Genéricos em Portugal
Hipocrisias, dissimulações e (algumas) tontarias…
A polémica desencadeada pela provocatória campanha da ANF fez emergir, na espuma dos dias muito daquilo que, de pior, existe no nosso sistema e nas políticas de saúde.
É óbvio que o desafio avançado por João Cordeiro tinha como racional (desenhado com o profissionalismo e a sageza habitual da agência de comunicação LPM) um efeito cujos objectivos, fundamentais, visam o médio prazo. Qualquer observador, minimamente, atento percebe que JC nos seus trinta anos de domínio (quase absolutista) do sector das farmácias não tem idade nem falta de experiência que o leve a “dar ponto sem nó”. É divertido ver alguns jornalistas e “opinion-makers” virem a terreiro falar de recuo, isolamento e derrota. Não perceberam nada mesmo do que está em jogo. JC e a ANF sabiam, claramente, que o desafio formulado configurava um crime, um acto de incitação pública ao incumprimento de uma Lei do Estado de Direito. Bastaria, aliás, às entidades oficiais terem feito uma pequena Nota à Imprensa e comunicado ao facto à PGR. Em alternativa fez-se o alarido do costume.
O que JC pretendia já conseguiu ao impor, na agenda política e mediática, uma questão incómoda, perturbadora e muito difícil de sustentar. Afinal porque razão os países nórdicos ou até mesmo os Estados Unidos se permitem poupar tantos milhões de Euros e Dólares abdicando de discutir estas questões, aparentemente, tão importantes entre nós. É caso para lembrar a discussão havida há uns anos (e as posições da OM da altura) sobre os riscos apocalípiticos de libertar para a venda livre coisas tão perigosas como as vitaminas, os anti-histamínicos, os analgésicos e os antipiréticos.
A questão da prescrição médica tem pouco para discutir nos seus fundamentos éticos e científicos. É um acto de responsabilidade individual e profissional. Faz parte do “contrato de confiança” que subjaz à relação de confiança que deve prevalecer na relação médico-doente. Tal não tem, contudo, nada a ver com o folclore mediático, por vezes patético, da discussão havida em torno dos genéricos, das DCI’s, da farmacovigilância, do “patient safety”, da qualidade, etc.
Mais importante do que envolver-se nesta querela estéril, de discutir a segurança a partir das cores dos comprimidos, ou (pasme-se) dos excipientes, seria preferível que as Autoridades de Saúde se afincassem no trabalho de impor, em todas as Unidades do SNS, a prescrição electrónica, por DCI, suportada em guidelines e em consensos científicos que suportem recomendações terapêuticas.
- Porque razão afinal a autoridade nacional do medicamento se vê obrigada a comercializar oitenta marcas de Simvastatina?
- Porque razão afinal a autoridade nacional do medicamento não assumiu, ainda, publicamente que lhe cabe garantir aos cidadãos a segurança e a eficácia de TODOS os medicamentos que autoriza comercializar?
- Porque razão o MS não faz concursos internacionais (à semelhança dos existentes nos HH’s) e adquire por cada DCI, anualmente, um conjunto restrito de genéricos de qualidade certificada e preço garantido?
- Porque razão nos países do norte da Europa as companhias de genéricos prescindirem de delegados (custam cerca de 60.000 Euros/ano) e em Portugal as companhias que comercializam genéricos só conseguem fazer progredir a sua quota suportados em enormes forças de vendas?
- Porque razão se continua a dar “incentivos” a médicos e farmacêuticos ganhos por pontos acumulados na prescrição de genéricos? Será pelas diferenças de forma, da cor ou do excipiente dos comprimidos?
- Porque razão o Estado “manda às urtigas” uma poupança anual estimada de cerca de 120 milhões de Euros e prefere continuar a subfinanciar os HH’s públicos comprometendo o seu futuro para depois os entregar de bandeja a grupos privados dominados pela própria ANF?
