quinta-feira, maio 29

Para pessoas diferentes


Os mesmos direitos.

“Deviam ser criadas condições financeiras para que as pessoas pudessem agarrar numa capitação, ou seja, no seu quinhão dos direitos que têm por serem cidadãos portugueses e terem direito a fazer despesas no SNS, e utilizar esses recursos para pagarem esses subsistemas (públicos, sociais ou privados), que constituem uma verdadeira alternativa ao SNS. Esta seria uma forma de financiamento para se dar o primeiro passo para a criação dessas alternativas.” link

A maioria dos portugueses concordará com a necessidade de descentralização do SNS e de lhe conferir uma maior autonomia relativamente ao decisor político. Também poucos se oporão à existência de subsistemas, desde que auto sustentáveis pois não faz sentido que se utilize o dinheiro de todos para pagar privilégios de alguns, ou de seguros complementares, para cobertura de assistências não contempladas no sistema público. Outra questão será o direito ao “opting out”, ou seja, à possibilidade das pessoas saírem do sistema sendo de alguma forma ressarcidas da sua parte de comparticipação através dos impostos para o SNS. Penso que é sobre esta última possibilidade que Miguel Gouveia fala na parte final da entrevista que acima se transcreve. Este é no fundo o grande objectivo das seguradoras e dos grupos económicos a elas associados, retirar do SNS a “parte rentável”, que são os cidadãos de maiores recursos e os mais saudáveis, deixando para o Estado os encargos com as populações de menores posses e mais idosas, logo mais doentes. É evidente que, por princípio, eles não rejeitam dar assistência a estes grupos mas alguém vai ter de pagar e, por razões óbvias, esse alguém só poderá ser o Estado. Foi assim que nos EUA as seguradoras destruíram as mútuas, baixando prémios atraindo os grupos com menor risco pondo assim em causa o princípio de solidariedade inerente aos sistemas de partilha social. Será assim que o que resta do SNS será destruído se for esta a opção do decisor político.
Questões ideológicas à parte, se um modelo destes vier a vingar imagine-se o drama humano que não arrastará num País em que 50% da população está isenta do pagamento de taxas moderadoras e muitas das que o fazem é com grande sacrifício. Em questões de Saúde não se trata pois de cumprir a ideia subjacente ao título da entrevista “Para pessoas diferentes soluções diferentes” mas sim “Para pessoas diferentes os mesmos direitos”, para condomínios fechados já chegam os da habitação.
Tá visto

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8 Comments:

Blogger tambemquero said...

O meu voto para a proposta do Avicena: Prémio "SICKO 2008" para o Professor Miguel Gouveia.

1:44 da tarde  
Blogger tambemquero said...

CC teve uns devaneios sobre o "opting out"
Vejamos o que ele disse em entrevista à GH:

GH - Concordaria com a criação de um seguro público obrigatório para a Saúde ?
CC - Não traz nenhuma vantagem em relação ao sistema actual. O que pode trazer vantagem é a pessoa optar por um seguro de saúde externo ao SNS, recebendo do SNS uma espécie de financiamento anual sob a forma de dedução nos impostos.
Vamos admitir que os portugueses recebem hoje 750 euros por cabeça, em média, em serviços e bens prestados pelo SNS. Se houver portugueses com um seguro de saúde tão bom que passem a utilizar apenas o seguro, isso pode ser bom porque liberta o Estado da responsabilidade de cobertura de toda essa população.
Isso só existe em relação a 250 mil pessoas que são beneficiários do SAMS, CTT e PT que têm um mecanismo de "opting out".
Esse é um mecanismo muito imperfeito porque a dedução para esses subsistemas é muito pequena, cerca de 150 euros, fixo há cinco anos. E não tem sido implementado com rigor, porque não temos uma forma de incluir apenas no SNS aqueles que querem ser beneficiários.

