segunda-feira, novembro 10

Hipocrisia


O Ministério da Saúde admitiu hoje a necessidade de corrigir "alguns aspectos" do financiamento aos hospitais, assegurando que a nova tabela de actualização de pagamentos vai entrar em vigor já no próximo ano. Esta é a reacção da tutela à notícia de hoje do “Correio da Manhã”, segundo a qual existem doentes que ficam mais dias em internamento nos hospitais públicos, sem que tal seja necessário, para as unidades conseguirem “arrecadar um maior financiamento do Governo”.
À Lusa, fonte oficial do ministério de Ana Jorge indicou que já foi feita uma revisão da tabela de pagamentos aos hospitais, uma vez que havia "necessidade de corrigir alguns aspectos". "A nova tabela de actualização de pagamentos aos hospitais, que já esteve em consulta pública, vai entrar em vigor no próximo ano", acrescentou.
Entretanto: …”O bastonário da Ordem dos Médicos considera que a situação "é inaceitável". Em declarações à TSF, Pedro Nunes lamenta a "manipulação miserável" a que são submetidos os doentes nas unidades que praticam o esquema, assegurando que os médicos que cooperem com esta política "serão seguramente punidos pela Ordem dos Médicos", por violarem o código deontológico destes profissionais.
Ainda à rádio, Pedro Nunes defendeu que estes casos devem ser alvo de uma investigação por parte da Inspecção-Geral da Saúde.
…/…
Esta é a reacção, vigorosa, do Sr. Bastonário indignado por uma “não notícia”. Pode ser, no entanto, o prenúncio de uma nova atitude, mais exigente e mais isenta no plano da ética e da deontologia. Se o quiser fazer, encontrará no regime de internamento, no sector privado, dos beneficiários da ADSE e dos sub-sistemas farta matéria para analisar em conjunto com a IGAS. Talvez seja desta que lhe ouviremos uma palavra sobre a selecção adversa de doentes no sector privado (convencionado com o Estado), dos doentes oncológicos “despachados” a meio dos ciclos terapêuticos para os Hospitais públicos, do incumprimento dos ratios e perfis de competência técnica e profissional em clínicas e hospitais privados. Talvez seja, ainda, desta que o vamos ver a fazer visitas-surpresa a blocos operatórios, UCI’s, Unidades de Internamento e Urgências no sector privado. Se o vier a fazer estaremos em condições de desfazer, em definitivo, a ideia que vai perpassando, neste tipo de juízos e comentários de parecerem haver “vícios privados e públicas virtudes”…

silly season

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10 Comments:

Blogger e-pá! said...

Caro silly season:

A denúncia desta situação é protagonizada - pelo menos na versão pública que os portugueses conheceram - pelo presidente da APAH - Dr. Pedro Lopes.
Parece que a denuncia inicial ao CM terá sido feita por uma direcção clínica de um HH (fonte não identificada).
Na realidade, o Dr. Pedro Lopes, assume, na plenitude, a situação:

"É verdade, os hospitais, dentro do processo de gestão, prolongam a estada dos doentes mais um dia ou dois para atingir o financiamento justo. Este é um problema que o Ministério da Saúde conhece há anos, mas nada fez para uma resolução e uma reavaliação dos limiares mínimos." (sic)
É verdade, este é um problema levantado desde o tempo de LFP no relatório de 93 do OPSS.

Lançada a atoarda sabemos que ela só é possível - o tal financiamento justo - com a colaboração entre as gestões hospitalares, as direccções clínicas, as direcções de serviços e, no fim da lista, os médicos de cabeceira (que deveriam defender-se e reivindicar autonomia técnica).

Este procedimento de prolongamento da hospitalização é, por diversas razões, prejudicial ao doente.

Aliás, para mim, é transformar uma hospitalização num internamento (coisas semanticamente e na prática diferentes).

O eventual prejuizo do doente e o uso de engenharias de gestão criativas para chegarmos a bons indices de eficiência no relatórios anual de contas, interessa a todos os portugueses.

Não se divisa qualquer hipocrisia, e, se acaso houvesse, mancharia de igual modo o Dr. Pedro Lopes da APAH.

Hipocrisia é impostura, fingimento.

Os prolongamentos de internamentos para melhorar o financiamento de HH's não foram negados. Nem são uma "não-notícia".

Têm, segundo podemos deduzir, sido uma prática continuada.

A IGAS, as ARS's, o OPSS, as Direcções Clínicas HH's, deveriam observar e monitorizar os "grandes" desvios (pelo encurtamento e/ou alongamento) às demoras médias padrão para os diferentes GDH's.

Parece que esse trabalho não tem sido feito.
Todavia os trabalhadores da Saúde sabem quanto custa em média um dia de hospitalização (diferentes conforme os serviços e os HH's)mas sempre na ordem das centenas de euros.