- Não seria mais corajoso (em vez de ameaçar JC com o não pagamento das receitas) ter anulado todas as PPP’s? Liberalizar totalmente o mercado das farmácias? Ensaiar a unidose? Abrir farmácias nos HH’s, ACE’s e USF e farmácias sociais? Comprar, em concurso internacional, os fármacos mais prescritos aproximando os custos de aquisição dos existentes (já hoje) nos HH’s? Coragem não seria também implementar, rapidamente, a prescrição electrónica e guidelines nos ACE’s e nas USF’s?
É claro que no final disto tudo vem a rábula da formação. Que o Estado não paga a formação (que será feito do valor pago pelos contribuintes em milhares dias de comissões gratuitas de serviço por ano?) E quanto à formação sobre genéricos? Não quererá a OM publicar a listagem nominal de todos os médicos que frequentaram reuniões no Estrangeiro em 2008 subsidiados por companhias farmacêuticas de genéricos? Terão ido à China ou ao Brasil discutir os últimos dados científicos sobre cor, forma ou excipientes do omeprazol?
Porque razão a OM não se associa ao MS e propõe à Apifarma a constituição de um Fundo (neutro) de Apoio à Formação Médica Continuada com financiamento misto do Estado e de uma percentagem sobre as vendas das companhias farmacêuticas? Desse modo ficava salvaguardado o propósito filantrópico da IF e a tão proclamada independência dos médicos. Quanto aos genéricos se a compra fosse centralizada na ACSS os “efeitos comercias” deletérios no retalho ao nível das farmácias (bónus, viagens e leasings) pura e simplesmente seriam eliminados.
É claro que tendo em conta subsidiação e o apoio a sociedades, associações, media, empresas de eventos e poderes (públicos e privados) a IF tem muito mais poder do que se calhar terá o “patriarca” da ANF. É preciso, no entanto, relembrar que o poder que a ANF tem foi sendo construído, ao longo dos últimos trinta anos, com o apoio de sucessivos governos e diferentes maiorias políticas…E já agora, não esquecer, que a IF, nos últimos trinta anos, tem tratado Portugal como um país do terceiro mundo com margens e preços vergonhosos jogando, cinicamente, com a dívida rolante para justificar práticas e políticas comerciais que em poucos países da Europa viu toleradas.
A polémica desencadeada pela provocatória campanha da ANF fez emergir, na espuma dos dias muito daquilo que, de pior, existe no nosso sistema e nas políticas de saúde.
É óbvio que o desafio avançado por João Cordeiro tinha como racional (desenhado com o profissionalismo e a sageza habitual da agência de comunicação LPM) um efeito cujos objectivos, fundamentais, visam o médio prazo. Qualquer observador, minimamente, atento percebe que JC nos seus trinta anos de domínio (quase absolutista) do sector das farmácias não tem idade nem falta de experiência que o leve a “dar ponto sem nó”. É divertido ver alguns jornalistas e “opinion-makers” virem a terreiro falar de recuo, isolamento e derrota. Não perceberam nada mesmo do que está em jogo. JC e a ANF sabiam, claramente, que o desafio formulado configurava um crime, um acto de incitação pública ao incumprimento de uma Lei do Estado de Direito. Bastaria, aliás, às entidades oficiais terem feito uma pequena Nota à Imprensa e comunicado ao facto à PGR. Em alternativa fez-se o alarido do costume.
O que JC pretendia já conseguiu ao impor, na agenda política e mediática, uma questão incómoda, perturbadora e muito difícil de sustentar. Afinal porque razão os países nórdicos ou até mesmo os Estados Unidos se permitem poupar tantos milhões de Euros e Dólares abdicando de discutir estas questões, aparentemente, tão importantes entre nós. É caso para lembrar a discussão havida há uns anos (e as posições da OM da altura) sobre os riscos apocalípiticos de libertar para a venda livre coisas tão perigosas como as vitaminas, os anti-histamínicos, os analgésicos e os antipiréticos.
