quinta-feira, agosto 20

Opinião: Melhor acesso à Saúde


Sobre as breves considerações feitas, num post anterior, ao artigo do secretário de estado da Saúde, “Opinião: Melhor acesso à Saúde”, publicado no JN, sobre o êxito deste governo relativamente à recuperação das listas de espera cirúrgicas (indicadores do SIGIC de Junho 2009), link a propósito, Manuel Pizarro, enviou-nos o comentário seguinte:

«Meu caro Xavier: será, de facto, um erro ignorar o que falhou. Mas, uma vez mais, os números impõem uma comparação. Em 31 de Dezembro de 2005 esperavam mais do que o tempo definido como adequado, 54% de 248.404 doentes (mais de 134 mil pessoas). Em 30 de Junho de 2009 estavam na mesma situação 19,5% de 169.461 doentes (cerca de 33 mil pessoas). Isto é, o número dos que esperam por cirurgia mais do que o tempo adequado reduziu-se para menos de ¼.
Também o link para o artigo do Jornal de Notícias que refere um aumento de 15,6% da mediana do tempo de espera para cirurgia por doença oncológica colo rectal merece um apontamento. É que, esses 15%, sendo exactos, traduzem um aumento da mediana de 19 para 21 dias. Trata-se de um daqueles (frequentes) casos em que a variação percentual dá uma imagem muito parcial da realidade.
Os comentários sobre a falta de dados em matéria de acesso à consulta hospitalar são absolutamente pertinentes. Mas não posso deixar de notar que, nestes anos, a procura de cuidados cirúrgicos nos hospitais públicos aumentou muito (22% entre 2006 e 2008, de 427 para 523 mil casos) e também a resposta aumentou muito* (28,8% entre 2006 e 2008, de 330 para 426 mil cirurgias). Se o acesso às consultas não tivesse melhorado poderia ocorrer um tão grande aumento na procura? Outro aspecto relevante é o aumento do número de consultas nos hospitais públicos, de 7.980.851, em 2004, para 9.731.588, em 2008. Esse aumento é ainda mais significativo no caso das primeiras consultas de especialidade que, no mesmo período, passam de 2.009.491, para 2.645.588.
Volto ao ponto essencial do meu artigo: há (sempre) muito a fazer e a melhorar, mas seria injusto e inadequado não reconhecer o largo caminho percorrido!
Manuel Pizarro
*para vincar o meu argumento indico apenas as cirurgias realizadas nos hospitais públicos.

É justo reconhecer o "largo caminho percorrido".
Em termos de politicas da Saúde, a recuperação das listas de espera, estou certo, será uma das bandeiras a apresentar pelo partido do Governo nas próximas eleições.
Parece-me, no entanto, que apesar do longo esforço, por detrás dos excelentes indicadores referentes à gestão deste difícil dossier, esconde-se uma realidade decepcionante em comparação com o que acontece noutros países da EU a que pertencemos.
A título de exemplo das graves assimetrias entre hospitais
, no HH onde trabalho da ARLVT, os doentes esperam em média dois meses pela marcação da primeira consulta de ortopedia. Numa especialidade onde a mediana do TE da LIC é de 4,1 meses. Temos que, se tudo correr bem, os doentes desta especialidade esperam em média seis meses para resolver o seu problema de saúde.
Em oftalmologia, o tempo de espera das primeiras consultas é superior a um ano.
Se é justo reconhecer o trabalho efectuado nesta matéria nestes últimos anos, os resultados, para quem está no terreno, são ainda escassos, pouco animadores, longe de resolver o grave problema do acesso dos doentes do SNS aos cuidados de saúde.

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7 Comments:

Blogger Hospitaisepe said...

Os tempos de espera cirurgicos são desde sempre um grave problema entre nós.

% de doentes em espera cirúrgica há mais de doze semanas (ano 1990):

Alemanha: 19.4
Suiça: 16.1
Itália: 36.3
Holanda: 15.2
Noruega: 28.0
Portugal: 58.1
Espanha: 18.5
Reino Unido: 41.7

In "Explaining Waiting Times Variations for Elective Surgery across OECD Countries",
Luigi Siciliani and Jeremy Hurst (2003)

Portugal campeão absoluto neste ranking.
O que se melhorou em vinte anos:
Comparar a evolução do nosso país com o Reino Unido.

