UMP, reivindica direito de preferência?
SNS, pagador de promessas ?
Duas declarações prévias:
1ª) Considero que o sector social tem um importante papel a desempenhar, na área da Saúde, integrando uma vertente de complementaridade, p. exº., em relação ao SNS;
2ª) O sector social é muito mais amplo do que as Misericórdias (ou a União das Misericórdias Portuguesas - UMP), existindo à sua volta uma Economia Social, onde se encaixam variadas instituições que não devem ser marginadas, nem menorizadas, como por exemplo:
- Cooperativas,
- IPSS;
- Associações Mutualistas;
- ONG’s ;
- etc.
A recente prosápia de Manuel Lemos, presidente da UMP, link sobre as listas de espera cirúrgicas, mostra, à luz de uma primeira abordagem, uma ânsia de protagonismo na área da Saúde (ou será mais?) que, no mínimo, começa a ser incomodativa.
CC, nas comemorações do 1º. Aniversário da implementação da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI), teve o ensejo de salientar o papel das Santas Casas que integraram em força – 77% das 56 unidades funcionais - a 1ª. fase da RNCCI. Logo, muito do que a RNCCI fez, neste ano de arranque, deve-o às Misericórdias. Todos devemos estar gratos por esse esforço. A UMP, através dos seus associados, serviu os portugueses.
Manuel Lemos pretende pressionar a ARS Norte, chama-lhe agilizar, no sentido de “arrematar”, ao que me parece “ad hoc”, as listas de espera cirúrgicas, na região Norte. Afirmou: “é precisamente nas cirurgias onde há maiores listas de espera que as Misericórdias têm maior capacidade de resposta, nomeadamente na cirurgia vascular, oftalmologia e apêndice". À primeira vista, face a um possante ruído de fundo, trata-se de um estreito leque de procedimentos cirúrgicos, grande parte deles no âmbito da Cirurgia de Ambulatório. Nada de “pesado”, portanto.
Mas aquilo a que chamei de prosápia, estende-se em relação aos tempos vindouros e propõe: “não só acabar com as listas de espera existentes, mas também evitar a formação de novas listas". Há aqui uma nova pretensão: a intenção de contractualizar, nem mais nem menos, o futuro.
Só assim se entende que, “as condições criadas”, como referiu Manuel Lemos,, significam a existência de um (vultuoso) investimento, i.e., uma visível capacidade instalada, de avanço. É este o crédito que lhe merece a evolução do SNS, ao nível da eficiência.
À primeira vista, esta “disponibilidade” da UMP abre caminho a boas – porque menos onerosas – contractualizações, já que as Misericórdias são, em princípio, prestadoras de cuidados de saúde, reivindicando eficiência e uma finalidade social, sem fins lucrativos.
Penso que não é disso que se trata. O que Manuel de Lemos parece querer é adjudicar, sem delongas, i.e., sem abertura de concursos públicos que ponham em confronto os diversos candidatos a prestadores, um “pacote” de intervenções cirúrgicas (cirurgia vascular, oftalmologia e “apêndice”), a preços de mercado (que se move num ambiente concorrencial, com lucros). Esta é a grande contradição. Assim, o que as Misericórdias estão a pugnar é pelo direito de preferência, no mercado. Enfim, tentando a entorse desse mercado.
Mas há mais. A oferta aparece inquinada e desfasada dos problemas que o SNS se debate no que diz respeito às listas de espera cirúrgicas.
Segundo o coordenador do SGIC, Pedro Gomes, cujo relatório de actividades se aguarda, “as principais dificuldades estão nas regiões Centro e Lisboa e Vale do Tejo e não no Norte”.
Portanto, e ainda segundo o coordenador do SGIC, a proposição da UMP, criaria uma “discriminação positiva” para a região onde se propõe actuar. Isto é, a mediana de espera na região de Lisboa é praticamente o dobro do que a do Norte. Logo a pressa de adjudicação das listas de espera cirúrgicas do Norte, não visa restabelecer equidades, mas sim rentabilizar investimentos e utilizar capacidades instaladas. Não visa servir o SNS, ou as suas incapacidades, mas a UMP.