Esta situação não é de hipocrisia, nem de "bufaria" para qualquer dos publicos intervenientes - Bastonário da OM e presidente da APAH.
É uma situação em que é necessária a máxima transparência quer da área Clínica, quer da Gestão.
Gritar que aqui há fogo, mas estão as roubar outras casas no bairro, para o caso vertente - não resolve nada - essa sim é uma "não notícia"...
O que se está a passar é ...uma CONFORMIDADE (ainda) não resolvida.

8:06 da manhã  
Blogger sillyseaspn said...

Caro e-pá não querendo particularizar o diálogo devo, no entanto, referir que o tenho na conta de uma pessoa muito séria, rigorosa e esclarecida. Os seus escritos testemunham, claramente, a sua posição na defesa de valores e princípios com os quais muitos de nós se identificam. É por isso, que tenho pena que subscreva este tipo de intervenções ligeiras, não documentadas, susceptíveis de põe em causa o bom nome de centenas de profissionais (médicos, dirigentes hospitalares, direcções clínicas, entre outros). A ligeireza das afirmações do Sr. Presidente da APAH leva-nos a colocar as seguintes questões:

- Que Hospitais?
- Que Administrações?
- Que Direcções Clínicas?
- Que Médicos?

O Sr . Presidente da APAH (enquanto “representante” de uma parte dos dirigentes hospitalares) tem conhecimento de factos concretos? Se sim denunciou-os (como era sua obrigação) a quem de direito?

Que o Sr. Bastonário se apresse a “cavalgar” uma onda de ataques soezes ao SNS parece-nos normal. Tudo o que sirva para denegrir as instituições públicas é, de imediato, aproveitado. Mesmo que seja não fundamentado em estudos, factos ou relatórios credíveis.

Se prevalecesse a decência o normal seria que estes dois senhores concretizassem, através de provas irrefutáveis, o rigor das respectivas denúncias. De resto usar adjectivos como “miserável” só qualifica quem os utiliza como instrumento de “sound-byte” para alimentar as tribos e vincar protagonismos.

12:36 da tarde  
Blogger e-pá! said...

Caro silly season:

Desculpe a insistência...

Não sou eu quem deve esclarecer e fundamentar a prática denunciada de prolongamentos dos internamentos para alterar os financiamentos dos Hospitais.

Existiu uma denúncia.
Feita – espero que com dados fundamentados – por uma Direcção Clínica de um HH do SNS, ao CM , julgo que a coberto do sigilo da fonte de informação.
Esta denúncia deve ser tratada convenientemente.
Ou é completamente falsa, ou não sendo, como os indícios que já referi parecem sugerir, deve ser investigada.
O jornal vai proteger a fonte denunciante, cabendo portanto ao IGAS, que possuirá instrumentos de análise, capazes de investigar acerca da sua veracidade.

Na verdade, todos suspeitamos que a demora média hospitalar tem sido, desde há longos anos, torturada.
E que os índices de case mix estão incapacitados de serem parte, válida e transparente, desses instrumentos de trabalho da IGAS, por absorverem resultados dessas "torturas"

Por isso, volto a insistir: “A IGAS, as ARS's, o OPSS, as Direcções Clínicas HH's, deveriam observar e monitorizar os "grandes" desvios (pelo encurtamento e/ou alongamento) às demoras médias padrão para os diferentes GDH's.”.

Já li relatórios hospitalares onde a demora média de uma PTA (prótese total da anca), sem complicações, foi de 2 dias. Nessa altura, ainda, não existiam unidades de convalescença.
Quem trabalha na Saúde tem logo a noção de que alguma coisa está mal. E não adianto mais.

O que se passa agora é o contrário – o prolongamento da demora para colher benefícios financeiros. Não sei como se consegue atingir o objectivo – não será pelos 5€/dia da taxa moderadora de internamento. Deve haver outras razões.

Mas há um facto que o Dr. Pedro Nunes tem razão.
A existirem essas práticas de prolongamento da demora de internamento, elas tem uma alta capacidade de virem a ser prejudiciais para o doente.
E dizer isso, não é cavalgar o SNS para maledicência.
È defender a centralidade do SNS - o doente.

Quanto á expressão usada "manipulação miserável" é óbvio que não posso subscrevê-la.
Só fala assim - com esse radicalismo - quem está afastado dos HH’s, há largos anos, e transitou de situação de médico para licenciado em Medicina.
Nos HH’s existem focos de tensões, áreas de crispação, mas entre administradores, gestores, médicos, enfermeiros e técnicos existe uma interface de cooperação e colaboração, muito saudável, para não caberem “manipulações miseráveis”.
O que sempre pugnei, e continuo a insistir é sobre a necessidade de cooperação inter-profissional no seio do SNS. Também podemos fraquejar por aí.

Finalmente, em defesa do Sr. Bastonário da OM.
A OM dos médicos não pode ser acusada de negligência nem de incapacidade na vigilância destas situações públicas ou de outras similares que sucedem na área privada.
Estou a pensar nas contractualizações dos HH’s privados com sub-sistemas (ADSE, p. exº) quando grande parte das competências de regulação e fiscalização, foram-lhe liminarmente retiradas.
Para serem entregues a quem? À ERS!
Que mais uma vez passa ao lado de tudo, menos da obsessão dos rankings..

