sábado, setembro 21

A ‘estratégia da aranha’…

As questões levantadas neste artigo são pertinentes. link 
Mas uma coisa é o actual momento político que visa a concretização do objectivo 'Estado mínimo' (nunca menosprezar este desígnio da actual governação) e outra será a estratégia a médio prazo para desenvolver um lucrativo 'mercado da saúde'. 
No imediato, a 'desconstrução do SNS' passa pela transferência de uma importante fatia da actividade prestadora do sector público para o sector privado e social, mantendo o Estado funções financiadoras (em permanente contracção). 
Para a prossecução deste objectivo (imediato) e, simultaneamente, 'parecer' que tudo o que se faz não passa de uma 'racionalização', servem todos os pretextos. 
É nesta 'cascata de ajustamentos' que se inserem muitas das medidas já em curso e outras na ‘incubadora’, entre elas, a da 'exclusividade' que aparece um pouco ‘deslocada’ a partir do último acordo sindical com o MS e o entendimento do horário das 40h/semanais. 
A 'exclusividade' será, portanto, no actual contexto, uma medida de gestão com efeitos muito limitados na produção (se existir cumprimento das obrigações de todas as partes…). 
Todavia, a ‘questão da exclusividade’ não se circunscreve a uma mera alteração de horário laboral que permita ‘mais produção’. É, lateralmente, um importante ‘instrumento facilitador' do recrutamento e, para não nos alongarmos em especulações, basta perceber quem anda a angariar e quem anda a 'dispensar' profissionais. 
Por vezes usa-se uma outra designação que nos leva a entender melhor o âmbito e as contradições do modelo: 'a dedicação exclusiva'. É, todavia, envolto neste ambiente de ‘sedução sócio-profissional’ que o regime de exclusividade - presentemente em discussão - mostra as suas gritantes fragilidades. O actual momento, sugere que estamos a tratar esta situação como uma questão platónica que, como os amores, não sendo diariamente alimentada, inexoravelmente, se esvai. E nada do que tem sido feito pelo MS, ou que se perspective, vai no sentido de desenvolver ('estimular') qualquer tipo de 'dedicação' pelo que as motivações serão necessariamente ‘outras’. 
No presente, e por que estamos no preambulo das 'transferências', a medida serve os interesses imediatos do sector privado, na fulcral questão do recrutamento dos recursos humanos. 
Trata-se de um importante e incontornável passo para a rápida consolidação, no sector privado, que depende da aquisição de um 'corpo técnico' qualificado (entre ele a vertente clínica, laboratorial e farmacêutica). Uma situação para a qual o 'mercado da saúde' não dá resposta pelo que o caminho viável é colonizar o SNS. Isto é, a 'canibalização' do SNS é o caminho estreito (único) do sector privado e social para, nesta fase, 'consolidar' as suas posições. Não tem, de momento, alternativas rentáveis e expeditas (como p. exº. a 'importação selectiva de profissionais’). 
O SNS é, em Portugal, o alforge das competências técnico-profissionais, da formação e do desempenho na área da Saúde (e não só na componente médica). Logo, a ida ao ‘pote da saúde’, enquanto considerado um ‘negócio próspero’ passa, inevitavelmente, por aqui. 
A exclusividade é um meio para atingir mais vastos (e concretos) objectivos. Que ninguém se iluda. Começou o assédio a uma das ‘mais-valias’ do SNS. 
Mas, atenção, não vale a pena embandeirar em arco: uma vez adquiridas soluções sólidas (técnicas e nos recursos humanos), o sector privado, altamente 'financeirizado', invocando a competitividade, o mercado 'livre', a livre ‘escolha’, os ganhos e custos de produção fará as necessárias ‘adaptações’. Começará, então, o 'esmagamento' dos profissionais nas questões laborais, salariais, de formação e até no desempenho, à volta da ‘filosofia do low-cost’. 
O sustentáculo material para o desenvolvimento desta filosofia serão os utentes que, espoliados de um serviço público e universal, serão imolados nos apetites dos mercados, entregues a política do ‘chacun pour soi’. O recente exemplo da Holanda onde foi declarado o fim do Estado Social link e em sua substituição um liberal e indefinido modelo de ‘sociedade participativa’ deve pôr-nos em guarda contra os novos ‘arautos da mudança’. 
Enfim, a 'estratégia da aranha' em plena ‘tecedura’... 
E-Pá!

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