sábado, junho 19

Carta dos Direitos de Acesso

Assunto: Relatório sobre a aplicação e o cumprimento da Carta dos Direitos de Acesso aos cuidados de saúde pelos utentes do SNS

Exmo. Senhor Presidente da Assembleia da República
A Lei n.º 41/2007, de 24 de Agosto, que aprovou a Carta dos Direitos de Acesso aos Cuidados de Saúde pelos utentes do Serviço Nacional de Saúde (SNS), estabeleceu também a obrigatoriedade do Ministério da Saúde apresentar à Assembleia da República, até 31 de Maio de cada ano, “um relatório sobre a situação do acesso dos Portugueses aos cuidados de saúde nos estabelecimentos do SNS”, incluindo os tempos de espera para consulta e cirurgia nas diferentes especialidades e nos vários estabelecimentos do SNS.

Já ultrapassado o prazo previsto legalmente, o Ministério da Saúde ainda não cumpriu as suas obrigações perante a Assembleia da República, apesar de já ter sido questionado diversas vezes pelo Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda sobre a disponibilização do referido relatório. Depois de entregue na Assembleia da República e de acordo com a Lei n.º 41/2007, o relatório do Ministério da Saúde deverá ser objecto de análise e consequente elaboração de relatório por parte da Comissão Parlamentar de Saúde, o qual será obrigatoriamente objecto de publicação e divulgação.

Por outro lado, e apesar de em resposta a pergunta anterior do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, o Ministério da Saúde ter referido que os estabelecimentos do SNS são obrigados a publicar e divulgar até 31 de Março de cada ano, um relatório circunstanciado sobre o acesso aos cuidados que prestam, tal não está a verificar-se no terreno. Um utente do ACES X Cacém-Queluz, em 6 de Maio de 2010, solicitou (ao abrigo da Lei de acesso a documentos administrativos) que lhe fosse fornecido o relatório do ACES sobre o cumprimento da Carta dos Direitos de Acesso aos Cuidados de Saúde. Como resposta, teve um telefonema do Director da unidade de saúde a que pertence (e não do Agrupamento) a informar que não tinha havido qualquer indicação do Ministério para ser produzido o relatório, mas que, no entanto, iriam averiguar e depois o contactariam. Até hoje, passado mais de um mês e meio, ainda não houve qualquer contacto.

No entanto, o Observatório Português dos Sistemas de Saúde (OPSS), no seu Relatório de Primavera 2010 intitulado Desafios em Tempos de Crise, divulgado hoje, vem substituir-se ao Ministério da Saúde, na avaliação do acesso aos cuidados de saúde em ambulatório, anunciando resultados desastrosos. O número de utentes em espera por uma consulta hospitalar aumentou quase 30% em dois anos. Dermatologia, cirurgia geral, oftalmologia, ortopedia e otorrinolaringologia são as especialidades onde a situação é mais grave, totalizando 285 mil utentes em espera no final de 2008. Em 2009, conforme noticiado hoje na comunicação social, dos mais de 700 mil pedidos de primeira consulta de especialidade, cerca de um terço transitou para 2010, com o consequente arrastamento dos tempos de espera. Por exemplo, no caso da Oftalmologia, o tempo de espera por uma consulta prioritária é, em média 123, 5 dias, quatro vezes mais do que o previsto na lei.

O relatório do OPSS é apenas a ponta do iceberg. É necessários conhecermos detalhadamente os tempos de espera para consultas, mas também para cirurgias, por tipo de prioridade, especialidade e estabelecimento de saúde. Só desta forma será possível identificar desigualdades no acesso aos cuidados de saúde e implementar as medidas necessárias para corrigir as situações em que os tempos máximos de resposta garantidos sejam violados.

A Carta dos Direitos de Acesso aos cuidados de saúde pelos utentes do Serviço Nacional de Saúde, se aplicada, constitui um instrumento fundamental para melhorar o funcionamento dos estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde (SNS), nomeadamente no que respeita ao cumprimento de tempos aceitáveis de atendimento, que respondam às necessidades dos utentes e à sua situação clínica. É por isso urgente, conhecer a realidade por especialidade e estabelecimento de saúde.
Atendendo ao exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda vem por este meio dirigir ao Governo, através do Ministério da Saúde, as seguintes perguntas, relativamente ao estabelecimento de saúde acima referido:

1. Por que motivo o Ministério da Saúde não solicitou aos estabelecimentos do SNS a produção do relatório sobre o acesso aos cuidados de saúde referente a 2009?

2. Por que motivo o Ministério da Saúde ainda não entregou à Assembleia da República o relatório sobre o acesso dos Portugueses aos cuidados de saúde nos estabelecimentos do SNS, conforme obrigado a fazê-lo legalmente até 31 de Maio? Quando prevê o Ministério da Saúde cumprir essa obrigação?

Palácio de São Bento, 18 de Junho de 2010.
O deputado, João semedo

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