sábado, junho 29

ADSE: jogar com todas as cartas do baralho…


A 'questão ADSE' tem sido um problema adiado que o Ministro da Saúde resolveu levantar no exacto momento em que cortes orçamentais garrotam os serviços públicos e os impostos 'esbulham' largamente os rendimentos das pessoas, das famílias e das empresas (de toda a gente).
Aparentemente, a teia de soluções que o Ministro Macedo tece à volta da ADSE tem a sua razão de ser. Dentro de um clima de rigor e de equidade decorrente dos constrangimentos que empurram os portugueses para um dramático empobrecimento (é preciso nunca esquecer esta circunstância) não existe espaço para situações que possam ser conotadas como sendo passíveis de ser interpretadas como privilégios. Esta deve ser uma regra para toda a gente.
Quando o ministro afirma que a ADSE não deve contar, “como até agora, [com] transferência do Orçamento do Estado, dos impostos de outros portugueses” link  seria bom definir outras vertentes deste tal ‘seguro público’ de saúde. E entrando por este caminho deverá o ministro clarificar, por exemplo, como entende o quadro de ‘dupla tributação’ que se está a desenhar. Os beneficiários da ADSE ao que toda a gente supõe – Paulo Macedo integra um Governo que não se cansa de afirmar 'privilégios remuneratórios' da Função Publica – pagam impostos e sustentam por esta via o SNS. Ao adiantar-se que os FP, através da ADSE, estão a ser empurrados para um ‘opting out’ (em relação ao SNS) deveria existir alguma compensação fiscal. Enfim, as contas não parecem ser tão lineares. Se a ADSE deixar de contar com transferências do OE em que medida os FP devem ser ‘aliviados’ da pesada carga (canga) fiscal que os esmaga, já que em Portugal afecta per capita cerca de 2000 euros para custos de saúde, sendo 65% deste montante (1350 euros) oriundos do OE … link (facto que devia nas contas do Ministro merecer alguma ponderação).
Ao fazer produzir declarações tão altissonantes é necessário que o MS jogue com todas as cartas do baralho. Caso contrário, o ar benévolo do Ministro no seio de um Governo tão desastrado esboroa-se porque ao seguir caminhos ínvios prossegue na senda do ‘esmifranço’ da FP, um processo em curso sob a batuta da dupla Coelho/Gaspar, que utiliza os mais toscos matizes para denegrir os serviços públicos.
Na verdade, e apresentado de maneira grotesca o problema é maior. Os FP estão a contribuir com a sua quota-parte para o SNS – enquanto serviço público e universal - e alocados para através de um ‘seguro público’ sustentar parte substancial (vamos ficar por aqui) dos serviços de saúde privados e do sector social que, nos últimos anos, tendo sido implantados no terreno. Este o ‘entalanço’ que se adivinha e deve ser desde já discutido e esclarecido.

Semanário Expresso: "Ministro da Saúde quer manter ADSE"  link

E-Pá!

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5 Comments:

Blogger Tavisto said...

Embora este acrisolado amor de Paulo Macedo pela ADSE possa parecer uma preocupação com a saúde dos Funcionários Públicos, em boa verdade não é. A razão por que defende a permanência do subsistema é a mesma que o leva a enaltecer o papel das PPP, a defesa dos interesses dos grupos económicos na área da Saúde.
Agora uma coisa me parece correta, este ou qualquer outro subsistema público a subsistir terá de ser autossustentável. Virem os Funcionários Públicos reclamar alguma forma de compensação pelo facto de, como o cidadão comum, contribuírem através dos seus impostos para o financiamento do SNS, tendo desta forma dupla tributação, é abrir uma enorme caixa de pandora. É que o mesmo raciocínio se aplica a quem tenha seguros de saúde ou subsistemas privados. Daí a passar-se ao direito generalizado ao “opting-out” em relação ao SNS vai um pequeno passo.

11:48 da tarde  
Blogger Clara said...

Paulo Macedo bem nos tem enganado. Bem nos continua a enganar.
Todos, no entanto, já percebemos que o fim último da política de saúde deste ministro é alijar a carga de responsabilidade do Estado no financiamento do sistema. O "opting out", a triagem dos que podem pagar seguros para fora do sistema, persistentemente defendido por "especialistas da saúde" como Mendes Ribeiro,é uma das medidas mais ou menos encapotadas desta política de saúde.
Ora aí temos, consciente ou inconscientemente, esta medida a ser defendida pelo E-Pá". Sinceramente não esperávamos. Certamente não passará de um mal entendido. Que Paulo Macedo e seu poderoso departamento de propaganda agradecem.

12:06 da tarde  
Blogger tambemquero said...