A questão da prescrição médica tem pouco para discutir nos seus fundamentos éticos e científicos. É um acto de responsabilidade individual e profissional. Faz parte do “contrato de confiança” que subjaz à relação de confiança que deve prevalecer na relação médico-doente. Tal não tem, contudo, nada a ver com o folclore mediático, por vezes patético, da discussão havida em torno dos genéricos, das DCI’s, da farmacovigilância, do “patient safety”, da qualidade, etc.
Mais importante do que envolver-se nesta querela estéril, de discutir a segurança a partir das cores dos comprimidos, ou (pasme-se) dos excipientes, seria preferível que as Autoridades de Saúde se afincassem no trabalho de impor, em todas as Unidades do SNS, a prescrição electrónica, por DCI, suportada em guidelines e em consensos científicos que suportem recomendações terapêuticas.
- Porque razão afinal a autoridade nacional do medicamento se vê obrigada a comercializar oitenta marcas de Simvastatina?
- Porque razão afinal a autoridade nacional do medicamento não assumiu, ainda, publicamente que lhe cabe garantir aos cidadãos a segurança e a eficácia de TODOS os medicamentos que autoriza comercializar?
- Porque razão o MS não faz concursos internacionais (à semelhança dos existentes nos HH’s) e adquire por cada DCI, anualmente, um conjunto restrito de genéricos de qualidade certificada e preço garantido?
- Porque razão nos países do norte da Europa as companhias de genéricos prescindirem de delegados (custam cerca de 60.000 Euros/ano) e em Portugal as companhias que comercializam genéricos só conseguem fazer progredir a sua quota suportados em enormes forças de vendas?
- Porque razão se continua a dar “incentivos” a médicos e farmacêuticos ganhos por pontos acumulados na prescrição de genéricos? Será pelas diferenças de forma, da cor ou do excipiente dos comprimidos?
- Porque razão o Estado “manda às urtigas” uma poupança anual estimada de cerca de 120 milhões de Euros e prefere continuar a subfinanciar os HH’s públicos comprometendo o seu futuro para depois os entregar de bandeja a grupos privados dominados pela própria ANF?
- Não seria mais corajoso (em vez de ameaçar JC com o não pagamento das receitas) ter anulado todas as PPP’s? Liberalizar totalmente o mercado das farmácias? Ensaiar a unidose? Abrir farmácias nos HH’s, ACE’s e USF e farmácias sociais? Comprar, em concurso internacional, os fármacos mais prescritos aproximando os custos de aquisição dos existentes (já hoje) nos HH’s? Coragem não seria também implementar, rapidamente, a prescrição electrónica e guidelines nos ACE’s e nas USF’s?
É claro que no final disto tudo vem a rábula da formação. Que o Estado não paga a formação (que será feito do valor pago pelos contribuintes em milhares dias de comissões gratuitas de serviço por ano?) E quanto à formação sobre genéricos? Não quererá a OM publicar a listagem nominal de todos os médicos que frequentaram reuniões no Estrangeiro em 2008 subsidiados por companhias farmacêuticas de genéricos? Terão ido à China ou ao Brasil discutir os últimos dados científicos sobre cor, forma ou excipientes do omeprazol?
Porque razão a OM não se associa ao MS e propõe à Apifarma a constituição de um Fundo (neutro) de Apoio à Formação Médica Continuada com financiamento misto do Estado e de uma percentagem sobre as vendas das companhias farmacêuticas? Desse modo ficava salvaguardado o propósito filantrópico da IF e a tão proclamada independência dos médicos. Quanto aos genéricos se a compra fosse centralizada na ACSS os “efeitos comercias” deletérios no retalho ao nível das farmácias (bónus, viagens e leasings) pura e simplesmente seriam eliminados.
