domingo, janeiro 6

Ofensiva para Arrumação dos Bancos (2)

hospital de anadia
Só dois comentários para tentar ser assertivo e não me confundir a mim próprio sendo prolixo.
1. O que estava então programado para um Hospital que faz 40 000 urgências/ano e qual a orientação que teriam esses doentes ?
2. Qual o impacto que irão ter nas urgências

Nenhum hospital existe isolado, muito menos se é público e integrado no SNS, nem pode esquecer-se do papel e das regras de hierarquia e complementaridade com os demais. Também não pode olvidar (ou desprezar) a população que visa servir, mas sempre dentro das regras hospitalares, de saúde e de funcionamento público – o que impõe limites à decisão.

Sabe-se que se aumentarmos a oferta de meios especializados (“bancos”) a procura rapidamente os ocupa e “pede mais” – sobretudo se é gratuito e quando a população não conhece ou não sente as consequências negativas, bem enumeradas pelo blogguista em causa.

Aos profissionais de saúde em geral, e aos decisores em particular, a Lei de Bases comete o dever de tudo fazer para evitar o uso inapropriado dos serviços – como também aos doentes. Em geral o C. Administração e os médicos devem contrariar a inapropriação (não estimular, aumentando a oferta) e com os restantes envolvidos (tutela, CSP, outros hospitais, outros serviços) preparar alternativas e consistentemente combater o uso indevido e inapropriado do “banco”.

Um hospital com aquela população, perfil e capacidade de resposta não deve ter mais que atendimento permanente nas horas em que se justificar (8-22H?). Repare que se fosse naquela cidade alemã nem esse serviço teria, porque como disse o E-pá para 6XX mais população que Coimbra havia uma urgência “a sério” com pouco mais de 5100 doentes/ano (14*365).

O impacto será mínimo e percebe-se porquê (é fazer as contas):
i) Por cada MGF que deixa de fazer 24 h/semana de “urgência” no hospital dá-se cobertura a mais 1023 pessoas (24*1500/35), que estavam sem MGF e acorriam “naturalmente à “urgência”, e fazem-se mais 5500 consultas/ano (5/hora);
ii) Idem em médicos especialistas quanto ao muito maior nº de CE (também cirurgias e outros actos) – em CE por médico daria mais 4400 consultas/ano face a menos de 500 na urgência (24*46*4). Assim diminui-se a lista de espera da CE e aí tem mais um motivo para os doentes quererem recorrer à urgência (onde quer que seja!).
iii) Depois basta a distância para afastar os “doentes do calo” (e semelhantes), pelo que muitos poucos recorrerão a uma verdadeira urgência.
iv) Finalmente, noutra óptica, o encerramento é só nocturno e nesse “banco” não haverá mais de meia dúzia de doentes/noite.

Quanto ao “estado das urgências dos HH que referiu”. Quem sabe se as medidas que se ouvem por aí não vão “dar a volta”:
1º- Profissionalização e novo regime de retribuição para urgência;
2º- Separação de fluxos para criar a emergência como descrita pelo E-Pá;
3º- Impacto das USF e de urgências básicas e atendimentos permanentes em CSP
4º- ...Após pensar maduramente nesta problemática espero que leve esta opinião (também) em conta para a fundamentação da sua posição.
Hermes

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5 Comments:

Blogger Xico said...

