Discutir o SNS
I - Caro Aidenós
Li com atenção o seu post Não é com Taxas Moderadoras e quero começar por lhe dar os parabéns pela excelente qualidade das suas intervenções, sempre com ideias e análises interessantes e profundas, denotando a alta qualidade do “analista”. Relativamente aos aspectos técnicos estamos de acordo no diagnóstico:
–O SNS precisa sobretudo de reduzir o desperdício;
–Por aí obter-se-á a grande maioria dos recursos necessários à sustentabilidade do SNS.
Diria mesmo que na redução de desperdício se resolverão 90% dos problemas do SNS, 10% via taxas (são estes 10%, apenas, que motivam este comentário).
Foi também o que afirmei em post recente que teve a amabilidade de comentar:
“... Isto é, a sustentabilidade obtém-se não tanto por contribuição muito maior dos doentes, antes por:
i) Reorganizar a oferta (qualificar e encerrar urgências e maternidades, garantir RRH, articular convenções com produção pública face à capacidade existente no SNS, etc.);
ii) Despolitizar e gerir adequadamente o SNS, globalmente e nos diferentes níveis;
iii)Melhorar a gestão das Unidades (reduzir desperdício, aumentar a qualidade, coordenar os cuidados, etc.).
Também estou de acordo com o seu comentário no ”tal post”: “Entendi o post do Semmisericórdia como pretendendo demonstrar que o SNS totalmente gratuito induz distorções e acaba por prejudicar objectivos dos SNS (equidade, acessibilidade e eficiência) e, no meu entender, a demonstração ficou feita.”
E tudo isto porquê? Porque ambos percebemos que as taxas são necessárias, não são a solução do financiamento mas podem ajudar à sustentabilidade. COMO, se são tão pequenas? Já lá vamos....
1º-O que tem acontecido no SNS?
–Os sucessivos governos (todos!) foram produzindo défices avultados, porque foram cedendo a tudo (dando): mais direitos de doentes e mais facilidades de acesso (SNS e convencionados); mais pessoas e mais remuneração média por pessoa; SU com cada vez mais pessoas; novos HH e nenhum dos velhos encerra; descontrolo nos medicamentos (maior despesa para as pessoas e para o Estado) e nos MCDT convencionados, etc. Os sucessivos governos também foram prometendo (e não dando!!), alternativas aos HH (CP a funcionar; CC; “Call center”). As pessoas foram-se convencendo que podiam ter tudo, sem pagar e que eram só direitos (mesmo que fossem alicerçados em situação fiscal que mascaravam).
–Esses défices foram “metidos debaixo do tapete” e a despesa não parou de crescer. Como bem diz gastamos mais que a média da UE, sendo muito mais pobres (mais qualidade? só por brincadeira). Só que isso fez a dívida púbica crescer e agora, com a subida da taxa de juro, temos factura pesada (pagar dívida e juros cada vez maiores).
–Também gastamos mais que a média em Educação, na Justiça e nos salários da Ad. Pública (mais qualidade? só por brincadeira). O “monstro” existe e o SNS integra-o (os pais foram: Guterres e Cavaco), e não pode continuar assim – doutro modo temos aumento dos impostos e problemas de competitividade (fuga de empresas; não virá o necessário investimento externo).
–É necessário pagar a factura da despesa excessiva: gastar menos mas melhor, acabar com o descontrolo e a indisciplina de acesso e de prescrição, mesmo pagar qualquer coisa.
2º-Onde o desperdício é maior? Para além dos medicamentos e actos convencionados é nos SU e serviços desnecessários/excessivos, nos internamentos e outros actos inapropriados e na despesa com o pessoal. Estamos de acordo, vai será necessário pôr fim à concorrência indevida e introduzir incentivos em função de resultados. Mas como bem disse “tocam interesses instalados, quer dos profissionais quer da indústria de saúde”.