GH - Dar a possibilidade ao utente de dizer que tem um seguro e não quer contribuir para o SNS ?
CC - Sim. Quero receber uma parte do que o SNS gastaria comigo se eu lá estivesse. Essas pessoas quando vierem ao SNS passam a pagar a totalidade dos serviços. Isso só se consegue com um sistema de informação capaz. Com um cartão de cidadão, como está no nosso programa, que serve para segurança social, para o registo de dador de sangue, saúde, carta de condução, identificação, cartão de eleitor. Aí estamos em condições de incluir nele se aquela pessoa optou por um subsistema ou um regime privado.

GH - Isso leva a um sistema de saúde a duas velocidades.
CC - Não creio. Poderia haver esse risco se essas pessoas tivessem um atendimento preferencial quando recorrem aos serviços públicos. Se as tabelas com que são assistidas nos subsistemas são as mesmas com que são remunerados os hospitais, os centros de saúde e os médicos, não há esse problema.
António Correia de Campos, entrevista à GH, fevereiro 2005.

2:05 da tarde  
Blogger tambemquero said...

Jorge Simões – considera o "optin out" uma carta fora do baralho.

“Esta não é, no contexto actual, uma opção viável para o financiamento dos cuidados de saúde [porque] implicaria uma redefinição do conceito de SNS que não se considera estar em discussão”. link

2:10 da tarde  
Blogger e-pá! said...

Penso que uma inevitável (provável) regionalização trará mudanças positivas ao SNS.
Ressalvo provável porque se neste momento a regionalização não está na agenda política do governo ela provavelmente entrará porque considerou importante, nestes tempos de contenção orçamental e de opções fulcrais quanto ao relançamento económico (as novas oportunidades), a gestão do Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN).

A Regionalização, para além de uma melhoria das condições de equidade, nomeadamente no capítulo da acessibilidade, uma redução de desigualdades (nós somos hoje o País das desigualdades, e as facilidades da proximidade da gestão dos poder regional, quer ainda uma administração verdadeiramente descentralizada, isto é, diferente das actuais ARS, correias de transmissão do Poder Central.
No Governo de Guterres perdemos essa oportunidade, em grande parte influenciada por argumentos políticos demagógicos, poupanças hipotéticas e “calculismos” eleitorais.
Se a Regionalização tivesse sucedido, era legítimo esperar que hoje, quer os hospitais distritais ou regionais e as Unidades de Saúde Locais, seriam diferentes. Desempenhariam um papel de proximidade que seria um importante contributo para a eficiência do sistema. Aliás esta constatação não é hoje novidade. A regionalização é uma directriz organizativa de alguns dos principais sistemas de saúde do mundo: Canadá, Reino Unido, Itália, Suécia, entre outros.
A regionalização permite de modo mais minucioso analisar, avaliar, prever (planificar) e prestar contas de modo mais expedito e eficiente. Situações como a recente questão da lista de espera de operações das cataratas, poderiam ser evitadas. Porque esta facilidade de gestão permite melhorar a utilização da capacidade instalada, ter uma melhor noção dos recursos humanos disponíveis, oferecer mobilidade aos doentes, antecipar a resolução dos problemas.
Finalmente, o conhecimento mais circunstanciado das afinidades regionais (económicas, políticas, culturais e epidemiológicas), permitem implantar pólos de referência regionais com uma base racional e científica e facilitar os fluxos intermunicipais de doentes.
Em Portugal é tudo diferente. A estratégia é outra. Primeiro, o Sector Privado e o Social constroi ou adapta (conforme os casos) uma ampla rede hospitalar. Depois exige contractualizações e mais contractualizações. Vão buscar os recursos humanos qualificads ao SNS. E a estratégia do “cuco”. Põe os ovos no ninho dos “outros” e depois é só esperar que os “pássaros” estejam crescidos, adultos e amestrados. Finalmente, condicionam o desenvolvimento, a inovação e a modernização do SNS. Os resultados serão progressivas contractualizações e o estiolamento da rede pública de hospitais.
A regionalização ao criar um alargado grupo de interlocutores aos vícios centralizadores será um instrumento útil para por travão a este envolvimento nacional, comandado pelo poder financeiro, de que está a ser vítima quotidianamente o SNS.
A Regionalização facilita, pela proximidade e pelo conhecimento pormenorizado das Unidades funcionais, uma melhor integração clínica. Consegue por outro lado controlar a duplicação de actos e detectar outros desnecessários. Haverá, com certeza ganhos em logística, na rede de informatização e nos custos de manutenção.
Nos CPS será necessário implementar uma concepção integral e integrada de Sáude.
Tudo isto, aliviaria o financiamento público do sistema (SNS). Era um passo na sustentabilidade.

