidade, visto que se tem como certo que 70% da capacidade do País está sob controlo directo daquela entidade; por último, mas não em último, é sabido que as 2500-2600 farmácias de ambulatório têm massivamente (mais de 90%) um alinhamento total com os interesses da sua Associação. Compreensivelmente, de resto.
Agora, as ilações. Mormente nesta fase de dificuldades para grande parte das empresas farmacêuticas, entregar, com este liberalismo serôdio, nestas circunstâncias, à «livre» determinação do mercado a definição das regras do jogo, deixando aos restantes agentes económicos o encargo de «definir as margens adequadas ao seu negócio», é uma decisão hipócrita, pressupondo que o Governo sabe do ponto de partida actual, ou inconsciente, se acaso no Executivo ninguém percebe verdadeiramente o que vai originar com esta mudança de regras.

Desinformação?

Colocamos esta possibilidade, a da desinformação no Executivo, posto que, em boa verdade, não é informado quem quer, como sabemos. Quem, no Governo de José Sócrates, tinha, a par de todos os seus defeitos, uma percepção razoável do sector, o ex-ministro António Correia de Campos, já lá não está há uns meses, e o secretário de Estado Adjunto e da Saúde, Francisco Ramos, que tem algum conhecimento da área, não por acaso tem sido o alvo privilegiado das críticas dos responsáveis da ANF e parece estar em «perda» neste momento (senão, como explicar que, tendo o mesmo sido praticamente insultado pelo Dr. João Cordeiro e outros dirigentes da ANF, em várias das suas recentes comunicações públicas, incluindo a cerimónia de abertura do mesmo Congresso, ninguém tenha vindo em sua defesa e tenha sido mantida a ida de Ana Jorge ao encerramento, que decorreu, aliás, sob o signo do entendimento? - ver também pág. 11). No entanto, a verificar-se a hipótese alternativa, estaremos perante uma verdadeira aberração num assunto de grande sensibilidade, criada pela política «politiqueira» que impera entre nós.

Se o Governo socialista ora em funções abrir esta «caixa de Pandora», deixando a ANF a controlar o sector, será, de facto, um escândalo digno de nota. Um verdadeiro Mundo ao contrário. O facto de o mesmo Governo que iniciou funções apontando, no próprio discurso de posse do primeiro-ministro, o estatuto da propriedade das farmácias como exemplo de instrumento de pressão a discutir, se propor, a terminar a legislatura, entregar todo um sector à ANF será caso para, pelo menos, perguntarmos «que diabo se passa aqui?», que forças originam estas rotações de um partido político com as responsabilidades do PS?

JM Antunes, Tempo de Medicina 01.12.08

Foi José Sócrates, quem conduziu as negociações do acordo "compromisso de Saúde", firmado entre este Governo e a ANF.
Em claro desapoio à política, até ali seguida, por CC. (que na última entrevista, mente descaradamente, quando refere que «Sócrates sempre me apoiou incondicionalmente em tudo»...).
A machadada final será dada efectivamente com esta medida.

Ana jorge, a concretizar-se mais esta cedência ao lobi das farmácias, fica também, uma vez mais, muito mal a fotografia.

11:19 da tarde  

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