3º-Será possível cortar apenas (substancialmente) na despesa para rapidamente voltarmos á “forma”? Parece que não, vejam-se as greves e o mais que as poucas medidas já tomadas originaram (relativas aos subsistemas e administração pública). Seguindo a recomendação dos partidos e analistas (alguns defenderam corte de 200 mil funcionários) o que seria?
4º-Será melhor equilibrar um pouco o barco do SNS ou deixá-lo continuar a ter défices e facilitar o seu afundanço? Alguns defendem mesmo a sua privatização, não é o nosso caso nem o da maioria do blogue. É melhor cortar algo visível e cobrar (pouco) que deixar tudo na mesma.
5º-Taxas só para consumo excessivo decidido pelos doentes? A prescrição do médico que foi induzida pelo doente ou familiar está na mesma situação, assim como o uso irresponsável deve ser penalizado (ex. falta à consulta sem avisar).
6º-Taxas ajudam nalguma coisa? Sem taxas a despesa do Estado disparava mesmo e o Estado perdia receita que globalmente ainda tem significado (aumentava mais o défice e +1% para cima dele é muito!).Qual o impacto das taxas na despesas do estado? Depende do valor das taxas, da % que as paga mesmo e do efeito indutor no consumo da ausência de preço. Suponha que temos um custo incremental da CE de 14 cts (2005: custo total unitário médio de 20 cts) e da urgência de 18 cts (2005: custo total unitário médio de 23,4 cts) e que esse efeito indutor é 10% na CE e 15% no SU (2005: à volta de 6 milhões de CE e 5 milhões de urgências hospitalares). A indução significava mais 600 mil CE e 900 mil urgências. Ao custo incremental indicado teríamos acréscimo total de 600 mil* 14cts= 8,4 milhões de cts e 750 mil*16cts=12 milhões cts; total de 20,4 milhões de contos. (Nota: custo engloba MCDT e medicamentos prescritos). A receita das taxas pouco sustentava o SNS (2 milhões?), o défice do SNS aumentava pelo efeito na despesa!
7º-Uso indevido (abuso do direito) deve ser penalizado? Analiso 2 exemplos: quem falta a CE sem avisar, quem recorre indevidamente ao SU. No primeiro caso os custos e a sub-produtividade que impõe ao SNS (todos nós pagamos, alguém é atendido tardiamente) deve ser paga por quem a provocou? (ex. prever penalidade ou instituir que a taxa moderadora será adiantada por todos na marcação, quem vai ou avisa a tempo não é penalizado) Na segunda situação os custos por uso indevido (ida amiúde e sem justificação clínica; ida ao SU depois de ser tratado nos CP e sem que estes recomendem e sendo considerada não urgente) devem ser pagos por quem abusa do direito ou por todos nós? No mínimo paga a conta à “2ª vez” (na 1ª recebe nota com despesa provocada e com alerta que da próxima paga conta toda, no máximo todo o uso indevido (sem justificação clínica deve pagar a conta verdadeira. (nota: pressupõe que oferta aumente nos CP e na CE para eliminar esperas excessiva, depois pode ser implementada para benefício de todos)
Um abraço
Semmisericórdia
II - Caro Semmisericordia
Primeiro parágrafo aparte, onde claramente exagerou, lisonjeia-me ter provocado o seu Comentário, com o nível de fundamentação a que todos os participantes do Saúde SA já estão habituados.
Congratulo-me não só pela concordância generalizada que verifico existir entre nós mas também porque o seu Comentário me dá oportunidade de algumas precisões que levem a melhor entendimento das minhas afirmações.
