segunda-feira, dezembro 8

HH Amadora Sintra, fim duma PPP



A publicação do estudo da Nova, relança a discussão ideológica em torno da gestão privada de Hospitais do SNS contratada pelo Ministério da Saúde, aliás a decisão de fazer cessar o contrato foi claramente política e não técnica como devia ser, afinal os estudos só servem para suportar decisões que são políticas e não para servirem de escudo às decisões, venham-se elas a revelar boas ou más. Em Março quando o primeiro-ministro José Sócrates, anunciou que o Hospital Amadora-Sintra seria uma EPE, disse na Assembleia da República, que o Governo tinha uma orientação "clara" sobre as parcerias público-privadas nos hospitais. "As parcerias público-privadas são úteis para a construção; a gestão hospitalar, essa, deve permanecer pública", mudando o rumo do MS no futuro no que se refere às novas parcerias, Todos os Santos e Algarve, mantendo os compromissos em trânsito Cascais, Braga…, e os que estão em actividade Saúde 24 e CMR Sul.

Agora que se começa a "fazer história" sobre o Hospital Fernando da Fonseca, vale a pena relembrar que aquele foi lançado em 1991 pelo Governo de Cavaco Silva, tendo com Ministro da Saúde, Arlindo de Carvalho e não Leonor Beleza, através de um concurso internacional de “concepção, projecto e construção”, incluindo o fornecimento de todo o equipamento médico-cirúrgico, adjudicado à construtora portuguesa Teixeira Duarte. Em 1994 e ao abrigo das alterações ao quadro legal, nova Lei de Bases de Saúde de 90, decreto-lei DL nº 11/93, portaria 704/94, que permitiam ao Governo passar a contratar serviços com privados, o Ministro Paulo Mendo e não Leonor Beleza, abriu em Setembro de 1994 o concurso público para a gestão do HFF, adjudicado ao Consórcio Mellos/ANF/HLC/GSI, em tempo recorde, Julho de 1995, assinado em Outubro de 1995. O contrato então assinado, tinha várias limitações conhecidas e algumas que se iriam conhecer com o tempo, sustentava-se em projecções demográficas ultrapassadas, dificuldades no acompanhamento por parte da ARSLVT do Contrato, conflitos sobre a produção produzida e a realizada.

Ao longo anos, o Consórcio foi confrontado com sérias dificuldades para recrutar profissionais de saúde, que o obrigou a provocar aumentos de cerca de 20% sobre as remunerações praticadas na FP, para além de incentivos à produção, conflitos laborais na área da enfermagem, com abandono sucessivo do Hospital de enfermeiras seniores qualificadas e a sua substituição por enfermeiras espanholas ou brasileiras em início de carreira. São conhecidos e públicos os diferendos sobre as contas de 99, 2000, 2001, 2002 e 2003, e as opiniões e decisões divergentes do Tribunal de Contas e Comissão Arbitral. Em 2003 de novo com um Governo do PSD, foi renegociado novo contrato assinado em Março de 2004. Em 2004 o Hospital passa por dificuldades, a maternidade fecha vários dias, os conflitos laborais têm o seu auge com várias greves, em Março de 2005 os Mellos aceitam um acordo de empresa que os obriga a fazer aumentar os custos com pessoal.
Em 2005, 2006 e 2007, o HFF enceta um programa de mudanças internas na gestão e melhora as suas receitas, em resultado das mudanças no contrato e na gestão interna: aumenta o nº de camas, encerra a actividade privada no hospital, reafectando-as ao internamento, cria uma “pool” de camas comuns a todos os serviços e um Gestor de Camas, desempenhado por um profissional de enfermagem, reforça as equipas de urgência. Entre o que de muito está publicado, encontram-se boas práticas, projecto de mudança interna encetado entre 2005 a 2007, a par dos problemas do costume " excesso de ECDT para quadros clínicos que não o justificam, o atraso na concessão de altas, excessiva duração dos períodos de internamento pré-cirúrgico, listas de espera para consultas externas, incumprimento de horários pelos médicos" e de situações já ultrapassadas em Hospitais públicos como a prescrição electrónica.

Quanto ao estudo como o não conheço não me atrevo a “diabolizá-lo”, concordando que se fosse negativo para os Mellos não teria sido publicado. Quando estiver acessível poderemos julgá-lo melhor à luz de outros estudos como o PAUS desenvolvido para o INA por Jorge Simões, Suzete Gonçalves, Pedro Lopes Ferreira, Anabela Ferreira da Costa, Manuel Schiappa Mendes, que estuda e compara ULS Matosinhos, Fernando da Fonseca e Feira (2001-2002, ou do INA de 1999. Finalmente não vale a pena escamotear as divergências antigas entre CC e AJ, quando o último contrariou por despacho as conclusões de um estudo mandado realizar pela ARSLVT que comparava o HFF com HGO, sendo o estudo favorável ao HGO.

avicena

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7 Comments:

Blogger inimigo público said...

Fantástico...