9:39 da manhã  
Blogger tambemquero said...

A ministra da Saúde acusou hoje a empresa que gere a Linha de Saúde 24 de incumprimento do contrato, ao atender menos sete mil chamadas diárias do que o previsto contratualmente. Ana Jorge sublinha que a falha do serviço não se deve apenas à gripe A, falando a ministra em problemas de organização do serviço telefónico 808 24 24 24.

O contrato com a Linha de Saúde 24 estabelece que o serviço deve atender, no mínimo, por dia, dez mil chamadas. Ana Jorge afirma que apenas três mil estão receber resposta por parte daquela linha telefónica. A ministra aponta que a empresa já foi alertada “há muito tempo” para esta questão, lamentando que após “reuniões sistemáticas” entre a empresa e a Direcção-Geral de Saúde se mantenha o incumprimento do acordado por contrato.

"A linha não é só para a gripe, é para toda a orientação. Mesmo para o que está contratualizado, independentemente da gripe, o número de respostas é cerca de um terço. Não é a gripe que está a sobrecarregar a linha. Ela não responde porque não foi capaz de se organizar para dar resposta àquilo que foi contratualizado", acusou a ministra, que falava à margem da inauguração das novas instalações no Centro Hospitalar de Gaia/Espinho.

"A empresa tem um compromisso que não está a cumprir”, reforçou, referindo que do Ministério da Saúde "tem havido toda a disponibilidade para melhorar" o serviço de atendimento. "Estamos no limite”, alertou.

Linha para médicos deve ser "reactivada"

Já ontem, Ana Jorge tinha exortado a Linha 24 a dar "maior resposta" aos utentes do serviço, que já apresentaram queixas por demora no atendimento. Também a Ordem dos Médicos diz ter recebido queixas sobre a "sobrecarga" da linha, defendendo como alternativa a reactivação da linha telefónica exclusiva para profissionais de saúde destinada a prestar informações sobre a gripe A.

Isabel Caixeiro, presidente do Conselho Regional do Sul da Ordem dos Médicos, diz que é "necessário reforçar a Linha Saúde 24 e também reactivar, quanto antes, a linha dedicada para os médicos".

Esta linha foi criada em Maio para que os profissionais de saúde pudessem debater com outros colegas um caso suspeito de gripe A, para identificar um caso que possa suscitar dúvidas ou para facilitar a orientação dos doentes para os locais mais adequados. Com a suspensão do serviço, em Julho, os médicos são, muitas vezes, obrigados a ligar para a Linha de Saúde 24 para fazer a notificação do caso.

"Pensamos que a actuação da Direcção-Geral da Saúde no sentido do reforço da Linha de Saúde 24 é muito útil e prioritária, mas achamos também que devem ser feitos todos os esforços para que a linha para os médicos seja reactivada", reiterou a responsável.

Isabel Caixeiro salientou ainda que a Ordem está disponível para colaborar com o Ministério da Saúde para uma solução para o problema.

JP 20.08.09

A Saúde 24 nunca deixou de falhar.
Entretanto este Governo renovou-lhe o contrato.
Agora no lugar de cumprimento fala-se em reforço do serviço. O que significa mais dinheiro para o adjudicatário deste serviço.

9:53 da manhã  
Blogger e-pá! said...

Interessa saber se em termos de acessibilidade estamos próximo da exaustão ou já batemos no fundo.
As CE's e as IC's, nos HH´s são efectuadas pelo mesmo pessoal médico, a que acresce ainda as periódicas prestações nas Urgências.

Não existe, nem deve existir, uma segmentação das actividades dos Serviços, Departamentos ou nas inovadoras Áreas de Gestão Integrada (!) onde uma parte do sector do recursos humanos disponível faz CE's a todo o vapor e, na extremidade da linha, outro grupo opera porfiadamente, mais à frente outro a tratar do recobro, e no fim da linha, outro procede ao follow-up pós-cirurgico... etc.