Assim:
1- No meu juízo, mais importante do que termos ou não um SNS, é que o respeito da personalidade humana implica, ou exige o direito fundamental aos cuidados necessários para manter, desenvolver ou recuperar a saúde. Todos devemos poder exercê-lo, sejam quais forem os meios de fortuna de que dispomos. Podíamos não ter, mas temos um SNS, universal, geral e tendencialmente gratuito, de acordo com a revisão da Constituição. Ainda bem porque, apesar do que, na sua concepção orgânica, na sua regulamentação e na sua prática tem estado errado, tem de reconhecer-se que, nesse contexto, foi notável o seu desempenho nos últimos 30 anos. Precisa de ser modernizado? Muitos pensarão que sim, mas foi CC quem o afirmou. E mais, afirmou-o em sede de justificação das “Taxas Moderadoras: São a única forma para manter viável este modelo público” (sublinhado meu), não em declarações de circunstância mas em discurso, obviamente, preparado.
2- As taxas moderadoras não dão um contributo para a sustentabilidade do SNS? Claro que sim. Existem para moderar ou racionalizar o acesso, moderam o aumento da procura, mas devem ser tais que não afastem a procura justificada. Por isso são compatíveis com a gratuitidade tendencial do SNS; a Constituição reconhece o direito ao uso e não ao abuso. Como é óbvio, esse efeito moderador trava um pouco o crescimento das despesas da saúde, e, sendo as TM pecuniárias, muito ou pouco, aumentam as receitas. Tudo como de forma inexcedível demonstra o Semmisericordia no ponto 6.º do seu Comentário.
3- Sendo assim, por que razão afirmei que “quando se fala de insustentabilidade do SNS, a conversa é totalmente outra e, para mim, não há nela qualquer espaço para taxas moderadoras”:
- porque ninguém reclama a extinção das TM já existentes; as agora anunciadas é que suscitam muitos protestos;
- porque CC disse: “TM: são a única forma de manter viável este modelo público”, omitindo que delas só é esperável um contributo mínimo, como o SemMisericórdia, eu e muitos mais pensamos;
- porque, não sendo a captação de recursos que, neste modelo público, legitima as T.M., procurar na receita acrescida que possam originar a forma de atingir a sustentabilidade parece-me distorcido, para não dizer ilógico. Teoria fiscal à parte, até admitiria que as TM revertessem para o Estado e não directamente para o SNS;
- porque tentar tamponar por essa via o problema é um equivoco, em si mesmo (varrer para debaixo do tapete, como diria o Semmisericórdia) e, principalmente, é alimentar o equívoco de que falta dinheiro, quando a saúde já dispõe de mais que a média da C.E. e o que lhe sobra é desperdício ou sub produtividade.
4 - Claro que é melhor fazer, não digo alguma, mas muita coisa para que o barco não continue a desequilibrar. Por que não (como simples exemplos):
- submeter a prescrição a validação (fácil, porque a maioria, se não a totalidade dos Serviços estão informatizados), só sendo concedida se o doente foi visto no dia em C.E ou S.U.?
- aprovar e por em vigor o Formulário para o Ambulatório - Proposta surgida no âmbito das 1000 Ideias?
- relevar para os efeitos que em cada caso couberem (remunerações variáveis – quando existam – estacionamento em parque, reconhecimento público de mérito, Congressos/seminários, etc.) o perfil do prescritor?
- penalizar o uso indevido (abuso do direito), tal como sugere nos pontos 5.º e 7.º do seu Comentário o Semmisericórdia?
5. Continuo, porém, convencido de que o mais importante é intervir ao nível das causas que fazem que os 10% não sejam suficientes para nos situar ao nível daqueles que suportam despesa semelhante. Embora reconheça que os políticos não podem dar-se ao luxo de ignorar a drasticidade das medidas adequadas, o que põe em destaque a importância do tempo, e da sequência em que são tomadas e apresentadas, a verdade é que, sem elas, a questão da insustentabilidade apresentar-se-á ciclicamente. Mas, também aqui, estamos de acordo.
AIDENÓS
Li com atenção o seu post Não é com Taxas Moderadoras e quero começar por lhe dar os parabéns pela excelente qualidade das suas intervenções, sempre com ideias e análises interessantes e profundas, denotando a alta qualidade do “analista”. Relativamente aos aspectos técnicos estamos de acordo no diagnóstico:
–O SNS precisa sobretudo de reduzir o desperdício;
–Por aí obter-se-á a grande maioria dos recursos necessários à sustentabilidade do SNS.