A propósito do “despacho” dos doentes oncológicos dos privados para o SNS publica hoje o DN:

...”Os hospitais públicos não podem deixar de aceitar os doentes. "Não vamos recusar. É difícil encaixá-los quando temos grande movimento", diz Luís Costa. Paulo Cortes, médico na mesma unidade e do privado, refere que, "sempre que possível, fazemos a ponte com o público, mas às vezes há atrasos". José Miguel Boquinhas, administrador dos HPP, reconhece o problema da falta de cobertura. "Espero que a ideia de integrar os privados na rede vá para a frente."|

O administrador dos HPP viaja à velocidade da luz de uma leitura conservadora e marxista do SNS para o liberalismo mais atrevido e anseia pela rápida integração dos privados na rede de referenciação de Oncologia. Os riscos de desnatação, do sector público da desintegração de cuidados, da mercantilização (com traços de comparação à hemodiálise) de uma área tão sensível como o tratamento do doente oncológico nada valem perante o choque do vil metal. Não há dúvida de que o “sistema” funciona. Ao pé disto o “sistema” do futebol é uma brincadeira de crianças...

9:54 da manhã  
Blogger Tá visto said...

Os estudos sobre hospitais valem o que valem, há-os para todos os gostos. E, quando realizados sob encomenda são, a mais das vezes, como fatos feitos à medida, assentam que nem uma luva a quem paga ao alfaiate. Repare-se no estudo encomendado pelo grupo Mello á Universidade Nova de Lisboa, alguém de boa fé acredita (por princípio) nos resultados sabendo-se que o financiador é parte interessada nos mesmos? O Conselho Científico e a Comissão de Ética (se é que existe) da Nova não o deveriam ter rejeitado em nome da transparência e credibilidade científica da Instituição?
Em nome da ética, o mínimo que se exige dos investigadores é que, aquando da publicação, conste no artigo que o mesmo foi financiado pelo Grupo José de Mello Saúde. É assim que mandam as boas práticas editoriais de revistas científicas (médicas, as que melhor conheço) com credibilidade mundial, aos investigadores é sempre exigida uma declaração de interesses e da mesma é dado conhecimento aos leitores. É completamente diferente o peso científico de um artigo realizado por investigadores independentes de um financiado por organizações externas directamente interessadas na natureza dos resultados. E, quem lê, tem todo o direito a ter juízo crítico sob práticas que, está mais que demonstrado, podem, por acção ou omissão, influenciar o desenvolvimento e as conclusões.
É pena que estas coisas ainda se passem assim por cá. Que uma Universidade aceite participar em estudos encomendados, que os nossos principais órgãos de informação escrita (Público e Expresso, por exemplo) se prestem a dar publicidade ao seu resultado sem uma nota crítica a um princípio básico de toda a metodologia científica, o de a por a salvo de conflitos de interesses entre quem investiga e quem financia.
Só a baixa credibilidade da nossa investigação pode explicar que um ministro, no caso Correia de Campos, tenha tido a desfaçatez de ordenar a um colaborador, no caso Ana Jorge, que colocasse em gaveta esconsa um estudo cujos resultados vinham contrariar os seus desígnios para a política hospitalar.

7:06 da tarde  
Blogger Joaopedro said...

A JMS decidiu fazer uma despedida da gestão do Amadora Sintra ao seu melhor estilo. Para terminar em beleza, encomendou um estudo à Universidade Nova de Lisboa onde se conclui que, afinal, a gestão da JMS se saldou em poupança de muitos milhões para o Estado.
A notícia ribombou como por encanto em toda a comunicação social, mais espampanantemente no Jornal Público.

Não li o referido estudo. Espero que a JMS tenha o bom senso de o divulgar para que os portugueses possam confirmar tal feito de um operador privado a quem foi posteriormente entregue a construção e gestão do novo hospital universitário de Braga.

Sobre esta adjudicação da nossa administração pública é oportuno lembrar o seguinte.
O consórcio Escala Braga, formado pela José de Mello Saúde (JMS), Somague e Edifer, apresentou ao concurso do Hospital Universitário de Braga PPP uma proposta inicial de 1.019 milhões de euros, 14.1% abaixo do Custo Público Comparável (CPC, 1.186 milhões de euros).
Na 2.ª fase do concurso (negociação) o consórcio Escala Braga baixou aquele valor para 794 milhões de euros (menos 225 milhões, ou seja, 22% abaixo do CPC), conseguindo, assim, bater o melhor preço apresentado por outro concorrente, o consórcio liderado pela Espírito Santo Saúde (843 milhões de euros).

A enorme diminuição de preço efectuada da 1.ª para a 2.ª fase levantou muitas dúvidas entre os concorrentes do concurso que questionaram os possíveis efeitos desta descida de preço na qualidade das propostas. O avaliador do Estado não pensou assim e deu o seu parecer favorável para que a adjudicação se consumasse.