É claro que tendo em conta subsidiação e o apoio a sociedades, associações, media, empresas de eventos e poderes (públicos e privados) a IF tem muito mais poder do que se calhar terá o “patriarca” da ANF. É preciso, no entanto, relembrar que o poder que a ANF tem foi sendo construído, ao longo dos últimos trinta anos, com o apoio de sucessivos governos e diferentes maiorias políticas…E já agora, não esquecer, que a IF, nos últimos trinta anos, tem tratado Portugal como um país do terceiro mundo com margens e preços vergonhosos jogando, cinicamente, com a dívida rolante para justificar práticas e políticas comerciais que em poucos países da Europa viu toleradas.
olho vivo
Etiquetas: olho vivo
15 Comments:
Apenas 2 coisas:
1.Vê-se bem no gráfico que em Portugal o volume é bem inferior ao valor, ao invés de todos os outros países. Logo, cá os genéricos são bem mais caros (em média por caixa)!! Vamos a baixar ainda mais os seus preços, esmagando esses lucros de modo a equipará-los aos de outros países, porque de facto a ÚNICA vantagem dos genéricos é o seu baixo preço e só assim se cumpre esse desígnio. Será que, com esses preços o Dr. Cordeiro continuará tão interessado no bem público???
2. Agora, que parece que o Governo acertou as contas com as farmácias, já não está a pagar milhões de Euros em juros e segundo F. Ramos poupa-se 76 milhões de Euros/ano. Já é significativo e é menos esse que entra na ANF!
Caro "olho vivo":
Uma perpiscaz visão do problema e o elencar de conjunto de medidas adequadas, que ultrapassam a visão estreita dos medicamentos genéricos enquanto importante factor económico na área da Saúde.
Eram estes pontos que deveriam integrar a revisão da regulamentação da prescrição anunciada pela Ministra e não só eliminar as tropelias de João Cordeiro.
Aliás, do que foi prometido nas últimas eleições da ANF, falta ainda accionar a importação paralela. Espero que o Governo esteja atento a esta medida que poderá influenciar, de modo determinante, o custo dos medicamentos.
A prescrição de genéricos - toda a gente tem fugido de o afirmar - tem progredido de ano para ano. Obviamente que tem limites (os EUA estarão próximos dele) ou, então, a investigação farmacêutica, nos últimos anos teria sido nula ou ínfima.
Os genéricos não podem ser introduzidos de chofre, embora se sinta que as farmácias desejem, para além de lucros rápidos, liderar a opinião pública na área da saúde.
A conferência de imprensa de João Cordeiro é um chorilho demagógico que nunca esclarece uma intrigante particularidade do negócio. Porque auferindo as Farmácias lucros à % preferem vender os produtos com menor valor? Intrigante!
Ou, nas novas competências oferecidas por Sócrates no “Compromisso para a Saúde”, ficaram habilitados a passar atestados de ineptos aos utentes do SNS. Isto é, aos cidadõs.
A introdução dos genéricos na prescrição médica quotidiana tem de ser feita gradativamente (é o que está a suceder) e tem como base os referenciais da literatura médica internacional idónea e independente, bem como a confiança técnica e a experiência pessoal do prescritor. Não andar com a carroça à frente dos bois…
É necessário procurar procedimentos explícitos de controlo de qualidade, é preciso estar atento à investigação e às fontes de documentação idóneas e pertinentes e fomentar a troca de opiniões com outras equipas médicas internacionais.
É obrigatório evitar influências económicas e financeiras (por vezes políticas) industria e empresas intervenientes neste domínio, inclusivé de organizações dedicadas à elaboração de sistemas de cuidados.
Muitas destas instituições estão enfeudadas a interesses particulares.
Portanto, a boa precrição em custo/benefício advirá da intensiva procura de relatórios e informações provenientes de organismos com objectivos não lucrativos, onde os leitores (médicos, farmacêuticos,gestores e, inclusive, doentes ou associações de doentes) tenham capacidade de intervir nas publicações e, em casos ideais, integrem a sua administração. Publicações onde ojectivos publicitários estejam ausentes e não dependam de subvenções da Indústria Farmacêutica.
É, também, a recusa de uma dupla preversão: the opinion-makers!