Diria mesmo que na redução de desperdício se resolverão 90% dos problemas do SNS, 10% via taxas (são estes 10%, apenas, que motivam este comentário).
Foi também o que afirmei em post recente que teve a amabilidade de comentar:
“... Isto é, a sustentabilidade obtém-se não tanto por contribuição muito maior dos doentes, antes por:
i) Reorganizar a oferta (qualificar e encerrar urgências e maternidades, garantir RRH, articular convenções com produção pública face à capacidade existente no SNS, etc.);
ii) Despolitizar e gerir adequadamente o SNS, globalmente e nos diferentes níveis;
iii)Melhorar a gestão das Unidades (reduzir desperdício, aumentar a qualidade, coordenar os cuidados, etc.).
Também estou de acordo com o seu comentário no ”tal post”: “Entendi o post do Semmisericórdia como pretendendo demonstrar que o SNS totalmente gratuito induz distorções e acaba por prejudicar objectivos dos SNS (equidade, acessibilidade e eficiência) e, no meu entender, a demonstração ficou feita.”
E tudo isto porquê? Porque ambos percebemos que as taxas são necessárias, não são a solução do financiamento mas podem ajudar à sustentabilidade. COMO, se são tão pequenas? Já lá vamos....
1º-O que tem acontecido no SNS?
–Os sucessivos governos (todos!) foram produzindo défices avultados, porque foram cedendo a tudo (dando): mais direitos de doentes e mais facilidades de acesso (SNS e convencionados); mais pessoas e mais remuneração média por pessoa; SU com cada vez mais pessoas; novos HH e nenhum dos velhos encerra; descontrolo nos medicamentos (maior despesa para as pessoas e para o Estado) e nos MCDT convencionados, etc. Os sucessivos governos também foram prometendo (e não dando!!), alternativas aos HH (CP a funcionar; CC; “Call center”). As pessoas foram-se convencendo que podiam ter tudo, sem pagar e que eram só direitos (mesmo que fossem alicerçados em situação fiscal que mascaravam).
–Esses défices foram “metidos debaixo do tapete” e a despesa não parou de crescer. Como bem diz gastamos mais que a média da UE, sendo muito mais pobres (mais qualidade? só por brincadeira). Só que isso fez a dívida púbica crescer e agora, com a subida da taxa de juro, temos factura pesada (pagar dívida e juros cada vez maiores).
–Também gastamos mais que a média em Educação, na Justiça e nos salários da Ad. Pública (mais qualidade? só por brincadeira). O “monstro” existe e o SNS integra-o (os pais foram: Guterres e Cavaco), e não pode continuar assim – doutro modo temos aumento dos impostos e problemas de competitividade (fuga de empresas; não virá o necessário investimento externo).
–É necessário pagar a factura da despesa excessiva: gastar menos mas melhor, acabar com o descontrolo e a indisciplina de acesso e de prescrição, mesmo pagar qualquer coisa.
2º-Onde o desperdício é maior? Para além dos medicamentos e actos convencionados é nos SU e serviços desnecessários/excessivos, nos internamentos e outros actos inapropriados e na despesa com o pessoal. Estamos de acordo, vai será necessário pôr fim à concorrência indevida e introduzir incentivos em função de resultados. Mas como bem disse “tocam interesses instalados, quer dos profissionais quer da indústria de saúde”.
3º-Será possível cortar apenas (substancialmente) na despesa para rapidamente voltarmos á “forma”? Parece que não, vejam-se as greves e o mais que as poucas medidas já tomadas originaram (relativas aos subsistemas e administração pública). Seguindo a recomendação dos partidos e analistas (alguns defenderam corte de 200 mil funcionários) o que seria?
