terça-feira, dezembro 18

Arraial de São João

O país noticioso não desiste de nos surpreender.
Hoje a abertura do Jornal da TVI revela-nos que o presidente (há sete anos) do hospital de São João descobriu ter uma batelada de cirurgiões que pouco ou nada operam.
Descobriu, igualmente, que todos os dias tem mais de 660 “malandros” que vivem de expedientes de ócio negligente, indolente preguiça ou outra qualquer desmazelada razão para o epíteto tecnocrático de “absentismo”.
Não terá o hospital, cimeiro dos rankings, mecanismos de gestão inovadora capaz de resolver tal maleita?
Já sabíamos que os concursos públicos e o tribunal de contas são um entrave ao progresso gestionário hospitalar. Também ficámos a saber que, afinal, as centrais de compras são um disparate. Mas a grande novidade veio com a afirmação de que afinal o dinheiro orçamentado para a saúde para 2013 chega e sobra.
No meio de tudo isto parece ficar claro que a redução geral do acesso (a consultas e cirurgias) e à inovação terapêutica são uma absoluta normalidade. Os problemas que subsistem devem-se, com certeza, à malandragem médica que vai infestando os hospitais superiormente geridos (há longos anos) pelos oráculos da virtude, da decência e da ética.
Existirá, afinal uma ética no racionamento tão útil no branqueamento da cegueira orçamental.
Se dúvidas existissem parece haver nesta narrativa folclórica um suporte doutrinário ao fundamentalismo do ministério dos cortes a eito.

Olinda

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6 Comments:

Blogger DrFeelGood said...

O Hospital de S. João, no Porto, foi recentemente considerado o melhor hospital público português, mas tem alguns problemas, como reconheceu António Ferreira, presidente do Conselho de Administração do São João. Com os cortes na Saúde em discussão, o administrador revelou alguns dos desperdícios, em entrevista na TVI.

Entre os principais problemas no Hospital de S. João está o absentismo, admitiu António Ferreira: “a taxa de absentismo é de 11 por cento. Isto significa que estão ausentes todos os dias, dos 5600 funcionários, cerca de 660”.

O administrador comparou as estatísticas dos números de cirurgias efetuadas, revelando que no S. João há “cerca de 30” cirurgiões que “nunca foram ao bloco: “temos em Portugal, cirurgiões especialistas, 3854. Cada especialista em cirurgia faz em média uma cirurgia por semana (convencional). Claro que é pouco. O cirurgião que fez maior número de cirurgias por ano no hospital fez 543, fez 12 por semana. O cirurgião com menor número de cirurgias, e que fez cirurgias, fez duas. Cerca de 30 nunca foram ao bloco”.

António Ferreira afirmou também que “o Serviço Nacional de Saúde está, pelo menos desde 2007, falido”, citando o exemplo de “uma cirurgia altamente financiada, a torácica”, que “custa 19 mil euros no S. João”, mas pela qual o Estado paga “30 mil”. “Isto é que precisa de ser alterado”, complementou.

ptj 18.12.12

À primeira vista parecem revelações pouco inteligentes do presidente do CA do São João.
Embalado pelo último resultado do ranking, entre o Medina e a Judite, o pequeno professor do são joão quis impressionar a audiência. E, esticou-se.
A intervenção do dr. António Ferreira foi apenas ridícula. Digna do programa "Estado de graça".link

12:04 da manhã  
Blogger e-pá! said...

Ao emérito e accountant presidente do CA do HSJ só faltou rechear a sua peroração com uns gráficos. Uma falta imperdoável que, se não tivesse existido, teria permitido ombrear com o seu ilustre companheiro na entrevista.
De resto, esta vetusta transposição de singulares 'contas de merceeiro' para doutorais conclusões veio mesmo a calhar e conseguiu não 'desafinar' do modelo de programa televisivo onde estava.
Foi, nesta quadra, tentar recolocar o (expulso) burro na natalícia manjedoura...

12:10 da manhã  
Blogger Clara said...