Fazer conferência, orientar colóquios, participar em simpósios, como médicos (ou especialistas nas áreas), farmacêuticos ou qualquer outro estatuto, quando na realidade são consultores de empresas industriais, sendo profusamente abonados por essa função (logro para o auditório).
As declarações de interesses têm de ser obrigatórias.
Em resumo, os médicos prescritores devem manter total independência em relação à Indústria Farmacêutica.
A independência profissional e a solidez dos conhecimentos não são proclamáveis.
Mas devem poder ser escrutinadas e verificadas a qualquer momento.
Quando se afirma categoricamente que o princípio activo é igual ao original devo ter possibilidade de saber se é igual, similar ou equivalente. O que, parecendo a mesma coisa, será diferente.
Finalmente, o gráfico que abre o post. Os shares do mercado de genéricos, referentes a 2006, mostram que, em Portugal, para um volume de vendas muito modesto um valor muito alto. Para um volume de vendas idêntico na Suiça corresponde a um valor cerca de 60%menos… Será?
Isto é, os genéricos não estão, ainda, a atingir o seu objectivo primordial na relação custo/eficácia.
Os "genéricos", aparentemente, não estão a beneficiar os doentes. Algo se perde no caminho.
Uma oportunidade para rever toda a gestão do circuito do medicamento...
Caro "olho vivo":
Na mouche!
Está lá tudo!
E, se é verdade "que a que a IF, nos últimos trinta anos, tem tratado Portugal como um país do terceiro mundo ...", não é menos verdade que aos decisores políticos, em geral, cabe a responsabilidade de o terem propiciado!
Neste post encontro uma excelente base de trabalho para um Programa Eleitoral para as eleições que se avizinham.
Ironicamente, claro, deixem-me que pergunte:
Algum dos partidos do denominado "arco da governação" terá a coragem de lhe pegar?
Um excelente post e um momento alto na Saúde SA. Subscrevo na íntegra a apreciação de “olho vivo” sobre esta matéria.
Excelente.
Concordo: Que melhor base de trabalho para um Programa Eleitoral ?
No meio desta balbúrdia, estrategicamente criada pelo Dr. João Cordeiro, onde em consequência do "Compromisso para a Saúde", ninguém sabe onde começa e onde acaba a intervenção dos farmacêuticos no vasto campo da Saúde, a imagem e a realidade do exercício médico, em Portugal, está ferida das maiores lacunas, de intoleráveis omissões e de "áreas sombra".
A juntar a este estouvado e perigoso enquadramento, onde a ANF resolveu introduzir a componente promiscuidade ao produzir, distribuir, comercializar, vender, aplicar e aconselhar medicamentos, auferindo "lucros" em todas as fases desta "cascata", surge o mundo subterrâneo das medicinas, ditas, alternativas.
Todos estes passos, todas estas derivas, algumas destas crendices, oneram o custo da Saúde em Portugal porque, as más práticas, são o dia a dia.
O português, seja saudável, ou padeça de alguma enfermidade, não tem a cultura de reivindicação dos direitos do consumidor, excepto em relação à medicina hipocrática, e nesta, com especial acuidade pelos serviços públicos (instituições do SNS), onde é implacável nos seus juízos e na ligeireza de instaurar procedimentos judiciais, visando o seu justo, ou duvidoso, ressarcimento.
Estas afirmações não pretendem negar, nem desvalorizar, o "erro médico".
Mas seria óptimo se conseguissemos reduzi-lo, introduzindo boas práticas e, simultaneamente, promovendo a evicção de um mundo de charlatanice que vegeta marginalmente a qualquer praxis.
São coisas distintas.
Hoje, o Jornal Público chama a atenção para mais uma destas vertentes, cuja existência só é possível, porque em Portugal a responsabilidade diliu-se e, o poder achou por bem, manter na indefinição - o se quisermos no controverso ambiente da ilusão, a definição do acto médico.