Concorde-se ou não com o encerramento de serviços de urgência, é certo que a cobertura nacional de serviços hospitalares necessita de ser revista. O país dispõe de uma cobertura de hospitais que assenta historicamente nos designados “hospitais de Misericórdia”, que foram absorvidos no pós 25 de Abril e com a criação do SNS. Muitos desses hospitais foram nas últimas décadas substituídos por novos hospitais com condições e tecnologias adequadas às necessidades actuais. Infelizmente não se aproveitou essa modernização do parque hospitalar para reformular não só a cobertura de serviços de urgência, mas também outros cuja distribuição é pouco mais que caótica.
O país mudou, o interior é hoje muito menos populoso do que há algumas décadas, as acessibilidades são hoje muito superiores e a exigência de qualidade e de rapidez na resposta é infinitamente superior. A realidade na prestação de cuidados de saúde é hoje muito diferente, com maiores exigências ao nível do equipamento e da qualidade da prestação.
A esmagadora maioria dos serviços de urgência do país são assegurados com recurso a médicos de clínica geral, muitos sem qualquer vínculo às instituições recebendo através do “recibo verde”. A maioria desses médicos não tem formação em suporte avançado de vida e o serviço que prestam serve para colmatar as falhas dos cuidados primários. Aos médicos especialistas cabe, muitas vezes em situações penosas por falta de médicos suficientes, assegurar a resposta às verdadeiras urgências.
Por outro lado, o serviço de urgência serviu historicamente para compensar financeiramente o pessoal médico, cujo vencimento base sempre foi considerado baixo. Por isso todos os hospitais do país têm a sua urgência, mesmo que não integrem oficialmente a rede nacional de serviços de urgência ou a mesma não se justifique.
O aproveitamento politico e o corporativismo/sindicalismo médico têm impedido qualquer ajustamento nos serviços hospitalares, o que causado situações caricatas, com excesso de hospitais em determinadas regiões (veja-se por exemplo o distrito de Santarém).
Quanto aos custos económicos, num serviço de urgência típico a Ordem dos Médicos exige um mínimo de 3 cirurgiões. Caso exista obstetrícia, têm que estar presentes no mínimo 3 obstetras. Se houve ortopedia, idem. No caso da anestesiologia, pelo menos 2 anestesistas, um para assegurar as cesarianas e outro para as restantes situações. E isto apenas para a urgência externa, porque alguns colégios de especialidades da OM exigem cobertura própria para a urgência interna.
Ora na grande maioria dos hospitais de pequena dimensão é impossível assegurar coberturas deste nível, por falta de médicos. Noutros, os custos são incomportáveis e a produtividade irrisória (com 5 ou 6 cirurgias feitas no período nocturno durante 1 ano).
Significa isto que esses SU são assegurados em muitos casos por equipas que não cumprem os requisitos da própria OM.
Apesar da pouca perícia politica, Correia de Campos ousou atacar de frente um problema estrutural do próprio SNS. Se o fez bem ou se as escolhas foram as correctas, o tempo o dirá.

11:26 da tarde  
Blogger Diabo de Saias said...

Muita Atenção:

Hermes disse:

iii) Depois basta a distância para afastar os “doentes do calo” (e semelhantes), pelo que muitos poucos recorrerão a uma verdadeira urgência.
iv) Finalmente, noutra óptica, o encerramento é só nocturno e nesse “banco” não haverá mais de meia dúzia de doentes/noite.

Palavras para quê, é um gestor português e não sofre dos calos - a não quando lhos calcam !

12:04 da manhã  
Blogger e-pá! said...

Caro Hermes:

Também para economizar, só um pequeno reparo que é ditado pelo meu realismo e pela experiência de mais de 30 anos de actividade clínica.

Escreve:

"Aos profissionais de saúde em geral, e aos decisores em particular, a Lei de Bases comete o dever de tudo fazer para evitar o uso inapropriado dos serviços – como também aos doentes. Em geral o C. Administração e os médicos devem contrariar a inapropriação (não estimular, aumentando a oferta) e com os restantes envolvidos (tutela, CSP, outros hospitais, outros serviços) preparar alternativas e consistentemente combater o uso indevido e inapropriado do “banco”.