4º-Será melhor equilibrar um pouco o barco do SNS ou deixá-lo continuar a ter défices e facilitar o seu afundanço? Alguns defendem mesmo a sua privatização, não é o nosso caso nem o da maioria do blogue. É melhor cortar algo visível e cobrar (pouco) que deixar tudo na mesma.
5º-Taxas só para consumo excessivo decidido pelos doentes? A prescrição do médico que foi induzida pelo doente ou familiar está na mesma situação, assim como o uso irresponsável deve ser penalizado (ex. falta à consulta sem avisar).
6º-Taxas ajudam nalguma coisa? Sem taxas a despesa do Estado disparava mesmo e o Estado perdia receita que globalmente ainda tem significado (aumentava mais o défice e +1% para cima dele é muito!).Qual o impacto das taxas na despesas do estado? Depende do valor das taxas, da % que as paga mesmo e do efeito indutor no consumo da ausência de preço. Suponha que temos um custo incremental da CE de 14 cts (2005: custo total unitário médio de 20 cts) e da urgência de 18 cts (2005: custo total unitário médio de 23,4 cts) e que esse efeito indutor é 10% na CE e 15% no SU (2005: à volta de 6 milhões de CE e 5 milhões de urgências hospitalares). A indução significava mais 600 mil CE e 900 mil urgências. Ao custo incremental indicado teríamos acréscimo total de 600 mil* 14cts= 8,4 milhões de cts e 750 mil*16cts=12 milhões cts; total de 20,4 milhões de contos. (Nota: custo engloba MCDT e medicamentos prescritos). A receita das taxas pouco sustentava o SNS (2 milhões?), o défice do SNS aumentava pelo efeito na despesa!
7º-Uso indevido (abuso do direito) deve ser penalizado? Analiso 2 exemplos: quem falta a CE sem avisar, quem recorre indevidamente ao SU. No primeiro caso os custos e a sub-produtividade que impõe ao SNS (todos nós pagamos, alguém é atendido tardiamente) deve ser paga por quem a provocou? (ex. prever penalidade ou instituir que a taxa moderadora será adiantada por todos na marcação, quem vai ou avisa a tempo não é penalizado) Na segunda situação os custos por uso indevido (ida amiúde e sem justificação clínica; ida ao SU depois de ser tratado nos CP e sem que estes recomendem e sendo considerada não urgente) devem ser pagos por quem abusa do direito ou por todos nós? No mínimo paga a conta à “2ª vez” (na 1ª recebe nota com despesa provocada e com alerta que da próxima paga conta toda, no máximo todo o uso indevido (sem justificação clínica deve pagar a conta verdadeira. (nota: pressupõe que oferta aumente nos CP e na CE para eliminar esperas excessiva, depois pode ser implementada para benefício de todos)
Um abraço
Semmisericórdia
II - Caro Semmisericordia
Primeiro parágrafo aparte, onde claramente exagerou, lisonjeia-me ter provocado o seu Comentário, com o nível de fundamentação a que todos os participantes do Saúde SA já estão habituados.
Congratulo-me não só pela concordância generalizada que verifico existir entre nós mas também porque o seu Comentário me dá oportunidade de algumas precisões que levem a melhor entendimento das minhas afirmações.
Assim:
1- No meu juízo, mais importante do que termos ou não um SNS, é que o respeito da personalidade humana implica, ou exige o direito fundamental aos cuidados necessários para manter, desenvolver ou recuperar a saúde. Todos devemos poder exercê-lo, sejam quais forem os meios de fortuna de que dispomos. Podíamos não ter, mas temos um SNS, universal, geral e tendencialmente gratuito, de acordo com a revisão da Constituição. Ainda bem porque, apesar do que, na sua concepção orgânica, na sua regulamentação e na sua prática tem estado errado, tem de reconhecer-se que, nesse contexto, foi notável o seu desempenho nos últimos 30 anos. Precisa de ser modernizado? Muitos pensarão que sim, mas foi CC quem o afirmou. E mais, afirmou-o em sede de justificação das “Taxas Moderadoras: São a única forma para manter viável este modelo público” (sublinhado meu), não em declarações de circunstância mas em discurso, obviamente, preparado.