Chamo a atenção dos leitores do Saudesa para esta elucidativa prosa:
"Há pessoas com a quarta classe a ver doentes"
Telma Gonçalves Pereira sabe do caso de um estofador de automóveis que se tornou naturopata por ser um ramo mais rentável.
"Há pessoas com a quarta classe a ver doentes", alerta a médica anestesista que hoje se dedica sobretudo à homeopatia no seu consultório privado em Lisboa.
"Não é uma questão de classe exacerbada, não é uma questão corporativa", sublinha.
"Alguns doentes correm riscos" e é urgente a regulamentação.
Fala do exemplo da Alemanha, onde existem terapeutas com carteira profissional e limites de actuação definidos, sabendo a partir de que momento devem mandar os doentes para os médicos convencionais.
"Pode-se-lhes pedir responsabilidade. Aqui não! É a barafunda total."
"Já tenho mandado doentes para as urgências do Instituto Português de Oncologia [porque tinham cancro] e andaram a fazer energias e reiki. Está na moda."
Ao mesmo tempo, sublinha que as substâncias ditas naturais não são necessariamente inócuas.
Lembra-se de um doente que sofria de prisão de ventre e a quem um naturopata aconselhou que tomasse potássio. "O potássio pode fazer paragem cardíaca."
"Às vezes, mandam parar medicamentos para a tensão para substituir só por produtos naturais."
"Na ervanária, dão cházinho para a prisão de ventre, pode ser cancro. O que eles deveriam dizer e não dizem é: 'Se não melhorar, vá ao médico'."
A médica homeopata diz que podem exercer estes métodos médicos ou então pessoas "com cursos oficializados, com estruturas científicas e abrangentes e fiscalizados".
Helena Ferreira, a médica vice-
-presidente da Sociedade Portuguesa Médica de Acupunctura, é mais peremptória.
Na sua opinião, a acupunctura deve apenas ser exercida por médicos ou por profissionais "com supervisão médica", porque a profissão médica tem regras estritas em relação à publicidade e porque é preciso à mesma fazer "um diagnóstico à moda ocidental, usando meios complementares [análises, exames]".
Lembra o caso de uma rapariga que vinha fazer acupunctura porque se queixava de dor nas costas mas na verdade tinha um pneumotórax. Teve que ir para o hospital e esteve internada três semanas."
C.G., Público, 11.04.2009, pág. 3
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Excelente post.
Há, no entanto, que não esquecer o papel importante da IF nas nossas exportações.
Portugal, segundo noticiava recentemente o semanário Expresso, exporta mais medicamentos do que vinho do Porto ... Perto de 400 milhões de euros ano.
Uma pequena gota de água em relação ao volume mundial de vendas, cerca de 500 mil milhões de dólares, cabendo aos EUA 50% deste negócio, repartindo-se a outra metade entre a Europa (apenas 15 mil milhões de dólares) e o Japão.
Penso que em 2005 a PharmaPortugal (formada pelos laboratórios Basi, Bial, Bluepharma, Edol, Iberfar, Jaba, Labesfal, Laboratórios Azevedos, Lusomedicamenta, Medinfar, Tecnifar, Tecnimed e Vida). estabeleceu uma parceria estratégica com o ICEP, Apifarma e Infarmed para a promoção da exportação nacional de medicamentos em todo o mundo, já com presença nos mercados farmacêuticos de cerca de oitenta países.
A conjugação dos vários interesses, a maioria dos quais legitimos, em redor da gestão do medicamento é que tornam qualquer intervenção política neste sector extremamente didicil. Responsável pelas frequentes distorções de informação e conclusões precipitadas com que todos os dias nos vemos confrontados nos órgãos de comunicação social.
Em termos éticos, é chocante admitir-se sequer a hipótese de inviabilizar a criação e o lançamento de uma inovação terapêutica só por razões economicistas
Aceitar sem rebuço uma medicação ultrapassada em vez de medicamentos mais inovadores, só com o objectivo de reduzir a factura actual do sistema, pode induzir custos bem maiores quando contabilizarmos, por exemplo, os valores dos acréscimos de tratamentos e de absentismo provocados pelo prolongamento do período de doença, Isto para não falar já na redução da qualidade de vida dos doentes e daqueles que lhes são próximos
João Almeida Lopes, presidente da Apifarma.
