segunda-feira, setembro 5

No retiro de Jackson Hole

Os banqueiros centrais...

«Lagarde pediu cuidado na consolidação orçamental. O economista Stephen Ceccheti alertou para os riscos do endividamento. São apenas dois lados da moeda.link
Ceccheti estima que o limiar da dívida pública esteja entre 80% e 100% do PIB. Acima desse valor começa a travar o crescimento.

O retiro dos banqueiros centrais em Jackson Hole voltou este ano a marcar a agenda mediática. Organizado pela Reserva Federal de Kansas City, um dos doze braços do banco central norte-americano, o encontro deste ano teve como tema “Achieving maximum long term growth” (“Alcançando o máximo crescimento de longo prazo” em tradução livre). Mas ao contrário do que aconteceu no ano passado, quando a estrela foi o presidente da Reserva Federal, Ben Bernanke, ao anunciar a segunda vaga de alívio quantitativo ( quantitative easing na terminologia anglo-saxónica, que significa compra de títulos para baixar as taxas de juro de médio e longo prazo), este ano ‘brilhou’ Christine Lagarde. A recém-empossada diretora do Fundo Monetário Internacional (FMI) veio avisar os governos para terem cuidado com o “travão orçamental” — leia-se medidas de austeridade — para não comprometer o crescimento económico. Numa altura em que a Europa e os EUA estão em claro abrandamento, a ex-ministra das Finanças francesa pede cautelas. Consolidação orçamental sim, mas com cuidado.

No sábado, Lagarde falou no encerramento juntamente com o economista Barry Eichengreen, de Berkeley, e Jean-Claude Trichet, presidente do Banco Central Europeu. As suas palavras correram mundo, até porque meteu ainda o dedo na ferida, apelando à recapitalização dos bancos europeus para travar os canais de contágio da crise da dívida soberana.

Mas antes, na manhã do dia anterior, vinha um alerta de sinal contrário. Stephen Ceccheti, economista do Banco de Pagamentos Internacionais, apresentou o artigo “The real effects of debt”, onde estima precisamente as consequências do endividamento.
Kenneth Rogoff, da Universidade de Harvard e ex-economista chefe do FMI, já o tinha feito no ano passado com a dívida pública e estimou um limiar de 90% do produto interno bruto (PIB). Agora Ceccheti fez as contas, considerando 18 países da OCDE (entre os quais Portugal), entre 1980 e 2010, e olhou também para a dívida privada — das empresas e das famílias.

E as conclusões não são muito diferentes. O limiar da dívida pública está entre 80% e 100% do PIB. No caso das empresas o limiar é de 90% e nas famílias é de 85%, embora a estimativa do seu impacto não seja muito precisa.
Estão Lagarde e Ceccheti a dizer coisas diferentes? Nem por isso. Estão apenas a olhar para dois lados do mesmo problema. O endividamento nas economias avançadas aumentou rapidamente nos últimos anos e, em alguns casos, está em níveis insustentáveis (ver gráfico). Não pode continuar a subir — até porque os mercados ‘não deixam’. Só que este processo pode ser doloroso, principalmente se todos o fizerem em simultâneo.

Daí os receios do diretora do FMI. A expressão double dip (uma recaída na recessão) tem sido repetida com frequência e os exemplos da Grande Depressão e do Japão são suficientemente assustadores. A dívida excessiva é má para o crescimento, não há dúvidas. E deve ser reduzida progressivamente, até para haver margem para usar a política orçamental nas fases baixas do ciclo. Mas tem de haver equilíbrio na desalavancagem, para não matar o doente com a cura. Até porque nem toda a dívida é má, como lembra Paul de Grauwe»
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Expresso, caderno de economia, 03.09.11

Nota: Neste retiro link foi apresentado um importante estudo: “ASPIRIN, ANGIOPLASTY, AND PROTON BEAM THERAPY: THE ECONOMICS OF SMARTER HEALTH CARE SPENDING”, link onde os autores procuram trazer à discussão a actual preferência dos dos utentes por tecnologias de alto custo a contrastar com outros procedimentos mais simples e eficazes.