domingo, maio 31

PPP´s

(ou a versão Portuguesa de La grande bouffe)

Na próxima semana estará em cima da mesa a discussão da “best and final offer” relativa ao projecto do Hospital de Loures. Estaremos assim à beira de concretizar um dos mais irresponsáveis e mais mal fundamentados processos de decisão do ponto de vista clínico, económico e financeiro a que alguma vez o Estado se tinha submetido. Venceu a pressão persistente e poderosa do “sindicato” dos interesses organizado em torno das consultoras multinacionais, dos escritórios de advogados, dos interesses políticos e económicos salpicados pelo aventureirismo de uns neófitos aprendizes de filosofia neo-liberal aplicada ao sistema de saúde.
Não nos espanta o empenho posto neste projecto por LFP. No essencial LFP aplicou a receita conhecida do PSD para a saúde (e para todos os problemas do país) – privatizar, alienar património, retalhar e vender o Estado hipotecando o interesse público. O que surpreende é a complacência do governo actual com este processo. Depois das entradas de leão no que respeita ao HFF vamos assistindo às saídas de sendeiro com a lastimável capitulação perante a LCS S24 e o silêncio com a barbárie de atropelos que vão sendo cometidas pelos HPP Cascais. Fica claro que o interesse público sai vencido quando confrontado com os tentáculos do imenso polvo que procura, por todos os meios, capturar e destruir o serviço público para, rapidamente, tomar conta do respectivo financiamento. Pouco importa se no terreno já se montam “moscambilhas” negociais entre a parte de gestão pública dos HPP (Cascais) e a sua (anémica e quase insolvente) parte privada. Pouco importa se em Vila Franca até o banco dos irmãos-metralha (BPN) pode ainda ganhar a concessão. Pouco importa se as contas do HFF ainda estão por fechar desde 2003. Para cada problema, nesta portuguesa versão da grande farra, existe sempre um verdadeiro artista “bem posicionado e influente. Poderá ser um ex-político (ainda que troca-tintas), um “gestor hospitalar” do tipo caixeiro-viajante. Poderá mesmo ser um qualquer outro que tenha deixado um ou outro hospital público semi-falido e desconjuntado ou até mesmo um qualquer que tenha vindo directamente da missão parcerias saúde para uma parceria no terreno sem passar por qualquer período de”nojo” e exigindo mesmo ser indemnizado por não poder acumular ambas as condições. O bloco central é assim mesmo. Nunca sabemos como começa mas temos sempre a certeza que acaba numa qualquer empresa do grupo CGD. Na saúde então é matemático, Interessa lá agora discutir se as ditas consultoras andam a vender, por milhões de euros, soluções não comprovadas em nenhuma parte do mundo ou mesmo até em regressão. Interessa lá agora discutir a vulnerabilidade Estado fiscalizador e regulador perante a “gula” dos grandes escritórios de advogados envolvidos no processo e cujo principal objectivo é participar na elaboração das leis, na montagem dos contratos e na futura gestão dos litígios que vierem a emergir. Interessa lá discutir se a construção destes hospitais sairia mais barata aos contribuintes através do recurso ao serviço da dívida pública ao invés dos encargos projectados para as próximas gerações. Importa lá discutir o valor actual líquido, o custo de oportunidade ou até o custo-efectividade. Importa lá discutir a coesão do sistema de saúde, a integração de cuidados ou o racional político das decisões.
O que importa mesmo é abrir rapidamente o canal de drenagem do dinheiro público para os interesses privados suportando a decisão na ausência de estratégia mas satisfazendo o apetite de “gestores” de pacotilha e de desempregados da política (passados, actuais e futuros)

Se nada disto for verdade disponham-se por favor a uma discussão pública, séria, científica e técnica sobre os fundamentos destas decisões políticas. Ficamos contudo pouco optimistas com o exemplo do que se acabou de passar com a LCS S24. link Ficou claro que a capitulação do Estado vale pouco mais de 40 M de Euros (ou então dois ou três telefonemas dos “gestores” de influências).

PPP

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7 Comments:

Blogger tambemquero said...