O SNS é um serviço público, constitucionalmente consagrado, de um Estado laico. Não é um pagador de promessas.
As contractualizações ou as convenções a fazer são para melhor servir os portugueses, todos e de modo equitativo, oferecendo aos cidadãos cuidados de saúde, de qualidade e com menores custos.
É nestes terrenos que a UMP, bem como todo o sector social e o empresarial, tem de se colocar.
O Estado não pode alinhar em manobras de “intimidação”, nem contemplar direitos de preferência. Se não, repetiremos na Saúde as cenas do “Bragaparques”, como já sucedeu no H S. João (Porto), por coincidência, no Norte.
É urgente dissipar as dúvidas e não alimentar os equívocos.
E, finalmente, recordarmos que o regime dos privilégios é contemporâneo com o auge e o esplendor das Misericórdias.
As Misericórdias duraram até hoje, mas os privilégios caíram com a Revolução Francesa…
É-Pá
1ª) Considero que o sector social tem um importante papel a desempenhar, na área da Saúde, integrando uma vertente de complementaridade, p. exº., em relação ao SNS;
2ª) O sector social é muito mais amplo do que as Misericórdias (ou a União das Misericórdias Portuguesas - UMP), existindo à sua volta uma Economia Social, onde se encaixam variadas instituições que não devem ser marginadas, nem menorizadas, como por exemplo:
- Cooperativas,
- IPSS;
- Associações Mutualistas;
- ONG’s ;
- etc.
A recente prosápia de Manuel Lemos, presidente da UMP, link sobre as listas de espera cirúrgicas, mostra, à luz de uma primeira abordagem, uma ânsia de protagonismo na área da Saúde (ou será mais?) que, no mínimo, começa a ser incomodativa.
CC, nas comemorações do 1º. Aniversário da implementação da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI), teve o ensejo de salientar o papel das Santas Casas que integraram em força – 77% das 56 unidades funcionais - a 1ª. fase da RNCCI. Logo, muito do que a RNCCI fez, neste ano de arranque, deve-o às Misericórdias. Todos devemos estar gratos por esse esforço. A UMP, através dos seus associados, serviu os portugueses.
Manuel Lemos pretende pressionar a ARS Norte, chama-lhe agilizar, no sentido de “arrematar”, ao que me parece “ad hoc”, as listas de espera cirúrgicas, na região Norte. Afirmou: “é precisamente nas cirurgias onde há maiores listas de espera que as Misericórdias têm maior capacidade de resposta, nomeadamente na cirurgia vascular, oftalmologia e apêndice". À primeira vista, face a um possante ruído de fundo, trata-se de um estreito leque de procedimentos cirúrgicos, grande parte deles no âmbito da Cirurgia de Ambulatório. Nada de “pesado”, portanto.
Mas aquilo a que chamei de prosápia, estende-se em relação aos tempos vindouros e propõe: “não só acabar com as listas de espera existentes, mas também evitar a formação de novas listas". Há aqui uma nova pretensão: a intenção de contractualizar, nem mais nem menos, o futuro.
Só assim se entende que, “as condições criadas”, como referiu Manuel Lemos,, significam a existência de um (vultuoso) investimento, i.e., uma visível capacidade instalada, de avanço. É este o crédito que lhe merece a evolução do SNS, ao nível da eficiência.
À primeira vista, esta “disponibilidade” da UMP abre caminho a boas – porque menos onerosas – contractualizações, já que as Misericórdias são, em princípio, prestadoras de cuidados de saúde, reivindicando eficiência e uma finalidade social, sem fins lucrativos.
