sexta-feira, janeiro 9

Fumar mata


Janeiro, oito horas, está um frio de rachar.
Entro na pastelaria de bairro. Um croissant e uma bica cheia.
Ao longo do balcão, os clientes habituais tagarelam entre natas e meias de leite. Esboço um gesto habitual. De imediato desfeito, quando reparo que os cinzeiros desapareceram .
Pago e saio para o frio.
No curto trajecto em direcção ao escritório consigo tirar umas passas apressadas.
Três horas de papelada mais tarde, dois cigarritos à socapa, levo pela décima quinta vez a mão ao bolso onde jaz o meu SGfiltro.
Lá fora o frio continua desanimador.
Encontro-me com os amigos para o almoço. A conversa animada do costume (gajas boas e futebol). Entre garfadas de arroz de tomate, deliciosos pastelinhos de bacalhau e carrascão da casa. No meio da bica com cheirinho cai um silêncio penoso. Adivinhando a nossa ansiedade, o empregado faz-nos lesto as contas com um sorriso trocista.
No trajecto de regresso ao trabalho consigo a proeza de fumar um cigarro inteiro. O quinto do dia.
À noite, lá estou no pavilhão da Luz para apoiar o glorioso contra o Ginásio. A animação do costume. Uma bancada inteira impedida de disfarçar o nervosismo clubista entre passas curtas de SGfiltro. Ventil. Malboro de contrabando. Canabis para os mais radicais.
A minha mulher diz que inexplicavelmente passei a roer as unhas.
Regresso de metro a casa. Quedo-me na soleira da porta: Os pés enregelados não me deixam ir além do meio cigarrito.
Feitas as contas . Não cheguei aos dez cigarros.
Desde a proibição tenho poupado meio maço por dia. À bolsa e ao pulmão.

Para surpresa minha leio hoje no DE (08.01.09), o seguinte:
«Um exemplo recente, que deveria ter feito corar de embaraço os especialistas de políticas de saúde e saúde pública, foi a tentativa de explicar a quebra no consumo de tabaco como um efeito da nova lei do tabaco»
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Este PKM não é fumador. Nem nunca engoliu umas passas. Se soubesse o inferno em que isto se tornou. Não escrevia estas patetices.
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8 Comments:

Blogger margarida said...

Excelente post.
PKM continua desajeitado.
Um caso tipico de falta de talento para este tipo de crónicas.
PKM, tarda em acertar o rumo.

2:03 da tarde  
Blogger Orapronobis said...

Que belo texto este!

Quanto ao tabaquito acompanho-o nos seus esforços para controlar o (saboroso) vício.

Como o compreendo quando, adicionalmente, rói as unhas… recentemente o nosso glorioso não nos tem ajudado nada na redução do stress!

Orapronobis

2:13 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Como o compreendo.
Desisti do tabaco devido aos incomodos e aos olhares penalizadores.
Uma das situações dei por mim a fumar o meu cigarro enquanto comprava o jornal no quiosque (em plena rua) e uma senhora chegou e colocou-se ao meu lado com uma criança, imediatamente olhou para mim como se tivesse alguma doença altamente contagiosa. Se tivesse um buraco desapareceria...
Quem não fuma ou nunca fumou não sabe o que a Lei alterou ao nível dos comportamentos dos fumadores e dos outros...

9:27 da tarde  
Blogger e-pá! said...

Caro Xavier

Reproduzo-lhe uma pequena parcela de um texto memorável sobre o Mundo simbólico do tabaco, que serve para um fumador, em "apropriada" queda de consumo controlada, "filosofar", num qualquer Janeiro, a qualquer hora, com um frio de rachar, o habitual no Inverno...