Bem, o excelente texto de "Tá visto", empurrou-me, mais uma vez, para a questão política.
E, residualmente, deixou-me na cabeça, uma nova pergunta, aparentemente, desconexa:
- capitação ou regionalização.

3:03 da tarde  
Blogger Clara said...

A alternativa "opting out" ao actual modelo de financiamento do SNS não é efectivamente de considerar.

A solução do "opting out" significa que os cidadãos com mais poder económico saiam do sistema para fazerem seguros privados de saúde ficando no serviço público os mais pobres e debilitados. Da solução "opting out" resultaria a criação de um SNS sem dinheiro, com os mais doentes a seu cargo, pois os saudáveis saíriam para companhias de seguros privadas.

O objectivo é claro:
Criação de Instituições de saúde para os pobres e Hospitais de excelência para os ricos cobertos por apólices que só as fartas bolsas podem pagar.
O sistema de seguros é discriminatório pois as apólices são tanto mais caras quanto mais velho e doente está o utente.

Quanto às políticas deste Governo, "opting out", por agora, só a ADSE.

3:13 da tarde  
Blogger Joaopedro said...

Faço outra proposta. Fazer desfilar no SaudeSA textos de autores que desejam o pior para o SNS. Tipo festival do terror do SNS.

Aqui vai o meu contributo:

Norte Médico (NM):
Ou seja, não ficaríamos limitados ao SNS

Bagão Félix (BF): A minha ideia, pelo menos aquela que eu ambiciono há muito tempo, é uma nova arquitectura do sistema nacional de saúde, e repito do sistema e não do serviço. Esta nova arquitectura funcionaria em três anéis, tal como tenho vindo a defender: uma rede pública universal para a chamada saúde pública, ou seja a assistência materno-infantil, rastreios, vacinações, situações de epidemia, etc. Depois uma rede pública para os cuidados de saúde primários diferenciados para todos os cidadão que livremente optem por não escolher um sistema fora do Estado. Finalmente uma rede contratual para todos os que assumirem o opting out, seja ele consubstanciado em seguros de saúde, subsistemas não estaduais, mutualidades, etc. Como é que esse opting out seria concretizado?... Bem, como opting out, seria um acto de liberdade, aderia quem quisesse e seria estimulado pela via fiscal através de uma dedução parcial à colecta do IRS do custo anual per capita do SNS. No fundo, hoje pagamos a saúde várias vezes, e assim a pessoa que optasse por sair teria um desconto no IRS; em contra partida, e isto é muito importante, essas pessoas poderiam continuar a ir aos estabelecimentos de saúde do Estado, só que pagariam o custo real debitado pelo próprio SNS.
Finalmente estes subsistemas do terceiro anel, ou esta rede contratual, devia ser certificada pelo Estado para efeitos da tal dedução à colecta do IRS. Quer dizer que não era qualquer entidade, já que estas tinham que ser previamente certificadas pelas autoridades públicas. Mais uma vez, aqui está o que considero uma boa função do Estado: controlar prudencialmente, garantindo transparência e solvência das entidades que fornecem cuidados de saúde.

E qual seria a mais valia deste terceiro anel, a oferta da qualidade dos serviços?
Sim. Essa questão é interessante, porque eu acho que um dos erros que se têm praticado na saúde nas últimas décadas é o estímulo da oferta sem incentivar a procura, ou ao contrário incentiva-se a procura, mas não estimula-se a oferta. Portanto, este sistema permitia, no meu entender, seguir a par e passo o aumento da oferta e o incentivo da procura. Ou seja, o opting out como era gradual, há medida que as pessoas fossem livremente escolhendo sair do sistema do SNS, a própria oferta de estabelecimentos e cuidados de saúde também reagiria a esse estimulo e portanto haveria aqui um faseamento, uma gradualização, que além de não pôr em causa os interesses dos profissionais da saúde permitiria esta conjugação entre a oferta e a procura.