Governo afasta administrador da Saúde 24

Ramiro Martins, sobre quem recaíam muitas das queixas dos enfermeiros da Saúde 24 (S24), foi afastado da administração da Linha de Cuidados de Saúde (LCS) que gere aquele serviço. O novo administrador delegado da LCS chama-se Artur Martins e foi apresentado como tendo uma "enorme experiência na área dos recursos humanos".
Contactado pelo PÚBLICO, o secretário de Estado da Saúde, Manuel Pizarro, que tutela a S24, acredita que "as mudanças que estão a ser realizadas vão ao encontro da necessidade de superar as deficiências que ainda existem, mas que nunca colocaram em causa a qualidade do serviço".
O afastamento de Martins aconteceu dias depois de o Governo ter anunciado o prolongamento do contrato por mais um ano com a LCS e do despedimento da enfermeira supervisora, Ana Rita Cavaco, a primeira subscritora de uma carta denunciando o "caos organizativo" da S24.

JP 30.05.09

Um despedimento (Ana Cavaco) e um afastamento (gestor responsável da LCS).
Ficou preservado o essencial: a empresa da CGD conseguiu a renovação do contrato.

Cumpriu-se, assim, mais um triste episódio das PPP´s à portuguesa.
Ou antes, da governação da Saúde, no seu melhor.

7:47 da tarde  
Blogger tambemquero said...

CHLC nega denúncias do SMZS

Na sequência da denúncia do Sindicato dos Médicos da Zona Sul (SMZS) de que os médicos com funções de chefia no Centro Hospitalar de Lisboa Central (CHLC) estavam a sofrer pressões para assinarem contratos de comissão de serviço e prescindirem do estatuto de trabalhador em funções públicas (ver edição de 25/05), o conselho de administração (CA) endereçou ao sindicato uma carta assinada por Daniel Ferro, vogal executivo do centro hospitalar. Na missiva, a que o «TM» teve acesso, é dito que o «sindicato confunde contratos individuais de trabalho com comissões de serviço a celebrar nos termos do artigo n.º 244 e do actual artigo n.º 161 do Código do Trabalho, regime aplicável a estas chefias, como decorre do Estatuto dos Hospitais EPE».
Na carta é dito que o SMZS «sabe que esta matéria não decorre das carreiras, mas do estatuto jurídico do CHLC, enquanto EPE». Em declarações ao nosso Jornal, enviadas pelo Gabinete de Comunicação por e-mail, o CA do CHLC acusa o sindicato de estar a «prestar uma informação incorrecta, contribuindo para a desinformação e confusão entre os seus associados». É ainda referido que «o facto de os contratos estarem quase todos assinados e de muitos dirigentes terem procurado junto de advogados um esclarecimento isento, é bem sintomático da decisão informada e livre dos profissionais». O CA diz mesmo que «contrariamente ao afirmado pela estrutura sindical, a comissão de serviço é a forma legal e correcta de exercício de cargos de chefia num hospital EPE».

Confrontada com a posição do CHLC, Pilar Vicente, sindicalista do SMZS, argumentou que «a comissão de serviço é uma forma de contrato de trabalho, é individual não é colectivo» e reafirmou: «Eles [CA] exigem que as pessoas prescindam da sua condição de funcionário público.» A sindicalista acusou ainda o CA de fazer «chantagem» e «pressão», criando uma situação em que «ou as pessoas assinam os contratos ou lhes retiram os cargos de chefia para os quais foram designadas».

Tempo de Medicina 01.06.09

Daniel Ferro, um dos AH circulante da nossa praça, depois de uma aprendizagem intensiva sobre "PPP´s à portuguesa" numa das empresas de saúde do BPN, sabe muito bem o que se pretende com a exigência feita às pessoas em prescindir da sua condição de funcionário público e que esta constitui efectivamente uma violação da lei.
O que parece resultar efectivamente desta crise é a ousadia crescente dos nossos liberais de pacotilha.

8:03 da tarde  
Blogger Zé Povinho said...

Caro tambemquero quando diz: ..."O que parece resultar efectivamente desta crise é a ousadia crescente dos nossos liberais de pacotilha"...encontra uma das razões porque a legislatura acaba e avaliação de CA's nem vê-la. Já viu a maçada que seria tantos "compagnons de route" postos em causa...É que o BPN já foi chão que deu uvas e os HPP's já não aguentam mais. Teríamos um problema de empregabilidade muito perturbador...

9:40 da tarde  
Blogger Observador Atento said...