Aos médicos, enquanto clínicos, nada podem fazer quanto ao uso inapropriado, ou ao abuso, de um serviço de urgências.
Eles continuam de "porta aberta". Estamos a transmitir a imagem de um "mercado de saúde". O "consumismo" vem na senda deste mercado.
Sendo assim, se não houver hierarquização dos fluxos (esse é o problema) a procura é aleatória e compete (dentologicamente) ao médico oferecer cuidados. Só que havendo o proposito de regular a oferta, esta terá tendencia a ser subdimensionada e um intenso fluxo leva ao engarrafamento, com todas as suas consequências, nomeadamente o alongamento do tempo de espera, com TSM, ou sem ela.
E, depois, segue-se uma cascata que "penaliza", não só os médicos, mas todo o pessoal da urgência:
1º) - a qualidade do atendimento;
2º) - a dificuldade de coordenação das diferentes respostas;
3º) - a sobreposição cumulativa de cuidados inadiáveis;
4º) - o espectro da negligência (este, por norma, é só para o médico).

Disciplinar a oferta, sendo fundamental para a organização de um SU é uma tarefa muito complexa. Passa pela gestão administrativa, clinica e humanitária dos fluxos em todos os pontos do sistema e em todos os momentos (pré-hospitalar e hospitalar).
Confesso que não vejo, como viável, nos tempos mais próximos, este tipo de integração e interoperacionalidade a funcionar na rede de urgências.
É um estadio superior de organização. É uma meta. Impossível de quantificar o tempo necessário para a atingir.

A "arrumação dos Bancos", não a querendo taxar de impossível lembra-me Einstein:
"Algo só é impossível até que alguém duvide e acabe por provar o contrário".
A dúvida existe, falta a prova!

12:13 da manhã  
Blogger Hermes said...

Caro E- Pá

Estive fora pelo que só agora vi o seu «pequeno reparo… ditado pelo realismo». Endosso-lhe uma pequena achega, mais que uma resposta, com melhor concretização e alguma quantificação (monitorização do encerramento de falsas “urgências”).

1 - A quantificação sobre o efeito nos verdadeiros SU do encerramento de falsas urgências (ou das 0 às 8 horas) vem em notícia do JN de 8 Janeiro 2008 (respigo):

«…transferência de uma média de nove doentes por dia daqueles dois hospitais (Cantanhede, Anadia) para os HUC desde o primeiro dia do ano»
«… Espinho foram transferidos para o CH de Gaia uma média de cinco doentes por dia»
«…Fundão… transferido para a Covilhã, no primeiro dia (2 de Janeiro), cinco doentes.»


Todos percebemos os motivos que movem alguns profissionais e autarcas ao querer perpetuar a situação aberrante de falsas “Urgências”, conseguida muitas vezes ao longo do tempo através de manobras politiqueiras e da pressão dos gestores e profissionais (vide comentário do XICO). Percebemos, mas não podemos aceitar, pelo custo de oportunidade e falta de eficácia dessa situação.
Não seria aceitável que alguém pressionasse para ter «urgências» ou «permanências» apenas para «compor» o seu ordenado. A solução é oferecer boa retribuição sempre que haja bom desempenho, sobretudo em qualidade mas também em redução do desperdício, seja qual for o local ou serviço do hospital.

2 – Afirmou que «Aos médicos … nada podem fazer quanto ao uso inapropriado, ou ao abuso, de um serviço de urgências.». Pois bem segue-se a achega.

Sobre o dever dos médicos de evitar a inapropriação no SU relembro a Lei de Bases:

Base II: «… e) A gestão dos recursos disponíveis deve ser conduzida por forma a obter deles o maior proveito socialmente útil e a evitar o desperdício e a utilização indevida dos serviços;»
Base XIII: «… 2- Deve ser promovida a intensa articulação…. reservando a intervenção dos mais diferenciados para as situações deles carecidas…».
Base XIV: «2- Os doentes devem: … b) Observar as regras sobre a organização e o funcionamento dos serviços e estabelecimentos; …. d) Utilizar os serviços de acordo com as regras estabelecidas».

Também, por ex., o regime jurídico da gestão hospitalar para os hospitais (art. 10º):

«… c) Avaliação dos titulares dos órgãos de administração, dos directores dos departamentos e de serviços e dos restantes profissionais, de acordo com o mérito do seu desempenho, sendo este aferido pela eficiência demonstrada na gestão dos recursos humanos e pela qualidade dos cuidados prestados aos doentes.»