JP, 07.04.09 (in TM)
Se o senhor JAL está tão preocupado, como parece, com o acesso dos portugueses aos medicamentos, porque não promove uma campanha de redução dos preços entre os associados da Apifarma.
«se não houver regras orientadoras para o trabalho nos hospitais», desde a criação de protocolos à monitorização dos doentes que tomam fármacos mais caros, «os medicamentos não chegam para todos».
Odete Isabel, tempo medicina 13.04.09
Falar Verdade
Tanta boa gente preocupada com os excessos populistas de JC e da ANF e, no entanto, tão pouca preocupação com “os custos a mais” que a IF impôs ao sistema de saúde, nos últimos trinta anos. Tão interessante que seria debater o comportamento da IF, em Portugal, nestas últimas décadas, os milhões de Euros retirados à nossa economia e transferidos para os países ricos, o acelerado e fortíssimo desinvestimento produtivo por troca numa aposta maciça em “forças de vendas” gigantescas com o único objectivo de impor pela “formação” e pela influência sobre a prescrição um grande número de fármacos inúteis e de preço obsceno tendo em conta a paridade de poder de compra com os países mais ricos da OCDE.
Seria bom que esta matéria viesse aqui ao debate no SaúdeSA e se descodificasse numa base técnica e científica o verdadeiro papel da IF no descontrolo das contas do sistema de saúde e no contributo indelével para a respectiva insustentabilidade. O exemplo da Bial, por ser quase único, infelizmente, não desfaz o panorama global de uma estratégia sanguessuga num terreno prescritivo muito fértil a “influências” muito pouco científicas…
O pior é que tal como JC e a ANF também a IF, em Portugal, sempre circulou muito bem pelas alcatifas dos corredores dos poderes…
O Saudesa - para o caso de AJ não continuar- devia começar a discutir o perfil do próximo Ministro da Saúde.
a) político;
b) da casa, ou seja, profissional da saúde.
E, sobretudo, que politica de saúde podemos ambicionar face à actual crise.
O Serviço Público, parece-me, não tem condições de sobreviver se continuar com actual baixa produtividade.
Por outro lado,que alternativas podemos criar face ao actual sistema de financiamento. Alguns economistas admitem a necessidade de criar taxas moderadoras a pagar de acordo com o rendimento dos beneficiários. O que não deixa de representar um sério risco para o nosso SNS baseado na solidariedade dos cidadãos contribuintes.
PARABÉNS ao SAUDESA!
PARABÉNS ao "XAVIER"!
Na data em que se cumprem os cinco anos do "nosso" SAUDESA envio o meu abraço de agradecimento, reconhecido, ao "Xavier" por propiciar-nos, diariamente (!), este espaço único de debate das questões da Saúde - do "nosso" Serviço Nacional de Saúde.
Este abraço é extensivo a todos os bloggers que, com a sua intervenção, têm contribuído para tornar o SAUDESA no único forum, permanente e livre, de debate na área da Saúde.
Como projecto de futuro deixo uma proposta de trabalho: a edição, em livro, dos melhores posts, agrupados por grandes temas.
Não digam que não é uma proposta sedutora. E, não posso negá-lo, trabalhosa, também ...
Mas, lá que vale a pena... valerá, certamente!
Agradeço ao dr. António Rodrigues a lembrança e a estima.
Efectivamente completamos cinco anos de actividade no dia treze de Abril.
Vamos traçar como ojectivo para o sexto ano o projecto que sugere.
Um abraço
Caro Xavier:
E a tal almoçarada de convívio que, desde o ano passado, está em stand-by?
Caro ~e-pá,
Vou fazer mais uma tentativa.
Quando passar por Lx, almoçamos os dois. Está convidado. Ponto de encontro: o meu hospital.
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