2- As taxas moderadoras não dão um contributo para a sustentabilidade do SNS? Claro que sim. Existem para moderar ou racionalizar o acesso, moderam o aumento da procura, mas devem ser tais que não afastem a procura justificada. Por isso são compatíveis com a gratuitidade tendencial do SNS; a Constituição reconhece o direito ao uso e não ao abuso. Como é óbvio, esse efeito moderador trava um pouco o crescimento das despesas da saúde, e, sendo as TM pecuniárias, muito ou pouco, aumentam as receitas. Tudo como de forma inexcedível demonstra o Semmisericordia no ponto 6.º do seu Comentário.
3- Sendo assim, por que razão afirmei que “quando se fala de insustentabilidade do SNS, a conversa é totalmente outra e, para mim, não há nela qualquer espaço para taxas moderadoras”:
- porque ninguém reclama a extinção das TM já existentes; as agora anunciadas é que suscitam muitos protestos;
- porque CC disse: “TM: são a única forma de manter viável este modelo público”, omitindo que delas só é esperável um contributo mínimo, como o SemMisericórdia, eu e muitos mais pensamos;
- porque, não sendo a captação de recursos que, neste modelo público, legitima as T.M., procurar na receita acrescida que possam originar a forma de atingir a sustentabilidade parece-me distorcido, para não dizer ilógico. Teoria fiscal à parte, até admitiria que as TM revertessem para o Estado e não directamente para o SNS;
- porque tentar tamponar por essa via o problema é um equivoco, em si mesmo (varrer para debaixo do tapete, como diria o Semmisericórdia) e, principalmente, é alimentar o equívoco de que falta dinheiro, quando a saúde já dispõe de mais que a média da C.E. e o que lhe sobra é desperdício ou sub produtividade.
4 - Claro que é melhor fazer, não digo alguma, mas muita coisa para que o barco não continue a desequilibrar. Por que não (como simples exemplos):
- submeter a prescrição a validação (fácil, porque a maioria, se não a totalidade dos Serviços estão informatizados), só sendo concedida se o doente foi visto no dia em C.E ou S.U.?
- aprovar e por em vigor o Formulário para o Ambulatório - Proposta surgida no âmbito das 1000 Ideias?
- relevar para os efeitos que em cada caso couberem (remunerações variáveis – quando existam – estacionamento em parque, reconhecimento público de mérito, Congressos/seminários, etc.) o perfil do prescritor?
- penalizar o uso indevido (abuso do direito), tal como sugere nos pontos 5.º e 7.º do seu Comentário o Semmisericórdia?
5. Continuo, porém, convencido de que o mais importante é intervir ao nível das causas que fazem que os 10% não sejam suficientes para nos situar ao nível daqueles que suportam despesa semelhante. Embora reconheça que os políticos não podem dar-se ao luxo de ignorar a drasticidade das medidas adequadas, o que põe em destaque a importância do tempo, e da sequência em que são tomadas e apresentadas, a verdade é que, sem elas, a questão da insustentabilidade apresentar-se-á ciclicamente. Mas, também aqui, estamos de acordo.
AIDENÓS
Etiquetas: Semisericórdia
3 Comments:
Para além de todo o interesse da discussão em torno das posições defendidas pelo Semmisericórdia e pelo Aidenós, e independentemente da minha concordância com uma e/ou outra das possições, deixo uma breve nota:
Quem falta a uma consulta, claramente cria algum problema aos Serviços. E, defende o Semmisericórdia, deve ser penalizado.
Tendo a estar de acordo com esta ideia, mas, e há sempre um mas...a mesma deverá ter como paralelo a indemnização ao doente nos casos em que a sua consulta não seja realizada por causa imputável ao Hospital ou CS.
E a verdade é que sou levado a pensar que são muitos mais os casos de não-consulta na segunda hipótese do que na primeira.