Os HH's, com os recursos humanos disponíveis, têm um tecto de resultados que conseguem – com segurança e eficiência - atingir.
Quando se força toda esta engrenagem para a obtenção de patamares numéricos ou objectivos estatísticos, coloca-se em risco muitas coisas, que me parece despiciendo estar aqui permanentemente a alertar.
Todos conhecemos como se incrementam os factores de risco na prestação de cuidados – fora também das contabilidades de duvidosa fundamentação – reflectindo sobre o erro médico, as negligências e, finalmente, as más práticas.

Ouvimos frequentemente dizer que a gestão de um HH não pode ser decalcada de uma unidade fabril de produção de automóveis, sapatos ou computadores.

Mas, vamos ouvir, nesta campanha eleitoral, falar dos HH´s públicos como um inespecíficos sector empresarial do Estado, onde para a sua avaliação seria necessário uma serena análise resultados e das capacidades instaladas e não realizações colectadas de 4 em 4 anos.
Neste processo eleitoral serão trazidas à colação questões de competitividade, nomeadamente, com o sector privado, necessariamente, ávido de entrar em força na área de prestação de cuidados, com metodologias de gestão, obviamente, distintas do sector público.

Todos sabemos o que está por detrás dessa competitividade...

Deveríamos ter seguido com maior atenção a discussão, promovida em França, da Lei Bachelot, onde as questões de sustentabilidade financeira do sistema francês foram resolvidas com a aplicação desalmada da estratégia social da Direita, com laivos de autoritarismo (nomeação em Conselho de Ministros dos Directores dos HH’s) e geradora de uma grande conflitualidade entre o poder político e os trabalhadores da saúde que procuraram evitar: "a pura transferência de uma parte das missões do sector público para o sector privado, sacrificando o sistema aos apetites financeiros dos seguros e dos grandes grupos que têm investido em estabelecimentos de Saúde" (excerto da Carta Aberta publicada por Olivier Badelon aos Deputados e Senadores) link.

Sem querer entrar por este caminho na disputa eleitoral nacional, que se avizinha, na área da Saúde, onde o tempo necessário para discutir os dois mais importantes vectores do nosso SNS escasseia (ou foi ao longo dos 4 anos esbanjado), i.e., a acessibilidade e a sustentabilidade financeira, acho pertinente recordar que temos - todos os profissionais de saúde - a responsabilidade de trabalhar para oferecer aos portugueses um SNS moderno, solidário e responsável.

Desenham-se no horizonte político próximo importantes alterações quer quanto aos meios - continuação da política de PPP's (modelo português...) e quanto à contratualização para o sector privado e segurador de uma substantiva fatia das prestações do SNS – quer, qainda, quanto a modelos ( ainda nebulosos) de co-financiamento que não podem deixar de ser preocupantes, estando, como parecem estar, eminentes - consideradas as mais prováveis hipóteses de saídas políticas eleitorais do acto eleitoral de 27.09.09 - os tradicionais acordos de partilha (pós-eleitorais) na área do dito "Centrão"...

Enfim, e resumindo em poucas palavras, o que parece eminente é a acessibilidade do sector privado ao SNS.

9:58 da manhã  
Blogger Clara said...

O e-pá acha que o alargamento da prestação de cuidados a entidades privadas, irá contribuir para a melhoria do acesso do nosso sistema de saúde?

11:11 da manhã  
Blogger tambemquero said...

Desabafos

Gostava mesmo muito que a Presidência da República não me estivesse a fazer assistir a isto:

1. Presidência da República teme estar a ser vigiada, no Público de 18 de Agosto pela manhã
"Como é que os dirigentes do PS sabem o que fazem ou não fazem os assessores do Presidente? Será que estão a ser observados, vigiados? Estamos sob escuta ou há alguém na Presidência a passar informações? Será que Belém está sob vigilância?". diz membro da Casa Civil do Presidente

2. Presidência não comenta temor de estar a ser vigiada, notícia generalizada no dia seguinte, 19 de Agosto.

Numa história que começa aqui, no Público, com José Junqueiro e Vitalino Canas do PS a "uma eventual participação de assessores do Presidente da República na elaboração do programa do PSD". Diz Junqueiro: "Se isso se confirmar, se Cavaco Silva autorizar, há uma clara interferência na campanha eleitoral"

3. Afinal o Semanário foi o primeiro jornal a divulgar a colaboração de assessores do Presidente no programa do PSD como se pode ver na síntese de Paulo Querido.

