Aranda da Silva
Diário de Notícias (DN): Mais de um ano depois, o acordo entre o Governo e a Associação Nacional de Farmácias [ANF] está na maioria por cumprir. Isso é bom ou mau?
Aranda da Silva (AdS): Deve fazer essa pergunta ao dr. João Cordeiro [presidente da ANF]. Eu não fui ouvido. Como foi feito sem garantias, o Governo está a avançar apenas com as medidas prejudiciais para as farmácias.
DN: Acredita que alguma vez será todo cumprido?
AdS: Tenho muitas dúvidas. O Governo, e em especial o ministro da Saúde, é autista em relação aos estudos com consistência técnica e minado por preconceitos ideológicos.
DN: Alguma vez imaginou que seria o último bastonário dos Farmacêuticos enquanto proprietários únicos?
AdS: Foi uma grande surpresa. Não conhecia essa posição ao PS, que sempre defendeu que a liberalização não era solução. E não constava do programa de Governo. A medida lança a suspeita de ser uma cedência a interesses que mais cedo ou mais tarde vão ser conhecidos.
DN: Quer concretizar?
AdS: A saúde é um grande negócio. Vamos assistir à entrega a grupos económicos que nada têm a ver com a saúde, que vêem o sector como actividade comercial, desligando-o da sua essência e tendo como objectivo o lucro. É conhecida desde 2004 a posição dos grossistas exigindo ao Governo a liberalização...
DN: A ANF é a face do sector, e a Ordem dos Farmacêuticos (OF) ficou na sua sombra?
AdS: Há um movimento do Governo de limitar o papel das ordens. O neoliberalismo é a corrente ideológica dominante. É preocupante que hoje não seja a Organização Mundial da Saúde a determinar as políticas, mas a OCDE, uma organização de carácter económico e de mercado. Estamos a assistir a uma desregulamentação da farmácia e também do farmacêutico e de outras profissões. Enviámos propostas sem qualquer tipo de acolhimento, com o argumento de que não era prioritário.
DN: Porque é que acha que a OF ficou de fora?
AdS: O Governo sabe a nossa posição e sabe que não a negociamos. A OF não ia ceder, tem interesses muito diferente dos da ANF, que só representa os proprietários. E foi marginalizada.
DN: Está a dizer que João Cordeiro negociou o que não devia ser negociado...
AdS: O acordo andou a ser negociado durante meses. Deve haver muita coisa no acordo que não consta do papel mas que mais cedo ou mais tarde se vai saber.
DN: Em fim de mandato, arrependeu-se de alguma coisa? Sentiu-se isolado, mesmo em relação à ANF?
AdS: Sim, senti que a ANF devia ter falado com a OF e não o fez. Em termos políticos, há também um grande isolamento das nossas posições. É muito difícil ter feito diferente. Havia consenso de todos os partidos, menos do PCP. Há nitidamente uma influência económica na definição das políticas. Cada vez mais o poder económico está perto do poder político. O poder político está capturado por interesses económicos.
DN: No confronto Correia de Campos-João Cordeiro, quem saiu perdedor?
AdS: Os dois. Os farmacêuticos. Principalmente os doentes.
Aranda da Silva (AdS): Deve fazer essa pergunta ao dr. João Cordeiro [presidente da ANF]. Eu não fui ouvido. Como foi feito sem garantias, o Governo está a avançar apenas com as medidas prejudiciais para as farmácias.
DN: Acredita que alguma vez será todo cumprido?
AdS: Tenho muitas dúvidas. O Governo, e em especial o ministro da Saúde, é autista em relação aos estudos com consistência técnica e minado por preconceitos ideológicos.
DN: Alguma vez imaginou que seria o último bastonário dos Farmacêuticos enquanto proprietários únicos?
AdS: Foi uma grande surpresa. Não conhecia essa posição ao PS, que sempre defendeu que a liberalização não era solução. E não constava do programa de Governo. A medida lança a suspeita de ser uma cedência a interesses que mais cedo ou mais tarde vão ser conhecidos.
DN: Quer concretizar?
AdS: A saúde é um grande negócio. Vamos assistir à entrega a grupos económicos que nada têm a ver com a saúde, que vêem o sector como actividade comercial, desligando-o da sua essência e tendo como objectivo o lucro. É conhecida desde 2004 a posição dos grossistas exigindo ao Governo a liberalização...
DN: A ANF é a face do sector, e a Ordem dos Farmacêuticos (OF) ficou na sua sombra?
AdS: Há um movimento do Governo de limitar o papel das ordens. O neoliberalismo é a corrente ideológica dominante. É preocupante que hoje não seja a Organização Mundial da Saúde a determinar as políticas, mas a OCDE, uma organização de carácter económico e de mercado. Estamos a assistir a uma desregulamentação da farmácia e também do farmacêutico e de outras profissões. Enviámos propostas sem qualquer tipo de acolhimento, com o argumento de que não era prioritário.
DN: Porque é que acha que a OF ficou de fora?
AdS: O Governo sabe a nossa posição e sabe que não a negociamos. A OF não ia ceder, tem interesses muito diferente dos da ANF, que só representa os proprietários. E foi marginalizada.
DN: Está a dizer que João Cordeiro negociou o que não devia ser negociado...
AdS: O acordo andou a ser negociado durante meses. Deve haver muita coisa no acordo que não consta do papel mas que mais cedo ou mais tarde se vai saber.
DN: Em fim de mandato, arrependeu-se de alguma coisa? Sentiu-se isolado, mesmo em relação à ANF?
AdS: Sim, senti que a ANF devia ter falado com a OF e não o fez. Em termos políticos, há também um grande isolamento das nossas posições. É muito difícil ter feito diferente. Havia consenso de todos os partidos, menos do PCP. Há nitidamente uma influência económica na definição das políticas. Cada vez mais o poder económico está perto do poder político. O poder político está capturado por interesses económicos.
DN: No confronto Correia de Campos-João Cordeiro, quem saiu perdedor?
AdS: Os dois. Os farmacêuticos. Principalmente os doentes.
DN 14.06.07, entrevista de Rute Araújo
2 Comments:
São de uma comovente candura as declarações de Aranda da Silva... sobre a ANF e JC.
Na hora da despedida... (como canta o fado de Coimbra) "descobriu" o esvaziamento dos enquadramentos deontológicos. Tropeçou no "vale tudo...".
Portugal é cada vez menos um País. Tornou-se um conglomerado de negócios, uma feira de negociações e o paraíso dos negociantes.
São os conteúdos eticamente "pragmáticos"!
Interessante é Aranda da Silva utilizar a ideia defendida pelo Prof. Paulo Moreira na sua recente entrevista na Visão: 'OMS vs OCDE'.
Este conflito é real e de facto devia-nos levar a um verdadeiro debate no sentido de discutirmos essa ideia em Portugal.
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