Espero ter esclarecido a minha posição sobre este assunto.

Que, para mim, não deve ser considerado com uma “não notícia”.
Mas isso são critérios jornalísticos…

2:20 da tarde  
Blogger Joaopedro said...

Não acredito que haja um único gestor hospitalar que seja (AH, médico, técnico) em todo o SNS que tenha dado semelhante orientação.
A noticia em causa tem de ser devidamente investigada e apuradas responsabilidades por semelhante atoarda.
Se algum HH incorreu em tal procedimento, que igualmente se apurem os responsabilidades.
Mais uma vez, à primeira vista, a intervenção do senhor bastonário, a não dispor de informação privilegiada, é de uma enorme irresponsabilidade.

Depois do ressurgimento do movimento de contestação dos professores, tinha que calhar alguma coisa à Saúde.
Qualquer dia, dá nojo viver neste país.

3:12 da tarde  
Blogger Clara said...

Dar-se-à o caso de o é-pá saber mais alguma coisa sobre este caso e não querer partilhar tal informação connosco ?!...

3:21 da tarde  
Blogger Tavisto said...

Não parece estar em causa o direito, direi mesmo o dever, que o Bastonário tem de denunciar situações anómalas do Sistema de Saúde particularmente se lesivas da saúde dos doentes. O que se crítica é o duplo padrão do Dr. Pedro Nunes na sua capacidade de indignação consoante se trate de erros ou atropelos cometidos nos serviços públicos ou privados. Para os primeiros é hipercrítico na análise e excessivo na verbalização, quanto aos segundos a permissividade é total.
Aos exemplos apontados por “silly season”, quanto a matéria para investigação pela Ordem dos Médicos relativamente a comportamentos irregulares do sector privado, acrescento mais uma: O de fazer reflectir no salário do profissional o valor dos exames complementares requisitados, pagando em percentagem.

4:05 da tarde  
Blogger Hospitaisepe said...

O E-Pá, ora está de um lado ora está do outro.
Deve ser do Benfica.
Parece uma papoila saltitante!

4:19 da tarde  
Blogger saudepe said...

«É verdade, os hospitais, dentro do processo de gestão, prolongam a estada dos doentes mais um dia ou dois para atingir o financiamento justo. »
A ser verdadeira esta declaração não há a mínima dúvida que o presidente da APAH meteu água pela barba.
Uma ingenuidade imcompreensível !

4:33 da tarde  
Blogger DrFeelGood said...

Será que nesta prática há conivência dos AH?
Como a declaração do presidente da APAH deixa antever:

«É verdade, os hospitais, dentro do processo de gestão, prolongam a estada dos doentes mais um dia ou dois para atingir o financiamento justo. »

E, então, o caso é mais grave do que parece.

6:41 da tarde  
Blogger e-pá! said...

Cara Clara:

Trabalhei mais de 30 anos em HH's do SNS. Já exercia medicina antes do SNS.
Durante tanto tempo de exercício vi muito atropelo, mas vi também boas práticas, brio e dignidade em todos os trabalhadores da Saúde.

Estou aposentado da função pública desde 1 de Maio passado (dia do trabalhador!).
Não possuo qualquer informação previlegiada sobre o caso.
Não sei se o Dr. Pedro Nunes a tem, nunca pertenci ao seu inner group.
É o meu bastonário eleito pela corporação.

Mas, já agora, quem sugere estar na posse de mais informação, de outros dados, é o presidente da APAH - Dr. Pedro Lopes.
Pior, o Dr. Pedro Lopes, afirma que o MS conhece esta situação que diz existir há anos...
Isto é que pode ser informação priveligiada.

Caro hospitaisepe:

Várias correcções:
- Não sou benfiquista...
- As papoilas não saltitam, mas algumas servem para produzir ópio. Que como sabe é estupefaciente com propriedades entorpecentes. Como pode ver "entorpecer" não foi a minha postura perante este caso.
O que pretendi foi questionar.

A correcção que fiz entre o primeiro e o segundo comentário diz respeito uma discordância semântica da linguagem utilizada. É um aspecto de pormenor.
Afirmei, reafirmo, com a convicção de uma longa vivência, que:
"Nos HH’s existem focos de tensões, áreas de crispação, mas entre administradores, gestores, médicos, enfermeiros e técnicos existe uma interface de cooperação e colaboração, muito saudável, para não caberem “manipulações miseráveis”.
Mantenho esta imagem ética sobre os trabalhadores da saúde. As minhas dúvidas são sobre comissários políticos que, se movimentam (e têm responsabilidades) no seio da Saúde - neste caso do SNS.
Não conheço, com a mínima profundidade, a metodologia de actuação do sector privado. Conheço casos esparsos condenáveis, transmitidos por uma das partes (os lesados) mas, tais informações, não constituiem uma base sólida para inferir a verdade.
É que além de não ser papoila, nunca fui inspector ou quaisquer ofícios correlativos.

7:58 da tarde  

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