Objectivo conseguido

Há cirurgiões que "têm uma produtividade muito abaixo da média", enquanto há outros "que fazem um número muito concentrado, diferenciado e elevado de cirurgias", afirmou esta terça-feira Paulo Macedo, citado pela Rádio Renascença, à margem da inauguração de um novo equipamento de cuidados continuados, em Camarate. link
JP 18.12.12

O dr. António Ferreira conseguiu impressionar o senhor ministro da saúde, que aproveitou a boleia para criticar a classe médica.
Vamos estar atentos às próximas nomeações do ministério da saúde.

12:25 da manhã  
Blogger Tavisto said...

A entrevista de António Ferreira à TVI é extremamente polémica. Pelo conteúdo e pelas reacções suscitadas, traz à memória o ambiente criado em torno do livro de Manuel Antunes sobre o Estado da Saúde. Neste livro, publicado uma década atrás, eram já identificados uma série de constrangimentos que impediam o funcionamento saudável do SNS, sector hospitalar em particular.
Trabalhando ambos em hospitais centrais universitários, é natural que as reflexões possam estar distorcidas pelo ambiente profissional que lhes é específico, resultando de estatutos profissionais diversos entre as carreiras universitária e hospitalar. É, também, nos grandes centros que os conflitos de interesses entre Público e Privado mais se fazem sentir, situação agravada pela entrada dos grandes hospitais privados no sector.
Não tendo sido feito nada de substancial nestes 10 anos em termos de reforma hospitalar, em particular na desejada separação entre sectores público e privado, é natural que determinado tipo de “aberrações”, porque é disso mesmo que se trata quando se identificam 30 cirurgiões que nunca vão ao bloco sem que se dê uma explicação plausível e sem que o Presidente do CA anuncie uma investigação rigorosa à situação, continuem a vir ao de cima.
Em dado momento da entrevista Judite de Sousa diz ao entrevistado que não estava a ser politicamente correcto, tendo este questionado “estou ou não estou?” E, de facto fica a duvida. Pelo teor de algumas declarações parece haver uma certa colagem á política do governo: gasta-se a mais na Saúde, pode haver mais cortes no número de hospitais e maternidades…. Noutros momentos, o entrevistado denuncia o privilégio no financiamento do sector privado, muito á custa da irracionalidade dos subsistemas públicos e da forma de pagamento do SIGIC.
Ficamos pois sem saber em que modelo de Saúde se revê o Presidente do Conselho de Administração do Hospital São João; talvez no próximo dia 7 de Janeiro se possa perceber melhor o seu posicionamento. Espera-se que, então, a serenidade da análise do profissional de saúde se sobreponha ao deslumbramento do gestor que o recente lugar cimeiro no ranking hospitalar parece ter exacerbado.

12:22 da tarde  
Blogger Tavisto said...

Cirurgiões fazem, em média, duas operações por semana

Bastonário da Ordem dos Médicos, José Manuel Silva, defende que não é ético fazer “análise de números em bruto”.

