quarta-feira, janeiro 19

OM, eleição do bastonário

Depois de uma 1.ª volta renhida: Manuel Silva: 38,78%; Isabel Caixeiro: 37,77%, realizou-se hoje a 2.ª volta da eleição para a Direcção do Ordem dos Médicos (OM)(iniciada a contagem dos votos às 22:00 horas).
As entrevistas dos candidatos: Isabel Caixeiro mais serena e contida, e José Manuel Silva mais irrequieto e dado aos sound bites

Isabel Caixeiro: “É preciso criar condições para os médicos reformados voltarem”

Qual deverá ser o papel dos médicos na concretização das medidas de contenção introduzidas pelo Governo? Por exemplo, na avaliação da capacidade dos doentes pagarem os remédios?

Os médicos estão cada vez mais sensibilizados porque são confrontados com as dificuldades económicas e sociais das famílias no consultório. Ainda há algum caminho a percorrer, mas só se os médicos tiverem a salvaguarda que a prescrição não é alterada nas farmácias.

Com o novo diploma da prescrição por princípio activo os médicos vão ter de justificar sempre que “trancarem” uma receita. Isto retira poder aos médicos?

O médico não quer a inviabilidade da sua prescrição porque sim. Se o médico não souber o que foi substituído na farmácia perde o controlo daquilo que o doente está a tomar e não consegue identificar a causa de algum desequilibro que possa ocorrer.

Como é que vê a obrigatoriedade da prescrição electrónica a partir de Março?

Dificilmente será realizável e lança muitas questões sobre a acessibilidade dos doentes ao seu médico. Nada está previsto em termos de domicílios e a banda larga em muitos centros de saúde funciona mal. É grave esta obrigação a partir de Março sem medidas transitórias.

Há falta de médicos em Portugal? Como é que se pode colmatar esta falha no curto prazo?

Não foi feito nenhum estudo fidedigno que pusesse os dados na mesa. Pretendo criar um mecanismo que actualize anualmente a situação dos médicos. A alteração à lei das reformas veio complicar a situação, levando muitos médicos a pedir a reforma antecipada. Foi um erro estratégico grave. A abertura de mais vagas em Medicina não é a solução. A curto prazo é preciso criar condições que motive os médicos reformados a voltarem ao SNS pormais uns anos.

Como é que vê a contratação de médicos estrangeiros?

Devia ser a solução última quando estivessem ultrapassadas todas as outras hipóteses.

Concorda com a fixação de médicos internos ao SNS por um período igual ao da formação?

A solução já foi testada na Madeira e nos Açores e não resultou. Se aos médicos mais jovens forem dadas condições de trabalho e de carreira, eles não abandonam o SNS.

Qual deve ser a relação dos médicos do SNS com os privados?

Deve haver uma relação de complementaridade porque os serviços de saúde públicos estão a ter cada vez mais dificuldade em dar resposta a todas as necessidades de formação dos jovens
internos.

A Ordem dos Médicos tem sido negligenciada pelo Governo no sentido de ser pouco chamada a participar das soluções?

Mais do que seria desejável. A Ordem tem o conhecimento técnico de muitas áreas onde é preciso tomar decisões. Pretendo criar uma comissão para o Parlamento que acompanhe as leis em preparação e até fazer propostas concretas.

Se for eleita vai rever os estatutos da Ordem? O que é urgente mudar?

Sim. A Ordem precisa de um funcionamento mais ágil. Proponho uma revisão em que tenhamos a possibilidade de ouvir todos os médicos e onde esses se sintam representados.

Qual será a sua primeira medida se for eleita?

A primeira acção é marcar uma reunião com os 33 colegas eleitos nas três secções regionais [Norte, Centro e Sul] para definir prioridades. Um dos pontos em discussão será o papel da Ordem perante as medidas que estão a ser tomadas devido à crise.

José Manuel Silva: “O SNS deve ser repensado para se separar o sector público do privado”

Qual deverá ser o papel dos médicos na concretização das medidas de contenção introduzidas pelo Governo? Por exemplo, na avaliação da capacidade dos doentes pagarem os remédios?

A pergunta é capciosa porque pressupõe que a generalidade dos médicos não tem estes cuidados, ideia que contesto frontalmente. A governação clínica, a realização de auditorias clínicas e a emissão de ‘guidelines’ por parte da Ordem são medidas que podem criar mais valor na prestação de cuidados de saúde.

Com o novo diploma da prescrição por princípio activo os médicos vão ter justificar sempre que “trancarem” uma receita. Isto retira poder aos médicos?

A inviolabilidade da prescrição não é uma questão de “poder”, é uma questão de defesa do doente e da qualidade da prática médica. A substituição de marcas do mesmo princípio activo nas farmácias é um acto tecnicamente errado e prejudicial ao doente, devido aos factores de variabilidade. É uma questão importantíssima a ser dirimida pelo próximo bastonário.

Como é que vê a obrigatoriedade da prescrição electrónica a partir de Março?

A generalização da prescrição electrónica é desejável, mas impossível de implementar com tanta rapidez. Falta analisar soluções para um número de situações particulares e nem sequer o Estado está devidamente preparado. É inaceitável que sejam os médicos a pagar o sistema.

Há falta de médicos em Portugal? Como é que se pode colmatar esta falha no curto prazo?

Apesar do ráciomédico/habitante estar na média europeia, há falta em algumas especialidades. Proponho uma reunião entre a Ordem, o Ministério da Saúde e os sindicatos para analisar e consensualizar soluções. Se se melhorar a organização do sistema, o problema serámitigado.

Como é que vê a contratação de médicos estrangeiros?

Desde que se cumpra a lei e não se coloquem médicos, estrangeiros ou não, a exercer funções para as quais não têm a devida competência, não haverá problemas.

Concorda com a fixação de médicos internos ao SNS por um período igual ao da formação?

Não. Os internos pagam a sua formação com o seu insubstituível trabalho. Muitos hospitais fechariam sem o trabalho dos internos.

Qual deve ser a relação dos médicos do SNS com os privados?

O SNS deve ser repensado para, no futuro, com diferentes regras, separar o sector público e o privado, o que é totalmente impossível com o enquadramento jurídico e organizativo actual e os recursos humanos existentes.

A Ordem dos Médicos tem sido negligenciada pelo Governo no sentido de ser pouco chamada a participar das soluções?

A Ordem deve ser pró-activa na apresentação de propostas e soluções, deve marcar a agenda política da saúde, semestar à espera de ir a reboque do Governo.

Se for eleito vai rever os estatutos da Ordem? O que é que é urgente mudar?

Os actuais estatutos bloqueiam a Ordem, concentram no bastonário a presidência de todos os
órgãos internos, confundem o poder executivo, fiscal e disciplinar, impedem o exercício das funções de auto-regulação e afastam osmédicos da Ordem. É preciso corrigir estas e outras disfuncionalidades.

Qual será a sua primeira medida se for eleito?

Operacionalizar a concretização de todas as propostas, nomear a Comissão de Revisão dos Estatutos, criar um gabinete de estudos e promover uma auditoria de contas e procedimentos,
e dar sinais de descentralização e aproximação da Ordem aos médicos.

entrevistas de Catarina Duarte, DE 19.01.10

joão pedro

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