Como sabe na qualidade dos cuidados inclui-se, pacificamente, a apropriação. Assim quer pela qualidade quer pela eficiência de uso de recursos (vide custos acrescido para SNS e custo de oportunidade referidos pelo semmisericordia) os médicos e o director do SU estão sujeitos ao combate à inapropriação no SU (como nos restantes serviços).

Por outro lado é dever ético dos médicos evitar o desperdício que caracteriza o «consumismo» do «mercado de saúde» ainda que, como bem referiu, não fossem pela inapropriação «penalizados» (e são) por: «qualidade do atendimento»; «dificuldade coordenação»; «sobreposição cumulativa de cuidados inadiáveis»; «espectro da negligência».

Resta então enunciar, brevemente, COMO fazer.

1º C que deve acontecer, a breve trecho, é a concretização do que me dizem anda a ser estudado pela SEAS (desde Novembro) para o SU: profissionalização, organização adequada e controle do desempenho, remuneração específica.
2º Depois a tarefa principal incube a órgãos e responsáveis externos ao hospital (ARS, MS) que devem actuar para garantir o cumprimento do previsto na legislação e na política de saúde, o que inclui:
 Sistema de financiamento e contratualização do SU que devem penalizar o uso inapropriado do SU, quando o peso dessa inapropriação for superior ao esperado;
 Monitorizar o cumprimento da RRH e dos protocolos e acordos de referenciação com outros serviços de saúde;
 Fixar objectivos e avaliar a performance do SU e do CA do hospital, e dessa avaliação tirar todas as consequências.
3º O CA do hospital deve:
 Fixar objectivos ao Director do SU, prever como será a medição e quais os prémios para o bom desempenho dos profissionais;
 Promover, com o DSU e com o apoio da ARS, a coordenação de cuidados com ouros serviços de saúde e a cooperação entre médicos do SU e dos CSP para melhorar a resposta global: adequação do local da prestação; actualização de práticas e terapêuticas, promover a resposta que for mais custo efectiva – muitas vezes será promover o uso do call center e garantir consulta no reforço dos CSP no dia seguinte;
 Avaliar o DSU e os profissionais do SU e tirar todas as consequências, nomeadamente para premiar os que o mereçam.
4º Médicos e outros profissionais devem:
 Cooperar com a gestão (DSU, CA) e sugerir mudanças de recursos e processos que promovam a melhoria da qualidade e a redução do desperdício;
 Lembrar aos doentes as alternativas existentes de atendimento de proximidade e o que a Lei de bases prevê. Encaminhar o doente que não necessita de todo do SU, sem terapêutica, directamente para o local mais adequado (conforme acordo com CSP e outros hospitais).
…

6:27 da tarde  
Blogger e-pá! said...

Caro Hermes:

Realismo, encontra-se e confronta-se, quando se faz urgências de presença física, em algum tempo da nossa vida, no interior do SNS real e não no que está compaginado em Bases ou regulamentações.
Vai desculpar-me, mas titulares dos orgãos de administração nos "bancos", só quando estão doentes...quando há inaugurações, ou visitas ministeriais.
De resto, a "pressão" só é superável, se colocar ao lado do médico, do enfermeiro, do técnico, um GNR.
É triste, mas é a realidade.

E quando avançamos na argumentação vem a talhe de foice aquilo que negamos antes. Por exemplo:
"Não seria aceitável que alguém pressionasse para ter 'urgências' ou 'permanências' apenas para 'compor' o seu ordenado". Terá sido em Cantanhede, Anadia ou Espinho?
Não devemos tomar a nuvem por Juno.
Na verdade, quem tem contestado a reestruturação das urgências, tem sido o poder autárquico.
Que, como sabe, não compõe ordenados nestes "bancos".
Deve haver confusão com outros "bancos".... daqu€l€s a val€r!

12:32 da manhã  

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