Penso que não é disso que se trata. O que Manuel de Lemos parece querer é adjudicar, sem delongas, i.e., sem abertura de concursos públicos que ponham em confronto os diversos candidatos a prestadores, um “pacote” de intervenções cirúrgicas (cirurgia vascular, oftalmologia e “apêndice”), a preços de mercado (que se move num ambiente concorrencial, com lucros). Esta é a grande contradição. Assim, o que as Misericórdias estão a pugnar é pelo direito de preferência, no mercado. Enfim, tentando a entorse desse mercado.
Mas há mais. A oferta aparece inquinada e desfasada dos problemas que o SNS se debate no que diz respeito às listas de espera cirúrgicas.
Segundo o coordenador do SGIC, Pedro Gomes, cujo relatório de actividades se aguarda, “as principais dificuldades estão nas regiões Centro e Lisboa e Vale do Tejo e não no Norte”.
Portanto, e ainda segundo o coordenador do SGIC, a proposição da UMP, criaria uma “discriminação positiva” para a região onde se propõe actuar. Isto é, a mediana de espera na região de Lisboa é praticamente o dobro do que a do Norte. Logo a pressa de adjudicação das listas de espera cirúrgicas do Norte, não visa restabelecer equidades, mas sim rentabilizar investimentos e utilizar capacidades instaladas. Não visa servir o SNS, ou as suas incapacidades, mas a UMP.
O SNS é um serviço público, constitucionalmente consagrado, de um Estado laico. Não é um pagador de promessas.
As contractualizações ou as convenções a fazer são para melhor servir os portugueses, todos e de modo equitativo, oferecendo aos cidadãos cuidados de saúde, de qualidade e com menores custos.
É nestes terrenos que a UMP, bem como todo o sector social e o empresarial, tem de se colocar.
O Estado não pode alinhar em manobras de “intimidação”, nem contemplar direitos de preferência. Se não, repetiremos na Saúde as cenas do “Bragaparques”, como já sucedeu no H S. João (Porto), por coincidência, no Norte.
É urgente dissipar as dúvidas e não alimentar os equívocos.
E, finalmente, recordarmos que o regime dos privilégios é contemporâneo com o auge e o esplendor das Misericórdias.
As Misericórdias duraram até hoje, mas os privilégios caíram com a Revolução Francesa…
É-Pá
Etiquetas: E-Pá
8 Comments:
Entre o extenso, variado e excelente conjunto de comentários, o melhor de todos.
O melhor é sempre o último.
Mas neste caso cocordo com o Xavier.
A UMP a nadar na calda da nossa cultura de compadrios.
E o Estado tem sido desde sempre o maior compadre.
Como o Estado pouco mudou, os compromissos permanecem os mesmos de sempre.
Depois dos recentes investimentos e da colaboração exemplar nos novos projectos do MS, chegou a hora do Estado cumprir promessas.
Os privilégios continuam os mesmos.
Os privilegiados também.
Basta ver a notícia de hoje do expresso sobre a oferta de Isaltino ao MS.
Oferece os terrenos para construção do IPO(Lisboa) que a Câmara de Oeiras ainda não comprou. Consegue assim com esta manobra valorizar os terrenos de Leceia, propriedade de algum amigo.
O ministro da Saúde, António Correia de Campos, alheio a estas jogadas, abrilhanta o contrato.
O expresso com esta notícia "mata" à nascença os intentos do astuto Presidente da Câmara de Oeiras.
As jogadas de sempre, neste Portugal à beira mar plantado.
As manobras de Isaltino continuam.
É o mercado a funcionar neste Portugal manhoso, armado em ultra liberal.
O percurso recente das relações com o MS não tem sido nada fácil.
Mal chegou pela segunda vez ao governo, CC decidiu contestar os contratos assinados entre LFP e o padre Milícias.
Seguiram-se os casos da exigência de taxas moderadoras pelos serviços das misericórdias aos doentes do SNS e de sobrefacturação de cuidados.