4. E Manuela Ferreira Leite fez eco desse apoio dos assessores do Presidente no seu site Falar Verdade no dia 7 de Agosto.

O que leva a Casa Civil do Presidente da República de Portugal a revelar, dia 17 de Agosto, ao Público, que receia estar sob vigilância, por causa de um comentário feito por socialistas, dia 15 de Agosto, sobre a colaboração de assessores da Presidência no programa do PSD, que já estava nos jornais e no site da líder social-democrata desde dia 9 de Agosto?

Confesso que a última coisa que esperava era assistir a uma guerrilha entre a Presidência da República de Portugal e o Governo a pouco mais de um mês de umas eleições em que se corre o risco de não ter um resultado que garanta estabilidade governativa. Em plena e grave crise económica.

Questões como a possibilidade de um Governo estar a vigiar outros órgãos de soberania são demasiado graves para serem usadas como parecem estar a ser.

Gostava mesmo muito de não estar a assistir a isto.
Helena Garrido

4:35 da tarde  
Blogger e-pá! said...

Oh! cara amiga Clara:

Penso que no meu comentário escrevo exactamente o oposto do que inferiu.
Leu bem?

Mas, já agora, permita-me uma pergunta.

Quem de bom senso não teme que os habituais acordos gizados no enorme polo de interesses do "Centrão", no tempo pós-eleitoral, não enveredem por esse caminho?

A minha posição, como tenho exposto ao longo do tempo, é que o sector privado deve, no âmbito da prestação de serviços aos utentes do SNS, ter um papel meramente complementar.

Não houve nenhum acontecimento telúrico - a não ser o mau feitio do sr. Salvador - que tenha motivado qualquer mudança nesta minha convicção.

Gostaria é que quem levanta questões, quem tenta prever, como godsto de fazer, não seja apontado a dedo como um inimigo e um detractor do SNS.
Enquanto médico vi nascer o SNS, sempre trabalhei nele (não tive interregnos...) e aposentei-me existindo um SNS, com dificuldades na equidade mas, ainda, e felizmente, universal no seu âmbito.

5:12 da tarde  
Blogger Tavisto said...

Os dados aqui apresentados sobre recuperação da lista de espera cirúrgica entre 2005 e 2009, são prova inequívoca da melhoria no acesso dos cidadãos aos cuidados de saúde hospitalar. Porém, para se saber se os números traduzem uma maior eficiência do SNS é fundamental conhecer-se os contributos da produção normal e da adicional (SIGIC) para a referida redução e qual o peso dos privados na produção adicional. Não sendo possível uma análise detalhada dos dados, o aumento no número de consultas cirúrgicas (18% entre 2004 e 2008) e de cirurgias (28,8% entre 2006 e 2008) constituem indicadores suficientes de melhoria da actividade dos hospitais do SNS.
Porém, sendo longo o caminho percorrido, é ainda imenso o que falta andar para nos aproximarmos dos resultados dos melhores sistemas de saúde da EU. Aqui, há que dizê-lo, as atitudes adoptadas pelo actual governo para o conseguir são altamente contraditórias. Se não vejamos, o recuo no tempo de trabalho médico das 40 para as 35 horas semanais só pode deixar preocupado quem conhece a realidade hospitalar. Como irá ser possível manter, já não digo aumentar, a produção se a maioria dos médicos em contrato individual de trabalho vier a optar pelas 35 horas? Em tempo de vacas magras terá este governo, ou outro qualquer, argumentos financeiros suficientes para “prender” os profissionais ao SNS? Ao arrepio do que disse anteriormente Ana Jorge, o de pretender reforçar a dedicação dos profissionais ao SNS, ao reduzir-se o tempo de trabalho normal a mensagem que se faz passar é precisamente a oposta.
Temos pois que no final de mandato do actual governo o espírito que paira sobre o SNS hospitalar não é o de avanço e consolidação, mas o da incerteza. Os privados continuam a espreitar a qualquer esquina e quem deveria posicionar-se em defesa de medidas de reforço do Serviço Público, cede à menor dificuldade dando sinais que só podem acalentar as pretensões dos seus detractores.

4:48 da tarde  

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