E que dizer de situações como uma de que hoje tive conhecimento: um doente marcou (foi-lhe marcada)em Fevereiro (de 2006) uma consulta para o passado dia 8(?) de Novembro. Por motivos de greve a consulta não teve lugar. Agora foi-lhe remarcada a consulta para Novembro de 2007 (sim, 2007, não me enganei). Que penalização deve ser aplicada ao Hospital? (trata-se de uma CE).
PS: sabemos que há margem para redução de "desperdício" (já disse qual o sentido que atribuo a este termo e não é o que geralmente vejo considerado) mas o crescimento das despesas de saúde não pode ignorar as suas verdadeiras causas e essas têm apenas uma pequena expressão no dito desperdício.
No seu Comentário, no Post “Discutir o SNS”, o Tonitosa declara que tende a estar de acordo com a ideia, defendida pelo semmisericórdia, de penalizar quem falta a uma consulta porque “claramente cria algum problema aos Serviços …. mas a mesma deverá ter como paralelo a indemnização ao doente nos casos em que a sua consulta não seja realizada por causa imputável ao Hospital ou CS”. Que, estes, são em muito maior número, o que eu também penso.
Caro Tonitosa, não é preciso lei nova para indemnizar nestes casos. A lei já prevê a responsabilidade criminal e civil, conforme no caso couber, para os danos causados pelo Estado aos cidadãos. Não estamos (ainda …) habituados a exigir essa responsabilidade e acredito que, na imensa maioria dos casos, as administrações não tomam a iniciativa. Mas sei de, pelo menos, dois casos em que utentes do SNS foram indemnizados por HH, por despesas de deslocação em vão e pelo custo em clínica privada do exame que o doente vinha fazer e não fez no Hospital.
Dá seguidamente conta de uma situação verdadeiramente arrepiante: C.E. marcada em Fevereiro (de 2006) para o passado dia 8 (?) de Novembro, não realizada por motivos de greve e remarcada para Novembro de 2007. Que penalização deve ser aplicada ao Hospital?
Em caso de greve, entendo que não será ao Hospital que a conta deve ser apresentada (se é que há lugar a ela, porque a lei só exige que fiquem assegurados os serviços mínimos) e as greves fazem-se exactamente para “prejudicar” a entidade patronal e a população utente dos serviços em causa! Só se prejudicarem é que fazem sentido.
Em todo o caso (na generalidade e não julgando o caso concreto), com greve ou sem ela, não tenho qualquer dúvida ao responder à sua pergunta: deve ser dada por finda a comissão de serviço do director do serviço.
O que é grave (diria criminoso, porque em alguns casos equivale a condenação do doente à morte) é a forma totalmente acrítica como, em muitos HH os doentes são inscritos em lista de espera. Colocar o Utente no Centro do SNS significa também que quem inscreve um doente em lista de espera fica responsável por ele desde o momento da inscrição, não pode, simplesmente, ficar à espera que chegue o dia. Infelizmente, a minha convicção é que poucos HH ou Serviços – se é que alguns – fazem este entendimento das listas de espera. O do caso apresentado parece não fazer!
Aidenós,
Quando citei o caso da consulta remarcada para 2007 não estava a pensar na "indemnização" ao doente. Penso que no caso não tem lugar, como você precisou.
O que na verdade pretendi destacar foi o ter sido fixada a nova data para um ano depois.
Sabe uma coisa: geralmente o director do serviço nem sequer perde tempo(?) a olhar para as consultas não realizadas e suas causas. Este processo (marcação e desmarcação) é tratado como um mero problema administrativo, o que naturalmente está errado. Mas quando um CA pede a informação e faz perguntas sobre a matéria não faltam justificações do próprio director do serviço...(como diz o anúncio ... isto é verdade).
Também é verdade que há médicos (e em número significativo) que sabendo que vão estar impedidos procuram mesmo antecipar consultas e remarcá-las em reforço de agenda nos dias mais próximos. O que é louvável.
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