Mais recentemente parecia correr tudo sobre rodas com as Misericórdias a ganharem sucessivos contratos na rede de cuidados continuados.
Até que nos aparece o Manuel Lemos, presidente da UMP, à conquista do SNS, a prometer solução para todas as maleitas.
Fruto da política de CC, o nosso SNS está prestes a converter-se num "sistema de quem dá mais".
Desde que o Estado se veja livre das prestações directas, vale tudo.
Á atenção e ao cuidado do MS:
"O representante nacional das Misericórdias aponta que pretende ver discutido com o Governo a intervenção daquelas instituições no plano dos cuidados primários da saúde e em vários outros, dos quais a população e o país está carente de respostas."
Conclusões do VIII Congresso Nacional das
Misericórdias, este fim-de semana, em Braga.
Nada mais, ou nada menos, do que a "balcanização" do SNS. Depois, a sua prosélita cristianização. Finalmente, a saúde caritativa, da esmola...
Como é possível que elucubrações medievais, sobre modelos sociais, ainda persistam?
Ou, serão, simplesmente:
elucubrações teológicas de circunstância de uma associação que (ainda) se rege pelo direito canónico?
Até onde a UMP poderá chegar neste mórbido apetite (será devoção?) para espoliar o SNS?
Parece-me que já estivemos mais longe do Estado teocrático e, possivelmente, mais perto do Estado republicano, laico.
Haja contenção nas ambições e moderação nas proposições.
"Não vá o sapateiro além da chinela "
As comuns venialidades não lhe assentam bem, nem são originais. Já imundam o sector privado. São dispensáveis no sector social.
O SNS - com muitos "pecados" - não é a personificação do "diabo"!
Talvez valha a pena recordar que a Misericórdia (IPSS) de Lisboa, a primeira, foi fundada a 15 de Agosto de 1498.
"É por iniciativa da ilustríssima e mui católica senhora, a rainha Dona Leonor (1458-1525), viúva de D.João II e irmã de D.Manuel I, senhora de grande fortuna e protectora de letrados e artistas (como Gil Vicente), que será fundada a primeira misericórdia, em Lisboa, no ano da graça de 1498 (mais exactamente a 15 de Agosto)."
"Até à morte de Dona Leonor, em 1525, teriam surgido 61 misericórdias. E mais de meia centena se lhes seguiu até ao final do Século XVI, incluindo as principais cidades e vilas do reino como, por exemplo, Coimbra (1500), Beja (1500), Setúbal (1501), Santarém (1502), Elvas (1503), Braga (1513), Viseu (1516), Loulé (1518), Lamego (1519), Viana do Lima (1512), etc."
Luís Graça
Cara naoseiquenome usar:
Ninguém retira, nem pretende diminuir, o passado e o riquíssimo trajecto histórico das Misericórdias.
Não é disso que se trata. Elas integram um sector (ainda) importante que podemos chamar da "Economia Social" e para além da sua apetência para actuar na área da Saúde, têm desempenhado um importante papel na sociedade, nomeadamente no Ensino.
O problema não é o venerável passado, mas a actualidade. Onde os privilégios deixaram de ter espaço e, quanto persistem, trazem iniquidades.
Temos uma Concordata, revista recentemente, que é das mais retrógadas do Mundo.
Não temos, no nosso País, uma questão religiosa mas tememos a Igreja.
O Mundo moderno tem dificuldade em conciliar o desenvolvimento e métodos seculares, por melhores que tenham sido.
Como sabe, em Saúde, não se tratam infecções com sinapismos, nem sequer com sulfamidas...
Estamos noutros tempos, com outras regras.
Não será feliz, nem santo, vermos o SNS ser canibalizado nos HH's pelo sector privado e nos Cuidados Continuados e Cuidados Primários de Saúde, pelas Misericórdias.
Haja Deus!... mas para todos.
Ou nem isso, já que vivemos num Estado secular.
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