Este sistema resolveria também o problema da não valorização da eficiência?
Na minha opinião, qualquer que seja o sistema, o primado da produtividade, quer dos recursos humanos quer materiais ou financeiros, é fundamental na área da Saúde. Isto significa que tem de haver incentivos e contra-incentivos, porque não podemos falar de incentivos sem falar de sanções, senão premiamos a normalidade e não o que está acima dela. Neste contexto, algumas medidas que eu considero importantes passam por uma maior e plena utilização da capacidade disponível das infra-estruturas, designadamente hospitalares, que não são utilizadas totalmente. Depois, penso que deveria haver uma maior responsabilização do sistema público alterando as regras remuneratórias dos agentes prestadores. Eu defendo que
uma componente salarial deveria ser variável em função do número de doentes captados e fidelizados, de modo a premiar a eficiência. Outro aspecto que favorece a produtividade é a modernização da gestão de recursos e estabelecimentos de saúde, aproveitando o desenvolvimento de sistemas de informação e telecomunicações. Hoje parece-me fundamental aproveitar a possibilidade do trabalho em rede, que permite, por exemplo, que um exame complementar de diagnóstico feito em Bragança possa ser conhecido em Lisboa. Desta forma não se repetiriam exames de uma maneira ineficaz e improdutiva, e evitar-se-ia uma série de gastos. Por fim, penso que é importante eliminar duplicações e emissões de cobertura sanitária que têm conduzido a enormes desperdícios de recursos. Há zonas do país mal cobertas e outras sobre cobertas.

Bagão Félix, “Um sistema de saúde livre de amarras ideológicas”, entrevista ao norte médico,

3:42 da tarde  
Blogger Tá visto said...

O Dr. Bagão Felix nunca terá lido nada sobre sistemas de saúde; o homem diz ter tido uma ideia sobre o que deveria ser a coisa. Ter-lhe-à ocorrido no velho Estádio da Luz quando, durante os festejos de um golo, observava a entusiasmada claque no terceiro-anel. Julgando que os aplausos lhe eram dirigidos, terá pensado, é isso! É esta a peça que faltava no meu sistema de saúde. E, voilá, aí temos a brilhante entrevista com que brindou o Norte Médico.
Pena tenho que quem escreveu o Conde de Abranhos já não se possa inspirar nos homúnculos da política nacional. Aí sim teríamos obra.
Ao contrário de Bagão Félix, Correia de Campos sabe do que fala e, por isso mesmo, não tem desculpas por ter querido hipotecar a saúde dos portugueses aos interesses dos grandes grupos económicos.

6:50 da tarde  
Blogger e-pá! said...

Bagão Félix, viverá obcecado ou atormentado por patamares, tectos salariais e, no caso da Saúde deve ter sonhado ou tido um pesadelo com o “opting out”.
Creio, pelo azedume, que terá deixado de cultivar flores…

O que me preocupa não é a sua vida privada nem os seus eloquentes pensamentos.
É, ter consciência, a curta distância (foi demitido em 2004) , que este homem , neste País, exerceu altos cargos públicos como ministro da Segurança Social e, mais tarde, das Finanças.

Na verdade, Portugal, com uma ampla costa atlântica e muitos políticos deste calibre, há sérios candidatos para fazer pirataria do tipo“to shoot in the sea or for the edge”.

Este é um espécimen capaz de engendrar argumentação para privatizar os privados (sanitários), enquanto devoto reza e coloca do cilício na coxa…e oferece um óbulo a um desempregado ou um bando de “lumpens”, uns “carjackers” vindos de uma sessão de gamanço e com rendimentos declarados inferiores ao ordenado mínimo.

O que certos políticos não suportam é estarmos todos no mesmo barco.
Os homens não nasceram iguais, nem todos são livres, isso é uma balela da revolução francesa, a verdade é que uns terão nascido com direito de escolha, outros não.
Uns opting, “outros” out.
É, assim, como no casamento e no divórcio….

11:00 da tarde  

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