"Há alguns anos, decidi parar de fumar.
O início foi duro e, na verdade, eu não me preocupava tanto por perder o gosto do tabaco quanto por perder o sentido do acto de fumar.
Produziu-se toda uma cristalização: eu fumava nas casas de espetáculo, ao trabalhar pela manhã, à noite depois do jantar, e parecia-me que, deixando de fumar, eu iria privar o espetáculo de seu interesse, o jantar de seu sabor, o trabalho matinal de seu frescura e vivacidade.
Qualquer que fosse o acontecimento inesperado que irrompesse aos meus olhos, parecia-me que, fundamentalmente, ele ficaria empobrecido a partir do momento em que não mais pudesse acolhê-lo fumando. [] Parecia-me que tal qualidade seria por mim exterminada e que, no meio desse empobrecimento universal, valia um pouco menos a pena viver. Pois bem: fumar é uma reação apropriadora destruidora. O tabaco é um símbolo do ser "apropriado", já que é destruído ao ritmo de minha respiração []. Para manter minha decisão de parar,
tive de realizar uma espécie de descristalização, ou seja, sem exatamente perceber, reduzi o tabaco a si mesmo: uma erva que queima; suprimi seus vínculos simbólicos com o mundo; convenci-me de que não estaria subtraindo nada ao teatro, à paisagem, ao livro que estava lendo, se os considerasse sem o meu cachimbo; isto é, finalmente, percebi haver outras maneiras de possuir esses objetos, além dessa cerimónia de sacrifícios"
.

Jean-Paul Sartre in L'Être et le néant: Essai d'ontologie phénoménologique.
(tradução livre)

10:07 da manhã  
Blogger Hospitaisepe said...

Face às sucesivas crises, o sector da Saúde tem sido o menos penalizado em termos de desemprego.

E que dizer dos inúmeros novos cursos não reconhecidos pelo ME ministrados a alunos incautos cujo futuro certo é desemprego?

PKM limita-se como é seu hábito a lançar uns estalidos para o ar sobre matérias que não sabe ou não consegue tratar.

12:50 da tarde  
Blogger joao saramago said...

Mais patetices do PKM:
a) em relação ao "sucesso" dos Hospitais EPE, devemos esperar uma clarificação do Modelo de empresarialização em vigor. Até ver, o modelo adoptado por este governo, não promove a autonomia dos gestores hospitalares nem permite a adaptação às realidades e especificidades locais. Continuamos a verificar decisões centralizadas e todo o tipo de interferências arbitrárias da tutela na micro gestão das unidades de saúde do SNS. Veremos alguma mudança?

Então para já, ao julgamento do modelo EPE, não basta a obtenção de ganhos de eficiência ?

«Já o aumento da eficiência em 1,5% foi alvo de atenção. Ana Paula Harfouche refutou por completo o reparo feito, de que este seja um aumento modesto. Na sua opinião, «esta eficiência de 1,5% é muito», porque «há organizações que não crescem ou decrescem».
Mantendo a tónica do que já havia dito ao «Tempo Medicina» (edição de 24 de Novembro) a propósito de não existir evidência de que a diferença da eficiência tivesse aumentado entre os hospitais-empresas e os que permaneceram no sector público administrativo no período estudado, entre 2001 e 2003, a investigadora salientou que os resultados permitem verificar que há um «carácter regenerador da reforma» e que, apesar de serem os "primeiros passos», algo «mexe na organização". »TM 05.01.09

4:09 da tarde  
Blogger Clara said...

«Um estudo feito por uma empresa científica aponta entre os primeiros dados que cerca de cinco por cento dos fumadores deixaram de fumar »
Ana Jorge,DD, 30.12.08

Evidências que moem o professor PKM, a construir uma carreira de oposicionista, a pensar num lugarzinho de destaque quando o PSD voltar a ser Governo (lá para o ano de dois mil e troca o passo).

4:17 da tarde  
Blogger saudepe said...

Caro PKM como explicar o êxito da gestão do Hospital de Santa Maria?
Para lá da competência da liderança do Adalberto Campos Fernandes, o modelo EPE demonstrou ser suficientemente capaz de se adaptar à inovação e à mudança.
E de uma forma geral, o mesmo acontece na generalidade dos HH que adoptaram este modelo.
O pior cego é aquele que não quer ver.

6:57 da tarde  

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