...A ADSE parece ser um seguro, mas não tem partilha de risco entre os beneficiários. O SNS serve também os funcionários e pensionistas do Estado, mas a ADSE permite-lhes aceder a benefícios complementares, como a livre escolha de médico e de clínica privada, com amenidades hoteleiras. Vantagens que só existem na faixa litoral do país.
A adesão não é voluntária, a prevenção e controlo do risco moral, típicas das seguradoras, estão ausentes, ou quase. No ponto de contacto o doente paga uma pequena fracção dos custos, mas a sua parte na conta fi nal, em tardio reembolso, é normalmente elevada – o que torna impossível a generalização da ADSE a todos os cidadãos. Quanto aos benefícios apontados, vejamos:
A liberdade de escolha pode resultar em prejuízo do utente, dado estarmos longe de um mercado de concorrência perfeita. Não existe soberania do consumidor, o qual tem informação insuficiente sobre o mercado, o produto e os resultados. Fragilizado pela doença e pela dependência do médico, seu “agente”, a sua escolha não é soberana. A ausência de referência médica, combinada com a livre escolha e liberta do preço, induz consumismo, acréscimo de custos e riscos adicionais para o doente. Regista-se, em estudos comparados, que os sistemas de tipo convencionado (“bismarckianos”) apresentam maior custo global e menor equidade.
J.C.E. fala em co-pagamentos responsabilizantes, mas desconhece o mercado das clínicas privadas convencionadas com a ADSE, onde o doente, embora não pague taxas moderadoras, tem a seu cargo importantes co-pagamentos, tendo por vezes que se submeter a sistemas de admissão discriminantes. É duvidoso que a ADSE possa “criar mercado e concorrência” e evite a destruição da “economia independente”. Mais importante que a concorrência é a cooperação, para tratar o doente e obter os melhores resultados. E para quê a expansão da economia “independente”, à custa do aumento de encargos para o Estado?
Afirma J.C.E. que a ADSE é um sistema mais racional e menos despesista. A ADSE nem sequer é um sistema, muito menos racional, mas um conjunto não estruturado, focado nos cuidados curativos, em que ninguém é responsável pela gestão da doença. Ao contrário, o SNS baseia-se na primeira instância, em cuidados primários, a prestar na comunidade, e numa segunda instância de cuidados hospitalares, promovido através de referência. O médico de família é o gestor dos recursos: como primeiro contacto, pode melhor gerir o uso de meios de diagnóstico e medicamentos e o envio a especialistas, evitando a hospitalização desnecessária.
Garante J.C.E. que a ADSE é “obviamente” mais barata. Não é verdade. Os actos não são idênticos no público e no privado, na diferenciação e no que o preço integra: a consulta hospitalar inclui medicamentos e meios de diagnóstico. O menor preço do cada acto sai mais caro ao Estado, se ocorrer uma multiplicação de actos, como cronicamente acontece na ADSE. No final, o custo total por doente, controlado por casuística e severidade, é mais elevado na ADSE que no SNS.
Afirma também que o SNS nem precisa de “construir e sustentar serviços estatais”. Tendo o SNS capacidade suficiente, aqui e ali excedentária, a solução correcta será utilizar a capacidade instalada e não fomentar investimentos duplicados. Com as condições políticas favoráveis actuais, há que preservar e melhorar a eficiência do SNS, que exibe resultados notáveis, com indicadores idênticos aos dos restantes países europeus e muito melhores que os dos EUA. Quanto à ADSE, sendo indesejável a sua extinção imediata, será necessário reformulá-la, tornando-a um sistema autosustentável e bem controlado.
A. Dias Alves J. Meneses Correia, Administradores hospitalares
link

12:22 da tarde  
Blogger e-pá! said...

Clara:

Eu não defendo que o SNS sofra qualquer tipo de excepção por parte dos contribuintes. Defendo que esta nova 'arrancada' de Paulo Macedo em relação à ADSE pode configurar uma situação de dupla tributação... para não 'isolar' este ministro de outros que estão entretidos, como sabemos, com o assalto às remunerações dos FP.
Esta a estratégia política envolvente deste Governo. As excepções são ilusões.

Em relação às questões de 'sustentabilidade' terreno habitual de refúgio de Paulo Macedo quando as questões políticas 'apertam' e mostram incongruências deixei bem claro que o plano será: "Os FP estão a contribuir com a sua quota-parte para o SNS – enquanto serviço público e universal - e alocados para através de um ‘seguro público’ sustentar parte substancial (vamos ficar por aqui) dos serviços de saúde privados e do sector social que, nos últimos anos, tendo sido implantados no terreno."

O 'entalanço' não passa do seguinte dilema:
contribuir para o sistema universal (SNS) - o que acho justíssimo - mas a tarefa de 'sustentabilizar' através de um contributo acessório (será uma nova 'renda'?) o sector privado e social da saúde (deixo de fora as PPP) parece-me que deve ser um novo assunto que carece de discussão.

6:11 da tarde  
Blogger Tavisto said...

A chamada de atenção da Clara parece-me correcta e oportuna. Não sei para que valores irá subir a contribuição dos FP no activo e aposentados, para manter a ADSE sustentável sem transferências do OGE. Temo, porque na prática se trata de um seguro e mal controlado, que vá para valores incomportáveis para a maioria dos beneficiários.
Seja como for, sendo um seguro é facultativo (já agora o é) e terá de ser competitivo no mercado das seguradoras. Defender o “opting out” para os FP como (admito que inadvertidamente) decorre do texto de e-pá é, insisto, abrir a caixa de pandora.

12:50 da manhã  

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