Em média, os cirurgiões fazem cerca de duas cirurgias por semana em Portugal, e não uma, como afirmou o presidente do conselho de administração do Hospital de S. João (Porto), António Ferreira, desencadeando ontem uma acesa polémica. Mas há grandes assimetrias de hospital para hospital de norte a sul do país. Pelo menos é neste sentido que apontam os dados oficiais que constam do relatório do Grupo Técnico para a Reforma Hospitalar, relativos a 2009 (a produção cirúrgica padrão por semana era de 2,08 intervenções por especialista).
António Ferreira avançou com a média de uma cirurgia por semana por cada cirurgião, durante uma entrevista à TVI na noite de segunda-feira. Pretendia com o número ilustrar a tese que desde há muito defende: a de que é possível reduzir ineficiências no Serviço Nacional de Saúde, aproveitando melhor os recursos humanos. Por isso, destacou o facto de a taxa de absentismo na unidade ser de “11%” e adiantou que pelo menos 30 dos cirurgiões da unidade não fizeram uma única cirurgia este ano. Para demonstrar que o problema não será exclusivo desta unidade hospitalar, foi mais longe, fazendo uma conta simples: pegou no número de cirurgiões especialistas (3854), no total de cirurgias convencionais, excluindo as feitas em ambulatório (mais de 196 mil em 2010) e dividiu tudo por 46 semanas. Conclusão: em todo o país, em média, cada cirurgião fará uma cirurgia por semana.
Ontem, o ministro da Saúde admitiu que este não será caso único e considerou que há uma grande assimetria na produtividade destes especialistas. Há cirurgiões que “têm uma produtividade muito abaixo da média”, enquanto há outros “que fazem um número muito concentrado, diferenciado e elevado de cirurgias”, afirmou Paulo Macedo, citado pela RR. “A análise dos números em bruto transmite uma ideia negativa muito injusta, não é ético colocar as coisas desta forma”, reagiu, agastado, o bastonário da Ordem dos Médicos (OM) José Manuel Silva, notando que há “uma série imensa de factores” que influenciam estes rácios.
Também o presidente da Sociedade Portuguesa de Cirurgia, Júlio Leite, e o presidente do Colégio da Especialidade de Cirurgia Geral da OM, Costa Maia, defenderam que as contas não podem ser feitas desta forma. Admitindo embora que os cirurgiões em Portugal podem fazer poucas cirurgias quando comparados com os colegas de países do Norte da Europa, os dois notam que a culpa não lhes pode ser atribuída por completo. “Não é um problema dos profissionais, mas sim da estrutura”, defende Júlio Leite. “Dividir o número de cirurgias por especialistas dá resultados simplistas de mais (...). As cirurgias não dependem só dos cirurgiões, mas de toda uma equipa, que inclui anestesistas e enfermeiros, e da disponibilidade dos blocos operatórios”, acrescentou Costa Maia.
“Se os cirurgiões trabalhassem mais uma hora por dia, num instante acabariam com as listas de espera”, contrapõe o director do Serviço de Cirurugia Cardiotorácica dos Hospitais da Universidade de Coimbra, Manuel Antunes, lembrando que já defendeu esta tese num livro em 2001 e “nada mudou, desde então”. No seu serviço, os cirurgiões fazem quatro intervenções por semana, em média. Mas Manuel Antunes também destaca que a culpa da baixa produtividade não pode ser só assacada aos cirurgiões: “Há poucos em exclusividade. São encorajados a ter clínica particular e hoje já não há missionários. Esta profissão não é melhor nem pior do que as outras e os dados da OCDE demonstram que a nossa produtividade se fica pelos dois terços.

Alexandra Campos, Público 19/11/2012

……..


Uma notícia equilibrada e inteligente. Afinal as coisas não estão tão más como retratou António Ferreira mas, por razões estruturais, ainda longe da produtividade média da OCDE.

2:18 da tarde  
Blogger e-pá! said...

"..pegou no número de cirurgiões especialistas (3854), no total de cirurgias convencionais, excluindo as feitas em ambulatório (mais de 196 mil em 2010) e dividiu tudo por 46 semanas. Conclusão: em todo o país, em média, cada cirurgião fará uma cirurgia por semana"...

Estas contas de António Ferreira, que já mereceram diversos epítetos, são um 'brilhante' estímulo à cirugia de ambulatório. Quando 'pensamos' os números exibidos na entrevista da TVI-24, só podemos suspeitar que este baldear dos actos cirúrgicos em ambulatório terá as suas razões (políticas?).
Cerca de 2800 cirurgias de ambulatório programadas para este ano no HJS (polo de Valongo) são para 'excluir', bem como os membros dessas equipas (e não só os cirurgiões) que lá vão dando o 'coiro'.
De tanto magicar para poupar, para 'cortar' a eito, estes insígnes galhardoados na gestão hospitalar, vão acabar por estilhaçar o SNS em homéricas epopeias 'carreiristas' (nada tem a ver com o M. Carreira)...

O anedótico seria chegarmos à conclusão que alguns daqueles 30 'transviados' especialistas teriam sido integrados em equipas de 'cirurgia de ambulatório' e deixaram de 'contar' como cirurgiões para engrossarem um outro número: o dos excluídos (que em número crescente e alarmante 'pululam' por este País).

11:52 da tarde  

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