É perante este cenário que se parte para a construção e gestão do novo Hospital Universitário de Braga PPP.
Que esperança devem ter os portugueses sobre o futuro deste negócio?
Trata-se efectivamente de mais uma missão impossível para as entidades responsáveis pela supervisão e fiscalização do contrato do novo Hospital de Braga PPP.
O consórcio adjudicatário conhece as debilidades do Estado nesta matéria. Fazer a recuperação do desconto de 225 milhões (muito abaixo do Custo Público Comparável), que lhe permitiu ganhar este concurso, em dez anos, tempo de vigência de contrato, vai ser canja.
Como estes negócios não se fizeram para peder dinheiro é fácil prever o que vai acontecer ao resto. À prestação de cuidados.
É caso para perguntar mais uma vez: Mas afinal em que país vivemos nós?

8:04 da tarde  
Blogger tonitosa said...

E enquanto se vão continuando a fazer análises e mais análises a uma certa concorrência entre os Hospitais Privados e os Públicos, na semana passada, o Jornal do Nordeste perguntava onde parava o Helicóptero prometido para Macedo de Cavaleiros, sendo que o heliporto está pronto e executado pelo Município, desde 2005! Quem ainda se lembra de tão famosa contrapartida oferecida por CC ao encerramento dos SU's?

E como se isso não bastasse, a última página do mesmo Jornal noticiava, com foto da utente, que uma doente esteve várias horas (durante a madrugada de uma fria noite de Inverno) numa maca com o colchão molhado (trazida do exterior e tinha chovido), no Serviço de Urgência do Hospital de Mirandela. E nem a sua lamentação terá sensibilizado quem por ela passava!

Assim vai - também - o nosso SNS.

8:59 da tarde  
Blogger saudepe said...

Estou a ler pacientemente o relatório da UNova encomendado pela JMS.
Parece-me à primeira vista um trabalho demasiado descritivo, veremos adiante se consegue ir ao fundo do problema,ou seja, a avaliação do periodo de gestão da JMS.

Para já uma ref.ª ao estudo que Correia de Campos não deixou publicar.(pag.)

«Projecto de avaliação de unidades de saúde (PAUS), INA 2002 (não publicado).»

«Em 2002, o INA procedeu, de novo, desta vez por solicitação do Ministério da Saúde, a uma avaliação comparada, envolvendo três unidades de saúde integradas no SNS – o HFF, o Hospital de S. Sebastião (Feira), e Unidade Local de Saúde de Matosinhos – tendo sido realizadas uma avaliação de cada uma das unidades e uma análise comparada. O relatório foi entregue ao Ministro da Saúde (Professor Correia de Campos), em Abril de 2002, mas nunca foi publicado.»

Avaliação da experiência de gestão privada do Hospital Fernando da Fonseca (1995-2008), faculdade de economia UN

11:13 da tarde  
Blogger Unknown said...

Para que goste aprofundar esta matéria sobre Garcia da Orta versus Amadora Sintra recomendo a leitura de Pedro Pita Barros em https://www.tcontas.pt/pt/actos/rel_auditoria/2003/rel047-2003-estudo_externo-final.pdf, excertos " O Conselho de Administração da ARSLVT aprovou em Novembro de 2001 uma
deliberação sobre o "Contrato de gestão celebrado entre a Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo e o Hospital Amadora/Sintra - Sociedade Gestora, S.A." O documento procede a uma avaliação comparada do Hospital de Amadora-Sintra face ao Hospital Garcia da Orta de Almada...com uma descrição comparada desde 1996, claramente desfavorável ao modelo de gestão privada do Hospital Fernando da Fonseca e conclui com considerações que pretendem
atingir a mesma conclusão quanto ao esforço financeiro realizado pelo Estado e aos resultados alcançados nos dois hospitais...A este documento, respondeu o então Ministro da Saúde António Correia de Campos, por despacho, que a realidade não confirma esta tese. Segundo o então Ministro, na comparação do esforço financeiro estão a analisar-se coisas
diferentes. Utilizando dados do IGIF, se ao subsídio de exploração do Hospital Garcia da Orta acrescentarmos os subsídios de investimento e os défices
económicos do exercício, onde à receita total (cobrada e por cobrar) é subtraída a despesa total, encontramos um gasto inexorável para o Estado, muito diferente do indicado pelo Conselho de Administração da ARSLVT..., e continua... Em 1998 foi conduzida uma avaliação comparada do Hospital de Amadora-Sintra face ao Hospital Garcia da Orta de Almada, realizada pelo Instituto Nacional de Administração (INA) para a Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo (ARSLVT). As conclusões desse estudo apontam para uma melhor performance do Hospital Amadora-Sintra em algumas áreas." Já agora enquanto aguardamos o relatório que o saudepe já teve acesso, vale a pena dizer que em minha opinião, não faz sentido atacar tudo e todos, acusá-los de falta de ética e de não ter publicitado conflitos de interesse, a necessidade de responder no imediato e tomar posição não nos deve toldar a consciência e irmos por aí a fazer processos de intensão.

12:09 da manhã  
Blogger tambemquero said...

O site do Hospital Fernando da Fonseca precisa de ser actualizado.
Efectivamente no referido página da internet ainda se pode ler:

«O Hospital Fernando Fonseca (Amadora Sintra) é um dos primeiros hospitais públicos na Europa com gestão privada.» link

12:57 da manhã  

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