Um despedimento (Ana Cavaco) e um afastamento (gestor responsável da LCS). Ficou preservado o essencial: a empresa da CGD conseguiu a renovação do contrato. Cumpriu-se, assim, mais um triste episódio das PPP´s à portuguesa.
Ou antes, da governação da Saúde, no seu melhor.
…/…
O colega tambemquero sintetiza bem a rábula desta PPP. E sem querer prenuncia aquilo que iremos ver nos próximos capítulos das PPP’s. Tudo jóia entre a rapaziada (política) que decide condimentando até, o processo de decisão, com uma ou outra graçola. Tudo tranquilo do lado do operador privado (que em nenhum momento terá comprometido o pouco risco que aceitou correr). Na (quase certa e provável) eventualidade de aparecer um qualquer tipo chato, desmancha-prazeres, a chamar a atenção para uma outra cláusula que possa constar do contrato, ou algum bloguista ou até jornalista a colocarem questões incómodas a coisa resolver-se-á sempre. Recorre-se ao clássico sacrifício de um qualquer apatetado bode expiatório e proclama-se urbi et orbi o grande papel do sector privado na modernização do sistema de saúde. Com tudo isto reforça-se o pipeline de dirigentes (disponíveis) ainda em funções públicas prontos para novas aventuras empresariais logo que o “sacrifício” do serviço público termine.
Cada vez gosto mais do Marinho Pinto.

9:55 da tarde  
Blogger Augusto Simplício said...

A trupe…

O pântano em que ameaça afundar-se o regime democrático resulta mais de uma profunda crise de valores do que de meros circunstancialismos político-partidários. No entanto importa recordar que o velho PPD, nascido nos idos anos de setenta, nada tem que ver com aquilo em que o PSD se transformou. Nesta débacle auto-fágica que o acomete existe um antes e um depois marcado, na história, por aquilo a que se convencionou chamar “cavaquismo”. A concentração e a duração do poder atraíram muito do que pior têm as “elites” políticas. A partir de então o PSD transformou-se num grande entreposto de interesses e de negócios. Os fundos comunitários deram o mote para um verdadeiro desaforo em que, quase sempre, a política dos interesses se sobrepôs à política dos valores. Foi o tempo da renegação das ideologias, da proclamação do fim das diferenças entre esquerda e direita, dos yuppies.
A este propósito valeria a pena um trabalho académico, de natureza sociológica, que correlacionasse dirigentes políticos, deputados, titulares de cargos públicos, com escritórios de advogados e com a ocorrência de grandes negócios. Seria muito interessante conhecer as variações de riqueza de muitos destes actores entre o antes e o depois. Com efeito o cavaquismo transformou o PPD num PSD que se organizou para os “negócios” de Estado, com o Estado e a partir do Estado.
Resistiu o sector da saúde até onde pôde. Mas não resistirá mais se o PSD regressar, a curto prazo, ao poder. É que há já tão pouco para delapidar que a necessidade se afigura extrema. A “trupe” está pronta e ávida para com o blá-blá da livre-escolha, da concorrência e da eficiência engolir o serviço público de saúde. Muitos se lembrarão, certamente, das “orientações” políticas que levaram os hospitais SA a serem clientes do BPN.
O pior é no que no PS pululam, infelizmente, muitos “vendilhões do templo” prontos a cooperar mediante a simples possibilidade de se sentarem à mesa do grande festim e de poderem partilhar (ainda que apenas os restos) do faustoso repasto…

11:06 da tarde  
Blogger DrFeelGood said...

«O que parece resultar efectivamente desta crise é a ousadia crescente dos nossos liberais de pacotilha.»

O tambemquero acertou em cheio.
Com o enfraquecimento do Estado e da democracia, em tempo de crise, isto transformou-se num paraíso para os chicos espertos.

Dum lado e doutro da ténue barreira, fintam-se contratos perante a vista grossa das entidades fiscalizadoras e a complacência dos responsáveis políticos.
A morte do SNS adivinha-se.
Em "slow motion" como no final dum qualquer filme rasca de acção.

12:35 da manhã  
Blogger Antunes said...

«Se nada disto for verdade disponham-se por favor a uma discussão pública, séria, científica e técnica sobre os fundamentos destas decisões políticas.»

Tudo menos isso.
Todos sabemos que a falta de transparência faz parte deste processo.
Basta ver as propostas de contratos que têm sido feitas ao´pessoal médico e técnico do Centro Hospitalar de Cascais.

2:12 da manhã  

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